4. 1608 - 1640
1608: António Vieira, aquele que é considerado um dos maiores
prosadores da Língua Portuguesa, nasceu a 6 de Fevereiro de 1608 em
Lisboa, quando reinava D. Filipe II, rei de Portugal e Espanha.
É batizado a 15 de Fevereiro do mesmo ano.
5.
1614: Parte com os pais para o Brasil, com apenas 6 anos.
Estuda no Colégio de Jesuítas, na Baía.
1623: Em 5 de Maio de 1623, com 15 anos, entra para o
noviciado do Colégio Jesuíta.
1624: Durante um ano vive numa aldeia índia, na qual os
jesuítas se refugiam após a conquista da Baía pelos
holandeses. Escreve o relatório anual que a Companhia envia
para Roma.
1625: A 6 de Maio, fez os primeiros votos como clérigo e
promete dedicar-se aos índios e negros, altura em que a
cidade da Baía volta a ser reconquistada.
6. Existem
muitas lendas sobre o padre António Vieira,
incluindo a de que, na juventude, a sua genialidade
lhe fora concedida por Nossa Senhora.
Nossa Senhora das Maravilhas
7.
Padre André de Barros:
“Não foi Vieira, como podem supor muitos, um precoce génio: nos
primeiros tempos de estudante, compreendia mal, decorava a custo, fazia
com dificuldade as composições; em tudo aluno medíocre (…). É de
imaginar que orando à Virgem das Maravilhas lhe suplicasse a de o tornar
mais hábil para os estudos. Em um de tais lances, a meio da súplica, sentiu
como estalar qualquer coisa no cérebro, com uma dor vivíssima, e pensou
que morria; logo o que parecia obscuro e inacessível à memória, na lição
que ia dar, se lhe volveu lúcido e fixo na retentiva. Dera-se-lhe na mente
uma transformação de que tinha consciência. Chegado às classes pediu
que o deixassem argumentar, e com pasmo dos mestres venceu a todos os
condiscípulos. Daí por diante foi ele o primeiro e mais distinto em todas as
disciplinas.”
7
8.
1627: Inicia a regência da cadeira de Retórica, no Colégio
Jesuíta de Olinda.
1633: Prega pela primeira vez em público.
9. 1634: A 10 de Dezembro é
ordenado presbítero, já então com
alguns sermões pregados de
créditos confirmados.
“Sermão da 4ª Dominga da Quaresma” em
1633
“XIV Sermão do Rosário” em 27 de Dezembro
de 1633”
“Sermão de S. Sebastião” Sábado de Ramos de
1634”
Púlpito da igreja do Colégio dos
Jesuítas - Baía
10.
1635: Ordenação sacerdotal.
1638: Professor de Teologia no Colégio da Companhia de Jesus da Baía.
Defende o “bom sucesso das armas de Portugal” contra os Holandeses:
“Sermão pelo bom sucesso das armas de Portugal contra as de Holanda”
Púlpito da igreja de Nossa Senhora da
Ajuda, donde Vieira pregou o sermão contra
as armas da Holanda.
12.
1641: A 27 de Fevereiro integra uma delegação que veio a
Lisboa reafirmar o apoio do Brasil à coroa portuguesa e
prestar vassalagem a D. João IV.
A 30 de Abril de 1641, após atribulada chegada, encontra-se
pela primeira vez com D. João IV.
13. 1641 - 1650
A 1 de Janeiro de 1642, terá pregado o seu
primeiro sermão ao rei, o Sermão dos Bons
Anos, com o objetivo de convencer os
membros
do
clero
e
da
nobreza
a
contribuírem com os seus bens para as
despesas da guerra.
Depois, foram muitos e variados os sermões
que pregou, principalmente para os seus
admiradores, o Rei D. João IV e a Rainha D.
Luísa de Gusmão.
14.
Os seus sermões na Igreja de S. Roque tornam-se um grande
acontecimento.
Entre 1641 e 1653, terá proferido cerca de meia centena de sermões,
contando apenas com os impressos. As igrejas enchem-se de multidões e
diz D. Francisco Manuel de Melo: “mandar lançar tapete de madrugada
em S. Roque para ouvir o Padre António Vieira”.
15.
1642: Conselheiro do rei.
1643: Propõe a D. João IV a admissão de mercadores
judeus e a abolição da discriminação dos cristãosnovos, com o objetivo de atrair os seus
investimentos.
1646: Inicia a sua carreira diplomática. Propõe a
reforma do processo inquisitorial.
1649: Obtém do Rei o alvará de proibição de confisco
dos bens dos cristãos-novos pela Inquisição. A
Inquisição tenta obter a sua expulsão.
D. João IV nomeara-o
pregador régio e o
padre torna-se o seu
homem de confiança.
Vieira quer repor
Portugal na sua
antiga grandeza.
16. 1651 - 1661
Depois de falsas partidas e de despedidas
patéticas, parte de Lisboa a 25 de
Novembro de 1651 e chega ao Maranhão
em 16 de Janeiro de 1653, com passagem
prolongada por Cabo Verde, levava um
missão a cumprir de defesa dos índios que
lhe haveria de dar uma luta sem tréguas
contra os colonos.
17.
Nas vésperas de uma das muitas missões que o levarão pelas florestas da
Amazónia, na cidade de São Luís do Maranhão, pregou Vieira o Sermão ao
Espírito Santo. Pretendia Vieira que os colonos autorizassem os escravos a
ir aprender a doutrina e as senhoras que a ensinassem às escravas. Deste
texto saiu a célebre passagem do estatuário.
O espírito missionário aumentava então em Vieira na mesma proporção
que aumentavam os conflitos com os colonos, que o levaram a segundo
regresso a Portugal. Antes da partida para Lisboa, não resistiu à tentação
de defrontar os seus inimigos, pregando, a 13 de Junho de 1654, o célebre
sermão de Santo António, em S. Luís do Maranhão.
18.
1653: Primeiro conflito com os colonos a propósito da
escravatura dos índios. Sermão de Santo António aos Peixes.
19.
1654: Viagem a Lisboa. Consegue um diploma do rei. Sermão
da Sexagésima. Regresso ao Maranhão.
19
20.
1656: Morte de D. João IV.
1660: A Inquisição abre um processo contra Vieira.
1661: Revolta dos colonos e expulsão dos Jesuítas do Maranhão. Vieira é
desembarcado para Lisboa. Apoia a facção do infante D. Pedro. A vitória
do partido de D. Afonso VI fá-lo cair em desgraça.
D. Afonso VI
D. Pedro II
21. 1662 - 1668
Os cárceres da Inquisição
O seu carácter incómodo, o governo
do conde de Castelo Melhor, a
desgraça da rainha, do Marquês de
Gouveia e Duque do Cadaval deixamno desprotegido e abrem campo para
que a Inquisição, que não o tinha
esquecido, o comece a perseguir.
22.
1662: Desterrado para o Porto.
1663: Em Fevereiro vai para Coimbra com regime de residência fixa e em fins de
Maio recebe notificação do Santo Ofício; a 21 de Julho é interrogado pelo
inquisidor Alexandre da Silva.
O processo leva cinco anos e meio de atribulados interrogatórios e defesa e, na
Véspera do Natal de 1667, Vieira retratou-se perante as determinações papais e
ouviu publicamente a sua sentença:
“seja privado para sempre de voz ativa e passiva, e do poder
de pregar, e recluso no colégio, ou casa de sua religião, que o
Santo Ofício lhe assinar, donde, sem ordem sua não sairá; e
que por termo por ele assinado, se obrigue a não tratar mais
das proposições de que foi arguido no discurso de sua causa,
nem de palavra, nem por escrito, sob pena de ser
rigorosamente castigado.”
24. 1669 - 1680
Ainda que a sua aceitação na corte não fosse igual à do tempo de D. João
IV, aí foi pregando e conseguiu voltar à ribalta diplomática. Em 15 de
Agosto de 1669, embarca para Roma, a propósito de uma canonização
de jesuítas, mas o objetivo era fugir da Inquisição.
Depois de uma atribulada viagem, torna-se protegido do provincial dos
Jesuítas, o padre Oliva, afamado pregador do papa e da Corte da Rainha
Cristina da Suécia, esta mesmo teria posteriormente nomeado Vieira seu
pregador oficial em Dezembro de 1673, cargo que não aceitaria.
25.
Roma e tempo de triunfos
“Tanta era a curiosidade de ouvir o forasteiro que se tornou necessário pôr
soldados às portas dos templos aonde ia pregar, para impedir que se
apossasse o público dos lugares, antes de chegarem as dignidades
eclesiásticas e pessoas de representação. O jesuíta português foi neste
tempo alvo predilecto das atenções na sociedade romana. Quem não ia
ouvi-lo decaía no conceito das pessoas de gosto, aquelas que nas grandes
cidades costumam arvorar-se em árbitros da distinção e da moda.”
26.
1671: Proposta de fundação da Companhia da Índia.
1675: Em 17 de Abril consegue o que mais ambicionava, o breve papal que
o livraria definitivamente do Santo Ofício e regressa a Lisboa, mas
permanece afastado dos negócios públicos.
Chegado a Lisboa a 23 de Agosto, visitou o rei D. Pedro II no dia seguinte,
mas a receção fora fria. Decide voltar ao Brasil com novas intenções
missionárias.
1679: Publica o primeiro tomo dos Sermões.
27. 1681 - 1697
1681: Retira-se definitivamente para o
Brasil.
A desilusão que levava de Portugal levamno a procurar descanso na Quinta do
Tanque, local que serviu de refúgio para a
elaboração de grande parte dos sermões,
que
enviará
nos
anos
seguintes
regularmente para serem publicados em
Portugal.
28.
Nesta fase, absteve-se da atividade concionatória e só subiu
ao púlpito por ocasiões importantes, como nas exéquias de
Dona Maria Francisca de Sabóia ou na celebração do
nascimento do primeiro filho de D. Pedro e Dona Maria Sofia
de Neuburgo.
Em Maio de 1688 é nomeado por Roma Visitador da Província
do Brasil o que o obrigou a regressar ao Colégio. O cargo foi
mais um reconhecimento que lhe permitiu, passados três
anos, regressar à Quinta do Tanque, em 1691.
29.
Em 1696 agrava-se a sua saúde e em Julho resolve regressar ao Colégio
dos Jesuítas da Baía:
“Enfim me resolvo a deixar este deserto e ir para o colégio, ou para sarar
como homem com os remédios da medicina, ou para morrer como religioso
entre as orações e braços dos meus padres e irmãos. Adeus, Tanque, não
vou buscar saúde nem vida, senão um género de morte mais sossegado e
quieto...”
1697: Termina a revisão do tomo XII dos Sermões. Morre na Baía, a 18 de
Julho, com 89 anos.
30.
Rodrigues Lapa:
“(…) ninguém como Vieira encarnou esse espírito civilista
do púlpito. Alto, moreno, com o olhar vivo, faiscante, o
grande orador jesuíta usou e abusou talvez desse lugar
para ventilar com brilho e força persuasiva os problemas
do momento. Enredado em questões políticas, de
política tratou na maior parte dos seus sermões, sob o
disfarce mais ou menos velado das alegorias da Bíblia,
onde o seu engenho encontrava com inacreditável
correspondência para o que queria.”
32.
Os Sermões são a parte mais conhecida da sua obra, mas também escreve outro
tipo de textos:
SERMÕES
CARTAS
TRATADOS DOUTRINÁRIOS
Obras de tom profético, História de Portugal e Esperança de Portugal. Nelas
acredita na chegada a Portugal do V Império baseando-se em certos
acontecimentos, documentos e nas Sagradas Escrituras. Ademais há uma
influência do sebastianismo, já que se fala de manter a esperança no futuro. Estas
obras foram consideradas heréticas, pelo que foi julgado pela Inquisição.
O rei dom Sebastião desaparece e nunca aparece o seu corpo nem ninguém o volve ver, mas
mantém-se a esperança de que algum dia volva. Por esta razão torna-se em Portugal o símbolo
da esperança.
33. Razões pelas que publica os seus sermões: em princípio um sermão não se elabora
para ser publicado, mas o Padre António Vieira publica-os porque:
Os seus sermões eram muito famosos e corriam manuscritos na época, e, por
essa razão:
• Corrompiam-se, copiavam-se com erros.
• Atribuíam-se-lhe ao Padre António Vieira textos que não eram da sua
autoria.
• Atribuíam-se-lhe a outros autores textos escritos por ele.
O sermão é também um instrumento da Contra-Reforma para manter os fieis
ligados à Igreja. O pregador tem de divulgar a palavra de Deus e seduzir ao
público.
34. Estrutura:
Parte duma frase das Sagradas Escrituras procurando um sentido
acomodatício, é dizer, acomoda as frases segundo o tema que trata. Mesmo
pode acomodar uma mesma frase a diferentes circunstâncias segundo o tema.
Exemplos:
• “Sermão de Santo António aos peixes”: parte da frase Vos estis sal
terrae (S. Mateus, 5) para explicar que os pregadores dever ser o sal
da terra, não permitir a corrupção nem a podridão das almas.
• “Sermão da sexagésima”: parte da frase Semen est verbum Dei (S.
Lucas, VIII, 11) para explicar que essa semente tem de frutificar nas
boas ações.
35. O discurso segue a estrutura do discurso clássico:
• Exórdio: apresenta-se o assunto perante o auditório e intenta
captar-se a sua benevolência. Serve para não começar
repentinamente, ex abrupto. Tem um carácter prologal.
• Confirmação: abordagem e desenvolvimento do tema.
• Peroração: remate do discurso com palavras que emocionem e
sensibilizem aos ouvintes com o assunto tratado.
36. Assuntos:
Moralidade: verdade e mentira, vaidade, ambição, penitência e outros aspetos da
ideologia cristã.
Patriotismo: sermão contra os holandeses quando pretendiam dominar o
nordeste brasileiro, exige-lhe a Deus que conserve Portugal ou elabora sermões
contra Castela.
Temática social: critica a acumulação de trabalhos, as diferenças entre ricos e
pobres, os hipócritas, os escravizadores de índios e negros, a desmesurada busca
de ouro nas minas, os impostos muito pesados...
Temática panegírica ou laudatória: elogia pessoas (nobres, família real) e
acontecimentos.
Temática hagiográfica: dedica-lhe sermões à rainha Santa Isabel (esposa de dom
Dinis), a Santa Teresa de Jesus e a outros muitos santos canonizados no século XVII
(Contra Reforma) como é o caso destas duas e de São Ignacio de Loyola (fundador
da Companhia dos Jesuítas) ou São Francisco Javier (Jesuíta). Também lhe dedica
sermões a Santa Iria.
38. ANTÓNIO VIEIRA
O céu 'strela o azul e tem grandeza.
Este, que teve a fama e à glória tem,
Imperador da língua portuguesa,
Foi-nos um céu também.
No imenso espaço seu de meditar,
Constelado de forma e de visão,
Surge, prenúncio claro do luar,
El-Rei D. Sebastião.
Mas não, não é luar: é luz do etéreo.
É um dia; e, no céu amplo do desejo,
A madrugada irreal do Quinto Império
Doira as margens do Tejo.
Fernando Pessoa, Mensagem
39. António Vieira
Filho peninsular e tropical
De Inácio de Loiola,
Aluno do Bandarra
E mestre
De Fernando Pessoa,
No Quinto Império que sonhou, sonhava
O homem lusitano
À medida do mundo.
E foi ele o pioneiro.
Original
No ser universal...
Misto de génio, mago e aventureiro.
Miguel Torga, Poemas Ibéricos