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Resumo
Este estudo investigou se a proposta da Estratégia
Saúde da Família (ESF) é objeto de discussão com a
população na prática educativa dos profissionais nela
inseridos e a compreensão sobre Educação em Saúde
que eles possuem. Trata-se de uma pesquisa qualita-
tiva, exploratório-descritiva, realizada a partir de en-
trevistas semi-estruturadas. Na análise de conteúdo,
identificaram-se as categorias: Educação em Saúde;
A Universidade não ensina e A ESF como objeto de
educação em Saúde. Os resultados mostraram que a
ESF não é objeto de educação; alguns profissionais
desconhecemseusfundamentoseamaioriadelestem
práticaseducativasverticaisepatologizantes,distan-
ciando-se da proposta de Promoção da Saúde da ESF.
Reflete-seacercadasconcepçõesdeEducaçãoemSaú-
de que permeiam os discursos dos profissionais, as-
sim como sobre sua participação na capacitação co-
munitária para a construção da autonomia, cidada-
nia e controle sobre os determinantes de saúde na
perspectiva da Promoção da Saúde. Aponta-se para a
importânciadaEducaçãoPermanenteeareestrutura-
ção da graduação, de modo a aproximar as práxis da
Educação em Saúde com a realidade social.
Palavras-chave: Saúde da Família; Educação em saú-
de; Recursos humanos em saúde.
Candice Boppré Besen
Cirurgiã-dentista, Especialista em Saúde da Família pela Uni-
versidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
E-mail: candice_boppre@bol.com.br
Mônica de Souza Netto
Cirurgiã-dentista, Especialista em Saúde da Família pela Uni-
versidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Profª. Substituta do
Departamento de Estomatologia da Universidade Federal de San-
ta Catarina (UFSC)
E-mail: netto.monica@ig.com.br
Marco Aurélio Da Ros
Médico, Doutor em Educação, Profº. Titular do Departamento de
Saúde Pública da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
E-mail: ros@ccs.ufsc.br
Fernanda Werner da Silva
Assistente Social, Especialista em Saúde da Família pela Univer-
sidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
E-mail: nandawerner2000@yahoo.com.br
Cleci Grandi da Silva
Enfermeira, Especialista em Saúde da Família pela Universidade
Federal de Santa Catarina (UFSC).
E-mail: aline_grandi@hotmail.com
Moacir Francisco Pires
Psicólogo, Especialista em Saúde da Família pela Universidade
Federal de Santa Catarina (UFSC), Mestre em Educação pela UFSC.
E-mail: moacirfranciscop@yahoo.com.br
1 Artigo elaborado a partir do Trabalho de Conclusão do Curso
de Especialização em Saúde da Família da Universidade Federal
de Santa Catarina (UFSC).
A Estratégia Saúde da Família como Objeto de
Educação em Saúde1
The Family Health Strategy as object of Health Education1
Saúde e Sociedade v.16, n.1, p.57-68, jan-abr 2007 57
Abstract
This study investigated whether the proposal of the
Family Health Strategy (FHS) is discussed with the
population in the educational practice of the profes-
sionals inserted in this strategy, and the understan-
ding of Health Education that these professionals
have. It is a qualitative, exploratory-descriptive re-
search, carried out through semi-structured inter-
views. The content analysis identified the following
categories: Health Education;
The University does not teach; and FHS as Object of
Health Education. The results showed that FHS is not
an object of education; some professionals are
unawareofitsprinciplesandthemajorityofthemhas
vertical educational practices based on diseases,
which makes them distance themselves from the
proposal of Health Promotion of the FHS. The study
providesreflectionsontheconceptionsofHealthEdu-
cationthatpervadethediscourseoftheprofessionals,
as well as on their participation in the community
qualification for the construction of autonomy, citi-
zenshipandhealthdeterminantscontrolintheHealth
Promotion perspective. The article points to the im-
portance of Permanent Education and to the reorga-
nization of undergraduate studies, so that the Health
Education practice is closer to the social reality.
Keywords: Family Health; Health Education; Health
Manpower.
Introdução
O Programa Saúde da Família (PSF) teve início em
meados de 1993, sendo regulamentado de fato em
1994, como uma estratégia do Ministério da Saúde
(MS) para mudar a forma tradicional de prestação de
assistência, visando estimular a implantação de um
novo modelo de Atenção Primária que resolvesse a
maior parte (cerca de 85%) dos problemas de saúde
(Roncolleta, 2003; Da Ros, 2006).
O PSF visa ao trabalho na lógica da Promoção da
Saúde, almejando a integralidade da assistência ao
usuário como sujeito integrado à família, ao domicí-
lio e à comunidade. Entre outros aspectos, para o al-
cance deste trabalho, é necessária a vinculação dos
profissionais e dos serviços com a comunidade, e a
perspectiva de promoção de ações intersetoriais (Da
Ros, 2006; Brasil, 1997; Roncoletta, 2003).
Obter profissionais aptos a trabalharem nesse
novo modelo e repensar as práticas educativas den-
tro da visão de Promoção da Saúde não se constitui
uma tarefa fácil (Gil, 2005; Brasil, 2003; Brasil,
2005a). Conforme Cutolo (2000), essa dificuldade
acontece como reflexo do modelo de formação destes
profissionais: hospitalocêntrico, biologicista, frag-
mentado. Essas características, do chamado modelo
flexneriano,utilizammetodologiadeensinoverticali-
zada e não problematizadora, ou, como dito por Freire
(2005), uma “educação bancária”.
EssemododepensaredefazeraEducaçãoemSaú-
de faz parte do Estilo de Pensamento (EP) hegemôni-
co, até hoje adotado nas Universidades. Cutolo (2000)
entende Estilo de Pensamento como modos de ver,
entender e conceber, que levam a um corpo de conhe-
cimentos e práticas compartilhados por um coletivo
com formação específica. Para Da Ros (2000), um co-
letivo de pensamento possui uma linguagem espe-
cífica, que utiliza certos termos técnicos e um direcio-
namento das observações, dos problemas e métodos
que passam a ter traços comuns.
Nas universidades, os EPs sobre o tema Educação
em Saúde são caracterizados por Da Ros (2000) em
dois estilos: a educação crítico-reflexiva e a educação
com foco na culpabilização da população.
Sobre a educação crítico-reflexiva, mais compatí-
vel com o modelo dePromoção da Saúde e estruturada
nomodelodeProduçãoSocialdaSaúde,DaRos(2000)
58 Saúde e Sociedade v.16, n.1, p.57-68, jan-abr 2007
coloca que a base histórica para esse EP se encontra
na Teoria da Medicina Social, que surgiu na Europa
em meados de 1800, e segundo a qual o conceito de
saúde tem suas bases na Determinação Social do pro-
cesso saúde-doença. Nesse estilo, a educação é uma
prática libertadora, de relação bilateral entre educa-
dor e educando, em que a postura verticalizadora é
criticada. Para Buss (2003), esse modelo apresenta-
se como uma estratégia de mediação entre as pesso-
as e seu ambiente, combinando escolhas individuais
com responsabilidade social pela saúde, as chamadas
políticas públicas saudáveis.
A educação culpabilizadora, a qual Da Ros (2000)
denomina de Educação Sanitária, enfatiza um EP
hegemônico na formação, em que educar em saúde é
praticar higiene como forma de mudar comportamen-
tos pessoais, para que não haja o adoecimento. A hi-
giene individual deve ser de responsabilidade do in-
divíduo, para evitar a presença do agente causal, em
uma visão claramente biologicista. Há uma negação
explícita na determinação social do processo saúde-
doença (Da Ros, 2000). Nesse caso, o lócus de respon-
sabilidade e a unidade de análise são o indivíduo, que
é visto como o último responsável (senão o único) por
seu estado de saúde. Esse foco sobre o indivíduo e seu
comportamento tem sua origem na tradição, na inter-
vençãoclínicaenoparadigmabiomédico(Buss,2003).
Esse EP gera um modelo de trabalho na saúde que
contempla atividades predominantemente curativas
e reabilitadoras. Não há espaço para a integralidade
da atenção, com a incorporação das ações de Promo-
ção da Saúde, entendidas como o processo de capaci-
tação da comunidade para atuar na melhoria da sua
qualidade de vida e saúde, incluindo sua maior parti-
cipação no controle desse processo (Brasil, 2003).
SegundoLefèvreeLefèvre(2004),quandoháações
de Educação em Saúde no modelo culpabilizante de
educação, geralmente o profissional acredita estar
socialmente investido de autoridade sanitária. Ele
pensa possuir, sob monopólio, o conhecimento verda-
deiro e absoluto dos temas que envolvem saúde e do-
ença; dessa forma, impõe, em nome de interesses
maiores da coletividade, o tipo de comportamento que
os indivíduos devem assumir.
O diálogo educativo entre as autoridades sanitá-
rias investidas de funções educativas e informativas
easpopulaçõestorna-seummerodiscurso,senãovier
acompanhado de um movimento de fortalecimento,
empowerment(empoderamento), econômico, político,
social e cultural dos indivíduos e grupos socialmente
subordinados (Lefèvre, Lefèvre, 2004).
É cada vez mais necessário “oferecer oportunida-
des para que as pessoas conquistem a autonomia ne-
cessária para a tomada de decisão sobre aspectos que
afetam suas vidas” e “capacitar as pessoas a conquis-
tarem o controle sobre sua saúde e condições de vida”
(Pereira e col. apud Lefèvre, Lefèvre, 2004, p. 152).
A autonomia, dessa forma, significa a possibilida-
de de o indivíduo escolher entre as alternativas e as
informações que lhe são apresentadas de forma escla-
recida e livre. Na perspectiva da Promoção da Saúde,
os profissionais devem estabelecer vínculos e criar
laços de co-responsabilidade com os usuários que irão
decidir o que é bom para si, de acordo com suas pró-
prias crenças, valores, expectativas e necessidades
(Brasil, 1997; Pedrosa, 2003). A pessoa autônoma ne-
cessita de liberdade para manifestar sua própria von-
tade, além de capacidadede decidir de forma racional,
optando entre as alternativas que lhe são apresenta-
das,bemcomocompreenderasconseqüênciasdesuas
escolhas (Pedrosa, 2003).
Partindo-se da importância de os profissionais da
saúde estarem aptos a trabalhar sob a lógica da Pro-
moção da Saúde, este estudo investigou a compreen-
sãosobreEducaçãoemSaúdedecirurgiões-dentistas,
enfermeiros e médicos inseridos na Estratégia Saúde
da Família (ESF). Considerando-se a necessidade do
fortalecimento da capacitação da comunidade no con-
trole sobre os determinantes de sua saúde, procurou-
se identificar se esses profissionais trocam informa-
ções ou promovem discussão com a população sobre
a proposta da ESF.
Percurso Metodológico
Este estudo baseia-se em uma pesquisa de campo qua-
litativa, do tipo exploratório-descritiva. Para sua execu-
ção,procurou-secompreenderaessênciadosfenômenos
queenvolvemotemaproposto,contemplandoasrelações
sociais, entendendo os determinantes e os modos pelos
quais se organizam na sociedade e a explicam.
Os dados foram coletados nos meses de setembro
e outubro de 2005, a partir de entrevistas semi-estru-
turadas e diário de campo, cujo questionário foi sub-
Saúde e Sociedade v.16, n.1, p.57-68, jan-abr 2007 59
metido a um pré-teste com três profissionais. As en-
trevistas foram gravadas e guiadas por duas ques-
tões centrais: “O que você entende por educação em
saúde?”, “Você explica o que é PSF para os usuários?”.
Foramentrevistadosonzeprofissionaisqueatuam,no
mínimo, há um ano em unidades de saúde de Floria-
nópolis, inseridos nas equipes da ESF. Para definir o
número de entrevistados, utilizou-se o recurso do es-
gotamento do discurso.
InspiradaporMinayo(1994)eBardin(1977),aaná-
lise das entrevistas foi realizada conforme processo
de ordenação dos dados, processo de categorização
inicial, processo de reordenação dos dados empíricos
e processo de análise final.
Comose tratadepesquisaenvolvendosereshuma-
nos, o projeto desta pesquisa foi submetido à aprova-
ção do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade
Federal de Santa Catarina (UFSC) – projeto 281/05 –
de acordo com a resolução do Conselho Nacional de
Saúde(CNS),no
196/96.Cadaentrevistadoassinouum
termo de consentimento, declarando sua livre parti-
cipação na pesquisa, após ter recebido os devidos es-
clarecimentos sobre objetivos e método do estudo.
Assim, para a preservação de sua identidade, utiliza-
ram-se codinomes (E1, E2, E3 etc.).
Nesta pesquisa, originalmente, emergiram oito
categorias de temas distintos. Para a temática de Pro-
moção e Educação em Saúde, à qual se destina este
artigo, destacam-se três destas categorias: Educação
em Saúde (com as subcategorias educação patologi-
zante e vertical, educação promotora de saúde e edu-
cação horizontal centrada na doença); Aprendi no Ser-
viço/A Universidade não Ensina; e A Estratégia Saú-
de da Família como Objeto de Educação em Saúde,
desdobradas conforme se segue.
1. Educação em Saúde
Esta categoria reúne elementos que identificam as
concepções de Educação em Saúde que permeiam os
discursos dos profissionais da Estratégia Saúde da
Família. Assim, achamos necessário decompor essa
categoria em três subcategorias.
1.1. Educação Patologizante e Vertical
Esta subcategoria baseou-se nos profissionais que
possuem um Estilo de Pensamento (EP) curativista
na Educação em Saúde, com foco nas patologias, e
impositivo na relação profissional-paciente. A maio-
ria dos entrevistados, no total de seis, apontam para
essa lógica do processo educativo, em que os discur-
sos são permeados por orientações preventivistas.
Aqui a idéia é educar para prevenir.
Vaitsman (1992) afirma tratar-se de uma herança
do modelo cartesiano que ainda domina as práticas
educativas e de saúde. Se, por um lado, apresenta
melhorias das condições de saúde da população, au-
mento da perspectiva de vida, por outro, desenvolve
uma sociedade medicalizada, estruturada em uma
tecnologia médica dealto custo,com enfoque reducio-
nista, que sempre parece correr atrás de respostas
para as doenças produzidas pelo modo de organiza-
ção da vida social (Stotz, 1993; Illich, 1990; Gazzinelli
e col., 2005).
Assim, o conhecimento científico e a tecnologia de
alto custo têm posição de destaque passando a ser di-
vulgados como verdade. Passaram a opor e, até mes-
mo, a desprezar o senso comum; ou seja, negam e tra-
tam como “erro” o modo como as classes populares,
teoricamentenãodetentorasdesteconhecimento“ofi-
cial”, entendem e explicam o mundo (Valla, 2000; Fon-
seca, 2000).
Para Pedrosa (2003), essa concepção científica,
que poderíamos chamar de clássica, impregna as
ações ditas pedagógicas nos serviços de saúde, com o
agravante de serem pontuais e focalizadas nas especi-
ficidades de cada programa, intervenção ou situação.
Dessa forma, são desenvolvidas ações educativas, por
exemplo, para diabéticos, hipertensos, cardíacos, ges-
tantes, nutrizes, adolescentes e outros, tipificando
cadaserhumanocomograuderiscoquedeterminado
modo de viver o enquadra.
O Estilo de Pensamento nas ações educativas des-
ta subcategoria preconiza, verticalmente, a adoção de
novos comportamentos, como por exemplo, “parar de
fumar, vacinar-se, ter melhor higiene, entre outros, e
de estratégias geralmente ditas coletivas, como a co-
municação de massa” (Stotz, 1993).
Seguindo essa concepção, percebe-se que a fala
está voltada para a prevenção de doenças:
Educação em Saúde são os procedimentos que você
faz, que você agrega à comunidade que você trabalha
paraprevenirasdoenças[...]Então,sãotodasasações
básicas simples que você possa formar a cabeça da-
quelas pessoas com as quais a gente trabalha. São
noções básicas de higiene. (E1)
60 Saúde e Sociedade v.16, n.1, p.57-68, jan-abr 2007
Esse modo de pensar a Educação em Saúde tem
sempre um agente externo causador da doença que
deve ser combatido como o “inimigo”. É o caso do ci-
garro, que causa câncer e doenças coronarianas; do
açúcar e do sal, que causam a diabetes e a hiperten-
são arterial; das gorduras, que causam o aumento do
colesterol e o infarto, a obesidade e assim por diante
(Laplantine, 1991).
Reforça-se nesse depoimento, o modelo biológico
ou “exógeno” do adoecimento, segundo Laplantine
(1991).
Oriento que não se deve comer fora de hora, falo bas-
tante sobre doces, perguntando: Tu adoças muito o
café ou suco? Não tem problema fazer isso, não é que
não se possa comer bala ou adoçar muito o suco para
quem gosta de doce, mas tem que saber que após, tem
que escovar os dentes e não após muitas horas. Eu
sempre falo isso. (E2)
Para Buss (2003), a prevenção difere-se da promo-
ção, porque direciona mais às ações de detecção, o
controle e o enfraquecimento dos fatores de risco ou
fatores causais de grupo de enfermidades ou de uma
enfermidade específica; seu foco é a doença e os me-
canismos para atacá-la, mediante o impacto sobre os
fatores mais íntimos que a geram ou a precipitam.
Nota-se que além de centrar-se na doença, a edu-
cação, nessa subcategoria, segue um modelo tradici-
onal de imposição de conhecimentos ao paciente.
Quando a relação linear entre o saber instituído e o
comportamento acontece, via de regra, a educação se
torna normativa (Gazzinelli e col., 2005). É muito co-
mum encontrar atividades educativas que fazem uma
transposição para o grupo da prática clínica indivi-
dual e prescritiva, tratando a população usuária de
forma passiva, transmitindo conhecimentos técnicos
sobre as patologias e como cuidar da saúde, descon-
siderando o saber popular e as condições de vida des-
sas populações. Muitas vezes, a culpabilização do pró-
prio paciente por sua doença predomina na fala do
profissional de saúde, mesmo que ele saiba dos
determinantes sociais da doença e da saúde (Vascon-
celos, 2000 apud Valla, 2000; Briceño León, 1996).
O princípio que está por trás da norma de compor-
tamento é a de que alguém, além do sujeito, conhece
melhor o que é apropriado para ele e para todos, in-
distintamente:
Educação em Saúde são ações que partem do serviço,
dos profissionais em direção ao usuário, no sentido
de ajudar o usuário no seu entendimento sobre as
questões de saúde,das questões dos cuidados que ele
possa ter com o corpo etc. (E3)
Nasatividadesditaseducativas,comoaspalestras
e as aulas, sejam em grupos ou em consultas indivi-
duais, passa-se a idéia de que a doença se deve, prin-
cipalmente, à falta de cuidado e ao desleixo da popu-
lação com a sua saúde, deixando a “vítima” com sen-
timentode“culpa”peloproblemaqueapresenta.Como
resultado dessa prática, dentre outros problemas, fo-
ram identificados por Chiesa e Veríssimo (2001), os
seguintes: baixa vinculação da população aos servi-
ços de saúde, baixa adesão aos programas e aos trata-
mentos e frustração dos profissionais de saúde.
Esses problemas ficaram evidentes nas entrevis-
tas a seguir:
A gente não remarca,peço para que anote na caderne-
ta e bote na geladeira. Os pais que têm interesse
retornam, quando a gente marcava era um desastre
total, a inadimplência era grande. (E1)
Já tentamos fazer grupos algumas vezes,mas as pes-
soas não vêm (...) (E4)
Autores como Briceño-León (1996) e Cáceres (1995)
deixam explícito o fato de que os programas de Educa-
ção e Saúde não devem se limitar a iniciativas que vi-
sem a informar a população sobre um ou outro proble-
ma. O trabalho educativo a ser feito deve extrapolar o
campo da informação, integrar a consideração de valo-
res,decostumes,demodelosedesímbolossociais,que
levam a formas específicas de condutas e práticas.
Ensinar é algo profundo e dinâmico; portanto, tor-
na-se imprescindível a “solidariedade social e políti-
ca”, para evitar um ensino elitista e autoritário, como
quem tem o domínio exclusivo do “saber articulado”
(Freire,1997).Segundoesseautor,educarnãoéamera
transferência de conhecimentos, mas sim a conscien-
tização e o testemunho de vida, do contrário não terá
eficácia. A autonomia, a dignidade e a identidade do
educando, no caso, a comunidade e seus sujeitos, têm
de ser respeitadas, caso contrário, o ensino se torna-
rá “inautêntico, palavreado vazio e inoperante”.
Neste sentido, qualquer iniciativa de educação só
toma dimensão humana quando se realiza a “expul-
são do opressor de dentro do oprimido”, como liberta-
ção da culpa (imposta) pelo “seu fracasso no mundo”
(Freire, 2005).
Saúde e Sociedade v.16, n.1, p.57-68, jan-abr 2007 61
Freire (1997) insiste também na “especificidade
humana” da educação, como competência profissio-
nal e generosidade pessoal, sem autoritarismos e ar-
rogância. Só assim nascerá um clima de respeito mú-
tuo e de disciplina saudável entre “a autoridade do-
cente e as liberdades dos alunos, [...] reinventando o
ser humano na aprendizagem de sua autonomia”.
1.2. Educação Promotora de Saúde
Nesta subcategoria, são reunidas as percepções dos
profissionais que têm outro Estilo de Pensamento
(EP), que está voltado para a Promoção da Saúde no
seu processo de trabalho educativo. Embora não se
tratando de uma pesquisa quantitativa, chama a aten-
ção o dado de que somente três profissionais foram
identificados dentro deste EP.
Neste EP, a Educação em Saúde é abordada como
estratégia fundamental, entendida de forma ampliada
e não somente como um momento cronológico anteri-
or à doença. Isso só ocorre quando a Promoção da Saú-
de é vista como um jeito de pensar e de fazer a saúde,
no qual as pessoas são vistas em sua autonomia e em
seu contexto político e cultural como sujeitos capazes
de superar o instituído e serem os seus próprios
instituintesdeummododevidasaudável(Buss,2003).
Nesse sentido, os entrevistados comentam:
A Educação em Saúde é uma educação diferente de
consultório. É uma educação que leva em considera-
ção as pessoas da comunidade, a questão cultural
dela [...] (E5)
Então,em Educação em Saúde,tu quer que as pessoas
saibam as coisas que tu sabe, mas aí vai muito a for-
ma que tu faz isso, né? Por exemplo, a gente parte do
pressuposto que quer promover a saúde e fazer preven-
ção de algumas doenças.Então,a gente vai pegar e dar
uma palestra para as pessoas, aí não dá, né? [sorriu].
Nãodá,tunãoestáutilizandooconhecimentodaspes-
soas, não está sendo estratégico, não tá respeitando o
conhecimentodessaspessoas,nãoestádiscutindocom
elas, não está levando em consideração o que elas sa-
bem, o contexto de vida que elas vivem, a história de
vida deles para aquilo que tu queres buscar: a melhor
qualidade de vida, daqueles tanto saudáveis como
com os doentes. Você deve utilizar a sabedoria delas
para tu discutires,fazer com que estas pessoas sejam
agentes da melhora da qualidade de vida deles. (E6)
Aqui, são estabelecidas condições favoráveis à su-
peração do caráter meramente instrumental da Edu-
cação em Saúde cujos princípios se apóiam exclusi-
vamente no saber científico. À medida que se observa
a progressiva importância conferida às representa-
ções e aos saberes do senso comum na relação dos
sujeitos com a doença, mais apurada se torna a críti-
ca ao absolutismo e à autonomia do saber científico.
O saber científico desconsidera a dimensão socioeco-
nômico-cultural do sujeito, tornando o processo edu-
cativo não eficaz, uma vez que suas intenções diver-
gem da realidade social e não proporcionam uma
interação efetiva. Se a educação não se voltar à reali-
dade concreta do indivíduo ela não se realiza, pois
extrapola o universo do qual ele faz parte (Vascon-
cellos, 2004; Valla, 2000).
Pedrosa (2003) defende que as práticas educativas
devem considerar a construção compartilhada de sa-
beres que fundamentam as visões de mundo das pes-
soas e respeitar esses saberes forjados no mundo da
vida, potencializando, dessa forma, o protagonismo
das pessoas e dos coletivos sociais.
Nessa perspectiva, as ações educativas assumem
umnovocaráter,maisaderenteaosprincípiospropos-
tos pela ESF, destacando-se o direito à saúde, como
eixo norteador, e a capacidade de escolha do usuário,
uma condição indispensável.
Assim, é fundamental que o setor saúde embase a
educação não apenas na transmissão de conhecimen-
tos historicamente acumulados, mas que, principal-
mente, trabalhe na perspectiva da construção de co-
nhecimentos e de qualidade de vida por todos aqueles
que a integram.
A fala a seguir expõe esse pensamento promotor
de saúde e de qualidade de vida:
A gente está abrindo também espaço aqui na unidade
para a comunidade realizar atividades que não envol-
va doença,como yoga,ginástica,resgate cultural,por
exemplo.Nós temos a dona Lurdes,que é nossa anciã,
ela faz renda de bilro e pensamos dela fazer aula de
renda de bilro. Tem também o motorista da ambulân-
cia que toda vida dele ele fez rede de pesca.E isso está
se perdendo, a importância cultural, está se perden-
do. A dona Lurdes fala igual manezinha2
e não tem
vergonha. Já os filhos mais velhos dela falam mais
2 Denominação popular para a pessoa nascida em Florianópolis.
62 Saúde e Sociedade v.16, n.1, p.57-68, jan-abr 2007
ou menos, e o mais novo faz questão de dizer que não
é mané,então,isso está se perdendo.Outra idéia tam-
bém seria a projeção de filme por semana, algo mais
cultural. (E5)
A Promoção da Saúde, na prática das ações de edu-
cação, pressupõe que os indivíduos aumentem o con-
trole sobre suas vidas através da participação em gru-
pos, visando transformar a realidade social e políti-
ca. Assim, há uma profunda distinção da abordagem
tradicional centrada na mudança de comportamento
individual. Assim, a prevenção dos agravos à saúde
não é tratada isoladamente, mas como uma das me-
tas a serem atingidas para a melhoria da qualidade
devidaeparaajustiçasocial(Valla,2000;Stotz,1993)
Nesta subcategoria, as condições de vida e a es-
trutura social são colocadas como as causas básicas
dos problemas de saúde. Neste enfoque, a Educação
em Saúde é entendida “como uma atividade cujo in-
tuito é o de facilitar a luta política pela saúde” (Valla,
2000).
1.3. Educação Horizontal Centrada na Doença
Nesta subcategoria, parece surgir um terceiro EP em
Educação em Saúde. As diferenças de EP, distancia-
mentos (ou proximidades), ou diferenças na precisão
dos limites entre alguns Estilos de Pensamento são
chamados por Fleck (1986) de matizes de Estilo de
Pensamento (Fleck, 1986; Cutolo, 2000).
A relação profissional–paciente aparece de modo
horizontal, sem imposição ou autoritarismos; entre-
tanto, não consegue sedespir do rigor doconhecimen-
to científico voltado para a prevenção, para o biológi-
co, como verdade absoluta e única a ser inserida no
conhecimento dos indivíduos. Percebe-se que o pro-
fissional, teoricamente, tem a consciência da neces-
sidade de considerar o conhecimento do paciente, res-
peita sua cultura e troca experiências com ele, porém
seu discurso não se descola do “tema” doença. Esse
estilo de pensar, para Mendes (1985), tem sua funda-
mentação advinda do aparelho formador ainda
Flexneriano.
No processo educativo, o profissional parte do co-
nhecimento do paciente, mas não promove saúde no
seu conceito amplo, seu foco educativo está direcio-
nado às doenças:
A educação não é feita toda de uma vez,é aos poucos,
partindo do que ele já sabe, perguntando: o que o se-
nhor ou a senhora sabe sobre sua doença? O que ou-
viu falar? O senhor/senhora conhece alguém com este
problema? Como essa pessoa vive? (E7)
Os profissionais de saúde acreditam que o modo
de vida dos indivíduos pode ser a causa de doenças e
que, quando necessário, sem autoritarismos, ele deve
ser mudado com base no que é considerado compor-
tamentocorreto,conformeopontodevistabiomédico.
Este pressuposto, segundo Illich (1990), pode levar o
comportamento humano à dependência de uma defi-
nição médica de “correção”, ou ao que tem sido cha-
mado de “medicalização da vida”. Isso pode ser consi-
derado um problema, porque pressupõe a aceitação
social da medicina como fonte legítima de verdade,
apesar da postura aberta de alguns profissionais aos
valores e cultura dos indivíduos, constituindo-a em
uma instituição de controle social.
A ideologia do individualismo tem conduzido à
escolha do convencimento como principal estratégia
educativa do modelo tradicional de educação em saú-
de (Mendes, 1985). Modos de vida não saudáveis, que
fogem às regras, são relacionados à ignorância dos
indivíduos quanto ao “correto” estilo de vida, segun-
do a visão biomédica. Ao instruir os indivíduos quan-
to à relação entre o comportamento “incorreto” e as
patologias, os educadores em saúde esperam persua-
di-los a assumir diferentes condutas.
Mesmoaquele profissionalquebuscaacolherever
os sujeitos enquanto integrantes de um meio socio-
cultural diverso acaba por “deslizar” no rigor do seu
conhecimento científico profissional a medida em
que impõe regras comportamentais, como se percebe
a seguir:
Não é só aquela consulta de você chegar e dar remé-
dio. As pessoas me procuram muito mais pra conver-
sar, pra ter alguém que ouça. [...] Quando eu atendo
primeiro o paciente eu digo que a pressão dele está
alta, porque ele está comendo muito salgado ou não
está caminhando e não está tomando muito líquido.
Aí ele [o usuário] vai sair daqui com uma informação
maior. Vai pensar melhor nisso aí, no que fazer. Por-
que não é uma vez que você consegue mudar o hábito
de vida de uma pessoa. E ele [o usuário] vindo e tu fa-
lando sempre a mesma coisa para ele,a gente cobran-
do não consegue assim uns 100%, mas aos pou-
quinhos, de grãozinho em grãozinho (...) (E8)
Saúde e Sociedade v.16, n.1, p.57-68, jan-abr 2007 63
2. Aprendi no Serviço/ A Universidade não Ensina
A capacitação dos profissionais nos cursos da área da
saúde tem demonstrado limitações quanto à forma-
ção básica, no caso desta pesquisa, na ESF. Essas li-
mitações podem ser percebidas, conforme alguns de-
poimentos dos profissionais quando questionados
onde aprenderam a fazer Educação em Saúde:
Na universidade eu sei que não foi.Foi com os pacien-
tes mesmo,né? Nós trabalhamos muito próximos das
comunidades em Florianópolis, isto é muito real. [...]
E aprende. É uma troca. Na realidade sai uma troca.
Eu já aprendi muito com meus pacientes. (E9)
A atual formação das Universidades gera um mo-
delo de trabalho na saúde que contempla atividades
predominantemente curativas e reabilitadoras, não
permitindo a integralidade da atenção, em que as
ações de saúde devem também incorporar as práticas
educativas promotoras de saúde (Brasil, 2003). A mai-
oria dos profissionais que atuam no Sistema Único
de Saúde (SUS) ainda segue esse modelo, curativista,
que não abre espaço para as práticas de educação e
saúde efetivas (Pedrosa, 2003).
Além disso, percebe-se, nos depoimentos, que a
Universidade tem sido uma instituição de ensino que
usa do método de transmissão de conhecimento, ba-
sicamente de maneira verticalizada, negligenciando
o processo de ensino-aprendizagem e a interação do
educador-educando, conforme expressa a fala:
[Aprendi] No dia-a-dia, porque na Universidade até
quando eu tava na graduação,é aquele grupo de sem-
pre. A gente vai com a palestra pronta, e passa, igual
na Universidade quandoa gente assiste uma aula.Vai
e fala o que é, e o que não é [...] e deu. E Educação em
Saúde não é isso. (E10)
É preciso que a universidade lance mão de uma
“pedagogia não-normativa, problematizadora e
dialogal” do tipo proposto por Freire (2002) na forma-
ção dos profissionais, para que eles possam, segundo
Lefèvre e Lefèvre (2004), propiciar oportunidades de
encontro e de troca entre o campo sanitário e o cam-
po de senso comum e o fortalecimento deste último
(associações de bairro, conselhos comunitários de
saúde, clubes de mães etc.). Caso contrário, os profis-
sionais acabarão sendo meros reprodutores daquela
Educação em Saúde autoritária e prescritiva que os
formou na universidade.
Da mesma forma, é essencial que o investimento
na formação profissional não se limite à qualificação
puramente técnica. A universidade precisa responder
às necessidades da sociedade. O processo de forma-
ção que pretende ser eficiente jamais pode perder de
vista a importância da comunidade na definição de
suas necessidades, pois a prestação de atendimento
somente tem sentido quando responde às demandas
dos usuários (Severino, 2002).
Sisson (2002) afirma que a ESF possui limitações
em sua operacionalização relacionada aos recursos
humanos, gestores e recursos financeiros. Entre es-
ses limites, aparece com destaque a formação inade-
quada dos profissionais. Segundo a mesma autora, o
modelo assistencial hegemônico mantém-se inaltera-
do ao privilegiar a atenção individual e hospitalar.
Conseqüentemente, na rede básica, as atividades cen-
trais continuam sendo a consulta médica, realizada
como pronto-atendimento, em prejuízo ao cuidado
integral deatenção e ao controlesobre os determinan-
tes principais das condições de saúde.
A necessidade de mudança no processo de traba-
lho, na gestão e na formação de recursos humanos é
amplamente reconhecida e acompanhada de críticas
à inércia do aparelho formador, às universidades, em
que existe grande resistência e dificuldades de mu-
danças, e nas quais continuam sendo formados pro-
fissionaisquerealimentammodelosassistenciaisque
algumas reformas buscam superar. As críticas con-
centram-se na educação médica, embora estejam re-
lacionadas à formação dos demais profissionais
(Sisson, 2002).
3. A Estratégia Saúde da Família como objeto de
Educação em Saúde
Essa categoria se propõe a trazer reflexões sobre a
ESF como um possível objeto de Educação em Saúde
para o acesso da população às informações sobre sua
saúde,construçãodacidadaniaebuscadeautonomia.
Pretende-se fomentar a socialização dos saberes acer-
ca do ESF/SUS, com o intuito de incentivar a partici-
pação social nos determinantes de sua saúde.
AESF,vistacomoobjetodeEducaçãoemSaúde,tem
comopapelcentralumapráticaeducativavoltadapara
aPromoçãoda Saúde,comoumconjunto deatividades
orientadas a propiciar o melhoramento de condições
de bem-estar e acesso a bens e a serviços sociais.
64 Saúde e Sociedade v.16, n.1, p.57-68, jan-abr 2007
Dessa forma, os autores entendem que dedicar um
espaço da Educação em Saúde para trabalhar ques-
tões que vão além do biológico com a população pro-
pulsionará o desenvolvimento de conhecimentos, ati-
tudesecomportamentosfavoráveisaocuidadodasaú-
de mediante o processo de empowerment e luta pelo
alcance de estratégias que permitam um maior con-
trole sobre suas condições de vida, individual e cole-
tivamente.
A Educação em Saúde pode ser feita dentro da fa-
mília, na escola, no trabalho ou em qualquer espaço
comunitário. Este é um componente que está presen-
te na Carta de Ottawa, resultante da I Conferência In-
ternacional sobre Promoção da Saúde, em 1986, no
Canadá, que resgata a dimensão da Educação em Saú-
de, além de avançar com a idéia de empowerment, ou
seja, o processo de capacitação (aquisição de conhe-
cimentos) e consciência política comunitária (Buss,
2003). A percepção de que a mudança na Educação em
Saúde deve acompanhar a formação dos profissionais
de saúde também está presente na declaração resul-
tante desta conferência (Buss, 2003).
Segundo Pedrosa (2003), faz-se necessário repen-
sar a Educação em Saúde sob a perspectiva da parti-
cipação social; compreender que as verdadeiras prá-
ticas educativas só têm lugar entre sujeitos sociais e
considerar a Educação em Saúde uma estratégia para
a constituição de sujeitos ativos, que se movimentam
em direção a um projeto de vida libertador.
Diante dessas e de outras considerações que são
apresentadas neste estudo, a partir da análise de tre-
chos das entrevistas realizadas, discute-se se os pro-
fissionais entendem a proposta da ESF e se trocam
informações com a população sobre a ela.
Os trechos abaixo nos conduzem à reflexão sobre
arelaçãoimediatistaecurativistaàqual estãoacostu-
mados os profissionais da ESF, quando questionados
se promovem discussão sobre a ESF com a população:
Não.O pessoal quer saber,ao bater na porta ali,ó,que
ele tá preocupado em resolver a necessidade dele,não
quer saber se é PSF. (E1)
Ascolocaçõesabaixoevidenciam,comtransparên-
cia, a falta de esclarecimento à população sobre a que
se propõe à ESF
Sabe que eu nunca parei para falar sobre isso.Na ver-
dade, eles [os usuários] não têm uma noção boa ain-
da sobre o PSF. Acho que nem mesmo a gente tem. A
gente fala que trabalha no PSF, mas eu nunca parei
para explicar especificamente o PSF para o paciente.
Até porque,deveria ter tempo,mas ele [o usuário] vem
aqui com outras coisas, e a gente acaba conversando
e não fala do programa. É uma lacuna mesmo. (E10)
A partir da análise das considerações feitas pelos
sujeitos de pesquisa, verificamos que, dos onze pro-
fissionais entrevistados, somente dois responderam
que discutem com usuários a proposta da ESF:
[...] No grupo, quando se fala do Programa Saúde da
Família,eles ficam bem interessados,eles perguntam,
mas você tem de estimular.É difícil alguém chegar do
nada e perguntar o que é PSF, a não ser quando uma
semana depois que a gente publicou um jornalzinho
local falando sobre o PSF. É outra forma que comple-
menta. Tivemos uma tiragem de 8 mil exemplares, é
pouco, mas são oito mil que lêem. (E5)
Para todos os entrevistados, se não fosse pela
indução da pergunta, a ESF não iria surgir como pro-
posta que faça parte da educação em saúde dos pro-
fissionais. Ela é considerada pelos autores como uma
categoria por ausência.
Sugere-se, neste estudo, que os profissionais da
ESF sejam capacitados a trabalharem neste novo mo-
delo de saúde, pois, mediante as análises de conteú-
do, constatou-se que muitos deles ainda não têm bem
claro o que realmente seja a ESF e que, portanto, pou-
co têm a contribuir como multiplicadores de informa-
ções a esse respeito. Ocorre que o EP hegemônico ain-
da se pauta em um processo de ensino, para a forma-
ção universitária, que valoriza a prática intervencio-
nista, com uma relação sujeito-objeto, e no modelo
biologicista, que não trata de emponderar a popula-
ção (Da Ros, 2004).
Por outro lado, podemos identificar que aqueles
profissionais que tentam promover uma discussão
com a população acerca dessa proposta não conse-
guem fazê-lo de modo mais aprofundado e contínuo,
em função, entre outros, da demanda de usuários in-
compatível com a capacidade de atendimento. Além
disso, os gestores (também malpreparados) não pos-
sibilitam a esses profissionais a possibilidadede Edu-
cação Permanente. Premidos pela formação flexine-
riana e pela realidade de um serviço que não valoriza
a formação de saúde, o modelo não avança. (Brasil,
2003). Esse fato tende a fazer com que os processos
de educação e comunicação na perspectiva da Promo-
çãodaSaúdesejamrelegadosaumaquestãodesegun-
da ordem.
Saúde e Sociedade v.16, n.1, p.57-68, jan-abr 2007 65
Considerações Finais
Constatou-sequeaformaçãodosprofissionaisdesaú-
de é uma das problemáticas centrais. Eles demons-
tram não estar preparados para o trabalho na lógica
da Promoção da Saúde requerida pela ESF. Ao contrá-
rio, a maioria dos discursos é permeada por uma edu-
cação voltada para as doenças e para a tentativa de
mudança de comportamento dos indivíduos, com re-
lação vertical e impositiva. Por essa razão, reitera-se
a relevância da Educação Permanente e da reestru-
turação da graduação, de modo a aproximar as práxis
da Educação em Saúde da realidade social.
Assim, afirma-se que a Educação Permanente é
aprendizagem no trabalho, em que o aprender e o en-
sinar se incorporam ao cotidiano das organizações
deste trabalho. Propõe-se que os processos de capaci-
tação dos trabalhadores da saúde tomem como refe-
rência as necessidades de saúde das pessoas e das
populações e tenham como objetivos a transformação
das práticas profissionais e da própria organização
do trabalho, estruturadas a partir do processo de
problematização (Brasil, 2003; Brasil, 2005a).
Além disso, propõe-se que o processo de trabalho
dos profissionais da ESF possa ser um veículo de
empoderamento da população mediante a discussão
sobre o que propõe a ESF e/ou o SUS e como devem
ser estruturados conforme a legislação.
Não somente os profissionais já formados e inte-
grantes das equipes da ESF devem ser capacitados
para uma Educação em Saúde adequada. Tendo em
vista a importância de todo o processo de formação
do profissional, eles precisam, desde a graduação, se
formar na lógica do modelo da Determinação Social
da Saúde, capacitando-se para trabalhar na ESF/SUS.
Assim, é essencial a articulação do Ministério da
Saúde (MS)/Ministério da Educação e Cultura (MEC)
a fim de efetivar a reforma curricular. O MS, por in-
termédio da Secretaria de Gestão do Trabalho e da
Educação na Saúde (SGTES), em conjunto com a Se-
cretaria de Educação Superior do Ministério da Edu-
cação (SESU/MEC), vem conduzindo o processo de
implantação do Programa Nacional de Reorientação
da Formação Profissional em Saúde – PRÓ-SAÚDE.
Inspirado no que foi o PROMED, dirigido às escolas
médicas, que incentivou e manteve 19 escolas médi-
cas, incrementando processos de transformação, o
PRÓ-SAÚDE tem como eixos básicos: a realização do
ensino nos ambientes reais onde se dá a assistência à
saúde pelo SUS, o uso de metodologias e estratégias
educacionais, nas quais os estudantes assumam pa-
péis mais ativos, e a própria expansão do objeto do
ensino, que não deve ser apenas a doença já instala-
da, mas a Produção Social da Saúde como síntese de
qualidade de vida. Essa iniciativa visa à aproximação
entre a formação de graduação no país e as necessi-
dades da Atenção Primária, que se traduzem no Bra-
sil pela ESF. A desarticulação entre os mundos acadê-
micos (saber científico) e o saber popular vem sendo
apontada, em todo mundo, como um dos responsáveis
pela crise do setor da saúde, no momento em que a
comunidade global inicia a tomada de consciência
acerca da importância da formação dos trabalhado-
res de saúde, valorizando-os cada vez mais (Brasil,
2005b; Brasil, 2003; Brasil, 2000).
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68 Saúde e Sociedade v.16, n.1, p.57-68, jan-abr 2007

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A Esf como objeto de educação em saúde

  • 1. Resumo Este estudo investigou se a proposta da Estratégia Saúde da Família (ESF) é objeto de discussão com a população na prática educativa dos profissionais nela inseridos e a compreensão sobre Educação em Saúde que eles possuem. Trata-se de uma pesquisa qualita- tiva, exploratório-descritiva, realizada a partir de en- trevistas semi-estruturadas. Na análise de conteúdo, identificaram-se as categorias: Educação em Saúde; A Universidade não ensina e A ESF como objeto de educação em Saúde. Os resultados mostraram que a ESF não é objeto de educação; alguns profissionais desconhecemseusfundamentoseamaioriadelestem práticaseducativasverticaisepatologizantes,distan- ciando-se da proposta de Promoção da Saúde da ESF. Reflete-seacercadasconcepçõesdeEducaçãoemSaú- de que permeiam os discursos dos profissionais, as- sim como sobre sua participação na capacitação co- munitária para a construção da autonomia, cidada- nia e controle sobre os determinantes de saúde na perspectiva da Promoção da Saúde. Aponta-se para a importânciadaEducaçãoPermanenteeareestrutura- ção da graduação, de modo a aproximar as práxis da Educação em Saúde com a realidade social. Palavras-chave: Saúde da Família; Educação em saú- de; Recursos humanos em saúde. Candice Boppré Besen Cirurgiã-dentista, Especialista em Saúde da Família pela Uni- versidade Federal de Santa Catarina (UFSC). E-mail: candice_boppre@bol.com.br Mônica de Souza Netto Cirurgiã-dentista, Especialista em Saúde da Família pela Uni- versidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Profª. Substituta do Departamento de Estomatologia da Universidade Federal de San- ta Catarina (UFSC) E-mail: netto.monica@ig.com.br Marco Aurélio Da Ros Médico, Doutor em Educação, Profº. Titular do Departamento de Saúde Pública da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). E-mail: ros@ccs.ufsc.br Fernanda Werner da Silva Assistente Social, Especialista em Saúde da Família pela Univer- sidade Federal de Santa Catarina (UFSC). E-mail: nandawerner2000@yahoo.com.br Cleci Grandi da Silva Enfermeira, Especialista em Saúde da Família pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). E-mail: aline_grandi@hotmail.com Moacir Francisco Pires Psicólogo, Especialista em Saúde da Família pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Mestre em Educação pela UFSC. E-mail: moacirfranciscop@yahoo.com.br 1 Artigo elaborado a partir do Trabalho de Conclusão do Curso de Especialização em Saúde da Família da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). A Estratégia Saúde da Família como Objeto de Educação em Saúde1 The Family Health Strategy as object of Health Education1 Saúde e Sociedade v.16, n.1, p.57-68, jan-abr 2007 57
  • 2. Abstract This study investigated whether the proposal of the Family Health Strategy (FHS) is discussed with the population in the educational practice of the profes- sionals inserted in this strategy, and the understan- ding of Health Education that these professionals have. It is a qualitative, exploratory-descriptive re- search, carried out through semi-structured inter- views. The content analysis identified the following categories: Health Education; The University does not teach; and FHS as Object of Health Education. The results showed that FHS is not an object of education; some professionals are unawareofitsprinciplesandthemajorityofthemhas vertical educational practices based on diseases, which makes them distance themselves from the proposal of Health Promotion of the FHS. The study providesreflectionsontheconceptionsofHealthEdu- cationthatpervadethediscourseoftheprofessionals, as well as on their participation in the community qualification for the construction of autonomy, citi- zenshipandhealthdeterminantscontrolintheHealth Promotion perspective. The article points to the im- portance of Permanent Education and to the reorga- nization of undergraduate studies, so that the Health Education practice is closer to the social reality. Keywords: Family Health; Health Education; Health Manpower. Introdução O Programa Saúde da Família (PSF) teve início em meados de 1993, sendo regulamentado de fato em 1994, como uma estratégia do Ministério da Saúde (MS) para mudar a forma tradicional de prestação de assistência, visando estimular a implantação de um novo modelo de Atenção Primária que resolvesse a maior parte (cerca de 85%) dos problemas de saúde (Roncolleta, 2003; Da Ros, 2006). O PSF visa ao trabalho na lógica da Promoção da Saúde, almejando a integralidade da assistência ao usuário como sujeito integrado à família, ao domicí- lio e à comunidade. Entre outros aspectos, para o al- cance deste trabalho, é necessária a vinculação dos profissionais e dos serviços com a comunidade, e a perspectiva de promoção de ações intersetoriais (Da Ros, 2006; Brasil, 1997; Roncoletta, 2003). Obter profissionais aptos a trabalharem nesse novo modelo e repensar as práticas educativas den- tro da visão de Promoção da Saúde não se constitui uma tarefa fácil (Gil, 2005; Brasil, 2003; Brasil, 2005a). Conforme Cutolo (2000), essa dificuldade acontece como reflexo do modelo de formação destes profissionais: hospitalocêntrico, biologicista, frag- mentado. Essas características, do chamado modelo flexneriano,utilizammetodologiadeensinoverticali- zada e não problematizadora, ou, como dito por Freire (2005), uma “educação bancária”. EssemododepensaredefazeraEducaçãoemSaú- de faz parte do Estilo de Pensamento (EP) hegemôni- co, até hoje adotado nas Universidades. Cutolo (2000) entende Estilo de Pensamento como modos de ver, entender e conceber, que levam a um corpo de conhe- cimentos e práticas compartilhados por um coletivo com formação específica. Para Da Ros (2000), um co- letivo de pensamento possui uma linguagem espe- cífica, que utiliza certos termos técnicos e um direcio- namento das observações, dos problemas e métodos que passam a ter traços comuns. Nas universidades, os EPs sobre o tema Educação em Saúde são caracterizados por Da Ros (2000) em dois estilos: a educação crítico-reflexiva e a educação com foco na culpabilização da população. Sobre a educação crítico-reflexiva, mais compatí- vel com o modelo dePromoção da Saúde e estruturada nomodelodeProduçãoSocialdaSaúde,DaRos(2000) 58 Saúde e Sociedade v.16, n.1, p.57-68, jan-abr 2007
  • 3. coloca que a base histórica para esse EP se encontra na Teoria da Medicina Social, que surgiu na Europa em meados de 1800, e segundo a qual o conceito de saúde tem suas bases na Determinação Social do pro- cesso saúde-doença. Nesse estilo, a educação é uma prática libertadora, de relação bilateral entre educa- dor e educando, em que a postura verticalizadora é criticada. Para Buss (2003), esse modelo apresenta- se como uma estratégia de mediação entre as pesso- as e seu ambiente, combinando escolhas individuais com responsabilidade social pela saúde, as chamadas políticas públicas saudáveis. A educação culpabilizadora, a qual Da Ros (2000) denomina de Educação Sanitária, enfatiza um EP hegemônico na formação, em que educar em saúde é praticar higiene como forma de mudar comportamen- tos pessoais, para que não haja o adoecimento. A hi- giene individual deve ser de responsabilidade do in- divíduo, para evitar a presença do agente causal, em uma visão claramente biologicista. Há uma negação explícita na determinação social do processo saúde- doença (Da Ros, 2000). Nesse caso, o lócus de respon- sabilidade e a unidade de análise são o indivíduo, que é visto como o último responsável (senão o único) por seu estado de saúde. Esse foco sobre o indivíduo e seu comportamento tem sua origem na tradição, na inter- vençãoclínicaenoparadigmabiomédico(Buss,2003). Esse EP gera um modelo de trabalho na saúde que contempla atividades predominantemente curativas e reabilitadoras. Não há espaço para a integralidade da atenção, com a incorporação das ações de Promo- ção da Saúde, entendidas como o processo de capaci- tação da comunidade para atuar na melhoria da sua qualidade de vida e saúde, incluindo sua maior parti- cipação no controle desse processo (Brasil, 2003). SegundoLefèvreeLefèvre(2004),quandoháações de Educação em Saúde no modelo culpabilizante de educação, geralmente o profissional acredita estar socialmente investido de autoridade sanitária. Ele pensa possuir, sob monopólio, o conhecimento verda- deiro e absoluto dos temas que envolvem saúde e do- ença; dessa forma, impõe, em nome de interesses maiores da coletividade, o tipo de comportamento que os indivíduos devem assumir. O diálogo educativo entre as autoridades sanitá- rias investidas de funções educativas e informativas easpopulaçõestorna-seummerodiscurso,senãovier acompanhado de um movimento de fortalecimento, empowerment(empoderamento), econômico, político, social e cultural dos indivíduos e grupos socialmente subordinados (Lefèvre, Lefèvre, 2004). É cada vez mais necessário “oferecer oportunida- des para que as pessoas conquistem a autonomia ne- cessária para a tomada de decisão sobre aspectos que afetam suas vidas” e “capacitar as pessoas a conquis- tarem o controle sobre sua saúde e condições de vida” (Pereira e col. apud Lefèvre, Lefèvre, 2004, p. 152). A autonomia, dessa forma, significa a possibilida- de de o indivíduo escolher entre as alternativas e as informações que lhe são apresentadas de forma escla- recida e livre. Na perspectiva da Promoção da Saúde, os profissionais devem estabelecer vínculos e criar laços de co-responsabilidade com os usuários que irão decidir o que é bom para si, de acordo com suas pró- prias crenças, valores, expectativas e necessidades (Brasil, 1997; Pedrosa, 2003). A pessoa autônoma ne- cessita de liberdade para manifestar sua própria von- tade, além de capacidadede decidir de forma racional, optando entre as alternativas que lhe são apresenta- das,bemcomocompreenderasconseqüênciasdesuas escolhas (Pedrosa, 2003). Partindo-se da importância de os profissionais da saúde estarem aptos a trabalhar sob a lógica da Pro- moção da Saúde, este estudo investigou a compreen- sãosobreEducaçãoemSaúdedecirurgiões-dentistas, enfermeiros e médicos inseridos na Estratégia Saúde da Família (ESF). Considerando-se a necessidade do fortalecimento da capacitação da comunidade no con- trole sobre os determinantes de sua saúde, procurou- se identificar se esses profissionais trocam informa- ções ou promovem discussão com a população sobre a proposta da ESF. Percurso Metodológico Este estudo baseia-se em uma pesquisa de campo qua- litativa, do tipo exploratório-descritiva. Para sua execu- ção,procurou-secompreenderaessênciadosfenômenos queenvolvemotemaproposto,contemplandoasrelações sociais, entendendo os determinantes e os modos pelos quais se organizam na sociedade e a explicam. Os dados foram coletados nos meses de setembro e outubro de 2005, a partir de entrevistas semi-estru- turadas e diário de campo, cujo questionário foi sub- Saúde e Sociedade v.16, n.1, p.57-68, jan-abr 2007 59
  • 4. metido a um pré-teste com três profissionais. As en- trevistas foram gravadas e guiadas por duas ques- tões centrais: “O que você entende por educação em saúde?”, “Você explica o que é PSF para os usuários?”. Foramentrevistadosonzeprofissionaisqueatuam,no mínimo, há um ano em unidades de saúde de Floria- nópolis, inseridos nas equipes da ESF. Para definir o número de entrevistados, utilizou-se o recurso do es- gotamento do discurso. InspiradaporMinayo(1994)eBardin(1977),aaná- lise das entrevistas foi realizada conforme processo de ordenação dos dados, processo de categorização inicial, processo de reordenação dos dados empíricos e processo de análise final. Comose tratadepesquisaenvolvendosereshuma- nos, o projeto desta pesquisa foi submetido à aprova- ção do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) – projeto 281/05 – de acordo com a resolução do Conselho Nacional de Saúde(CNS),no 196/96.Cadaentrevistadoassinouum termo de consentimento, declarando sua livre parti- cipação na pesquisa, após ter recebido os devidos es- clarecimentos sobre objetivos e método do estudo. Assim, para a preservação de sua identidade, utiliza- ram-se codinomes (E1, E2, E3 etc.). Nesta pesquisa, originalmente, emergiram oito categorias de temas distintos. Para a temática de Pro- moção e Educação em Saúde, à qual se destina este artigo, destacam-se três destas categorias: Educação em Saúde (com as subcategorias educação patologi- zante e vertical, educação promotora de saúde e edu- cação horizontal centrada na doença); Aprendi no Ser- viço/A Universidade não Ensina; e A Estratégia Saú- de da Família como Objeto de Educação em Saúde, desdobradas conforme se segue. 1. Educação em Saúde Esta categoria reúne elementos que identificam as concepções de Educação em Saúde que permeiam os discursos dos profissionais da Estratégia Saúde da Família. Assim, achamos necessário decompor essa categoria em três subcategorias. 1.1. Educação Patologizante e Vertical Esta subcategoria baseou-se nos profissionais que possuem um Estilo de Pensamento (EP) curativista na Educação em Saúde, com foco nas patologias, e impositivo na relação profissional-paciente. A maio- ria dos entrevistados, no total de seis, apontam para essa lógica do processo educativo, em que os discur- sos são permeados por orientações preventivistas. Aqui a idéia é educar para prevenir. Vaitsman (1992) afirma tratar-se de uma herança do modelo cartesiano que ainda domina as práticas educativas e de saúde. Se, por um lado, apresenta melhorias das condições de saúde da população, au- mento da perspectiva de vida, por outro, desenvolve uma sociedade medicalizada, estruturada em uma tecnologia médica dealto custo,com enfoque reducio- nista, que sempre parece correr atrás de respostas para as doenças produzidas pelo modo de organiza- ção da vida social (Stotz, 1993; Illich, 1990; Gazzinelli e col., 2005). Assim, o conhecimento científico e a tecnologia de alto custo têm posição de destaque passando a ser di- vulgados como verdade. Passaram a opor e, até mes- mo, a desprezar o senso comum; ou seja, negam e tra- tam como “erro” o modo como as classes populares, teoricamentenãodetentorasdesteconhecimento“ofi- cial”, entendem e explicam o mundo (Valla, 2000; Fon- seca, 2000). Para Pedrosa (2003), essa concepção científica, que poderíamos chamar de clássica, impregna as ações ditas pedagógicas nos serviços de saúde, com o agravante de serem pontuais e focalizadas nas especi- ficidades de cada programa, intervenção ou situação. Dessa forma, são desenvolvidas ações educativas, por exemplo, para diabéticos, hipertensos, cardíacos, ges- tantes, nutrizes, adolescentes e outros, tipificando cadaserhumanocomograuderiscoquedeterminado modo de viver o enquadra. O Estilo de Pensamento nas ações educativas des- ta subcategoria preconiza, verticalmente, a adoção de novos comportamentos, como por exemplo, “parar de fumar, vacinar-se, ter melhor higiene, entre outros, e de estratégias geralmente ditas coletivas, como a co- municação de massa” (Stotz, 1993). Seguindo essa concepção, percebe-se que a fala está voltada para a prevenção de doenças: Educação em Saúde são os procedimentos que você faz, que você agrega à comunidade que você trabalha paraprevenirasdoenças[...]Então,sãotodasasações básicas simples que você possa formar a cabeça da- quelas pessoas com as quais a gente trabalha. São noções básicas de higiene. (E1) 60 Saúde e Sociedade v.16, n.1, p.57-68, jan-abr 2007
  • 5. Esse modo de pensar a Educação em Saúde tem sempre um agente externo causador da doença que deve ser combatido como o “inimigo”. É o caso do ci- garro, que causa câncer e doenças coronarianas; do açúcar e do sal, que causam a diabetes e a hiperten- são arterial; das gorduras, que causam o aumento do colesterol e o infarto, a obesidade e assim por diante (Laplantine, 1991). Reforça-se nesse depoimento, o modelo biológico ou “exógeno” do adoecimento, segundo Laplantine (1991). Oriento que não se deve comer fora de hora, falo bas- tante sobre doces, perguntando: Tu adoças muito o café ou suco? Não tem problema fazer isso, não é que não se possa comer bala ou adoçar muito o suco para quem gosta de doce, mas tem que saber que após, tem que escovar os dentes e não após muitas horas. Eu sempre falo isso. (E2) Para Buss (2003), a prevenção difere-se da promo- ção, porque direciona mais às ações de detecção, o controle e o enfraquecimento dos fatores de risco ou fatores causais de grupo de enfermidades ou de uma enfermidade específica; seu foco é a doença e os me- canismos para atacá-la, mediante o impacto sobre os fatores mais íntimos que a geram ou a precipitam. Nota-se que além de centrar-se na doença, a edu- cação, nessa subcategoria, segue um modelo tradici- onal de imposição de conhecimentos ao paciente. Quando a relação linear entre o saber instituído e o comportamento acontece, via de regra, a educação se torna normativa (Gazzinelli e col., 2005). É muito co- mum encontrar atividades educativas que fazem uma transposição para o grupo da prática clínica indivi- dual e prescritiva, tratando a população usuária de forma passiva, transmitindo conhecimentos técnicos sobre as patologias e como cuidar da saúde, descon- siderando o saber popular e as condições de vida des- sas populações. Muitas vezes, a culpabilização do pró- prio paciente por sua doença predomina na fala do profissional de saúde, mesmo que ele saiba dos determinantes sociais da doença e da saúde (Vascon- celos, 2000 apud Valla, 2000; Briceño León, 1996). O princípio que está por trás da norma de compor- tamento é a de que alguém, além do sujeito, conhece melhor o que é apropriado para ele e para todos, in- distintamente: Educação em Saúde são ações que partem do serviço, dos profissionais em direção ao usuário, no sentido de ajudar o usuário no seu entendimento sobre as questões de saúde,das questões dos cuidados que ele possa ter com o corpo etc. (E3) Nasatividadesditaseducativas,comoaspalestras e as aulas, sejam em grupos ou em consultas indivi- duais, passa-se a idéia de que a doença se deve, prin- cipalmente, à falta de cuidado e ao desleixo da popu- lação com a sua saúde, deixando a “vítima” com sen- timentode“culpa”peloproblemaqueapresenta.Como resultado dessa prática, dentre outros problemas, fo- ram identificados por Chiesa e Veríssimo (2001), os seguintes: baixa vinculação da população aos servi- ços de saúde, baixa adesão aos programas e aos trata- mentos e frustração dos profissionais de saúde. Esses problemas ficaram evidentes nas entrevis- tas a seguir: A gente não remarca,peço para que anote na caderne- ta e bote na geladeira. Os pais que têm interesse retornam, quando a gente marcava era um desastre total, a inadimplência era grande. (E1) Já tentamos fazer grupos algumas vezes,mas as pes- soas não vêm (...) (E4) Autores como Briceño-León (1996) e Cáceres (1995) deixam explícito o fato de que os programas de Educa- ção e Saúde não devem se limitar a iniciativas que vi- sem a informar a população sobre um ou outro proble- ma. O trabalho educativo a ser feito deve extrapolar o campo da informação, integrar a consideração de valo- res,decostumes,demodelosedesímbolossociais,que levam a formas específicas de condutas e práticas. Ensinar é algo profundo e dinâmico; portanto, tor- na-se imprescindível a “solidariedade social e políti- ca”, para evitar um ensino elitista e autoritário, como quem tem o domínio exclusivo do “saber articulado” (Freire,1997).Segundoesseautor,educarnãoéamera transferência de conhecimentos, mas sim a conscien- tização e o testemunho de vida, do contrário não terá eficácia. A autonomia, a dignidade e a identidade do educando, no caso, a comunidade e seus sujeitos, têm de ser respeitadas, caso contrário, o ensino se torna- rá “inautêntico, palavreado vazio e inoperante”. Neste sentido, qualquer iniciativa de educação só toma dimensão humana quando se realiza a “expul- são do opressor de dentro do oprimido”, como liberta- ção da culpa (imposta) pelo “seu fracasso no mundo” (Freire, 2005). Saúde e Sociedade v.16, n.1, p.57-68, jan-abr 2007 61
  • 6. Freire (1997) insiste também na “especificidade humana” da educação, como competência profissio- nal e generosidade pessoal, sem autoritarismos e ar- rogância. Só assim nascerá um clima de respeito mú- tuo e de disciplina saudável entre “a autoridade do- cente e as liberdades dos alunos, [...] reinventando o ser humano na aprendizagem de sua autonomia”. 1.2. Educação Promotora de Saúde Nesta subcategoria, são reunidas as percepções dos profissionais que têm outro Estilo de Pensamento (EP), que está voltado para a Promoção da Saúde no seu processo de trabalho educativo. Embora não se tratando de uma pesquisa quantitativa, chama a aten- ção o dado de que somente três profissionais foram identificados dentro deste EP. Neste EP, a Educação em Saúde é abordada como estratégia fundamental, entendida de forma ampliada e não somente como um momento cronológico anteri- or à doença. Isso só ocorre quando a Promoção da Saú- de é vista como um jeito de pensar e de fazer a saúde, no qual as pessoas são vistas em sua autonomia e em seu contexto político e cultural como sujeitos capazes de superar o instituído e serem os seus próprios instituintesdeummododevidasaudável(Buss,2003). Nesse sentido, os entrevistados comentam: A Educação em Saúde é uma educação diferente de consultório. É uma educação que leva em considera- ção as pessoas da comunidade, a questão cultural dela [...] (E5) Então,em Educação em Saúde,tu quer que as pessoas saibam as coisas que tu sabe, mas aí vai muito a for- ma que tu faz isso, né? Por exemplo, a gente parte do pressuposto que quer promover a saúde e fazer preven- ção de algumas doenças.Então,a gente vai pegar e dar uma palestra para as pessoas, aí não dá, né? [sorriu]. Nãodá,tunãoestáutilizandooconhecimentodaspes- soas, não está sendo estratégico, não tá respeitando o conhecimentodessaspessoas,nãoestádiscutindocom elas, não está levando em consideração o que elas sa- bem, o contexto de vida que elas vivem, a história de vida deles para aquilo que tu queres buscar: a melhor qualidade de vida, daqueles tanto saudáveis como com os doentes. Você deve utilizar a sabedoria delas para tu discutires,fazer com que estas pessoas sejam agentes da melhora da qualidade de vida deles. (E6) Aqui, são estabelecidas condições favoráveis à su- peração do caráter meramente instrumental da Edu- cação em Saúde cujos princípios se apóiam exclusi- vamente no saber científico. À medida que se observa a progressiva importância conferida às representa- ções e aos saberes do senso comum na relação dos sujeitos com a doença, mais apurada se torna a críti- ca ao absolutismo e à autonomia do saber científico. O saber científico desconsidera a dimensão socioeco- nômico-cultural do sujeito, tornando o processo edu- cativo não eficaz, uma vez que suas intenções diver- gem da realidade social e não proporcionam uma interação efetiva. Se a educação não se voltar à reali- dade concreta do indivíduo ela não se realiza, pois extrapola o universo do qual ele faz parte (Vascon- cellos, 2004; Valla, 2000). Pedrosa (2003) defende que as práticas educativas devem considerar a construção compartilhada de sa- beres que fundamentam as visões de mundo das pes- soas e respeitar esses saberes forjados no mundo da vida, potencializando, dessa forma, o protagonismo das pessoas e dos coletivos sociais. Nessa perspectiva, as ações educativas assumem umnovocaráter,maisaderenteaosprincípiospropos- tos pela ESF, destacando-se o direito à saúde, como eixo norteador, e a capacidade de escolha do usuário, uma condição indispensável. Assim, é fundamental que o setor saúde embase a educação não apenas na transmissão de conhecimen- tos historicamente acumulados, mas que, principal- mente, trabalhe na perspectiva da construção de co- nhecimentos e de qualidade de vida por todos aqueles que a integram. A fala a seguir expõe esse pensamento promotor de saúde e de qualidade de vida: A gente está abrindo também espaço aqui na unidade para a comunidade realizar atividades que não envol- va doença,como yoga,ginástica,resgate cultural,por exemplo.Nós temos a dona Lurdes,que é nossa anciã, ela faz renda de bilro e pensamos dela fazer aula de renda de bilro. Tem também o motorista da ambulân- cia que toda vida dele ele fez rede de pesca.E isso está se perdendo, a importância cultural, está se perden- do. A dona Lurdes fala igual manezinha2 e não tem vergonha. Já os filhos mais velhos dela falam mais 2 Denominação popular para a pessoa nascida em Florianópolis. 62 Saúde e Sociedade v.16, n.1, p.57-68, jan-abr 2007
  • 7. ou menos, e o mais novo faz questão de dizer que não é mané,então,isso está se perdendo.Outra idéia tam- bém seria a projeção de filme por semana, algo mais cultural. (E5) A Promoção da Saúde, na prática das ações de edu- cação, pressupõe que os indivíduos aumentem o con- trole sobre suas vidas através da participação em gru- pos, visando transformar a realidade social e políti- ca. Assim, há uma profunda distinção da abordagem tradicional centrada na mudança de comportamento individual. Assim, a prevenção dos agravos à saúde não é tratada isoladamente, mas como uma das me- tas a serem atingidas para a melhoria da qualidade devidaeparaajustiçasocial(Valla,2000;Stotz,1993) Nesta subcategoria, as condições de vida e a es- trutura social são colocadas como as causas básicas dos problemas de saúde. Neste enfoque, a Educação em Saúde é entendida “como uma atividade cujo in- tuito é o de facilitar a luta política pela saúde” (Valla, 2000). 1.3. Educação Horizontal Centrada na Doença Nesta subcategoria, parece surgir um terceiro EP em Educação em Saúde. As diferenças de EP, distancia- mentos (ou proximidades), ou diferenças na precisão dos limites entre alguns Estilos de Pensamento são chamados por Fleck (1986) de matizes de Estilo de Pensamento (Fleck, 1986; Cutolo, 2000). A relação profissional–paciente aparece de modo horizontal, sem imposição ou autoritarismos; entre- tanto, não consegue sedespir do rigor doconhecimen- to científico voltado para a prevenção, para o biológi- co, como verdade absoluta e única a ser inserida no conhecimento dos indivíduos. Percebe-se que o pro- fissional, teoricamente, tem a consciência da neces- sidade de considerar o conhecimento do paciente, res- peita sua cultura e troca experiências com ele, porém seu discurso não se descola do “tema” doença. Esse estilo de pensar, para Mendes (1985), tem sua funda- mentação advinda do aparelho formador ainda Flexneriano. No processo educativo, o profissional parte do co- nhecimento do paciente, mas não promove saúde no seu conceito amplo, seu foco educativo está direcio- nado às doenças: A educação não é feita toda de uma vez,é aos poucos, partindo do que ele já sabe, perguntando: o que o se- nhor ou a senhora sabe sobre sua doença? O que ou- viu falar? O senhor/senhora conhece alguém com este problema? Como essa pessoa vive? (E7) Os profissionais de saúde acreditam que o modo de vida dos indivíduos pode ser a causa de doenças e que, quando necessário, sem autoritarismos, ele deve ser mudado com base no que é considerado compor- tamentocorreto,conformeopontodevistabiomédico. Este pressuposto, segundo Illich (1990), pode levar o comportamento humano à dependência de uma defi- nição médica de “correção”, ou ao que tem sido cha- mado de “medicalização da vida”. Isso pode ser consi- derado um problema, porque pressupõe a aceitação social da medicina como fonte legítima de verdade, apesar da postura aberta de alguns profissionais aos valores e cultura dos indivíduos, constituindo-a em uma instituição de controle social. A ideologia do individualismo tem conduzido à escolha do convencimento como principal estratégia educativa do modelo tradicional de educação em saú- de (Mendes, 1985). Modos de vida não saudáveis, que fogem às regras, são relacionados à ignorância dos indivíduos quanto ao “correto” estilo de vida, segun- do a visão biomédica. Ao instruir os indivíduos quan- to à relação entre o comportamento “incorreto” e as patologias, os educadores em saúde esperam persua- di-los a assumir diferentes condutas. Mesmoaquele profissionalquebuscaacolherever os sujeitos enquanto integrantes de um meio socio- cultural diverso acaba por “deslizar” no rigor do seu conhecimento científico profissional a medida em que impõe regras comportamentais, como se percebe a seguir: Não é só aquela consulta de você chegar e dar remé- dio. As pessoas me procuram muito mais pra conver- sar, pra ter alguém que ouça. [...] Quando eu atendo primeiro o paciente eu digo que a pressão dele está alta, porque ele está comendo muito salgado ou não está caminhando e não está tomando muito líquido. Aí ele [o usuário] vai sair daqui com uma informação maior. Vai pensar melhor nisso aí, no que fazer. Por- que não é uma vez que você consegue mudar o hábito de vida de uma pessoa. E ele [o usuário] vindo e tu fa- lando sempre a mesma coisa para ele,a gente cobran- do não consegue assim uns 100%, mas aos pou- quinhos, de grãozinho em grãozinho (...) (E8) Saúde e Sociedade v.16, n.1, p.57-68, jan-abr 2007 63
  • 8. 2. Aprendi no Serviço/ A Universidade não Ensina A capacitação dos profissionais nos cursos da área da saúde tem demonstrado limitações quanto à forma- ção básica, no caso desta pesquisa, na ESF. Essas li- mitações podem ser percebidas, conforme alguns de- poimentos dos profissionais quando questionados onde aprenderam a fazer Educação em Saúde: Na universidade eu sei que não foi.Foi com os pacien- tes mesmo,né? Nós trabalhamos muito próximos das comunidades em Florianópolis, isto é muito real. [...] E aprende. É uma troca. Na realidade sai uma troca. Eu já aprendi muito com meus pacientes. (E9) A atual formação das Universidades gera um mo- delo de trabalho na saúde que contempla atividades predominantemente curativas e reabilitadoras, não permitindo a integralidade da atenção, em que as ações de saúde devem também incorporar as práticas educativas promotoras de saúde (Brasil, 2003). A mai- oria dos profissionais que atuam no Sistema Único de Saúde (SUS) ainda segue esse modelo, curativista, que não abre espaço para as práticas de educação e saúde efetivas (Pedrosa, 2003). Além disso, percebe-se, nos depoimentos, que a Universidade tem sido uma instituição de ensino que usa do método de transmissão de conhecimento, ba- sicamente de maneira verticalizada, negligenciando o processo de ensino-aprendizagem e a interação do educador-educando, conforme expressa a fala: [Aprendi] No dia-a-dia, porque na Universidade até quando eu tava na graduação,é aquele grupo de sem- pre. A gente vai com a palestra pronta, e passa, igual na Universidade quandoa gente assiste uma aula.Vai e fala o que é, e o que não é [...] e deu. E Educação em Saúde não é isso. (E10) É preciso que a universidade lance mão de uma “pedagogia não-normativa, problematizadora e dialogal” do tipo proposto por Freire (2002) na forma- ção dos profissionais, para que eles possam, segundo Lefèvre e Lefèvre (2004), propiciar oportunidades de encontro e de troca entre o campo sanitário e o cam- po de senso comum e o fortalecimento deste último (associações de bairro, conselhos comunitários de saúde, clubes de mães etc.). Caso contrário, os profis- sionais acabarão sendo meros reprodutores daquela Educação em Saúde autoritária e prescritiva que os formou na universidade. Da mesma forma, é essencial que o investimento na formação profissional não se limite à qualificação puramente técnica. A universidade precisa responder às necessidades da sociedade. O processo de forma- ção que pretende ser eficiente jamais pode perder de vista a importância da comunidade na definição de suas necessidades, pois a prestação de atendimento somente tem sentido quando responde às demandas dos usuários (Severino, 2002). Sisson (2002) afirma que a ESF possui limitações em sua operacionalização relacionada aos recursos humanos, gestores e recursos financeiros. Entre es- ses limites, aparece com destaque a formação inade- quada dos profissionais. Segundo a mesma autora, o modelo assistencial hegemônico mantém-se inaltera- do ao privilegiar a atenção individual e hospitalar. Conseqüentemente, na rede básica, as atividades cen- trais continuam sendo a consulta médica, realizada como pronto-atendimento, em prejuízo ao cuidado integral deatenção e ao controlesobre os determinan- tes principais das condições de saúde. A necessidade de mudança no processo de traba- lho, na gestão e na formação de recursos humanos é amplamente reconhecida e acompanhada de críticas à inércia do aparelho formador, às universidades, em que existe grande resistência e dificuldades de mu- danças, e nas quais continuam sendo formados pro- fissionaisquerealimentammodelosassistenciaisque algumas reformas buscam superar. As críticas con- centram-se na educação médica, embora estejam re- lacionadas à formação dos demais profissionais (Sisson, 2002). 3. A Estratégia Saúde da Família como objeto de Educação em Saúde Essa categoria se propõe a trazer reflexões sobre a ESF como um possível objeto de Educação em Saúde para o acesso da população às informações sobre sua saúde,construçãodacidadaniaebuscadeautonomia. Pretende-se fomentar a socialização dos saberes acer- ca do ESF/SUS, com o intuito de incentivar a partici- pação social nos determinantes de sua saúde. AESF,vistacomoobjetodeEducaçãoemSaúde,tem comopapelcentralumapráticaeducativavoltadapara aPromoçãoda Saúde,comoumconjunto deatividades orientadas a propiciar o melhoramento de condições de bem-estar e acesso a bens e a serviços sociais. 64 Saúde e Sociedade v.16, n.1, p.57-68, jan-abr 2007
  • 9. Dessa forma, os autores entendem que dedicar um espaço da Educação em Saúde para trabalhar ques- tões que vão além do biológico com a população pro- pulsionará o desenvolvimento de conhecimentos, ati- tudesecomportamentosfavoráveisaocuidadodasaú- de mediante o processo de empowerment e luta pelo alcance de estratégias que permitam um maior con- trole sobre suas condições de vida, individual e cole- tivamente. A Educação em Saúde pode ser feita dentro da fa- mília, na escola, no trabalho ou em qualquer espaço comunitário. Este é um componente que está presen- te na Carta de Ottawa, resultante da I Conferência In- ternacional sobre Promoção da Saúde, em 1986, no Canadá, que resgata a dimensão da Educação em Saú- de, além de avançar com a idéia de empowerment, ou seja, o processo de capacitação (aquisição de conhe- cimentos) e consciência política comunitária (Buss, 2003). A percepção de que a mudança na Educação em Saúde deve acompanhar a formação dos profissionais de saúde também está presente na declaração resul- tante desta conferência (Buss, 2003). Segundo Pedrosa (2003), faz-se necessário repen- sar a Educação em Saúde sob a perspectiva da parti- cipação social; compreender que as verdadeiras prá- ticas educativas só têm lugar entre sujeitos sociais e considerar a Educação em Saúde uma estratégia para a constituição de sujeitos ativos, que se movimentam em direção a um projeto de vida libertador. Diante dessas e de outras considerações que são apresentadas neste estudo, a partir da análise de tre- chos das entrevistas realizadas, discute-se se os pro- fissionais entendem a proposta da ESF e se trocam informações com a população sobre a ela. Os trechos abaixo nos conduzem à reflexão sobre arelaçãoimediatistaecurativistaàqual estãoacostu- mados os profissionais da ESF, quando questionados se promovem discussão sobre a ESF com a população: Não.O pessoal quer saber,ao bater na porta ali,ó,que ele tá preocupado em resolver a necessidade dele,não quer saber se é PSF. (E1) Ascolocaçõesabaixoevidenciam,comtransparên- cia, a falta de esclarecimento à população sobre a que se propõe à ESF Sabe que eu nunca parei para falar sobre isso.Na ver- dade, eles [os usuários] não têm uma noção boa ain- da sobre o PSF. Acho que nem mesmo a gente tem. A gente fala que trabalha no PSF, mas eu nunca parei para explicar especificamente o PSF para o paciente. Até porque,deveria ter tempo,mas ele [o usuário] vem aqui com outras coisas, e a gente acaba conversando e não fala do programa. É uma lacuna mesmo. (E10) A partir da análise das considerações feitas pelos sujeitos de pesquisa, verificamos que, dos onze pro- fissionais entrevistados, somente dois responderam que discutem com usuários a proposta da ESF: [...] No grupo, quando se fala do Programa Saúde da Família,eles ficam bem interessados,eles perguntam, mas você tem de estimular.É difícil alguém chegar do nada e perguntar o que é PSF, a não ser quando uma semana depois que a gente publicou um jornalzinho local falando sobre o PSF. É outra forma que comple- menta. Tivemos uma tiragem de 8 mil exemplares, é pouco, mas são oito mil que lêem. (E5) Para todos os entrevistados, se não fosse pela indução da pergunta, a ESF não iria surgir como pro- posta que faça parte da educação em saúde dos pro- fissionais. Ela é considerada pelos autores como uma categoria por ausência. Sugere-se, neste estudo, que os profissionais da ESF sejam capacitados a trabalharem neste novo mo- delo de saúde, pois, mediante as análises de conteú- do, constatou-se que muitos deles ainda não têm bem claro o que realmente seja a ESF e que, portanto, pou- co têm a contribuir como multiplicadores de informa- ções a esse respeito. Ocorre que o EP hegemônico ain- da se pauta em um processo de ensino, para a forma- ção universitária, que valoriza a prática intervencio- nista, com uma relação sujeito-objeto, e no modelo biologicista, que não trata de emponderar a popula- ção (Da Ros, 2004). Por outro lado, podemos identificar que aqueles profissionais que tentam promover uma discussão com a população acerca dessa proposta não conse- guem fazê-lo de modo mais aprofundado e contínuo, em função, entre outros, da demanda de usuários in- compatível com a capacidade de atendimento. Além disso, os gestores (também malpreparados) não pos- sibilitam a esses profissionais a possibilidadede Edu- cação Permanente. Premidos pela formação flexine- riana e pela realidade de um serviço que não valoriza a formação de saúde, o modelo não avança. (Brasil, 2003). Esse fato tende a fazer com que os processos de educação e comunicação na perspectiva da Promo- çãodaSaúdesejamrelegadosaumaquestãodesegun- da ordem. Saúde e Sociedade v.16, n.1, p.57-68, jan-abr 2007 65
  • 10. Considerações Finais Constatou-sequeaformaçãodosprofissionaisdesaú- de é uma das problemáticas centrais. Eles demons- tram não estar preparados para o trabalho na lógica da Promoção da Saúde requerida pela ESF. Ao contrá- rio, a maioria dos discursos é permeada por uma edu- cação voltada para as doenças e para a tentativa de mudança de comportamento dos indivíduos, com re- lação vertical e impositiva. Por essa razão, reitera-se a relevância da Educação Permanente e da reestru- turação da graduação, de modo a aproximar as práxis da Educação em Saúde da realidade social. Assim, afirma-se que a Educação Permanente é aprendizagem no trabalho, em que o aprender e o en- sinar se incorporam ao cotidiano das organizações deste trabalho. Propõe-se que os processos de capaci- tação dos trabalhadores da saúde tomem como refe- rência as necessidades de saúde das pessoas e das populações e tenham como objetivos a transformação das práticas profissionais e da própria organização do trabalho, estruturadas a partir do processo de problematização (Brasil, 2003; Brasil, 2005a). Além disso, propõe-se que o processo de trabalho dos profissionais da ESF possa ser um veículo de empoderamento da população mediante a discussão sobre o que propõe a ESF e/ou o SUS e como devem ser estruturados conforme a legislação. Não somente os profissionais já formados e inte- grantes das equipes da ESF devem ser capacitados para uma Educação em Saúde adequada. Tendo em vista a importância de todo o processo de formação do profissional, eles precisam, desde a graduação, se formar na lógica do modelo da Determinação Social da Saúde, capacitando-se para trabalhar na ESF/SUS. Assim, é essencial a articulação do Ministério da Saúde (MS)/Ministério da Educação e Cultura (MEC) a fim de efetivar a reforma curricular. O MS, por in- termédio da Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde (SGTES), em conjunto com a Se- cretaria de Educação Superior do Ministério da Edu- cação (SESU/MEC), vem conduzindo o processo de implantação do Programa Nacional de Reorientação da Formação Profissional em Saúde – PRÓ-SAÚDE. Inspirado no que foi o PROMED, dirigido às escolas médicas, que incentivou e manteve 19 escolas médi- cas, incrementando processos de transformação, o PRÓ-SAÚDE tem como eixos básicos: a realização do ensino nos ambientes reais onde se dá a assistência à saúde pelo SUS, o uso de metodologias e estratégias educacionais, nas quais os estudantes assumam pa- péis mais ativos, e a própria expansão do objeto do ensino, que não deve ser apenas a doença já instala- da, mas a Produção Social da Saúde como síntese de qualidade de vida. Essa iniciativa visa à aproximação entre a formação de graduação no país e as necessi- dades da Atenção Primária, que se traduzem no Bra- sil pela ESF. A desarticulação entre os mundos acadê- micos (saber científico) e o saber popular vem sendo apontada, em todo mundo, como um dos responsáveis pela crise do setor da saúde, no momento em que a comunidade global inicia a tomada de consciência acerca da importância da formação dos trabalhado- res de saúde, valorizando-os cada vez mais (Brasil, 2005b; Brasil, 2003; Brasil, 2000). Referências BARDIN, L. Análise de conteúdo. São Paulo: Martins Fontes, 1977. BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria GM/MS nº 1882, de 18 de dezembro de 1997. Brasília, DF, 1997. Disponível em: <http:// www.saude.gov.br>. Acesso em: 20 ago. 2006. BRASIL. Ministério da Educação. Minuta do Anteprojeto das Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos de graduação em medicina. Brasília, DF, 2000. Disponível em: <http:// www.mec.org.br>. Acesso em: 30 dez. 2005. BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde. Departamento de Gestão da Educação na Saúde. Política de educação e desenvolvimento para o SUS. Brasília, DF, 2003. Disponível em: <http:// www.saude.gov.br>. Acesso em: 27 set. 2004. BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde. Departamento de Gestão da Educação na Saúde. A educação permanente entra na roda: pólos de educação permanente em saúde: conceitos e caminhos a percorrer. Brasília, DF, 2005a. 66 Saúde e Sociedade v.16, n.1, p.57-68, jan-abr 2007
  • 11. BRASIL. Ministério da Saúde. Pró-saúde: Programa Nacional de Reorientação. Brasília, DF, 2005b. Disponível em: <http:// portal.saude.gov.br /saude>. Acesso em: 10 nov. 2005. BRICEÑO-LEÓN, R. Siete tesis sobre la educación sanitaria para la participación comunitaria. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 12, n. 7, p. 30, 1996. BUSS, P. M. Uma introdução ao conceito de promoção da saúde. In: CZERESNIA, D. (Org.). Promoção da saúde: conceitos, reflexões, tendências. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2003. p. 15-38. CÁCERES, C. F. La construcción epidemiológica del SIDA. In: HARDY, E.; OSIS, M.I.D.; CRESPO, E. R. (Org.). Ciências sociais e medicina, atualidades e perspectivas latino-americanas. Campinas: Centro de Pesquisas Materno-Infantis de Campinas; 1995. p. 131-71. CHIESA, A. M.; VERISSÍMO, M. R. A educação em saúde na prática do PSF: manual de enfermagem. Brasília, DF: Instituto para o Desenvolvimento da Saúde, 2001. CUTOLO, L. R. A. Estilo de pensamento em educação médica: um estudo do currículo do Curso de Graduação em Medicina da UFSC. 2000. Tese - UFSC, Florianópolis, 2000. DA ROS, M. A. Estilos de pensamento em saúde pública: um estudo de produção FSP – USP e ENSP – Fiocruz entre 1948 e 1994, a partir da epistemologia de Ludwick Fleck. 2000. Tese (Doutorado em Educação e Ciência) - CED, UFSC, Florianópolis, 2000. DA ROS, M.A. A ideologia nos cursos de medicina. In: MARINS, J. J. N. et al. (Org.). Educação médica em transformação: instrumentos para a construção de novas realidades. São Paulo: HUCITEC, 2004. p. 224- 244. DA ROS, M.A. Políticas públicas de saúde no Brasil. In: BAGRICHEVSKI, M. (Org.). Saúde em debate na Educação Física. Blumenau: Nova Letra, 2006. p.44- 66. FLECK, L. La génesis y el desarollo de un hecho científico. Madrid: Alianza Editorial, 1986. FONSECA, L. C. de S. Ensino de ciências e saber popular. In: VALLA, V. V. Saúde e educação. Rio de Janeiro: DP&A, 2000. p.87-104. FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à pratica educativa. 5. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1997. FREIRE, P. Extensão ou comunicação. 12. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2002. FREIRE, P. Educação e mudança. 28. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2005a. FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. 44. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2005b. GAZZINELLI, M. F. et al. Educação em saúde: conhecimentos, representações sociais e experiências da doença. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 21. n. 1, jan./fev. 2005. GIL, C. R. R. Formação de recursos humanos em saúde da família: paradoxos e perspectivas. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 21. n. 2, mar./abr. 2005. ILLICH, I. Limits to medicine - medical nemesis: the expropriation of health. London: Penguin Books, 1990. LAPLANTINE, F. Antropologia da doença. São Paulo: Martins Fontes, 1991. LEFEVRE, F.; LEFEVRE, A. M. C. Promoção de saúde, a negação da negação. Rio de Janeiro: Vieira & Lent, 2004. MENDES, E. V. A evolução histórica da prática médica, suas implicações no ensino, na pesquisa e nas tecnologias médicas. Belo Horizonte: PUC-MG: FINEP, 1985. MINAYO, M. C. S. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 3. ed. São Paulo: HUCITEC; Rio de Janeiro: ABRASCO, 1994. PEDROSA, I. I. É preciso repensar a educação em saúde sob a perspectiva da participação social. Disponível em: <www. gices-sc.org>. Acesso em: 20 out. 2005. Entrevista cedida a Radis, 2003. RONCOLLETA, A. F. T. et al. Princípios da medicina de família. São Paulo: Sombramfa, 2003. Saúde e Sociedade v.16, n.1, p.57-68, jan-abr 2007 67
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