1. UNIVERSIDADE ESTADUAL DO RIO GRANDE DO SUL
UNIDADE DE MONTENEGRO
CURSO DE GRADUAÇÃO EM MÚSICA - LICENCIATURA
PATRICK DA COSTA SILVA
A FUGA PELA EDUCAÇÃO – DRAMATURGIA CRIADA COM BASE
NAS IDÉIAS DE DURKHEIM, MARX, WEBER E BOURDIEU
MONTENEGRO
UERGS
2013
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2. A FUGA PELA EDUCAÇÃO
Escrito por Patrick Costa
Era noite de inverno no Brasil. Os noticiários apenas falavam sobre duas
coisas: futebol e protesto. Do futebol já estávamos acostumados, porém os protestos
surgiram a partir do povo brasileiro que acordava perante as ações realizadas pelo
governo. Enquanto isso acontecia la fora, em uma prisão recém inaugurada no
sudeste brasileiro, encontravam-se alguns prisioneiros, entre eles os quatro
prisioneiros no qual eram chamados de “pensadores” pelos demais.
Era uma sela pouco iluminada, havia quatro camas pequenas e alguns livros
ao lado das camas. Lá fora se ouvia a canção meio abafada dos gafanhotos e mais
distante ainda podiam se ouvir os latidos dos cães de guarda. Enquanto isso os
chamados “pensadores” jogavam cartas para passar o tempo.
Bourdieu – Joga logo Marx. (Resmunga ele)
Marx – Calma aí, só irei baixar minha trinca de copas. Sua vez Weber.
Weber – Ok... Estive pensando hoje, enquanto almoçava, acho interessante o
papel do educador, talvez após minha saída desta prisão eu estude para me tornar
professor.
Marx – O que? Professor nesse país capitalista que mal dá valor aos
profissionais, ainda mais para professores.
Durkheim – Lá vem o Marx com o socialismo dele. (Pensa alto)
Weber – O que tem a ver o capitalismo com não dar valor aos profissionais,
Marx?
Marx – Simples! É algo no qual eu chamo de alienação, onde o capitalismo
retira a possibilidade do profissional de se reconhecer dentro daquilo que está
produzindo. Ah, Malditas classes sociais! Acho uma sociedade comunista sem as
classes sociais poderia fazer com que o homem moderno parasse de se preocupar
nas suas condições sociais, consumo, enfim, em ganhar dinheiro para assim se
preocupar com seu trabalho e reconhecer sua produção.
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3. Bourdieu – Não tiro sua razão Marx, as classes sociais de certa forma afetam
na educação. Mas acho que afeta não só aos professores, mas também os alunos.
Marx – Pelo menos alguém concorda comigo.
Enquanto isso, indignado com a conversa alta um dos guardas noturno se
aproxima da sela sem que eles percebessem. Porém, ao ouvir sobre o que se
tratava, ele não chamou a atenção dos quatro, apenas ficou de canto ouvindo a
conversa, como se não estivesse ali.
Weber – Como assim Bourdieu, por que as classes sociais afetam na
educação?
Bourdieu – Bom, sabemos que cada indivíduo pertence a uma família de certa
classe social e econômica. Com isso, cada família apresenta uma expectativa em
relação à escola e isso vai passando para seus filhos, netos, etc.
Weber – Ainda continuo sem entender.
Bourdieu – Por exemplo: será que para um indivíduo que vem de uma família
de classe baixa valeria a pena passar doze anos estudando sem receber retorno
financeiro? Afinal de conta, o indivíduo termina os estudos, mas ainda continua
pobre. E depois que acabam os estudos, faria qualquer curso na faculdade? Para as
famílias de classe baixa sairia mais em conta o indivíduo fazer um curso técnico,
pois seria uma forma mais rápida de ingressar no mercado de trabalho e ter um
retorno financeiro.
Durkheim – Ta, mais e como poderíamos mudar isso? Acho que a escola é
um lugar que todos deveriam freqüentar. Se não for a escola e o professor, quem vai
desenvolver a visão social da criança? Quem irá prepará-la para vida, para a
sociedade?
Bourdieu – Veja bem! A escola não é uma instituição neutra. Devia se pensar
a função e o funcionamento do sistema de ensino sob o ponto de vista crítico, ou
seja, encontrar elementos para ampliar o capital cultural dos indivíduos.
Marx – Já que você falou em crítico, acho que a escola não é apenas uma
mediadora do conhecimento ou de cultura, ela também é uma das responsáveis em
desenvolver o pensamento crítico do aluno.
Bourdieu – Sim, também acho.
Weber – Bom, como vocês deram suas opiniões, vou falar o que penso
também.
Durkheim – Diga aí Weber.
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4. Weber – Olha! Eu concordo com o que vocês falaram até agora, acho que a
educação deve sim preparar o indivíduo para a vida e para o mercado de trabalho.
Mais ainda, acho que a escola também pode desenvolver o potencial de muitos
alunos. Porém com o crescimento da burocratização e das grandes corporações
capitalistas privadas, o homem deixa de buscar um pouco a sua liberdade, tornando
uma pessoa que se preocupa mais em ascensão social e riqueza material.
Durkheim – E... (interroga)
Weber – E aí surge uma questão: até onde o sujeito tem a liberdade de agir?
O problema muitas vezes é este, o indivíduo moderno geralmente usa associações
para agir. Mas porque tomar esta decisão e não outra?Acho que até a própria
sociedade onde a pessoa vive pode influenciar nas suas escolhas.
Marx – Nossa! Interessante ouvir você falar Weber. Apesar do tempo que
estamos juntos nesta prisão nunca tinha ouvido você falar assim.
Durkheim – É isso aí Weber. Mas acho também que o professor pode ser um
grande influenciador para os alunos. Claro que o professor não vai dizer ao aluno o
que fazer, mas ele poderá apontar para o aluno alguns caminhos para a so...
ciedade. (pausa sua fala)
Bourdieu – O que houve Durkheim?
Durkheim – Pensei ter ouvido algum barulho.
Weber – Ah, vai ver é os cães na rua!
Durkheim – É pode ser, mas minha impressão é que foi aqui dentro. Bom
deixa pra lá.
Weber – Bom, eu sei que viemos discutindo sobre a influência das classes
sociais na educação, porém atualmente estamos vivendo num país capitalista,
devemos pensar numa educação a partir disto.
Marx – Nós sabemos disso Weber, porém mesmo assim eu ainda acredito que
a sociedade possa se transformar. Eu não nego, uma sociedade comunista poderia
ser bem melhor.
Bourdieu – Olha! Acho que assim como a religião necessita da ciência em
alguns momentos e vice-versa, por mais que não assumam isso, acredito que o
capitalismo precise do socialismo muitas vezes, assim como o socialismo também
precisa do capitalismo.
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5. Durkheim – Sei lá, mas acho que a mudança da sociedade deve começar a
partir da escola.
Weber – Pois é. Sei que temos muitas idéias e teorias, mas o que podemos
fazer dentro desta sela? Só nos resta jogar cartas.
Marx – Maldita hora que fomos presos. (balançando a cabeça)
Bourdieu – Se pudéssemos apresentar nossas idéias para o mundo...Talvez
não exercêssemos o papel de professor, mas tentaríamos contribuir para a
educação que se encontra tão, tão...ah!!(solta o ar com cara de desilusão)
Marx – Bati.
Durkheim – Já nem estava mais preocupado com o jogo.
Guarda noturno – Atchim!
Bourdieu – Silêncio galera! É o guarda noturno, ele certamente vai dar uma
bronca na gente, como sempre. (sussurra ele)
Guarda noturno – Não, desta vez não darei um bronca em vocês.
Marx – Ué?! Devo estar sonhando.
Guarda noturno – Talvez sim Marx. Já faz algum tempo que estou
observando a conversa de vocês e...
Durkheim – Bem que eu desconfiei daquele barulho. (interrompe o guarda)
Guarda noturno – Posso continuar ou ta difícil?
Durkheim – Prossiga seu guarda.
Guarda noturno – Olha. Muita coisa está acontecendo lá fora. O Brasil está
acordando e tentando buscar os seus direitos e como vocês já sabem a educação
também é algo que precisa ser revisto, repensado. Às vezes penso: será este um
período de transição do Brasil?
Bourdieu – Nunca tinha visto você tão simpático, seu guarda...
Guarda noturno – Além de guarda, eu também sou pai e me preocupo com a
educação do meu filho. (desabafa)
Marx – Acho que essa sua questão pode fazer sentido, afinal toda sociedade
pode ser transformada.
Weber – É o que eu vinha falando antes. O brasileiro tomou essa liberdade
para agir em busca de seu direito. Talvez fosse isso que faltava.
Durkheim – Ta, mas o que temos a ver com isso?
Guarda noturno – Até hoje não havia escutado ninguém propor idéias tão
geniais como vocês. Bom, não é a toa que lhes chamam de pensadores, agora sei o
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6. porquê. Apesar de cada um apresentar uma idéia diferente, acho que a união delas
poderia contribuir muito para a educação de hoje.
Bourdieu – Quer dizer que...
Guarda noturno – Sim Bourdieu, sei que posso estar cometendo um grande
erro como profissional na minha área, podendo até ser... Bom, deixa pra lá. O
importante é que não podemos perder esta oportunidade. Eu como guarda noturno
conheço o lugar de todas as câmeras de vigilância e sou um dos responsáveis por
guardar as chaves das selas.
Weber – Mas por que irá fazer isso?
Guarda noturno – Pelo bem da educação. Pelo bem da educação do meu
filho. Mas lembrem-se estou fazendo isso sob uma condição: vocês prometem que
irão tentar mudar a educação a partir de suas idéias?
Marx – Não. Não prometemos tentar, e sim mudar.
Bourdieu – Concordo com o Marx. Já que teremos essa chance de apresentar
nossas idéias para o mundo e você confia em nós para isso, acho que isso já se
torna uma responsabilidade para nós, mas que faremos com todo orgulho.
Marx, Weber e Durkheim – É isso aí.
Marx – Por uma igualdade social e pelos direitos da educação!
Durkheim – Por uma educação que prepare as pessoas para sociedade!
Weber – Por maior liberdade de ação das pessoas e por uma educação que
as prepare para o mercado!
Bourdieu – Por uma ampliação do capital cultural dos alunos!
Guarda noturno – Bom, vamos indo, temos pouco tempo antes da troca de
guardas.
Passaram-se dez minutos.
Guarda noturno – Ufa, consegui. Talvez as grandes idéias não mudem o
mundo, mas influencia para uma mudança da sociedade. (pensa)
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