Procasur, mãos rendeiras cartilha. Gestión de conocimiento para los proyectos FIDA en em ámbito del Programa SEMEAR, envolviendo también otras organizaciones e instituciones de desarrollo rura en el Nordeste semiárido.
1. A cartilha descreve as histórias e trajetórias de duas organizações de rendeiras no Semiárido da Paraíba: a Associação de Resistência das Rendeiras de Cacimbinha (ARCA) e a Cooperativa de Produção de Bens e Serviços de São João Tigre (Coopetigre).
2. A ARCA foi fundada em 1998 com o objetivo de dar continuidade à arte da renascença e apoiar as mulheres rendeiras. A Coopetigre surgiu em 2006 para fortalecer
Informativo da GRE Mata Sul nº 7 - Novembro de 2019
Similaire à Procasur, mãos rendeiras cartilha. Gestión de conocimiento para los proyectos FIDA en em ámbito del Programa SEMEAR, envolviendo también otras organizaciones e instituciones de desarrollo rura en el Nordeste semiárido.
Similaire à Procasur, mãos rendeiras cartilha. Gestión de conocimiento para los proyectos FIDA en em ámbito del Programa SEMEAR, envolviendo también otras organizaciones e instituciones de desarrollo rura en el Nordeste semiárido. (20)
Procasur, mãos rendeiras cartilha. Gestión de conocimiento para los proyectos FIDA en em ámbito del Programa SEMEAR, envolviendo también otras organizaciones e instituciones de desarrollo rura en el Nordeste semiárido.
1. MãosRendeiras
Tecendo histórias e disseminando conhecimentos das rendeiras de
Renascença da Associação de Resistência da Comunidade de
Cacimbinhas (ARCA) e da Cooperativa de Produção de Bens e Serviços de
São João Tigre (Coopetigre).
2.
3. 1ª EDIÇÃO
SÃO JOÃO DO TIGRE – PARAÍBA – BRASIL
- 2014 -
MãosRendeiras
Tecendo histórias e disseminando conhecimentos das
rendeiras de Renascença da Associação de Resistência da
Comunidade de Cacimbinhas (ARCA) e da Cooperativa
de Produção de Bens e Serviços de São João Tigre
(Coopetigre).
4.
5. Aos grupos de mulheres rendeiras ARCA e Coopetigre;
Ao Projeto de Desenvolvimento Sustentável do Cariri,
Seridó e Curimataú (Procase);
E as organizações parceiras Cunhã Coletivo Feminista e
Centro Feminista 8 de Março.
AGRADECIMENTOS
6.
7. SUMÁRIO
1
2
3
4
5
6
7
8
9
Um bom começo para uma boa história ......................................
Parcerias que dão certo ................................................................
Tecendo a história da Renascença ................................................
Um passeio pela história e trajetória dos grupos de rendeiras ......
Avançar com as conquistas ..........................................................
Caminhando com os desafios ......................................................
Lições e aprendizagens ................................................................
Protagonistas desta história .........................................................
Fonte de pesquisa bibliográfica ....................................................
06
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30
32
8. UM BOM COMEÇO PARA
UMA BOA HISTÓRIA
1
Oficinas de Sistematização Participativa na Coopetigre (E) e na ARCA (D)
9. - Mãos Rendeiras -
07
Esta cartilha é resultado da sistematização das
experiências da Cooperativa de Produção de
Bens e Serviços de São João Tigre (Coopetigre)
e Associação de Resistência das Rendeiras da
Comunidade de Cacimbinhas (ARCA), contri-
buindo para a construção e disseminação de
conhecimento desses dois grupos, ao permitir
que as próprias rendeiras se apropriarem de
suas experiências como protagonistas nesse
processo de resgate de trajetórias, reflexões e
(re) construções da produção de saberes.
O exercício de sistematizar permite que as
rendeiras coloquem em prática seus saberes
antigos, conheçam e apreendam novas expe-
riências e disseminem mais outros conheci-
mentos. A produção do conhecimento funda-
mentalmente acontece no espaço do coletivo,
ou seja, toda a construção e reflexão da
sistematização se dá no conjunto dos atores
locais. É importante que as rendeiras se
empoderem do seu próprio saber de maneira
coletiva, alcançando uma compreensão pro-
funda sobre os aprendizados e resultados desta
experiência.
Esperamos que esta cartilha consiga trazer um
pouco da trajetória vivenciada pelos grupos de
rendeiras de Renascença da Coopetigre e
ARCA, sendo elas protagonistas dessa história.
Ao mesmo tempo, esta publicação dá visi-
bilidade a resistência e a perseverança das
mulheres em dar continuidade a essa arte e
ofício secular, que é a Renascença; trazendo os
desafios e as conquistas desse trabalho diante
do contexto local, que é o Semiárido
paraibano.
Uma ótima história.
Uma prazerosa leitura!
UM BOM COMEÇO PARA UMA BOA HISTÓRIA
Diálogos sobre a experiência
As rendeiras dos grupos Coopetigre e ARCA participaram de uma Oficina de Sistematização Participativa entre os dias 15 a
19 de outubro de 2014, no município de São João do Tigre, no Semiárido da Paraíba. Foi um momento de olhar para trás e
recontar a história dos dois coletivos.
Na ocasião, as rendeiras resgataram os processos de organização desencadeados e os principais passos dados para chegarem
a uma experiência exitosa enquanto grupos, mas também com seus desafios. Ao mesmo, tempo foram identificados: as
chaves de sucesso, os acertos e as falhas, os resultados, os aprendizados, as dificultades, os desafios e as perspectivas
futuras.
Foi uma oportunidade de cada rendeira olhar e refletir a partir da experiência e refazer todo o itinerário dessa caminhada
enquanto grupos de mulheres.
11. 09
Com a intenção de contribuir para facilitar o
acesso e o intercâmbio de conhecimentos e
boas práticas assim como a colaboração entre
os diversos atores do desenvolvimento rural no
Semiárido, o FIDA, em parceria com o Instituto
Interamericano de Cooperação para a
Agricultura – IICA e com o apoio da Agência
Espanhola de Cooperação Internacional para o
Desenvolvimento – AECID, implementou o
Programa de Gestão do Conhecimento em
Zonas Semiáridas do Nordeste, o Semear. O
Programa tem o objetivo de aprimorar a
capacidade da população rural de acessar e
aproveitar um conjunto de conhecimentos,
experiências, inovações e boas práticas que
contribuam para melhorar suas condições de
vida, coexistir com as condições semiáridas e
tirar maior proveito das possibilidade de
desenvolvimento da região Semiárida do
Nordeste do Brasil.
Nesse contexto, o Programa Semear desen-
volve ações em parceria com a corporação
PROCASUR na gestão e disseminação de
conhecimentos entre os projetos apoiados pelo
FIDA no Brasil. A parceria é no sentido de
articular e fortalecer intercâmbios, trocas de
saberes, sistematizações de experiências e
outro espaços da construção da aprendizagem
entre os projetos, organizações, grupos e
associações que estão nos territórios do
Semiárido.
A proposta da PROCASUR é promover e
difundir referências que possam orientar
políticas públicas de combate à pobreza e
apoio ao desenvolvimento rural sustentável no
Semiárido. A partir dessa opção, a abordagem
teórico-metodológica do projeto buscou
romper com a noção de transferência de
tecnologias, adotando um enfoque de cons-
trução participativa de conhecimentos desde a
prática e em diálogo como os atores chave no
desenvolvimento do Semiárido.
Esta sistematização dos grupos ARCA e
Coopetigre conta com a parceria do Projeto
de Desenvolvimento Sustentável do Cariri,
Seridó e Curimataú (Procase). O projeto é
resultado do convênio entre o Governo do
Estado da Paraíba e o FIDA, beneficiando
projetos de associações e cooperativas rurais
de 56 municípios do Semiárido paraibano.
PARCERIAS QUE DÃO CERTO
- Mãos Rendeiras -
13. 11
A Renda Renascença é uma atividade artesanal
e uma técnica têxtil surgida no século XVI
tendo origem em Veneza, na Itália. Chegou ao
Brasil pelas mãos das mulheres dos coloni-
zadores europeus e passou a fazer parte das
tradições rurais do Semiárido do Nordeste
brasileiro. Há influência muito forte também
das freiras estrangeiras que, nos conventos,
ensinavam este tipo de trabalho às alunas.
A produção da Renascença no Brasil se destaca
nos estados da Paraíba, Pernambuco, Ceará,
Sergipe e Bahia. A Renascença chegou à
Paraíba na década de 1950 pelas mãos de
algumas mulheres que residiam nos municípios
de Camalaú, São João do Tigre, São Sebastião
do Umbuzeiro e Zabelê, que na época eram
todos distritos da cidade de Monteiro. E muitas
dessas rendeiras já aprenderam o ofício nos
municípios vizinhos de Poção e Pesqueira, no
Agreste de Pernambuco.
Na Paraíba, os municípios que concentram a
produção da Renda são Monteiro, Camalaú,
São João do Tigre, São Sebastião do
Umbuzeiro, Prata, Congo, Sumé e Zabelê,
situados no Cariri Ocidental. Nesse território,
há o registro de pouco mais de quatro mil
artesãs, aproximadamente 20% da população
feminina da região. Hoje, boa parte dessas
rendeiras está organizada em associações ou
cooperativas.
Na última década, o ofício da Renascença
paraibana tem se fortalecido enquanto uma
arte e atividade econômica graças a um
conjunto de iniciativas, apoios e parcerias de
instituições governamentais e organizações da
sociedade civil, como Governo do Estado da
Paraíba, através do Procase, Serviço Brasileiro
de Apoio às Micro e Pequenas Empresas -
Sebrae/Paraíba, Banco do Nordeste, Prefeituras
Municipais, Cunhã Coletivo Feminista e Centro
da Mulher 8 de Março. Constituindo, assim,
uma rede de novos atores territoriais no apoio
à reestruturação produtiva e incentivo à
organização das rendeiras, na lógica do coope-
rativismo e do associativismo e no intuito de
fortalecer ainda mais a Renda como atividade
econômica e identidade local de um povo.
O contexto das experiências da ARCA e
Coopetigre se dá na Paraíba, Semiárido brasi-
leiro, especificamente no Cariri Ocidental (a
região é dividida em Ocidental e Oriental), no
município de São João do Tigre.
TECENDO A HISTÓRIA DA RENASCENÇA
Mapa da Paraíba. Em destaque, o município
de São João do Tigre
- Mãos Rendeiras -
14. - MÃOS RENDEIRAS | TECENDO A HISTÓRIA DA RENASCENÇA -
12
O município de São João do Tigre está a
243km da Capital - João Pessoa. Possui uma
população de 4.578 habitantes, de acordo com
o IBGE/2010, com uma área territorial de 816
km², fazendo divisa com o município de Poção,
em Pernambuco.
São João do Tigre está na área de Proteção
Ambiental das Onças numa extensão de
36.000 hectares, apresentando paisagens
montanhosas e uma vasta mata servindo de
atrativo turístico. Apesar da aridez, caracte-
rística da região, durante à noite a temperatura
tende a cair. Grande parcela dos moradores
vive da agricultura e da pecuária.
O que chama à atenção também em São João
do Tigre é a quantidade de rendeiras que ainda
produzem a Renascença. Ao andar pelas ruas
da cidade, todo final de tarde, é comum ver
mulheres sentadas nas calçadas com suas
almofadas tecendo e fazendo Renda.
Por muitos anos, a Renda foi a atividade econô-
mica de destaque do município. A Renascença
chegou a São João do Tigre por volta do ano de
1960 através da senhora Maria dos Anjos
Jatobá. Ela aprendeu a Renda no município
vizinho de Poção, estado de Pernambuco.
Depois começou a ensinar esse ofício para
outras mulheres da localidade.
Atualmente, a Renascença resiste como um
complemento da renda familiar ou como uma
atividade prazerosa. Muitas mulheres dividem
os afazeres de dona-de-casa e de agricultora
com o de rendeira.
As rendeiras da Coopetigre e ARCA trabalham
com a Renascença, muitas vezes, para suprir
uma pequena demanda de consumo local ou
por encomendas. Normalmente, também
como uma renda subsidiária em complemento
com outra renda, como na agricultura,
trabalhos domésticos, docência, aposenta-
doria, serviço público ou em organizações da
região.
243 Km
4.578
816 Km2
DE JOÃO PESSOA/PB
HABITANTES
DE ÁREA TERRITORIAL
São João do Tigre/PB (centro da cidade)
Rendeira Fernandina Celeste (E) e sua irmã no Tigre/PB
15. UM PASSEIO PELA HISTÓRIA
E TRAJETÓRIA DOS GRUPOS
DE RENDEIRAS
4
Joana Cândida (conhecida como Jandira, 59 anos)
16. 14
Associação de Resistência das Rendeiras de
Cacimbinha (ARCA)
O movimento, enquanto grupo de mulheres
rendeiras, teve início ainda na década de 80
por intermédio de Maria das Dores Souza dos
Anjos (Dona Dorinha). Algumas mulheres da
comunidade participavam da Associação de
Artesão do Nordeste (Associarte), uma
organização com sede em Olinda, em
Pernambuco, que apoiava grupos de produção
de artes em alguns estados do Nordeste.
O contexto das experiências da ARCA e
Coopetigre se dá na Paraíba, Semiárido
brasileiro, especificamente no Cariri Ocidental
(a região é dividida em Ocidental e Oriental),
no município de São João do Tigre.
Esse apoio da Associarte se dava através da
venda dos produtos por consignação em uma
loja em Olinda. Os problemas enfrentados com
a escassez de recursos e de capacitação, as
dificuldades e a falta de apoio levaram o grupo
a ficar parado por quase 10 anos.
Somente, em 1998, é fundada a ARCA na
comunidade rural de Cacimbinha, município de
São João do Tigre. A Associação já traz no
nome o sentido da resistência e da luta das
mulheres rendeiras em continuar com a arte e
o ofício da Renascença.
UM PASSEIO PELA HISTÓRIA E TRAJETÓRIA
DOS GRUPOS DE RENDEIRAS
Quando a gente nasce parece que já nasce com
essa inteligência de fazer Renascença. Já ensinei
muitas mulheres a fazer renda, na época, à luz
do candeeiro ou do lampião. Antigamente, as
mulheres se reuniam em grupos para fazer
Renascença, era uma festa só e muita alegria.
Ficavam vários grupos de mulheres nas calçadas.
A gente ficava conversando e trabalhando. Eu
adoro trabalhar, apesar da minha vista ser pouca,
é um divertimento pra mim.
Inácia Farias, 72 anos.
Uma das rendeiras mais antiga de Cacimbinha.
- Mãos Rendeiras -
17. 15
- MÃOS RENDEIRAS | UM PASSEIO PELA HISTÓRIA E TRAJETÓRIA DOS GRUPOS DE RENDEIRAS -
Desde esse período, era algo constante o
envolvimento de atravessadores/as para com-
prar as peças das rendeiras por preços baixos e
vender fora do município por preços bem
elevados. Era um contexto de muita pobreza;
momento difícil para as famílias da
comunidade.
As mulheres foram incentivadas a se
organizarem numa associação para buscarem
suas melhorias a partir do incentivo do Padre
João, e do prefeito da época, Genuíno. A
primeira presidenta da ARCA era eleita, Maria
do Socorro da Costa. Até então o grupo já
reunia 20 sócias.
No ano de 2000, a ARCA elege nova direção
tendo na presidência a rendeira Josefa Maria
Gomes de Farias, mais conhecida como Nita.
Nesse mesmo período, surgem as primeiras
encomendas de Renda para as mulheres
produzirem. Elas começam também a parti-
cipar de capacitações pelo Sebrae/Paraíba
sobre pontos diferentes de Rendas e aper-
feiçoamento na qualidade da Renascença.
Em 2002, as organizações Cunhã Coletivo
Feminista e Centro da Mulher 8 de Março
começam a acompanhar à comunidade
Cacimbinha. O acompanhamento à localidade
se dá a partir de atividades sobre gênero numa
parceria com o Projeto Dom Helder Câmara
(PDHC).
As rendeiras destacam, nesse mesmo momen-
to, o acesso ao Programa Nacional de Fortale-
cimento da Agricultura Familiar (PRONAF
Mulher). Uma linha de crédito voltada para
investimento às atividades agropecuárias,
turismo rural, artesanato e outras atividades de
interesse da mulher agricultora.
De 2000 a 2007, a Associação ficou sem
ações, apenas com atualização de pagamento
das declarações. Somente no ano de 2007,
acontece uma nova eleição para direção da
ARCA, assumindo a presidência a rendeira
Maria Aparecida Aureliano (Neném) que fica
na função até 2009. As mulheres se sentem
mais encorajadas e começam se mobilizar para
reativar novamente as atividades da ARCA.
Criam pela primeira vez um banco de matéria
prima para a produção da Renascença com o
apoio do PDHC e da Associação Menonita de
Assistência Social (AMAS). Dentro do projeto
do banco de matéria prima, as mulheres
realizavam avaliações das atividades e partici-
pavam de momentos de confraternizações
entre elas.
Ainda em 2007, as organizações Cunhã e
Centro da Mulher 8 de Março acompanham
mensalmente à comunidade Cacimbinha com
apoio às questões produtivas e com oficinas de
formação. Nesse mesmo ano, surge o primeiro
projeto de construção da sede da ARCA.
De 2010 a 2011, a rendeira Socorro Costa
assume a direção da Associação. Nesse
período, o grupo começa a participar de
espaços de comercialização. As mulheres
passam a comercializar suas peças de
1998 Foi eleita a primeira presidenta
da ARCA, Maria do Socorro
da Costa.
18. - MÃOS RENDEIRAS | UM PASSEIO PELA HISTÓRIA E TRAJETÓRIA DOS GRUPOS DE RENDEIRAS -
Renascença em exposições e feiras fora do
município.
Em 2011, a ARCA acessa o programa
Empreender Paraíba. É uma política pública de
microcrédito para atender empreendedores
locais, residentes no estado da Paraíba.
Já em 2012, a Associação participa do
programa Empreender Mulher. Uma linha de
crédito para às mulheres com condições
diferenciadas para acessar e voltada para inves-
timentos de grupos produtivos. Nesse mesmo
ano, a ARCA recebe o apoio da União
Europeia, através da organização Cunhã. Nesse
mesmo período, o grupo chega a 40 sócias.
Ainda em 2012, as rendeiras conseguem o Selo
Indicação Geográfica (IG) pelo Conselho das
Associações, Cooperativas, Empresas e Enti-
dades Vinculadas a Renda Renascença do Cariri
Paraibano (Conarenda). O selo é uma garantia
para o consumidor, pois comprova que o
produto é genuíno e possui qualidades particu-
lares, ligadas à sua origem, como é o caso da
Renascença. Nos mercados nacionais e interna-
cionais, muitos produtos são caracterizados
não apenas pela marca que ostentam, mas
também pela indicação da sua verdadeira
origem geográfica. Essa indicação lhes atribui
certa reputação, valor intrínseco e identidade
própria que os distinguem dos demais produtos
de igual natureza disponíveis no mercado.
O ano de 2013 foi significativo para a
Associação com a chegada do apoio do
Procase. O grupo acessou o edital, enviou o
projeto e foi contemplado com investimentos
A Renascença é uma arte muito rica. Está ligada
na identidade e na história da gente. Muitas
famílias construíram sua vida e criaram seus filhos
com a renda. A mulher além de fazer Renascença
porque gosta traz também a autonomia dela. A
Associação dá um poder de voz às mulheres. Em
grupo, a gente aprende muito umas com as
outras, a respeitar o limite da outra. Viver no
coletivo proporciona a construção de um mundo
melhor, de uma comunidade melhor. A solução
dos problemas é coletivo. A gente consegue
desabafar e apoiar uma a outra. Meu maior
sonho é ver as mulheres da comunidade
produzindo a renda como sustento e vivendo só
dessa arte, desse ofício. Há um sentimento de
orgulho pelas mulheres. Produzimos peças de
arte. Eu amor tecer!
Lucivânia Queiroz, 26 anos.
Faz parte da ARCA. Aprendeu fazer Renascença aos
7 anos de idade.
16
19. Quando comecei, via na Renascença uma
oportunidade de sobrevivência, financeira. Tudo
que tenho hoje em casa foi através da
Renascença, mas hoje é um complemento. Ela é
muito forte na vida da gente. Antes de ser
professora me dedicava quase 10 horas/dia e, às
vezes, entrava pela noite. Meu sonho é ver a sede
da ARCA pronta. Quando me aposentar quero
viver exclusivamente para a Renascença.
Maria Aparecida Aureliano, 48 anos.
Mais conhecida como Dona Neném.
Faz parte da ARCA.
- MÃOS RENDEIRAS | UM PASSEIO PELA HISTÓRIA E TRAJETÓRIA DOS GRUPOS DE RENDEIRAS -
para construção da sede da associação, e
compra de máquinas de costura e material
para produção. Ao todo, estão sendo
beneficiadas 25 famílias de rendeiras. O
montante faz parte de um convênio do
Governo do Estado com o Fundo Internacional
de Desenvolvimento para a Agricultura (FIDA).
Em 2014, a ARCA participa de alguns espaços
políticos de mobilização e articulação, como o
Dia 8 de Março (Dia Internacional da Mulher),
na cidade de São João do Tigre, Conferência de
Economia Solidária e Plebiscito Popular, que
aconteceu em todo o país. Ainda nesse mesmo
ano, a Associação recebe os primeiros recursos
do edital do Procase e também o apoio da
Petrobras, através das organizações Cunhã
Coletivo Feminista e Centro da Mulher 8 de
Março.
Cooperativa de Produção de Bens e
Serviços de São João Tigre (Coopetigre)
A Coopetigre é fundada em 2008, surge no
intuito de buscar o fortalecimento e as
melhorias para as rendeiras. Três pessoas foram
importantes na formação da Cooperativa: as
rendeiras Lourdinha e Doralice, e Chico Dantas,
ligado à sociedade civil.
2013
A Associação ganha o apoio da Procase.
Ajudando a beneficiar 25 famílias de rendeiras.
CHEGADA DA PROCASE
17
20. Aprendi a fazer Renascença com minha mãe.
Ensinei esse ofício para as minhas filhas também.
Sempre trabalhei com renda e na roça. Adoro
fazer Renascença, sinto uma coisa boa, pois
conheço desde criança. Fico preocupada com o
futuro da renda. Um dia pode ser que se acabe.
As jovens não se interessam, porque ganha
pouco. Espero ter sempre saúde na vista para
nunca poder parar. Estou desde o início da
Cooperativa. É bom trabalhar em grupo.
Sede da Coopetigre no centro de São João do Tigre
- MÃOS RENDEIRAS | UM PASSEIO PELA HISTÓRIA E TRAJETÓRIA DOS GRUPOS DE RENDEIRAS -
Logo no início não foi nada fácil para fundar a
Coopetigre. Sem apoio e recursos, de porta em
porta as pessoas iam mobilizando e convi-
dando as rendeiras para participarem do
grupo. Começaram a receber doações e fazer
bingos para cobrir as despesas com a docu-
mentação do registro e fundação da
Cooperativa. Nesse mesmo período, a prefei-
tura doa um espaço por cinco anos para
funcionar a sede do grupo, que já reunia 23
rendeiras cooperadas.
Após passar o ano de 2009 sem apoio e
descrentes, 2010 foi cheio de atividades e
ações. Nesse ano, o grupo acessou a linha de
financiamento do Banco do Nordeste, o
CrediAmigo, em valores de R$ 500,00 a R$
1.100,00 para compra de materiais para
produção da Renascença beneficiando 23
mulheres.
Joana Cândida, 59 anos
Faz parte da Coopetigre.
Mais conhecida como Jandira
18
21. Já sobrevivi exclusivo da Renascença. Criei meus
filhos com a renda. Só deixo um dia esse ofício
quando não poder mais pegar na agulha. É um
ofício que a gente aprende pro resto da vida.
Depois da Cooperativa a gente tem viajado para
outros lugares expondo e divulgando nosso
trabalho. A Renascença representa tanta coisa
na minha vida. É uma paixão que a gente tem
pela renda. A Renascença ajuda a gente viver.
Maria do Socorro Lopes, 63 anos.
É cooperada da Coopetigre.
- MÃOS RENDEIRAS | UM PASSEIO PELA HISTÓRIA E TRAJETÓRIA DOS GRUPOS DE RENDEIRAS -
Ainda em 2010, a Coopetigre começa a
participar de espaços que iriam fortalecer e
divulgar o trabalho das rendeiras, como a Feira
da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária
(Embrapa), no município de Monteiro, e
também em exposições. Nesse ano, recebe o
apoio da organização 8 de Março com oficinas
sobre gênero e participa de oficinas de
formação em designer, gestão e desenvol-
vimento humano, numa parceria com o
Sebrae/Paraíba.
Em 2011, acontece a renovação da direção da
Coopetigre e o Sebrae cria para o grupo a
primeira etiqueta para colocar nas peças de
Renascença. No ano de 2012, o grupo participa
da Marcha das Margaridas, em Brasília, e da
Feira Nacional de Negócios do Artesanato
(Feneart), no Centro de Convenções em
Olinda, Pernambuco.
Ao passar dos anos a Cooperativa cada vez
mais tem participado de espaços e momentos
políticos e de articulação importante para a
comercialização e consolidação da arte e do
ofício da Renascença. Como em 2013, em que
o grupo esteve no Show Room do Sebrae, em
São Paulo, na Feira Estadual de Agricultura
Familiar, no Salão do Artesanato, em João
Pessoa, no Congresso Internacional dos
Territórios, também na Capital do estado, e
mais uma vez na Feira Nacional de Negócios do
Artesanato (Feneart), em Olinda.
Ainda em 2013, a Coopetigre acessou o
programa Empreender Mulher, uma linha de
crédito fornecida pelo Governo do Estado para
implantar o banco de matéria prima. A ação se
19
22. - MÃOS RENDEIRAS | UM PASSEIO PELA HISTÓRIA E TRAJETÓRIA DOS GRUPOS DE RENDEIRAS -
deu com o apoio da organização 8 de Março
para comprar lacê, linha e papel para produção
da Renascença.
Nesse mesmo ano, o grupo cria a carteira da
cooperada e ainda é contemplado com a
Carteira do Artesão fornecida pelo Sebrae.
Recebe também apoio da União Europeia para
realização de intercâmbios.
Ainda em 2013, a Cooperativa também
recebeu o Selo de Indicação Geográfica (IG)
promovido pelo Conselho das Associações,
Cooperativas, Empresas e Entidades Vincula-
das à Renda Renascença do Cariri Paraibano
(Conarenda). Participou de intercâmbios com
outros grupos de mulheres artesãs nos
municípios de Afogados da Ingazeira e Tabira,
no Sertão do Pajeú, em Pernambuco, e de
oficina sobre modelagem realizada pelo
Sebrae.
Nesse ano também o grupo acessa o edital do
Procase e foi contemplado com um projeto que
prevê a ampliação da produção e circulação
das peças de Renascença das mulheres,
reforma da sede e aquisição de equipamentos
para fabrico dos produtos.
Em 2014, a Coopetigre chega a 48 cooperadas
e a doação da sede pela prefeitura é renovada
por mais 15 anos. Nesse mesmo ano, o
Governador do Estado visita a Cooperativa,
momento muito significativo para as rendeiras.
Começam também a chegar os primeiros
recursos do Procase e é elaborado o projeto de
reforma da sede. A Cooperativa ainda recebeu
durante intercâmbio os grupos de mulheres
rendeiras dos municípios de Pesqueira e Poção,
região Agreste de Pernambuco.
Ainda nesse mesmo ano, o grupo participou
de curso de designer de aplicação da
Renascença promovido pela Universidade
Federal de Campina Grande (UFCG), do
campus de Monteiro, e também Renascença
3D, técnica de modelagem em espuma, com o
professor Romero Souza do Sebrae. As coope-
radas tiveram a oportunidade de comerciali-
zarem algumas peças para a estilista Raquel
Grace, de São Paulo, com o apoio do Projeto
Dom Helder Camara, e participação no curso
de manequim molage numa parceria entre
Sebrae e a organização 8 de Março. Outro
marco para as mulheres foi estarem envolvidas
no Plebiscito Popular.
Vivo exclusivamente da Renascença, só tenho ajuda do Bolsa
Família. Quando termino uma peça e vendo, com esse dinheiro
já pago uma conta de energia, de água ou um botijão de gás.
Mudou muita coisa depois que entrei para Cooperativa. É
importante a gente trabalhar em grupo. A gente aprende uma
com as outras. Enquanto a vista tiver boa não quero parar de
fazer renda. Maria José Carvalho, 50 anos.
Faz parte da Coopetigre.
20
24. Hoje, a Renascença é um complemento. No
momento não dá pra viver só exclusivamente da
renda. Trabalho com agricultora, cabeleireira e
revendedora de cosméticos. Pra mim a
Renascença é uma tradição. Espero que nunca
morra. Nasci e cresci vivendo essa arte. Me criei
vendo minha mãe trabalhar com a renda. A
partira da Associação o nosso trabalho ficou mais
reconhecido, com mais qualidade. Através da
ARCA tivermos muitos cursos. A gente deve
incentivar as colegas a não pararem com essa
arte. Eu me orgulho de ser rendeira.
Djanilda Marques Lima, 32 anos.
Mais conhecia como Dejinha. É associada da ARCA.
22
AVANÇAR COM AS CONQUISTAS
As rendeiras colocam como algo que vem
facilitando seus trabalhos desde o início da
fundação é a presença e o acompanhamento
das organizações da sociedade civil. O trabalho
em grupo e a relação de confiança são
elementos que têm contribuído também para o
crescimento, o empoderamento e a organi-
zação do grupo, bem como o fortalecimento e
a autonomia da mulher.
A primeira questão que se observa é que diante
de todas as fragilidades da produção e
perpetuação da própria Renascença enquanto
arte e ofício e o contexto social e econômico
em que vivem às mulheres, as rendeiras foram
capazes de se organizarem numa associação
ou cooperativa e uniram-se para buscar as
melhorias do coletivo. Essa capacidade de
resiliência e a boa vontade do grupo já é um
ótimo começo para iniciar uma trajetória de
um grupo de rendeiras de Renascença, no
município de São João do Tigre.
A vontade e a capacidade de aprender, buscar
conhecimento e está em diversos espaços
estratégicos para o trabalho com a Renascença
são elementos também que marcam o êxito
das experiências com os dois grupos de
rendeiras. A partir dessa necessidade de forma-
ção que as mulheres têm, vão aperfeiçoando e
inovando a Renascença com novos pontos,
cores, moldes e designer.
Outra questão importante para o sucesso
dessas duas experiências é a presença e o apoio
- Mãos Rendeiras -
25. No início, sobrevivia exclusivamente da rende.
Hoje, é um complemento com minha aposentaria
do serviço público. É um trabalho que a gente faz
por prazer. A partir da Coopetigre fomos
participando de diversos cursos de formação de
aperfeiçoamento e profissionalização. Nosso
trabalho é pouco valorizado, isso se deve por
causa dos atravessadores. O sonho da gente é
que o nosso trabalho seja valorizado. Precisamos
também de um ponto comercial só nosso para
comercializar nossos produtos.
Maria de Lourdes Souza, 61 anos.
Presidenta da Coopetigre.
- MÃOS RENDEIRAS | AVANÇAR COM AS CONQUISTAS -
23
de agentes locais e exógenos ao longo da
trajetória da ARCA e do Coopetigre. Esses
agentes têm acompanhado os dois grupos
desde suas fundações. São organizações da
sociedade civil, entidades governamentais e
instituições bancárias que formam uma rede de
apoio e assistência aos dois coletivos de
mulheres.
27. A Cunhã iniciou acompanhando os grupos de
rendeiras em 2002. Os grupos foram escolhidos
pela complexidade da cadeia produtiva, a falta de
valorização da Renascença e as fragilidades na
organização social, política e econômica. Temos
procurado fomentar a reflexão e a discussão do
papel e da autonomia das mulheres. As rendeiras
têm estado em diversos espaços políticos
importantes para a organização e para a
caminhada delas enquanto grupo. Hoje, elas são
agente políticos, mulheres empoderadas e
conhecedoras dos seus direitos.
Lúcia Lira, coordenadora do Cunhã
Coletivo Feminista.
25
CAMINHANDO COM OS DESAFIOS
A Renda Renascença é uma arte e ofício muito
oral. Chegou aos tempos atuais porque foi
passando de geração em geração. Ainda hoje é
muito raro as publicações que diz respeito
sobre o tema. Todo o patrimônio e herança da
Renascença está muito nas memórias das
mulheres desde os pontos aos desenhos. É
necessário garantir a perpetuação e difusão do
trabalho da Renascença para as gerações
futuras. Este é o primeiro desafio comum aos
dois grupos, apontados nas falas, reflexões e
debates com as rendeiras.
Outro desafio inerente à Associação e à
Cooperativa é de se impor, e tentar acabar,
com a figura do/a atravessador/a. Seu papel se
resume basicamente, em comprar a baixo
preço as peças produzidas pelas rendeiras e
revendê-las por valores bem maiores. Por isso,
a relação entre atravessador/a e artesã não é
nada fácil, ao contrário, é muito tensa. O/a
atravessador/a só tem conseguido espaço para
comprar as peças pelo fato das rendeiras serem
descapitalizadas e não terem condições neces-
sárias de comprar a matéria prima para produ-
ção da Renascença. Atualmente, as rendeiras
só conseguem vender suas peças por enco-
menda, em um ponto comercial na cidade de
Monteiro ou quando participam de feiras e
exposição. Em média, por mês, cada rendeira
lucra em torno de R$ 200,00 a R$ 450,00. Este
valor depende valor depende muito do tipo e
do tamanho da peça de Renascença.
A ARCA traz como desafios para o futuro a
construção da própria sede do grupo e
AMINHANDO COM OS DESAFIOS
- Mãos Rendeiras -
28. 26
A figura do atravessador ainda é um dos grandes entraves para o
desenvolvimento, e reconhecimento dos grupos de mulheres que produzem
a renda renascença no âmbito de associações ou cooperativas. É preciso dar
visibilidade e valorizar as pessoas que estão por trás de cada peça de
renascença, ressaltando o valor artístico e cultural da renda, e sua
importância para a identidade regional. Todo esse processo só será garantido
com o alinhamento de políticas públicas direcionadas para o
desenvolvimento sustentável da cadeia produtiva da renascença,
assegurando a valorização das rendeiras, e a comercialização justa da
produção.
Dirce Salete Ostroski,
coordenadora do Procase.
- MÃOS RENDEIRAS | CAMINHANDO COM OS DESAFIOS -
melhorar a autoestima das mulheres, promo-
vendo mais envolvimento, comprometimento e
participação de cada uma no coletivo. Ao
mesmo tempo, desejam também mais oportu-
nidades para participarem de momentos de
formação e profissionalização.
A Associação almeja ainda ampliação e
melhorias na comercialização da Renascença.
Sugerem a aquisição de uma máquina de
cartão de crédito para o grupo e um maior
estoque de matéria prima para a produção das
peças. Outro desafio a ser superado pela ARCA
é em relação a mais divulgação do trabalho das
mulheres com a elaboração de uma logomarca,
site, folders, blog e página no Facebook.
Para as rendeiras da Coopetigre o principal
desafio está no aperfeiçoamento na produção
da Renascença. Além de momentos de forma-
ção, reciclagem e profissionalização, elas
desejam cursos de aplicação da Renda em
confecção e tecido e de risco/molde em
Renascença, a serem realizados em São João
Tigre.
As cooperadas almejam também ampliação da
comercialização das peças produzidas por elas;
entre as estratégias apontadas está a aquisição
de um espaço comercial em Monteiro ou
Campina Grande para venderem seus produtos
e a compra de um trailer para viajar e comer-
cializar em feiras, eventos e exposições.
As rendeiras da Coopetigre desejam criar um
Fundo Rotativo Solidário, principalmente para
ajudar na compra da matéria prima e também
pretendem acessar à Declaração de Aptidão ao
Pronaf (DAP) Artesão. Outra questão colocada
pelas rendeiras foi a necessidade de divulgação
dos seus trabalhos e produção com a
Renascença.
30. 28
LIÇÕES E APRENDIZAGENS
Diante das adversidades do contexto em que
viviam, as mulheres rendeiras foram capazes de
se organizarem em uma Associação e o outro
grupo numa Cooperativa. A partir desses dois
coletivos, com união e participação, os desafios
e os problemas sempre existiram na trajetória
dos dois grupos, mas no conjunto foi mais fácil
superar os obstáculos e buscar as melhorias
para todas.
As experiências mostram também que quando
as pessoas estão organizadas as ações e as
políticas públicas chegam com mais tranqui-
lidade e facilidade. Tanto na ARCA como na
Coopetigre as decisões são tomadas no cole-
tivo. E as mulheres que estão dentro desses
grupos se aperfeiçoaram e se desenvolveram
mais em relação as outras rendeiras que estão
isoladas, que trabalham por conta própria em
São João do Tigre.
O espaço da ARCA e da Coopetigre, além de
trazer o aperfeiçoamento da Renascença e a
profissionalização das rendeiras, promoveram a
autonomia e o empoderamento da mulher
enquanto artesã e sujeito político. Esse percur-
so de crescimento político se deve a atuação
das organizações (Cunhã e 8 de Março) junto
às famílias desses dois grupos.
Outro ponto que chama à atenção é a
consciência que as rendeiras têm em relação as
fragilidades e os desafios enquanto grupos
organizados, ofício de rendeira e produção da
Renascença. Sabem da existência dos proble-
mas e querem resolver e solucioná-los. É
importante essa clareza dos dois grupos na
superação dos obstáculos.
Há um forte sentimento que liga a mulher à
Renascença no município de São João do Tigre.
- Mãos Rendeiras -
31. - MÃOS RENDEIRAS | LIÇÕES E APRENDIZAGENS -
29
Aprendi fazer Renascença aos 7 anos de idade.
A renda é a cultura da gente. Temos muitos
atravessadores aqui, em São João do Tigre. O
sonho da gente é que nosso trabalho seja
reconhecido como deveria. Gostaria uma dia
que nossas peças tivessem um preço justo e
que também tivéssemos um ponto fixo para
comercializar nossos produtos. Hoje, a renda é
um complemento pra gente por falta do valor
que se paga, que não é justo. Temos muito
trabalho e muito gasto pra vender nossas
peças baratas.
Anatália Aparecida Reinaldo, 19 anos.
Presidenta da ARCA.
Esse sentimento está nas falas das rendeiras,
nas histórias e nas ações delas enquanto
artesã. Algo que está enraizado na árvore
genealógica de cada família rendeira, que até
então, esse ofício foi transmitido de geração
em geração.
Esse empoderamento das rendeiras se percebe
porque elas estão dentro dos grupos.
Atingiram um capital simbólico de desenvol-
vimento e conhecimento diferenciado em
relação às rendeiras que estão fora dos grupos
e trabalham isoladas, sem participar desses
espaços. Essa mudança se deve a represen-
tatividade e o lugar social que a ARCA e
Coopetigre representam na vida dessas
rendeiras.
Esperamos que esta cartilha tenha resgatado e
construído um pequeno recorte da memória e
da trajetória desses dois grupos, tendo como
protagonistas desse processo as próprias
rendeiras. A principal fonte de pesquisa foi os
relatos, os testemunhos, as reflexões em
grupos e a conversa de “pé do ouvido” que
ajudou a contar essas histórias de vida e de
resistência em São João do Tigre. Esta
sistematização traz a voz e os olhares dessas
mulheres sertanejas do Cariri paraibano, que
muitas vezes não são vistas pelas políticas
públicas e costumeiramente são silenciadas
pela história oficial.
33. 31
PROTAGONISTAS DESTA HISTÓRIA
Associação de Resistência das Rendeiras
da Comunidade de Cacimbinhas (ARCA)
- Anatália Aparecida da Silva Reinaldo
- Djanilda Marques de Lima
- Edite Farias Cavalcante
- Genilda Marques da Silva;
- Janeide Marques de Araújo
- Lucivânia Queiroz
- Maria Aparecida Aureliano
- Maria José da Silva
- Maria José Venturosa
- Maria Rosenilda da Costa Farias
- Maria Zita da Silva
- Severina Maria Ferreira
Cooperativa de Produção de Bens e
Serviços de São João Tigre (Coopetigre)
- Albani de Paula de Lima Silva
- Joana Cândida de Souza
- Josefa Selma da Silva Saturno
- Maria da Conceição Cordeiro
- Maria das Dores dos Santos
- Maria de Lourdes Souza de Oliveira
- Maria do Socorro Lopes
- Maria José de Carvalho
- Maria Ivonete Dias de Souza
- Raimunda Robervânia de Araújo Slva
- Tereza Cristina de Freitas Silva
Rendeiras que participaram da sistematização desta cartilha:
- Mãos Rendeiras -