1. EGOTRIP
“Navegar é preciso”.
Ao fundo de mim mesma,
quer traga pranto ou riso.
Sinto não ser capaz...
A mim mesma encontrar
é difícil, bem mais
do que olhar pra trás,
sem ter que se voltar,
em solitário cais.
(Fio de prum- 1989)
2. SÓ SER
Sou flor de lótus vagando
na superfície de um lago.
Sou pena que vai levando
o vento que passa ao largo.
Sou beijo de amor escapando
de um lábio frio e amargo.
Sou criança definhando
sem alimento ou afago.
Sou espírito abortando
em ventre estéril e aziago.
Sou assim _ vida finando
num suspiro triste e vago.
Chama de vela expirando,
sem sou sopro, só, me apago...
(SÓ SER -1991)
3. DOAÇÃO
Quisera dar-te a paz de um verdejante prado
e o leito que refaz o viajor cansado,
fazendo do meu próprio ser teu doce ninho.
Quisera alvorecer de luz tua solidão
com uma esteira de estrelas, em profusão,
jamais deixando escurecer o teu caminho.
Quisera dar-te, amor, a cada novo dia,
um sonho colorido por novo matiz.
Quisera dar-te o céu, num arco-íris de alegria
e, ao fazer-te feliz, ser muito mais feliz!
(Sonatas -1996)
4. HAICAIS
Na espuma clara
do mar deitei os meus sonhos.
Dormem no azul.
Na concha da mão
adormece uma lágrima.
Pérola escondida.
Duas alvas lágrimas:
contas ocultas na concha
de um mar de saudades.
Para onde vão
as almas dos sonhos mortos?
Eu não sei dizer...
(Aquarelas Poéticas- 1996)
5. MULTIFÁRIAS VOZES
Os anjos falam
no silêncio.
É preciso calar
para ouvi - los.
E suas vozes soam,
na alma,
como o tilintar
de cristais
tocados pelo vento.
A canção que entoam,
inscrita nas pautas
do infinito,
embala a alma
que, insone e só,
suplica a Deus
a paz
dos sonhos dormidos.
(Mistral-1999)
6. SOBRE UMA DOR
Ainda há soluços...
Há soluços no quarto,
sob os alvos lençóis,
pairando sobre cada objeto...
Ainda há soluços,
sobrepondo-se aos silêncios,
debatendo-se no peito
como pássaros aprisionados
contra fechadas vidraças.
E há uma voz emudecida,
sem nenhum canto ou riso,
uma voz que já não canta,
e há um espinho na garganta...
(Mistral - 1999)
7. O FIO DE ARIADNE
Ah! Esse sabor amargo
que na boca aflora
e essa saudade imensa
e esse vazio atroz
que fez de mim, sozinha,
o que antes era nós...
Ah! Esse silêncio largo
que me envolve agora
e essa dor intensa
e o desamor feroz
que cedo me definha
e cala minha voz...
Ah! Esse amor aziago
que minh’alma chora,
que torna a vida densa
e os dias negras mós,
é o que cortou a linha
de seculares nós.
(Canzoni d’amore - 1999)
8. FILOSOFANDO
“Nunca pisamos duas vezes
nas águas de um mesmo rio”
_ disse certo filósofo, e eu sorria...
Teimava em volver ao já passado,
águas de um rio lindo, mas já ido...
Hoje, margeando o rio da minha vida,
olho as águas que passam, noite e dia,
fluindo rumo a um fim insuspeitado.
E me contento tão somente em vê-las,
amando o que não foi, o já perdido,
saudosa do que foi, sem ter voltado.
(Canzoni d’ amore -1999)
9. Verde mar,
verde folha,
verde esperança
que se desfaz,
que se desfolha,
na alva areia,
entre alga e espuma...
Assim o amor,
concha esquecida
em praia deserta,
no vaivém
da onda - saudade
também se evade,
também se esfuma.
Poemar - 1999)
10. SOL
NEGRO
Celebro enfim a paz e a claridade.
Na alma, já curada do seu mal,
não mais brilha o sol negro de Nerval.
Tristeza, dor e vã temeridade
são máscaras de antigo Carnaval
que, uma vez findo, soa tão banal.
Um brilho alvinitente no olhar,
breve sorriso que o lábio esboça
são traços visíveis a espelhar
envelhecida alma que remoça.
(Inéditos- 2003)
11. BUSCA
Eu TE procuro em todas as fontes
de vida do ser, latentes no mundo:
no céu, na terra e no mar profundo.
Eu TE procuro em todos instantes
que a alma imerge e vai no mais fundo
do imo, a cismar, segundo a segundo.
E eis que TE encontro, como nunca antes,
nos carmas dos homens, eternos viandantes:
nos risos, nos sonhos, os mais delirantes,
nas preces, no canto, no amor dos amantes.
(Ave-Marias - 2004)