Páris é representado na Ilíada como não possuindo grande virtude guerreira, mas ainda assim pode ser considerado um herói. A obra tem função educativa para os aristocratas ensinando valores como coragem e honra. Páris serve como exemplo negativo nisso, retratando a alteridade entre troianos e aqueus, embora ambos sejam helenos.
1. Páris Theoeidés e a sua
Função Paidêutica Através
da Ilíada
Renata Cardoso de Sousa
Universidade Federal do Rio de Janeiro
História - Instituto de Filosofia e Ciências Sociais
Laboratório de História Antiga (LHIA)
Bolsista de Iniciação Científica do CNPq/PIBIC
Orientador: Fábio de Souza Lessa
2. APRESENTAÇÃO GERAL DA
PESQUISA
Propomos analisar em nossa pesquisa a
construção do herói homérico a partir de Páris,
um herói controverso.
Faremos isso a partir da leitura das epopeias de
Homero, sobretudo a Ilíada.
3. RECORTE TEMPORAL
As obras homéricas foram compostas entre os séculos IX e VII
a.C., período no qual a pólis começava a se formar.
Entretanto, os acontecimentos descritos pelo poeta situam-se no
Período Palaciano (XVII-XII a.C.), uma vez que a guerra de
Troia aconteceu por volta de 1250-1240 a.C.
“É possível que o período descrito na obra [de Homero] abarque
um milênio completo, do ano 1600 ao 600 a.C. Os especialistas
situam a composição da dita descrição [da guerra de Troia] em
uma época entre fins do século IX e começos do século VII,
quando se constitui e se consolida na Grécia europeia, insular e
asiática essa forma extraordinária de vida social, cultural,
econômica e política que foi a pólis” (COLOMBANI, 2005, p.
8).
COLOMBANI, María Cecilia. Homero. Ilíada: Una introducción crítica. Buenos
Aires: Santiago Arcos, 2005.
4. LEITURA DAS OBRAS
HOMÉRICAS
Fundamenta-se na adaptação da
metodologia de leitura semiótica de
Algirdas Greimas para a História Antiga,
realizada por Ciro Flamarion Cardoso, que
consiste na análise dos elementos que se
repetem ao longo das epopeias. Desse
modo, pois, observaremos aqueles que
forem euforizados, disforizados ou
aforizados.
CARDOSO, Ciro Flamarion. Narrativa, Sentido, História. Campinas: Papirus,
1997.
5. APRESENTAÇÃO DESSA
COMUNICAÇÃO
O objetivo desta comunicação é:
Mostrar como Páris pode ser considerado
um herói, embora ele não possua tanta
areté (virtude) guerreira quanto outros
heróis da Ilíada.
Explicitar o caráter educativo das obras
homéricas para aqueles aristocratas, os
kaloì kagathoí (belos e bons), que viriam
a dominar o cenário político da pólis.
6. COMO PÁRIS É
REPRESENTADO NA ILÍADA
Fica claro, nessa obra, que ele não possui
grande areté guerreira a partir do modo
como ele é caracterizado pelo poeta, seja
na atribuição de adjetivos e/ou epítetos,
seja pelas palavras de outras personagens,
isto é, os comentários que elas fazem
acerca de Páris.
7. “divo” (theoeidés), (vários versos);
“marido de Helena cacheada” (vários versos);
“Páris funesto” (Dýsparis), (III, v. 39);
“fautor desta guerra” (III, v. 87; VII, v. 374);
“fautor de desgraças” (VI, v. 282);
“de belas feições” (III, v. 39);
“sedutor de mulheres” (III, v. 39);
“careces de força e coragem” (III, v. 45);
“Esses cabelos, a cítara, os dons de Afrodite, a
beleza” (III, v. 54);
“Mas, voluntário, te escusas; não queres lutar”
(VI, v. 523);
“Este, porém, nunca teve firmeza, nem nunca há
de tê-la” (VI, v. 352).
8. COMPARANDO-O COM
OUTROS HERÓIS DA ILÍADA
Aquiles: “de rápidos pés”;
Heitor: “de penacho ondulante”,
“domador de cavalos”;
Menelau: “de Ares forte discípulo”;
Odisseu: “astucioso”.
9. QUESTÃO DO ESTATUTO
HEROICO DE PÁRIS
A partir da análise da Ilíada e da Odisseia, podemos
perceber que no modelo de conduta homérico preza-se a
coragem e a honra.
Embora ele seja da maneira como vimos, a Páris não lhe
faltam tais características, pois ele participa das batalhas,
matando, inclusive, alguns guerreiros e procura reaver a
sua honra quando a vergonha pelos seus atos lhe atinge.
No Canto III, por exemplo, Páris irá retornar à luta que
ele mesmo propôs travar contra Menelau, o rei de
Esparta de quem ele arrebatou a esposa, após recuar da
refrega e ser alvo de risos por parte dos aqueus.
10. FUNCIONALIDADE
EDUCACIONAL DA ILÍADA
“Mas, para que a honra heroica permaneça viva no seio de
uma civilização, para que todo o sistema de valores
permaneça marcado pelo seu selo [do herói], é preciso que
a função poética, mais do que objeto de divertimento, tenha
conservado um papel de educação e formação, que por ela
e nela se transmita, se ensine, se atualize na alma de cada
um este conjunto de saberes, crenças, atitudes, valores de
que é feita uma cultura. (...) a epopeia desempenha o papel
de paideía [educação helênica], exaltando os heróis
exemplares, assim como os gêneros literários ‘puros’ como
o romance, a autobiografia, o diário íntimo o fazem hoje”
(VERNANT, 1978, p. 42).
VERNANT, Jean-Pierre. A bela morte e o cadáver ultrajado. Tradução, Elisa A. Kossovitch e
João. A. Hansen. Discurso, São Paulo, Editora Ciências Humanas, n. 9, 1978, p. 31-62.
11. FUNCIONALIDADE EDUCACIONAL
DA REPRESENTAÇÃO DE UM HERÓI
COMO PÁRIS
Páris é um modelo de como não se deve
agir no campo de batalha.
Ele é mostrado assim porque ele é o
Outro.
12. QUESTÃO DA ALTERIDADE ENTRE
OS GREGOS DO PELOPONESO E OS
TROIANOS
Na Ilíada, a alteridade que
se dá entre os helenos do
Peloponeso e os troianos
não tem a ver com estes
serem o estrangeiro, ou o
não-grego, uma vez que os
habitantes de Troia
pertencem à faixa asiática
de território heleno, sendo,
portanto, também helenos.
13. QUESTÃO DA ALTERIDADE ENTRE
OS GREGOS DO PELOPONESO E OS
TROIANOS
Na Ilíada, a alteridade que
se dá entre os helenos do
Peloponeso e os troianos
não tem a ver com estes
serem o estrangeiro, ou o
não-grego, uma vez que os
habitantes de Troia
pertencem à faixa asiática
de território heleno, sendo,
portanto, também helenos.
Fonte: HUGHES, Bettany. Mapa 1. O
mundo micenese. In: Helena de Troia:
Deusa, Princesa e Prostituta.
Tradução, S. Duarte. Rio de Janeiro:
Record, 2009, p. 19.
14. O que marca a alteridade entre gregos e troianos,
então, é o fato de estes serem inimigos daqueles,
uma vez que “(...) a identidade helênica conhece
tensões, fissuras e oposições de alteridades
internas no seu seio – o Outro pode, também,
ser o Grego, como rival, inimigo, invasor,
infrator de códigos de comportamento”
(FIALHO, 2010, p. 114).
FIALHO, Maria do Céu. Rituais de cidadania na Grécia Antiga. In: FERREIRA, José
Ribeiro; FIALHO, Maria do Céu; LEÃO, Delfim Ferreira (Orgs.). Cidadania e
Paideía na Grécia Antiga. Coimbra: Centro de Estudos Clássicos e Humanísticos,
2010, p. 112-144.
15. CONCLUSÃO
A Ilíada, por possuir uma função paidêutica, traz Páris
como um modelo de como não se deve agir.
Isso se dá porque ele é um representante da alteridade
helênica.
Entretanto, seu estatuto heroico não pode ser
questionado, pois ele, de certa forma, tenta reaver sua
honra através de atos corajosos, mesmo tendo que ser
exortado sempre pelo irmão ou pela própria Helena.