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A História da Ordem de Santo Agostinho (parte 1)
O Monacato de Santo Agostinho
Santo Agostinho (354-430), africano de nascimento e romano de
cultura, é um património de santidade e cultura não só da Igreja,
mas de toda a humanidade. Filósofo, teólogo, místico, pastor e
defensor dos pobres, é também fundador de um estilo de vida
religiosa.
Após 32 anos de buscas do sentido da vida, da felicidade e da
Verdade, finalmente encontrou o que procurava em Jesus Cristo, o
Verbo Encarnado, o Cristo Humilde, o Mestre Interior. Após o seu
baptismo, em Milão, regressou à sua terra natal, Tagaste, na África
e, junto com seus amigos, vendeu seus bens e iniciou um novo
estilo de vida, através do estudo e da oração, consagrando-se como
“servos de Deus”.
Ordenado sacerdote em 391, Agostinho conseguiu uma chácara em
Hipona, onde construiu um mosteiro para sua comunidade de
irmãos. Mais tarde escreveu a Regra, inspirada na primitiva
comunidade cristã de Jerusalém: “Antes de tudo, vivei unânimes em
casa e tende uma só alma e um só coração orientados para Deus”
(I, 2).
Quando foi consagrado bispo de Hipona, preferiu residir na casa
episcopal, mas vivendo em comunidade com os seus clérigos. Mais
tarde, erigiram, dentro da cidade, um mosteiro para mulheres,
constituindo, assim, três formas de vida religiosa agostiniana:
masculina, tanto para religiosos leigos, como religiosos clérigos e a
feminina, para religiosas.
O ideal agostiniano estendeu-se a outras partes da África. Alguns
dos irmãos foram ordenados bispos e levaram, assim, o monacato
de Agostinho a outras Igrejas locais. No século V havia
aproximadamente 35 mosteiros de inspiração agostiniana na África.
Por causa da perseguição dos Vândalos, os monges agostinianos
emigraram para a Europa, levando consigo os restos mortais do
Santo, sua rica biblioteca e o seu estilo de vida religiosa,
implantando-o na Itália, Sardenha, Espanha e França.
Num certo período, diminuiu durante a Idade Média, a influência da
Regra agostiniana, obscurecida por outras regras monásticas, como
a de São Bento, por exemplo. No séc. XI volta a aparecer na
organização da vida religiosa da Europa, tanto nos mosteiros como
na fundação de novas Ordens de Cónegos.
A História da Ordem de Santo Agostinho (parte 2)
O Nascimento da Ordem de Santo Agostinho
Em 1244, sob o patrocínio da Santa Sé, reuniram-se os eremitas de
muitos conventos da Toscana. Começou assim a história da Ordem
de Santo Agostinho. Em 1256, o Papa Alexandre IV deu um novo
impulso à Ordem fundada na Itália, através da bula Licet Ecclesiae
catholicae, à qual foram unidas várias ordens e congregações.
A Grande União aconteceu no convento romano de Santa Maria del
Popolo e, no acto de sua fundação, a nova Ordem abarcava 180
casas religiosas na Itália, Áustria, Alemanha, Suíça, Países Baixos,
França, Espanha, Portugal, Hungria, Boémia e Inglaterra.
A União de 1256 foi um passo importante na reforma da vida
religiosa da Igreja. Com isso, o Papa procurava por fim à confusão
provocada pelo excessivo número de pequenos grupos religiosos,
canalizando suas forças espirituais no apostolado da pregação e
cuidado pastoral nas muitas cidades europeias. Os Agostinianos
foram assim colocados no rol das Ordens Mendicantes, junto aos
Dominicanos, Franciscanos e, pouco depois, os Carmelitas. Sua
característica básica é a de serem “frades”, “freis” – irmãos –
vivendo sua vocação imersos no mundo urbano.
O movimento mendicante do século XIII foi uma resposta
revolucionária a uma situação também revolucionária. A unidade da
Igreja vivia continuamente ameaçada pelas heresias. Surgiam
novos desafios ocasionados pelas mudanças sociais e económicas
da sociedade. Os frades foram enviados directamente aos centros
de desenvolvimento comercial para pregar às crescentes classes
instruídas, à nova classe que surgia – a burguesia – e levar a
espiritualidade evangélica às classes populares.
A História da Ordem de Santo Agostinho (parte 3)
A Expansão da Ordem
A nova Ordem conheceu uma rápida expansão já no primeiro
século de existência, espalhando-se por toda a Europa, com mais
de 500 conventos e cerca de seis mil religiosos, com renomados
exemplos de santidade, destacando-se a figura de São Nicolau de
Tolentino e Santa Rita de Cássia.
Desde o início levou a sério a filiação espiritual de Santo Agostinho,
denominando-o “nosso Pai e Fundador”. Surgiu daí a Escola
Teológica Agostiniana, cujo fundador foi Egídio Romano, sucessor
de Santo Tomás de Aquino na cátedra de Paris. Marcada por um
tomismo moderado, a Escola teológica da Ordem caracterizou-se
por um sadio ecleticismo, priorizando os temas bíblicos e
patrísticos, inspirada nos passos de Santo Agostinho.
Na decadência da Cristandade Medieval teve também seus
momentos de profundas crises, ocasionadas, entre outros factores,
pelo arrefecimento dos ideais da fundação, pela ausência de
observância religiosa, decadência nos estudos e apostolado,
conflitos internos, além de factores exteriores, como a própria
decadência geral da Igreja, a peste que dizimou a Europa, a Guerra
dos 100 Anos.
Como em outras Ordens, o espírito religioso foi retomado através
das chamadas Congregações de Observância, que se inserem no
quadro da ampla reforma que vinha se preparando silenciosamente
dentro da própria Igreja. Provenientes desse desejo fervente de
retorno aos fundamentos do carisma agostiniano, despontaram
duas congregações: os Agostinianos Recoletos, na Espanha (1588)
e os Agostinianos Descalços, na Itália, França e Alemanha (1592),
que se tornaram ordens independentes, em 1912 e 1936,
respectivamente.
Da Congregação de Observância da Saxónia, saiu o monge
inquieto que iria desencadear o movimento da Reforma Protestante,
Martinho Lutero. Na Itália despontou o cardeal Jerónimo Seripando,
o líder dos Agostinianos que iria trabalhar no Concílio de Trento
pela Reforma Católica.
As História da Ordem de Santo Agostinho (parte 4)·
Os Agostinianos chegam à America
Em 1533, cinco missionários agostinianos desembarcam na Nova
Espanha, o México, provenientes da reformada Província
Observante de Castela, que tinha dado excelentes frutos, como o
literato Frei Luís de León, o Beato Afonso de Orozco, Santo Tomás
de Villanova e São João de Sahagún. Entre os frades que vieram
no primeiro grupo, estava Fr. Alonso de Veracruz, co-fundador da
primeira universidade americana, e ardoroso defensor das causas
indígenas, num momento em que a conquista e o genocídio dos
povos deste continente já eram uma tristíssima realidade.
Os Agostinianos participaram, como outros grupos religiosos, do
processo civilizatório e evangelizador da América Latina, como
também da África e Ásia. Nossa história tem suas “luzes e
sombras”. Reconhecendo nossas faltas históricas, em atitude
penitencial, queremos seguir o exemplo de profetismo evangélico
de nossos Maiores, como Fr. Diego Ortiz, protomártir do Peru;
Antonio de Moya, grande catequista do México; Agostinho de la
Coruña e Gaspar de Villaroel, bispos missionários da Venezuela e
do Chile; Luis López de Solís, evangelizador do Equador. Sem
esquecer Santo Ezequiel Moreno, bispo Agostiniano Recoleto de
Pasto, na Colômbia, proclamado em Santo Domingo, 1992, modelo
de bispo evangelizador das Américas.
A História da Ordem de Santo Agostinho (parte 5)
Os Agostinianos no Brasil
Em 1693, os Agostinhos Reformados da Observância de Portugal
chegam a Salvador na Baía, aí permanecendo até 1824. A
implantação definitiva dos Agostinianos no Brasil se deu, porém, em
1899, com a vinda dos Agostinianos espanhóis das Filipinas, os
quais se estabeleceram em São Paulo e abriram missões no
Amazonas e em Goiás, além de outras frentes em São Paulo,
Minas Gerais e Paraná.
Sucessivamente chegaram outros grupos procedentes da Espanha:
os Agostinianos do Escorial (1929) e os Agostinianos de Castela
(1931). Em 1962 vieram os Agostinianos de Malta. Hoje a presença
agostiniana encontra-se disseminada pelos Estados de São Paulo,
Rio de Janeiro, Minas Gerais, Paraná, Goiás e Mato Grosso, em
cerca de trinta comunidades.
No início, estabeleceram obras tradicionais como paróquias,
missões e colégios, assumindo, pouco a pouco a caminhada da
Igreja do Brasil, não sem conflitos e dificuldades, mas com muita
generosidade e dedicação. Actualmente, além das “obras
históricas” e de assistência social e promoção humana, dedicam-se
à formação de novos frades, assessorias de pastorais e
movimentos populares e de grupos e pastorais ligadas à promoção
dos direitos humanos, da justiça e paz.
A História da Ordem de Santo Agostinho (parte 6)
Carisma e Espiritualidade
A identidade espiritual da Ordem teve, desde o início, dois
fundamentos. O primeiro, na pessoa de Santo Agostinho, de quem
recebeu o ideal sobre a vida religiosa, especialmente a importância
da busca interior de Deus, da vida comum e da disponibilidade em
servir a Igreja. O segundo foi o Movimento Mendicante, pelo qual a
Ordem de Santo Agostinho transformou-se numa “fraternidade
apostólica”, ou seja, conservando a sua dimensão contemplativa,
orientou-se para o serviço da Igreja, através de múltiplos
apostolados.
O ideal “anima una e cor unum in Deum” – uma só alma e um só
coração orientados para Deus – tem suas raízes na própria vida de
Deus, a Trindade, cujo “amor foi derramado em nossos corações
pelo Espírito Santo que nos foi dado” (Rom 5, 5). O “amor da
unidade e a unidade do amor” constituem o sentido mesmo da
Igreja missionária, unida à sua Cabeça, da qual provêm todos os
bens – o Cristo Total. A vida religiosa, para S. Agostinho, é um sinal
magnífico dessa unidade e desse amor.
Três são os pilares sob os quais se eleva a fraternidade
agostiniana: a via da interioridade (do exterior para o interior e daí
para o alto, no encontro profundo com Cristo Mestre Interior); a vida
em comunidade, com um destaque especial ao valor da amizade,
tão caro para Agostinho e, por fim, o serviço à Igreja onde ela mais
o necessitar.

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  • 1. A História da Ordem de Santo Agostinho (parte 1) O Monacato de Santo Agostinho Santo Agostinho (354-430), africano de nascimento e romano de cultura, é um património de santidade e cultura não só da Igreja, mas de toda a humanidade. Filósofo, teólogo, místico, pastor e defensor dos pobres, é também fundador de um estilo de vida religiosa. Após 32 anos de buscas do sentido da vida, da felicidade e da Verdade, finalmente encontrou o que procurava em Jesus Cristo, o Verbo Encarnado, o Cristo Humilde, o Mestre Interior. Após o seu baptismo, em Milão, regressou à sua terra natal, Tagaste, na África e, junto com seus amigos, vendeu seus bens e iniciou um novo estilo de vida, através do estudo e da oração, consagrando-se como “servos de Deus”. Ordenado sacerdote em 391, Agostinho conseguiu uma chácara em Hipona, onde construiu um mosteiro para sua comunidade de irmãos. Mais tarde escreveu a Regra, inspirada na primitiva comunidade cristã de Jerusalém: “Antes de tudo, vivei unânimes em casa e tende uma só alma e um só coração orientados para Deus” (I, 2). Quando foi consagrado bispo de Hipona, preferiu residir na casa episcopal, mas vivendo em comunidade com os seus clérigos. Mais tarde, erigiram, dentro da cidade, um mosteiro para mulheres, constituindo, assim, três formas de vida religiosa agostiniana: masculina, tanto para religiosos leigos, como religiosos clérigos e a feminina, para religiosas.
  • 2. O ideal agostiniano estendeu-se a outras partes da África. Alguns dos irmãos foram ordenados bispos e levaram, assim, o monacato de Agostinho a outras Igrejas locais. No século V havia aproximadamente 35 mosteiros de inspiração agostiniana na África. Por causa da perseguição dos Vândalos, os monges agostinianos emigraram para a Europa, levando consigo os restos mortais do Santo, sua rica biblioteca e o seu estilo de vida religiosa, implantando-o na Itália, Sardenha, Espanha e França. Num certo período, diminuiu durante a Idade Média, a influência da Regra agostiniana, obscurecida por outras regras monásticas, como a de São Bento, por exemplo. No séc. XI volta a aparecer na organização da vida religiosa da Europa, tanto nos mosteiros como na fundação de novas Ordens de Cónegos. A História da Ordem de Santo Agostinho (parte 2) O Nascimento da Ordem de Santo Agostinho Em 1244, sob o patrocínio da Santa Sé, reuniram-se os eremitas de muitos conventos da Toscana. Começou assim a história da Ordem de Santo Agostinho. Em 1256, o Papa Alexandre IV deu um novo impulso à Ordem fundada na Itália, através da bula Licet Ecclesiae catholicae, à qual foram unidas várias ordens e congregações. A Grande União aconteceu no convento romano de Santa Maria del Popolo e, no acto de sua fundação, a nova Ordem abarcava 180 casas religiosas na Itália, Áustria, Alemanha, Suíça, Países Baixos, França, Espanha, Portugal, Hungria, Boémia e Inglaterra. A União de 1256 foi um passo importante na reforma da vida religiosa da Igreja. Com isso, o Papa procurava por fim à confusão
  • 3. provocada pelo excessivo número de pequenos grupos religiosos, canalizando suas forças espirituais no apostolado da pregação e cuidado pastoral nas muitas cidades europeias. Os Agostinianos foram assim colocados no rol das Ordens Mendicantes, junto aos Dominicanos, Franciscanos e, pouco depois, os Carmelitas. Sua característica básica é a de serem “frades”, “freis” – irmãos – vivendo sua vocação imersos no mundo urbano. O movimento mendicante do século XIII foi uma resposta revolucionária a uma situação também revolucionária. A unidade da Igreja vivia continuamente ameaçada pelas heresias. Surgiam novos desafios ocasionados pelas mudanças sociais e económicas da sociedade. Os frades foram enviados directamente aos centros de desenvolvimento comercial para pregar às crescentes classes instruídas, à nova classe que surgia – a burguesia – e levar a espiritualidade evangélica às classes populares. A História da Ordem de Santo Agostinho (parte 3) A Expansão da Ordem A nova Ordem conheceu uma rápida expansão já no primeiro século de existência, espalhando-se por toda a Europa, com mais de 500 conventos e cerca de seis mil religiosos, com renomados exemplos de santidade, destacando-se a figura de São Nicolau de Tolentino e Santa Rita de Cássia. Desde o início levou a sério a filiação espiritual de Santo Agostinho, denominando-o “nosso Pai e Fundador”. Surgiu daí a Escola Teológica Agostiniana, cujo fundador foi Egídio Romano, sucessor de Santo Tomás de Aquino na cátedra de Paris. Marcada por um
  • 4. tomismo moderado, a Escola teológica da Ordem caracterizou-se por um sadio ecleticismo, priorizando os temas bíblicos e patrísticos, inspirada nos passos de Santo Agostinho. Na decadência da Cristandade Medieval teve também seus momentos de profundas crises, ocasionadas, entre outros factores, pelo arrefecimento dos ideais da fundação, pela ausência de observância religiosa, decadência nos estudos e apostolado, conflitos internos, além de factores exteriores, como a própria decadência geral da Igreja, a peste que dizimou a Europa, a Guerra dos 100 Anos. Como em outras Ordens, o espírito religioso foi retomado através das chamadas Congregações de Observância, que se inserem no quadro da ampla reforma que vinha se preparando silenciosamente dentro da própria Igreja. Provenientes desse desejo fervente de retorno aos fundamentos do carisma agostiniano, despontaram duas congregações: os Agostinianos Recoletos, na Espanha (1588) e os Agostinianos Descalços, na Itália, França e Alemanha (1592), que se tornaram ordens independentes, em 1912 e 1936, respectivamente. Da Congregação de Observância da Saxónia, saiu o monge inquieto que iria desencadear o movimento da Reforma Protestante, Martinho Lutero. Na Itália despontou o cardeal Jerónimo Seripando, o líder dos Agostinianos que iria trabalhar no Concílio de Trento pela Reforma Católica.
  • 5. As História da Ordem de Santo Agostinho (parte 4)· Os Agostinianos chegam à America Em 1533, cinco missionários agostinianos desembarcam na Nova Espanha, o México, provenientes da reformada Província Observante de Castela, que tinha dado excelentes frutos, como o literato Frei Luís de León, o Beato Afonso de Orozco, Santo Tomás de Villanova e São João de Sahagún. Entre os frades que vieram no primeiro grupo, estava Fr. Alonso de Veracruz, co-fundador da primeira universidade americana, e ardoroso defensor das causas indígenas, num momento em que a conquista e o genocídio dos povos deste continente já eram uma tristíssima realidade. Os Agostinianos participaram, como outros grupos religiosos, do processo civilizatório e evangelizador da América Latina, como também da África e Ásia. Nossa história tem suas “luzes e sombras”. Reconhecendo nossas faltas históricas, em atitude penitencial, queremos seguir o exemplo de profetismo evangélico de nossos Maiores, como Fr. Diego Ortiz, protomártir do Peru; Antonio de Moya, grande catequista do México; Agostinho de la Coruña e Gaspar de Villaroel, bispos missionários da Venezuela e do Chile; Luis López de Solís, evangelizador do Equador. Sem esquecer Santo Ezequiel Moreno, bispo Agostiniano Recoleto de Pasto, na Colômbia, proclamado em Santo Domingo, 1992, modelo de bispo evangelizador das Américas.
  • 6. A História da Ordem de Santo Agostinho (parte 5) Os Agostinianos no Brasil Em 1693, os Agostinhos Reformados da Observância de Portugal chegam a Salvador na Baía, aí permanecendo até 1824. A implantação definitiva dos Agostinianos no Brasil se deu, porém, em 1899, com a vinda dos Agostinianos espanhóis das Filipinas, os quais se estabeleceram em São Paulo e abriram missões no Amazonas e em Goiás, além de outras frentes em São Paulo, Minas Gerais e Paraná. Sucessivamente chegaram outros grupos procedentes da Espanha: os Agostinianos do Escorial (1929) e os Agostinianos de Castela (1931). Em 1962 vieram os Agostinianos de Malta. Hoje a presença agostiniana encontra-se disseminada pelos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Paraná, Goiás e Mato Grosso, em cerca de trinta comunidades. No início, estabeleceram obras tradicionais como paróquias, missões e colégios, assumindo, pouco a pouco a caminhada da Igreja do Brasil, não sem conflitos e dificuldades, mas com muita generosidade e dedicação. Actualmente, além das “obras históricas” e de assistência social e promoção humana, dedicam-se à formação de novos frades, assessorias de pastorais e movimentos populares e de grupos e pastorais ligadas à promoção dos direitos humanos, da justiça e paz.
  • 7. A História da Ordem de Santo Agostinho (parte 6) Carisma e Espiritualidade A identidade espiritual da Ordem teve, desde o início, dois fundamentos. O primeiro, na pessoa de Santo Agostinho, de quem recebeu o ideal sobre a vida religiosa, especialmente a importância da busca interior de Deus, da vida comum e da disponibilidade em servir a Igreja. O segundo foi o Movimento Mendicante, pelo qual a Ordem de Santo Agostinho transformou-se numa “fraternidade apostólica”, ou seja, conservando a sua dimensão contemplativa, orientou-se para o serviço da Igreja, através de múltiplos apostolados. O ideal “anima una e cor unum in Deum” – uma só alma e um só coração orientados para Deus – tem suas raízes na própria vida de Deus, a Trindade, cujo “amor foi derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado” (Rom 5, 5). O “amor da unidade e a unidade do amor” constituem o sentido mesmo da Igreja missionária, unida à sua Cabeça, da qual provêm todos os bens – o Cristo Total. A vida religiosa, para S. Agostinho, é um sinal magnífico dessa unidade e desse amor. Três são os pilares sob os quais se eleva a fraternidade agostiniana: a via da interioridade (do exterior para o interior e daí para o alto, no encontro profundo com Cristo Mestre Interior); a vida em comunidade, com um destaque especial ao valor da amizade, tão caro para Agostinho e, por fim, o serviço à Igreja onde ela mais o necessitar.