Trovadorismo
Surgiu no século XII, período em que Portugal
desponta como nação independente.
Suas origens deram-se nas regiões históricas de
Provença (Occitânia), de onde se espalhou por
praticamente toda a Europa.
No entanto, a lírica medieval galego-português
possuiu características próprias, uma grande
produtividade e um número considerável de autores
conservados.
Origens
Admitem-se quatro teses:
- arábica - considera a cultura arábica como sua velha
raiz;
- folclórica - criada pelo próprio povo;
- médio-latinista - origem na literatura latinista,
produzida durante a Idade Média;
- litúrgica - fruto da poesia litúrgico-cristã elaborada na
mesma época.
Todas são aceitas conjuntamente, a fim de melhor
abarcar os aspectos constantes dessa poesia.
Trovadores
Compunham os poemas e as melodias que as
acompanhavam, logo, cantigas são as poesias cantadas.
“Trovador" autores de origem nobre;
Jogral autor de origem vilã.
Ainda que seja coerente a afirmação de que quem tocava e
cantava as poesias eram os jograis, é muito possível que a
maioria dos trovadores interpretasse igualmente as suas
próprias composições.
Cantiga da Ribeirinha
Esta cantiga de Paio Soares de
Taveirós é considerada o mais
antigo texto escrito em galego-
português: 1189 ou 1198, portanto
fins do século XII. Uns a tomam por
cantiga de amor; outros por de
escárnio.
Estaria completa? Segundo consta,
foi dedicado a D. Maria Paes
Ribeiro - apelidada "A Ribeirinha",
amante do rei D. Sancho I - e
pertence a uma coleção de textos
arcaicos denominada Cancioneiro
da Ajuda.
"No mundo nom me sei parelha,
mentre me for' como me vai,
ca ja moiro por vos - e ai
mia senhor branca e vermelha,
queredes que vos retraia
quando vos eu vi em saia!
Mao dia que me levantei, que vos enton nom vi fea!
"E, mia senhor, des aquel di' , ai!
me foi a mim muin mal,
e vós, filha de don Paai
Moniz, e ben vos semelha
d'aver eu por vós guarvaia,
pois eu, mia senhor, d'alfaia
nunca de vós ouve nem ei
valia d'ua correa".
Poetas
Ricardo Coração de Leão
Afonso Sanches
Aires Corpancho
Aires Nunes
Bernardo Bonaval
Dom Dinis I de Portugal
D. Pedro, Conde de
Barcelos
João Garcia de Guilhade
João Soares de Paiva ou
João Soares de Pávia
João Zorro
Paio Gomes Charinho
Paio Soares de Taveirós
(Cantiga da Garvaia)
Meendinho
Martim Codax
Nuno Fernandes Torneol
Guilherme IX, Duque da
Aquitânia
Pedro III de Aragão
Teocentrismo
A mentalidade da época serviu como base para a estrutura da
cantiga de amigo, em que o amor espiritual e inatingível é
retratado. As cantigas, primeiramente destinadas ao canto,
foram depois manuscritas em cadernos de apontamentos, que
mais tarde foram postas em coletâneas de
canções chamadas Cancioneiros (livros que reuniam grande
número de trovas).
São conhecidos três Cancioneiros galego-portugueses: o
“Cancioneiro da Ajuda", o “Cancioneiro da Biblioteca Nacional
Biblioteca Nacional de Lisboa” (Colocci-Brancutti) e o
“Cancioneiro da Vaticana".
Além disso, há um quarto livro de cantigas dedicadas à Virgem
Maria pelo rei Afonso X de Leão e Leão Castela, O Sábio.
Prosa
Cronistas como Rui de Pina, Fernão Lopes e
Gomes Eanes de Zurara e as novelas de
cavalaria, como a demanda do Santo Graal.
A Cantiga de amor
O cavalheiro se dirige à mulher amada como uma figura idealizada, distante. O
poeta, na posição de fiel vassalo, se põe a serviço de sua senhora, dama da
corte, tornando esse amor um objeto de sonho, distante, impossível. Mas
nunca consegue conquistá-la, porque tem medo e também porque ela rejeita
sua canção, mas como eles tinham bastante dinheiro as mulheres se
entregavam a eles.
Neste tipo de cantiga, originária de Provença, no sul de França, o eu-lírico é
masculino e sofredor. Sua amada é chamada de senhor (as palavras
terminadas em or como senhor ou pastor, em galego-português não tinham
feminino). Canta as qualidades de seu amor, a "minha senhor", a quem ele
trata como superior revelando sua condição hierárquica. Ele canta a dor de
amar e está sempre acometido da "coita", palavra frequente nas cantigas de
amor que significa "sofrimento por amor". É à sua amada que se submete e
"presta serviço", por isso espera benefício (referido como o bem nas trovas).
Essa relação amorosa vertical é chamada "vassalagem amorosa", pois
reproduz as relações dos vassalos com os seus senhores feudais. Sua
estrutura é mais sofisticada.
Tipos
Cantiga de Meestria: é o tipo mais difícil de cantiga
de amor. Não apresenta refrão, nem estribilho, nem
repetições (diz respeito à forma.)
Cantiga de Tense ou Tenção: diálogo entre
cavaleiros em tom de desafio. Gira em torno da
mesma mulher.
Cantiga de Pastorela: trata do amor entre pastores
(plebeus) ou por uma pastora (plebéia).
Cantiga de Plang: cantiga de amor repleta de
lamentos.
Exemplo de lírica galego-portuguesa (de Bernardo de Bonaval)
"A dona que eu am'e tenho por Senhor
amostrade-me-a Deus, se vos en prazer for,
se non dade-me-a morte.
A que tenh'eu por lume d'estes olhos meus
e porque choran sempr(e) amostrade-me-a
Deus,
se non dade-me-a morte.
Essa que Vós fezestes melhor parecer
de quantas sei, a Deus, fazede-me-a veer,
se non dade-me-a morte.
A Deus, que me-a fizestes mais amar,
mostrade-me-a algo possa con ela falar,
se non dade-me-a morte."
Eu lírico masculino
Assunto Principal: o sofrimento amoroso
do eu-lírico perante uma mulher
idealizada e distante.
Amor cortês; vassalagem amorosa.
Amor impossível.
Ambientação aristocrática das cortes.
Forte influência provençal.
Vassalagem amorosa "o eu lírico usa o
pronome de tratamento "senhor"
A cantiga de amigo
Origem popular, com marcas evidentes da literatura oral (reiterações,
paralelismo, refrão, estribilho), recursos esses próprios dos textos para serem
cantados e que propiciam facilidade na memorização. Esses recursos são
utilizados, ainda hoje, nas canções populares.
Este tipo de cantiga, que não surgiu em Provença como as outras, teve suas
origens na Península Ibérica. Nela, o eu-lírico é uma mulher (mas o autor era
masculino, devido à sociedade feudal e o restrito acesso ao conhecimento da
época), que canta seu amor pelo amigo (isto é, namorado), muitas vezes em
ambiente natural, e muitas vezes também em diálogo com sua mãe ou suas
amigas.
A figura feminina que as cantigas de amigo desenham é, pois, a da jovem que
se inicia no universo do amor, por vezes lamentando a ausência do amado, por
vezes cantando a sua alegria pelo próximo encontro.
Outra diferença da cantiga de amor, é que nela não há a relação Suserano x
Vassalo, ela é uma mulher do povo. Muitas vezes tal cantiga também revelava
a tristeza da mulher, pela ida de seu amado à guerra.
Tipos
Pastorelas – assuntos campestres, diálogo
com a natureza
Romarias – assuntos relacionados às festas
religiosas
Barcarolas – assuntos relacionados ao mar,
a rios ou lagos
Bailias – assuntos ligados à dança.
Exemplo
"Ai flores, ai flores do verde pino,
se sabedes novas do meu amigo!
ai Deus, e u é?
Ai flores, ai flores do verde ramo,
se sabedes novas do meu amado!
ai Deus, e u é?
Se sabedes novas do meu amigo,
aquel que mentiu do que pôs comigo!
ai Deus, e u é?
Se sabedes novas do meu amado,
aquel que mentiu do que mi há jurado!
ai Deus, e u é?"
– (...)
Eu lírico feminino.
Presença de paralelismos.
Predomínio da musicalidade.
Assunto Principal: o lamento da moça
cujo namorado partiu.
Amor natural e espontâneo.
Amor possível.
Ambientação popular rural ou urbana.
Influência da tradição oral ibérica.
Deus é o elemento mais importante do
poema.
Pouca subjetividade.
Tipos
Ondas do mar de Vigo,
se vistes meu amigo!
E ai Deus, se verrá cedo!
Ondas do mar levado,
se vistes meu amado!
E ai Deus, se verrá cedo!
Se vistes meu amigo,
o por que eu sospiro!
E ai Deus, se verrá cedo!
Se vistes meu amado,
por que hei gran cuidado!
E ai Deus, se verrá cedo!
Martim Codax. In Massaud Moisés. A literatura portuguesa através dos textos.
São Paulo, Cultrix, 2012.
A cantiga de escárnio
Em cantiga de escárnio, o eu-lírico faz uma sátira a alguma
pessoa. Essa sátira era indireta, cheia de duplos sentidos.
As cantigas de escárnio (ou "de escarnho", na grafia da época)
definem-se, pois, como sendo aquelas feitas pelos trovadores
para dizer mal de alguém, por meio de ambiguidades,
trocadilhos e jogos semânticos, em um processo que os
trovadores chamavam "equívoco".
O cômico que caracteriza essas cantigas é
predominantemente verbal, dependente, portanto, do emprego
de recursos retóricos. A cantiga de escárnio exigindo
unicamente a alusão indireta e velada, para que o destinatário
não seja reconhecido, estimula a imaginação do poeta e
sugere-lhe uma expressão irônica, embora, por vezes,
bastante mordaz.
Exemplo
.Ai, dona fea, foste-vos
queixar
que vos nunca louv[o] em
meu cantar;
mais ora quero fazer um
cantar
em que vos loarei toda via;
e vedes como vos quero
loar:
dona fea, velha e sandia!
(...)
Crítica indireta;
normalmente a pessoa
satirizada não é identificada.
Linguagem trabalhada,
cheia de sutilezas,
trocadilho e ambiguidades.
Ironia.
A cantiga de maldizer
A cantiga de maldizer traz uma sátira direta e sem
duplos sentidos.
É comum a agressão verbal à pessoa satirizada, e
muitas vezes, são utilizados até palavrões.
O nome da pessoa satirizada pode ou não ser
revelado, no entanto pode aparecer como apelido
reconhecido.
Cantiga de maldizer
Maria Mateu, daqui vou desertar.
De cona não achar o mal me vem.
Aquela que a tem não ma quer dar
e alguém que ma daria não a tem.
Maria Mateu, Maria Mateu,
tão desejosa sois de cona como eu!
Quantas conas foi Deus desperdiçar
quando aqui abundou quem as não quer!
E a outros, fê-las muito desejar:
a mim e a ti, ainda que mulher.
Maria Mateu, Maria Mateu
tão desejosa sois de cona como eu!
Afonso Eanes de Cotoné