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ANÁLISE JURÍDICA DO PROJETO LEGISLATIVO DO ESTATUTO DO
NASCITURO1
1. Tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº 478/2007, de autoria dos Deputados
Luiz Bassuma e Miguel Martini, ao qual se apensaram os PLs nºs 489/2007, 1763/2007 e
3748/2008. A esse Projeto de Lei se denominou Estatuto do Nascituro, encontrando-se
atualmente sob deliberação da Comissão de Finanças e Tributação dessa Casa Legislativa.
2. O Estatuto do Nascituro tem por premissa básica a proteção integral ao ser humano desde a
concepção, ainda que in vitro, nos procedimentos de fertilização artificial, aí incluídos o direito
à vida, à saúde, ao desenvolvimento, à alimentação, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à
família, além de colocá-lo a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração,
violência, crueldade e opressão (art. 4º).
3. De início, cumpre destacar que o texto do PL 478/2007, ao estender o conceito de nascituro
aos seres humanos concebidos ainda que “in vitro”, mesmo antes da transferência para o útero
da mulher, não incorre em incongruência científica ou conceitual. Afirmar-se, de forma
simplista, que o termo “nascituro” diz respeito ao ser humano já no contexto de uma gestação, e
que o termo “embrião” se refere ao material biológico proveniente da concepção, do encontro
dos gametas masculino e feminino, é negar a própria natureza das coisas. Como se extrai do
artigo da Dra. Alice Teixeira Ferreira2
(A Origem da Vida do Ser Humano e o Aborto),
“Embriologia quer dizer o estudo dos embriões. Entretanto, refere-se, atualmente, ao estudo do
desenvolvimento de embriões e fetos”.
4. Com efeito, considerando-se a certeza científica de que a vida humana começa com a
concepção, ou seja, desde o momento da fecundação do óvulo pelo espermatozoide, a proteção
jurídica deve evidentemente se estender a todas as fases desse desenvolvimento humano, desde
a concepção, pois a vida já se manifesta de modo inequívoco, não importando se em uma
ampola laboratorial ou no ventre materno.
5. O vocábulo “embrião”, no dicionário Michaelis, é assim definido: “1. Zool. Ser vivo nas
primeiras fases do desenvolvimento: nos vivíparos, desde a fecundação do ovo até o
nascimento, e nos ovíparos, até a eclosão. (...) 3. Med. Germe fecundado, nos três primeiros
meses da vida intrauterina.” Por sua vez, o vocábulo “nascituro” define-se desse modo: “1.
Que, ou aquele há de nascer. 2. Diz-se dos, ou os seres concebidos, mas ainda não dados à
1
Em Parecer de autoria da Comissão de Bioética e Biodireito da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção
do Estado do Rio de Janeiro (CBB/OABRJ), enviada aos Senhores Deputados Federais, apontam-se
algumas inconstitucionalidades no texto proposto no referido PL e seu substitutivo aprovado na Comissão
de Seguridade Social e Família da Câmara dos Deputados, com Parecer de Relatoria da Deputada Solange
Almeida. É exatamente sobre tais pontos controvertidos que iremos nos pronunciar, afastando a tese da
inconstitucionalidade equivocadamente, com a devida vênia, levantada.
2
Pesquisa na internet.
Link:http://www.cancaonova.com/portal/canais/formacao/internas.php?id=&e=47
luz.” Bem se vê, com isso, que não se faz distinção entre nascituro e embrião, podendo este
último se referir, igualmente, àqueles seres já concebidos e presentes no ventre materno até o
terceiro mês de gestação. Não há, portanto, razão para qualquer perplexidade diante do que
dispõe o art. 2º, parágrafo único, do PL em estudo.
6. Diante dessa constatação, também não assiste razão àqueles que afirmam que o PL
nº 478/2007 contraria o ordenamento jurídico vigente “ao atribuir direitos fundamentais ao
embrião, mesmo que ainda não esteja em gestação, partindo de uma concepção equivocada de
que o nascituro e o embrião humanos teriam o mesmo status jurídico e moral de pessoas
nascidas e vivas”. Não há qualquer violação ao ordenamento jurídico. Ao contrário, o Estatuto
do Nascituro tem o escopo exatamente de suprir a lacuna existente nesse mesmo ordenamento,
ao dar maior amplitude ao contido no art. 5º, caput, da Constituição Federal, que garante a
inviolabilidade do direito à vida, e no art. 2º do Código Civil, que estabelece que a
personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a
concepção, os direitos do nascituro.
7. O reconhecimento dos direitos da personalidade previstos nos arts. 11 a 21 do Código Civil
também não é motivo para perplexidades. Na lição de Sílvio de Salvo Venosa, “no sentido
jurídico, pessoa é o ente suscetível de direitos e obrigações”. O nosso ordenamento jurídico já
prevê, no art. 2º do Código Civil, que o nascituro, mesmo ainda não tendo adquirido a
personalidade, é sujeito de proteção jurídica, sendo resguardados os seus direitos. E não há
qualquer incompatibilidade entre o texto do PL em relevo e a decisão proferida pelo Supremo
Tribunal Federal, no julgamento da ADI 3.510, mencionado no Parecer aqui contraditado, pois
no próprio voto do Relator, Min. Carlos Ayres Britto, este afirmou que “Os momentos da vida
humana anteriores ao nascimento devem ser objeto de proteção pelo direito comum”. E é
exatamente o que faz o Estatuto do Nascituro.
8. Os direitos da personalidade são de natureza imaterial ou incorpórea, de modo que não há
qualquer incompatibilidade ou invalidade jurídica em se atribuir esses direitos aos nascituros e
aos embriões. É importante destacar que até mesmo os mortos, ou seja, os que já não mais têm
personalidade jurídica, são protegidos por esses direitos de personalidade, mormente os
relativos à dignidade e à honra. Entretanto, como é óbvio, esses direitos somente serão
exercitados em dadas circunstâncias que o permitam. Na doutrina de Carlos Roberto
Gonçalves3
, colhe-se que os direitos da personalidade dividem-se em duas categorias: os inatos,
como o direito à vida e à integridade física e moral, e os adquiridos, que decorrem do status
individual e existem na extensão da disciplina que lhes foi conferida pelo direito positivo.
Decorre daí que o exercício de alguns dos direitos da personalidade, em especial os adquiridos,
somente fará sentido quando o indivíduo nascer com vida, porém os inatos são usufruídos desde
a concepção, na dicção do Estatuto do Nascituro.
9. A afirmação de que há uma contradição no art. 3º do Estatuto do Nascituro, ao dispor que “a
personalidade jurídica se inicia com o nascimento com vida, mas sua natureza humana é
reconhecida desde a concepção”, é um sofisma que merece desconsideração. Isto porque, uma
coisa é o reconhecimento da natureza humana do ser concebido; outra coisa é o reconhecimento
da personalidade jurídica a partir do nascimento com vida. Assim o ordenamento jurídico
vigente já estatui, ao salvaguardar dos nascituros no art. 2º do CC. O que o Estatuto inova é ao
reconhecer que existe vida humana desde o momento da concepção, evitando-se interpretações
3
Direito Civil Brasileiro. São Paulo: Saraiva. 4ª edição. 2007. p. 155.
equivocadas que tratam o concepto apenas como uma coisa, um bem desprovido de natureza
humana.
10. Sob o título “A impropriedade da equiparação entre nascituro, embrião, pessoa e
criança e as violações de direitos fundamentais decorrentes da promoção desta
equiparação pela eventual aprovação do Projeto de Lei do Estatuto do Nascituro”, os
Pareceristas da CBB/OABRJ apontam inconstitucionalidade e arbitrariedade em estender
aos nascituros os mesmos direitos da pessoa viva, por atentar contra os princípios da
dignidade humana e da isonomia. Afirma-se que o Estatuto aplica tratamento idêntico a
situações diversas e sem qualquer critério de proporcionalidade, ferindo o princípio da
igualdade. O que os doutos Pareceristas parecem não enxergar é que o texto do Estatuto
busca exatamente o contrário, ou seja, pretende-se dar maior significado ao princípio da
isonomia, uma vez que, considerando-se que já existe vida humana desde o momento da
concepção, como verdade científica irrefutável, não pode mais haver distinção ou acepção
entre os concebidos e os já nascidos vivos. Não há qualquer desproporcionalidade no
Projeto de Lei em tela, haja vista as garantias serem exercidas na medida do status de cada
um, sendo evidente que um embrião congelado não terá direito a atendimento pelo SUS
(art. 8º), o que somente é válido para os nascituros implantados no ventre materno (pré-
natal, terapias e atendimento obstétrico). Por outro lado, o próprio art. 6º do PL em relevo já
estabelece os parâmetros de interpretação da norma legal, ao dispor que “Na interpretação
desta lei, levar-se-ão em conta os fins sociais a que ela se destina, as exigências do bem
comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a condição peculiar do nascituro
como pessoa em desenvolvimento”, não deixando margem a dúvidas quanto à diferenciação
que se deve estabelecer entre direitos a serem usufruídos pelos seres já nascidos vivos e os
daqueles ainda não nascidos. O que não se pode admitir, por absurdo, é a indução à
interpretação no sentido de que o embrião in vitro, por força do Estatuto, terá direito a um
patrimônio, a um nome, a um registro civil, a alimentos, à sucessão, ou outros direitos da
personalidade, porquanto estes somente serão usufruídos na medida da condição e da
necessidade de cada estágio, garantindo-se aos embriões congelados, tão-somente, o direito
à vida, até por dedução lógica inafastável.
11. A garantia do direito à vida estendida ao nascituro, desde a concepção, contempla e
consolida o princípio da isonomia, ao tratar o ser humano de forma igualitária em todas as
fases de sua existência. O Min. Gilmar Ferreira Mendes4
, do STF, ensina que “O princípio
da isonomia pode ser visto tanto como exigência de tratamento igualitário
(Gleichbehandlungsgebot) quanto como proibição de tratamento discriminatório
(Ungleichbehandlungsverbot)”. Neste caso, afastar os direitos do nascituro e do embrião,
por entendê-los distintos dos direitos da criança, é discriminatório e, portanto, violador do
princípio da isonomia.
12. De todo modo, é bom se destacar que no Parecer substitutivo de autoria da Dep. Solange
Almeida, aprovado na Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara dos Deputados,
o art. 8º do Projeto original foi alterado, suprimindo-se a parte final, que previa “o
atendimento em igualdade de condições com a criança”. Isto porque, como se depreende do
próprio Parecer da nobre Deputada, o Brasil é signatário da Convenção da ONU sobre
4
Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade. São Paulo: Saraiva. 3ª edição. 2006. p. 10.
Direitos da Criança, segundo a qual “a criança, em virtude de sua falta de maturidade física
e mental, necessita proteção e cuidados especiais, inclusive a devida proteção legal, tanto
antes quanto após seu nascimento. Este entendimento vem reiterado ao longo do texto da
Convenção, que dispõe, em seus artigos 1° e 2.1, que criança é todo ser humano menor de
18 (dezoito) anos, não admitindo discriminações decorrentes de nascimento ou qualquer
outra condição da criança”.
13. Mostra-se irremediavelmente equivocada, com a devida vênia, a interpretação do texto
do Estatuto do Nascituro, ao se afirmar que se fere o princípio da dignidade humana da
mulher, garantida pelo art. 1º, III, da Carta Magna. O constitucionalista Alexandre de
Moraes5
leciona que “a dignidade é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se
manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e
que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se um
mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que, somente
excepcionalmente, possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas
sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto
seres humanos”. Não há no texto do Estatuto do Nascituro nenhuma disposição que venha a
suprimir direitos humanos fundamentais da mulher. Afirmar-se tal disparate é tentar induzir
os incautos a interpretações equivocadas.
14. Embora o Parecer aqui contraposto não explicite que direitos fundamentais da mulher
são perdidos, é possível deduzir que os dignos Pareceristas se referem ao direito ao próprio
corpo, permitindo-se o abortamento como uma faculdade da mulher, consagrando o que os
defensores do aborto chamam de autonomia da mulher em matéria de sexualidade e
reprodução. Há um conceito básico em Direito, que afirma que “o direito de uma pessoa
termina quando começa o de outra”. A dita autonomia reprodutiva da mulher encontra
amparo no ordenamento jurídico, à medida que lhe é facultado o controle de natalidade, por
meio dos variados recursos contraceptivos existentes. A mulher não pode ser obrigada a
reproduzir e para tanto lhe é assegurada a defesa da autonomia e liberdade de agir. No
entanto, uma vez concebido um filho, esse direito cede lugar, inevitavelmente, ao direito à
vida do outro ser gerado. São duas vidas distintas e, portanto, igualmente sujeitas de
direitos. A autonomia sexual e reprodutiva da mulher não pode dar ensejo à supressão do
direito à vida do seu filho.
15. É patente que a mulher não perde esse direito, uma vez que esse direito o ordenamento
jurídico jamais lhe conferiu. Não se perde senão aquilo que se tem. Os direitos da mulher –
e, de resto, de todo ser humano – ao seu próprio corpo, como direito da personalidade, não
se estende ao corpo de um outro ser humano, seu filho, seja em que fase de
desenvolvimento ele se encontre. Como já dito e reafirmado insistentemente, a ciência
estabelece o momento da concepção como o marco inicial da vida humana, de sorte que,
uma vez concebido, o ser é titular da proteção estatal, não se podendo, sob o pálio da
dignidade da pessoa humana, transigir quanto a essa vida em formação. Não há, portanto,
qualquer violação ao princípio da dignidade humana.
16. A mulher não deve se colocar, como pretendem os Pareceristas ora questionados, como
mera “incubadora”. Esse papel somente será exercido se a mulher assim o desejar. Como
5
Direitos Humanos Fundamentais. Teoria Geral. São Paulo: Atlas. 8ª edição. 2007. p. 46.
esclarecido no item 14, acima, cabe à mulher decidir sobre a reprodução de filhos. Direito,
aliás, não exclusivo, pois na dicção do art. 226, § 7º, da Constituição Federal, o
planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos
educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva
por parte de instituições oficiais ou privadas. Tal dispositivo constitucional encontra-se
regulamentado pela Lei nº 9.263/96, que estabelece que “O planejamento familiar é parte
integrante do conjunto de ações de atenção à mulher, ao homem ou ao casal, dentro de
uma visão de atendimento global e integral à saúde”. Merece repúdio a alegação de que o
Estatuto do Nascituro nega o direito ao planejamento familiar, previsto no art. 226 da
Constituição Federal. Nada impede que um casal ou uma mulher possam recorrer às técnicas de
reprodução assistida para ter filhos ou que se socorram dos métodos contraceptivos para evitá-
los. O que se busca impedir é que esse planejamento familiar esteja atrelado à
irresponsabilidade de sacrificar a vida do ser concebido in vitro, portanto a vida de um ser
humano, do mesmo modo como também não é lícito à mulher matar esse filho já no seu
ventre, por meio do abortamento, em nome de sua autonomia reprodutiva e do seu direito ao
planejamento familiar.
17. O texto proposto no Estatuto do Nascituro em nada suprime direitos da mulher ou cria
prevalência ou prioridade do embrião sobre a mulher. É um sofisma afirmar-se que a
mulher “teria de ser praticamente monitorada e ter a sua gravidez registrada e
supervisionada ou vigiada para cumprir os dispositivos do ‘Estatuto do nascituro’”. Não há
em todo o texto do PL 478/2007 algum dispositivo que imponha tal fiscalização. O
ordenamento jurídico atualmente em vigor no Brasil já impede a prática do aborto,
tipificando-o como crime, exceto nas hipóteses previstas no art. 128 do Código Penal, nos
casos de aborto necessário, quando não há outro meio de salvar a vida da gestante, ou nos
casos de gravidez resultante de estupro. E nem por isso o Estado monitora a mulher, ou
exige o registro e supervisão da gestação.
18. Não há qualquer mudança de paradigma no trato e respeito à mulher gestante, apenas se
evolui no ordenamento jurídico para ampliar os direitos do nascituro. E não soa razoável
imaginar que a mulher que gera um filho em seu ventre se sinta tão indigna e desprestigiada
a ponto de se considerar mero instrumento para seu nascimento. Quem assim se sinta e não
pretenda gerar filhos, que se precavenha com os meios lícitos de contracepção que lhe são
disponibilizados. E com isso não se estabelece nenhuma gradação entre a mulher e o feto,
colocando-se aquela em situação de inferioridade ou desproporcionalidade. Como dito, não
se suprimem direitos da mulher, apenas se acrescentam direitos, de forma proporcional e
equânime, ao embrião.
19. Também se revela totalmente descabida a afirmação de que o Estatuto do Nascituro
obriga a mulher a ter todos os filhos gerados na fertilização in vitro. Trata-se de mais um
sofisma criado para induzir em erro os incautos. Não há previsão legal para tamanha
insensatez. O que se preserva é, tão-somente, a vida dos embriões fertilizados in vitro,
evitando-se o seu descarte irresponsável, tratando-se o embrião como coisa, em detrimento
de sua natureza humana.
20. Outro ponto que soa no mínimo equivocado no Parecer da CBB/OABRJ, diz respeito à
afirmação de que a gestante “deve obrigatoriamente se submeter a todos os tratamentos
terapêuticos ou profiláticos existentes, mesmo que isso implique em sérios riscos para sua
saúde psíquica, com o objetivo único de assegurar o desenvolvimento e a integridade do
feto ou embrião, cuja inviabilidade a ciência médica comprova e atesta” e que o Projeto
“tenta impor compulsoriamente a maternidade em caso de risco de vida e à saúde das
mulheres”. O que o art. 10 do EN estabelece é que “O nascituro terá à sua disposição os
meios terapêuticos e profiláticos disponíveis e proporcionais para prevenir, curar ou minimizar
deficiências ou patologia”. O atual ordenamento jurídico já prevê o abortamento no caso de
risco iminente de morte para a gestante e quando não houver outro meio de lhe salvar a vida
(aborto necessário), no art. 128, I, do Código Penal. Deste modo, em sobrevindo diagnóstico
(não um mero prognóstico) de risco imediato de morte da gestante, o abortamento é permitido, e
tão-somente neste caso. E o Projeto também não obriga a gestante a um tratamento desumano
ou degradante, equiparado à tortura, como afirmam, de modo absolutamente indefensável, os
nobres Pareceristas. Ao contrário, assim dispõem os §§ 1º e 2º do art. 10 do PL nº 478/2007:
§ 1º O diagnostico pré-natal deve ser precedido de consentimento informado da
gestante.
§ 2º É vedado o emprego de métodos para diagnóstico pré-natal que causem à mãe ou
ao nascituro, riscos desproporcionais ou desnecessários.
A dignidade humana serve para proteger a gestante, como também o nascituro. Ninguém, em sã
consciência, poderá imaginar que a gestação de um feto com má-formação neurológica não
venha a trazer sofrimento à gestante. É absolutamente natural que haja um abalo psicológico
não apenas para a gestante como para toda a família. Porém, o abortamento desse feto, por
anencefalia ou outra anomalia qualquer, não pode ser a solução para a questão, cabendo ao
Estado garantir a essa gestante o devido acompanhamento psicológico que lhe minimize a dor.
O abortamento, nesses casos, como o comprova a ciência médica, também é fonte de sofrimento
intenso, remorso, arrependimento, um abalo psicológico que pode e deve ser evitado, além de
salvaguardar o direito à vida do nascituro. Nas sábias palavras do Min. Cezar Peluso, do STF,
em seu voto proferido quando da cassação da liminar na ADPF nº 54, que tratava da autorização
para o abortamento de fetos anencefálicos, “O sofrimento não degrada a dignidade humana. É,
ao contrário, essencial. O remorso também é sofrimento. O sistema judiciário só repudia o
sofrimento por atos injustos, o que não é o caso”.
21. O art. 13 do Estatuto do Nascituro, por outro lado, em nenhum momento obriga a mulher
que seja vítima de um estupro, do qual resulte uma gravidez, a levar adiante a gestação. A
autonomia da gestante é preservada nesses casos, aplicando-se o disposto no art. 128, II, do
Código Penal, se assim o desejar a gestante. E a previsão de atendimento prioritário à
assistência pré-natal nos casos de fetos resultantes de estupro não caracteriza violação ao
princípio da isonomia em relação aos demais fetos gerados de forma lícita, mesmo porque é
evidente que essa prioridade somente seria exercida acaso não houvesse uma situação de
urgência ou emergência a demandar a priorização de outros casos. De todo modo, no
Substitutivo aprovado na CSSF da Câmara dos Deputados foi suprimida essa previsão, de modo
a não haver qualquer mácula ao texto constitucional.
22. Também não passa de sofisma a alegação de que o Estatuto legitima a violência contra a
mulher. Esta continua com a autonomia para decidir quanto à manutenção ou não da gestação
resultante de estupro, assim como o ordenamento jurídico ainda preservará a tipificação do
crime de estupro, conforme previsto no art. 213 do Código Penal. O que pretende o Projeto em
questão é apenas assegurar à gestante, na elevada hipótese de optar por dar prosseguimento à
gestação, todo o atendimento médico, psicológico e hospitalar, além da assistência social e
financeira para que a vida humana seja preservada, vida humana que não tem nenhuma
responsabilidade pelo ato delituoso perpetrado por seu genitor e, portanto, não pode ser
submetida à pena de morte por ato de terceiro. Isto porque deve ser levada em consideração a
garantia fundamental prevista no art. 5º XLV, da Lei Maior, que afirma que “nenhuma pena
passará da pessoa do condenado”. Nas circunstâncias estabelecidas pelo Estatuto, prevalecerá
o princípio da dignidade da pessoa humana e se cumpre o disposto no caput do art. 5º da Carta
Magna, atinente à inviolabilidade do direito à vida, mesmo porque no chamado aborto
sentimental ou humanitário, nas hipóteses de gestação decorrente de estupro, no dizer do
penalista Luiz Regis Prado6
, “o mal causado é maior do que aquele que se pretende evitar”.
23. Outro grave equívoco, fruto da má-vontade interpretativa do texto do Projeto, está em se
afirmar que o Estatuto obriga a mulher a “desenvolver relações pessoais com aquele que lhe
dirigiu nefasta violência sexual, em virtude do reconhecimento legalmente determinado de
qualidade de pai do(a) filho(a) que ela potencialmente carrega”. Mesmo numa leitura
superficial do texto do Projeto pode-se concluir que não se trata de uma imposição legal, mas de
uma faculdade que assiste à mulher. Em caso de identificação do estuprador, este poderá, se
assim o desejar a mulher, ser submetido à obrigação de prestar alimentos. Como o recebimento
de pensão de seus pais ou responsáveis constitui um direito de qualquer indivíduo, tal
dispositivo apenas contempla o princípio da isonomia, mesmo porque o art. 1.707 do Código
Civil dispõe que o direito a alimentos é irrenunciável (Art. 1707, CC: Pode o credor não
exercer, porém lhe é vedado renunciar o direito a alimentos, sendo o respectivo crédito
insuscetível de cessão, compensação ou penhora). Ocorre que, embora irrenunciável, a parte
credora (no caso o filho ou sua representante legal) poderá não exercer o direito aos alimentos.
Com isso, basta que a mulher, vítima de um estupro do qual foi gerado um filho, mesmo com a
identificação do criminoso, não exerça o direito a alimentos, não ingressando com a respectiva
ação.
24. O que o Estatuto do Nascituro prevê é apenas aquilo que a legislação já proclama (a
irrenunciabilidade do direito a alimentos e o princípio da isonomia), porém não se vislumbra
prejuízo para a vítima do estupro ou para o seu filho, desde que esta não procure a percepção
dos alimentos. Mas se o quiser, terá esse direito assegurado. É uma faculdade que lhe assiste
(embora se possa presumir que na maioria dos casos a vítima não quererá enfrentar uma batalha
judicial pelos alimentos, tendo inevitável contato com o ofensor).
25. As estatísticas, no entanto, demonstram que os crimes de violência sexual contra a mulher
ocorrem, em grande proporção, no próprio ambiente doméstico, no âmbito das próprias relações
familiares, por um pai, um avô, um tio, um irmão, um padrasto, ou até mesmo pelo próprio
esposo. O vínculo entre vítima e agressor já existia e continuará a existir. Tal circunstância não
pode ser modificada. O Estatuto do Nascituro proposto, longe de criar constrangimentos para as
vítimas desse abuso sexual, assegura-lhe o sustento e à prole, mediante a prestação alimentícia
pelo agressor, desde que assim o queira. E o Estatuto vai além: no caso de a mulher optar por
não buscar a prestação alimentícia pelo ofensor, caberá ao Estado oferecer as mínimas
condições para o sustento desse filho, a menos que a mulher-vítima opte por entregá-lo para
adoção. Afigura-se, desta forma, uma opção legislativa em favor da vida, mesmo em
circunstâncias adversas e dolorosas, sem qualquer eiva de violação aos direitos da gestante.
6
Comentários ao Código Penal. São Paulo: RT. 3ª edição. 2006. p. 422.
26. Não merece também albergue a preocupação em relação ao texto previsto no art. 18, § 1º, do
PL nº 478/2007, na redação da proposta originária, quanto a eventuais prejuízos para os
herdeiros que concorreriam com o nascituro à herança. A uma, porque tal expectativa de direito
do nascituro já encontra guarida no Código Civil (art. 2º); a duas, porque o Substitutivo
aprovado na CSSF suprimiu do Estatuto os arts. 14 a 21, justamente por já haver previsão legal
de mesmo teor.
27. A preocupação, igualmente, com os dispositivos penais previstos no Projeto originário, não
se justifica, uma vez que também foram suprimidos todos os artigos que tratavam de matéria
penal, no Substitutivo aprovado na CSSF, de autoria da Dep. Solange Almeida.
28. Quanto ao art. 25 do Projeto originário, também suprimido no Substitutivo da mencionada
Deputada Federal, este não viola nem contraria a decisão do Supremo Tribunal Federal, na ADI
nº 3510, que considerou constitucional a realização de pesquisas com células-tronco
embrionárias. Isto porque aquela decisão foi tomada à míngua de legislação infraconstitucional
que dispusesse expressamente a respeito. No entanto, nada impede que o legislador possa
deliberar de modo diverso, suprindo a lacuna legislativa hoje existente. De todo modo, ao
suprimir o dispositivo que criminalizava a manipulação do material genético, não há mais o que
se discutir a respeito.
29. A livre manifestação do pensamento também não é objeto do Estatuto do Nascituro. O que o
Projeto originário previa era a incriminação da apologia ou a incitação ao aborto. Fazer
apologia é muito mais do que simplesmente defender o ponto de vista; incitar é ir além do mero
discurso teórico. De todo modo, como já reafirmado, as disposições penais do PL em questão já
foram suprimidas pelo Substitutivo já aprovado, o que não é mais motivo para discussão.
30. Carece de boa interpretação o texto do Regimento Interno da Câmara dos Deputados,
especificamente no art. 191, levantado pelos ilustres Pareceristas para justificar a preocupação
com a reativação, na Comissão de Finanças e Tributação, do Projeto originário do Estatuto do
Nascituro. De fato, argumenta-se que, de acordo como art. 191, inciso V, do referido Regimento
Interno, o projeto originário ainda poderá ser submetido ao Plenário ou restabelecido. Não é
verdade. O inciso V, que deve ser aplicado apenas na hipótese de o inciso IV não se aplicar,
assim está redigido:
V - na hipótese de rejeição do substitutivo, ou na votação de projeto sem substitutivo, a
proposição inicial será votada por último, depois das emendas que lhe tenham sido
apresentadas;
E assim se apresenta o inciso IV, do mesmo dispositivo legal:
IV - aprovado o substitutivo, ficam prejudicados o projeto e as emendas a este
oferecidas, ressalvadas as emendas ao substitutivo e todos os destaques;
Ora, uma vez já tendo tramitado o PL nº 478/2007 na Comissão de Seguridade Social e Família-
CSSF, sendo ali aprovado o Substitutivo da Relatora, Dep. Solange Almeida, aplicou-se ali o
inciso IV, de modo que ficaram prejudicados o projeto e as emendas a este oferecidas. Seguindo
sua tramitação, agora, pela Comissão de Finanças e Tributação-CFT, apenas o Substitutivo já
aprovado na Comissão precedente será submetido à apreciação, a menos que novo Substitutivo
lhe seja apresentado na CFT, substitutivo esse que, em sendo rejeitado (inciso V), a proposição
inicial a que se refere dito inciso corresponde exatamente ao Substitutivo aprovado na CSSF e
não o projeto originário. Essa é a interpretação mais consentânea dos referidos dispositivos
legais, sob pena de se permitir idas e vindas na tramitação dos projetos de lei, com aprovação e
rejeição do mesmo substitutivo, sequencialmente, em várias Comissões ou no Plenário. Deste
modo, o que atualmente prevalece e que será submetido ao crivo da CFT, e posteriormente da
CCJ e do Plenário da Câmara dos Deputados é apenas o Substitutivo aprovado pela CSSF, ou os
que forem apresentados posteriormente, jamais o mesmo texto originário do PL nº 478/2007,
que se encontra prejudicado, conforme dispõe o art. 163, V, do RI da Câmara dos Deputados:
“Art. 163. Consideram-se prejudicados: (...) V - a proposição, com as respectivas emendas, que
tiver substitutivo aprovado, ressalvados os destaques”. Cai por terra, portanto, toda a discussão
acerca de dispositivos já suprimidos do texto originário do PL em tela.
31. Interpretação no sentido de que o texto do Estatuto do Nascituro derrogou tacitamente a
previsão legal para o abortamento nos casos de risco de vida para a gestante é, no mínimo,
equivocada. Não resiste à mais rasteira técnica de hermenêutica. Nos termos do art. 2º, inciso I,
da Lei de Introdução ao Código Civil, “A lei posterior revoga a anterior quando expressamente
o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que
tratava a lei anterior”. Nenhuma dessas hipóteses é alcançada pelo texto legal em comento. É
que não há expressa revogação do art. 128 do Código Penal, nem se apresenta nenhuma
incompatibilidade entre o Estatuto e o dispositivo penal em tela, como também o Estatuto não
regula a matéria penal, de modo que a disposição penal a respeito das hipóteses de abortamento
legal permanece hígida, até que uma outra lei nova a extirpe do ordenamento jurídico. Parte da
doutrina entende, todavia, que o art. 128 do Código Penal não foi recepcionada pela
Constituição Federal de 1988, por violar a garantia da inviolabilidade do direito à vida.
32. A vedação prevista no art. 12 do PL em debate, ao estabelecer que é vedado “ao Estado ou a
particulares causar dano ao nascituro em razão de ato cometido por qualquer de seus
genitores”, apesar da imprecisão e da técnica redacional pouco escorreita, não é motivo para
perplexidades ou para arguição de inconstitucionalidade. Nada impede que, ao longo da
tramitação do PL haja algum aclaramento, mediante emenda modificativa ou aditiva,
aprimorando-se a técnica redacional.
33. Por fim, o argumento de que o Projeto de Lei em relevo cria despesa pública sem indicar as
receitas orçamentárias legalmente previstas, em violação ao art. 165, parágrafos 5º, I, e 9º, art.
167, II, e art. 168, da Constituição Federal, não merece amparo. De fato, há uma omissão na
Justificativa do mencionado Projeto a esse respeito. Ocorre que tal omissão não representa óbice
à aprovação do texto proposto, bastando, para isso, que haja uma correção desse vício formal,
como já o fez, aliás, o nobre Deputado Eduardo Cunha, Relator do PL na CFT da Câmara, ao
propor emenda de adequação no intuito de permitir a adequação financeira e orçamentária das
propostas, votando pela adequação orçamentária e financeira, nos termos da emenda de
adequação que se anexa ao seu Parecer.
34. Deste modo, não há no Estatuto do Nascituro em tramitação na Câmara dos Deputados
qualquer vício formal ou material que impeça a sua aprovação na CFT, na CCJ ou no Plenário.
Considerando, de antemão, a honestidade científica dos eminentes juristas signatários do
Parecer da CBB/OABRJ, as conclusões por eles alcançadas não resistem a uma análise mais
rigorosa e desprovida de conceitos preconcebidos em favor do aborto. As inconstitucionalidades
arguidas constituem, concessa venia, meros sofismas, sem qualquer lastro na doutrina ou na
jurisprudência, sem amparo fático ou jurídico. A extensão das garantias essenciais já
consagradas no texto constitucional aos nascituros, abrangendo-se nestes os embriões
fertilizados in vitro, apenas vem a corrigir uma lacuna histórica na legislação brasileira, que é
signatária de diversos tratados e pactos internacionais que preveem direitos e garantias aos
nascituros, desde a concepção. O próprio constituinte de 1988, ao estabelecer a garantia
suprema da inviolabilidade do direito à vida, em contraposição aos últimos textos
constitucionais brasileiros que lhe antecederam, que se limitavam a assegurar a “inviolabilidade
dos direitos concernentes à vida...” (art. 153, CF/67 e art. 141, CF/46), introduziu uma nova e
significativa amplitude a essa garantia, a mais relevante de todas, que é a do direito à vida, e
não apenas os direitos a ela concernentes (direitos de personalidade). É a própria vida que foi
alçada a uma garantia fundamental e todo o ordenamento jurídico deve se adequar a esse
contexto. O Estatuto do Nascituro vem, portanto, resgatar a mens legislatoris do constituinte
originário, salvaguardando o direito à vida em todas as suas manifestações e em todas as fases
de seu desenvolvimento, a partir da concepção, coadunando-se, ademais, com a chancela
científica a respeito do tema.
35. A aprovação do Estatuto do Nascituro, portanto, é um enorme avanço na legislação
brasileira, merecendo dos Senhores Deputados o máximo de atenção e boa vontade, por refletir
os anseios da imensa maioria da população brasileira, desfavorável ao aborto, e por constituir
uma tendência marcante nas legislações estrangeiras.
Kéops de Vasconcelos Amaral Vieira Pires
Juiz de Direito/PB
Delegado da Associação Brasileira dos Magistrados Espíritas na Paraíba
Federação Espírita Brasileira-FEB - Comissão de Direito e Acompanhamento Legislativo
– Fórum das Entidades Especializadas Espíritas de Âmbito Nacional
MEMBROS
Helio Ribeiro Loureiro
Associação Jurídico-Espírita do Brasil (AJE)
Kéops de Vasconcelos Amaral Vieira Pires
Associação Brasileira dos Magistrados Espíritas (ABRAME)
Marcelo Henrique Pereira
Associação Brasileira de Divulgadores do Espiritismo (ABRADE)
Waldir Antonio Silvestre
Associação Brasileira de Esperantistas-Espíritas (ABEE)

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Análise jurídica do projeto legislativo do estatuto do nascituro

  • 1. ANÁLISE JURÍDICA DO PROJETO LEGISLATIVO DO ESTATUTO DO NASCITURO1 1. Tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº 478/2007, de autoria dos Deputados Luiz Bassuma e Miguel Martini, ao qual se apensaram os PLs nºs 489/2007, 1763/2007 e 3748/2008. A esse Projeto de Lei se denominou Estatuto do Nascituro, encontrando-se atualmente sob deliberação da Comissão de Finanças e Tributação dessa Casa Legislativa. 2. O Estatuto do Nascituro tem por premissa básica a proteção integral ao ser humano desde a concepção, ainda que in vitro, nos procedimentos de fertilização artificial, aí incluídos o direito à vida, à saúde, ao desenvolvimento, à alimentação, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à família, além de colocá-lo a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão (art. 4º). 3. De início, cumpre destacar que o texto do PL 478/2007, ao estender o conceito de nascituro aos seres humanos concebidos ainda que “in vitro”, mesmo antes da transferência para o útero da mulher, não incorre em incongruência científica ou conceitual. Afirmar-se, de forma simplista, que o termo “nascituro” diz respeito ao ser humano já no contexto de uma gestação, e que o termo “embrião” se refere ao material biológico proveniente da concepção, do encontro dos gametas masculino e feminino, é negar a própria natureza das coisas. Como se extrai do artigo da Dra. Alice Teixeira Ferreira2 (A Origem da Vida do Ser Humano e o Aborto), “Embriologia quer dizer o estudo dos embriões. Entretanto, refere-se, atualmente, ao estudo do desenvolvimento de embriões e fetos”. 4. Com efeito, considerando-se a certeza científica de que a vida humana começa com a concepção, ou seja, desde o momento da fecundação do óvulo pelo espermatozoide, a proteção jurídica deve evidentemente se estender a todas as fases desse desenvolvimento humano, desde a concepção, pois a vida já se manifesta de modo inequívoco, não importando se em uma ampola laboratorial ou no ventre materno. 5. O vocábulo “embrião”, no dicionário Michaelis, é assim definido: “1. Zool. Ser vivo nas primeiras fases do desenvolvimento: nos vivíparos, desde a fecundação do ovo até o nascimento, e nos ovíparos, até a eclosão. (...) 3. Med. Germe fecundado, nos três primeiros meses da vida intrauterina.” Por sua vez, o vocábulo “nascituro” define-se desse modo: “1. Que, ou aquele há de nascer. 2. Diz-se dos, ou os seres concebidos, mas ainda não dados à 1 Em Parecer de autoria da Comissão de Bioética e Biodireito da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção do Estado do Rio de Janeiro (CBB/OABRJ), enviada aos Senhores Deputados Federais, apontam-se algumas inconstitucionalidades no texto proposto no referido PL e seu substitutivo aprovado na Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara dos Deputados, com Parecer de Relatoria da Deputada Solange Almeida. É exatamente sobre tais pontos controvertidos que iremos nos pronunciar, afastando a tese da inconstitucionalidade equivocadamente, com a devida vênia, levantada. 2 Pesquisa na internet. Link:http://www.cancaonova.com/portal/canais/formacao/internas.php?id=&e=47
  • 2. luz.” Bem se vê, com isso, que não se faz distinção entre nascituro e embrião, podendo este último se referir, igualmente, àqueles seres já concebidos e presentes no ventre materno até o terceiro mês de gestação. Não há, portanto, razão para qualquer perplexidade diante do que dispõe o art. 2º, parágrafo único, do PL em estudo. 6. Diante dessa constatação, também não assiste razão àqueles que afirmam que o PL nº 478/2007 contraria o ordenamento jurídico vigente “ao atribuir direitos fundamentais ao embrião, mesmo que ainda não esteja em gestação, partindo de uma concepção equivocada de que o nascituro e o embrião humanos teriam o mesmo status jurídico e moral de pessoas nascidas e vivas”. Não há qualquer violação ao ordenamento jurídico. Ao contrário, o Estatuto do Nascituro tem o escopo exatamente de suprir a lacuna existente nesse mesmo ordenamento, ao dar maior amplitude ao contido no art. 5º, caput, da Constituição Federal, que garante a inviolabilidade do direito à vida, e no art. 2º do Código Civil, que estabelece que a personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro. 7. O reconhecimento dos direitos da personalidade previstos nos arts. 11 a 21 do Código Civil também não é motivo para perplexidades. Na lição de Sílvio de Salvo Venosa, “no sentido jurídico, pessoa é o ente suscetível de direitos e obrigações”. O nosso ordenamento jurídico já prevê, no art. 2º do Código Civil, que o nascituro, mesmo ainda não tendo adquirido a personalidade, é sujeito de proteção jurídica, sendo resguardados os seus direitos. E não há qualquer incompatibilidade entre o texto do PL em relevo e a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADI 3.510, mencionado no Parecer aqui contraditado, pois no próprio voto do Relator, Min. Carlos Ayres Britto, este afirmou que “Os momentos da vida humana anteriores ao nascimento devem ser objeto de proteção pelo direito comum”. E é exatamente o que faz o Estatuto do Nascituro. 8. Os direitos da personalidade são de natureza imaterial ou incorpórea, de modo que não há qualquer incompatibilidade ou invalidade jurídica em se atribuir esses direitos aos nascituros e aos embriões. É importante destacar que até mesmo os mortos, ou seja, os que já não mais têm personalidade jurídica, são protegidos por esses direitos de personalidade, mormente os relativos à dignidade e à honra. Entretanto, como é óbvio, esses direitos somente serão exercitados em dadas circunstâncias que o permitam. Na doutrina de Carlos Roberto Gonçalves3 , colhe-se que os direitos da personalidade dividem-se em duas categorias: os inatos, como o direito à vida e à integridade física e moral, e os adquiridos, que decorrem do status individual e existem na extensão da disciplina que lhes foi conferida pelo direito positivo. Decorre daí que o exercício de alguns dos direitos da personalidade, em especial os adquiridos, somente fará sentido quando o indivíduo nascer com vida, porém os inatos são usufruídos desde a concepção, na dicção do Estatuto do Nascituro. 9. A afirmação de que há uma contradição no art. 3º do Estatuto do Nascituro, ao dispor que “a personalidade jurídica se inicia com o nascimento com vida, mas sua natureza humana é reconhecida desde a concepção”, é um sofisma que merece desconsideração. Isto porque, uma coisa é o reconhecimento da natureza humana do ser concebido; outra coisa é o reconhecimento da personalidade jurídica a partir do nascimento com vida. Assim o ordenamento jurídico vigente já estatui, ao salvaguardar dos nascituros no art. 2º do CC. O que o Estatuto inova é ao reconhecer que existe vida humana desde o momento da concepção, evitando-se interpretações 3 Direito Civil Brasileiro. São Paulo: Saraiva. 4ª edição. 2007. p. 155.
  • 3. equivocadas que tratam o concepto apenas como uma coisa, um bem desprovido de natureza humana. 10. Sob o título “A impropriedade da equiparação entre nascituro, embrião, pessoa e criança e as violações de direitos fundamentais decorrentes da promoção desta equiparação pela eventual aprovação do Projeto de Lei do Estatuto do Nascituro”, os Pareceristas da CBB/OABRJ apontam inconstitucionalidade e arbitrariedade em estender aos nascituros os mesmos direitos da pessoa viva, por atentar contra os princípios da dignidade humana e da isonomia. Afirma-se que o Estatuto aplica tratamento idêntico a situações diversas e sem qualquer critério de proporcionalidade, ferindo o princípio da igualdade. O que os doutos Pareceristas parecem não enxergar é que o texto do Estatuto busca exatamente o contrário, ou seja, pretende-se dar maior significado ao princípio da isonomia, uma vez que, considerando-se que já existe vida humana desde o momento da concepção, como verdade científica irrefutável, não pode mais haver distinção ou acepção entre os concebidos e os já nascidos vivos. Não há qualquer desproporcionalidade no Projeto de Lei em tela, haja vista as garantias serem exercidas na medida do status de cada um, sendo evidente que um embrião congelado não terá direito a atendimento pelo SUS (art. 8º), o que somente é válido para os nascituros implantados no ventre materno (pré- natal, terapias e atendimento obstétrico). Por outro lado, o próprio art. 6º do PL em relevo já estabelece os parâmetros de interpretação da norma legal, ao dispor que “Na interpretação desta lei, levar-se-ão em conta os fins sociais a que ela se destina, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a condição peculiar do nascituro como pessoa em desenvolvimento”, não deixando margem a dúvidas quanto à diferenciação que se deve estabelecer entre direitos a serem usufruídos pelos seres já nascidos vivos e os daqueles ainda não nascidos. O que não se pode admitir, por absurdo, é a indução à interpretação no sentido de que o embrião in vitro, por força do Estatuto, terá direito a um patrimônio, a um nome, a um registro civil, a alimentos, à sucessão, ou outros direitos da personalidade, porquanto estes somente serão usufruídos na medida da condição e da necessidade de cada estágio, garantindo-se aos embriões congelados, tão-somente, o direito à vida, até por dedução lógica inafastável. 11. A garantia do direito à vida estendida ao nascituro, desde a concepção, contempla e consolida o princípio da isonomia, ao tratar o ser humano de forma igualitária em todas as fases de sua existência. O Min. Gilmar Ferreira Mendes4 , do STF, ensina que “O princípio da isonomia pode ser visto tanto como exigência de tratamento igualitário (Gleichbehandlungsgebot) quanto como proibição de tratamento discriminatório (Ungleichbehandlungsverbot)”. Neste caso, afastar os direitos do nascituro e do embrião, por entendê-los distintos dos direitos da criança, é discriminatório e, portanto, violador do princípio da isonomia. 12. De todo modo, é bom se destacar que no Parecer substitutivo de autoria da Dep. Solange Almeida, aprovado na Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara dos Deputados, o art. 8º do Projeto original foi alterado, suprimindo-se a parte final, que previa “o atendimento em igualdade de condições com a criança”. Isto porque, como se depreende do próprio Parecer da nobre Deputada, o Brasil é signatário da Convenção da ONU sobre 4 Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade. São Paulo: Saraiva. 3ª edição. 2006. p. 10.
  • 4. Direitos da Criança, segundo a qual “a criança, em virtude de sua falta de maturidade física e mental, necessita proteção e cuidados especiais, inclusive a devida proteção legal, tanto antes quanto após seu nascimento. Este entendimento vem reiterado ao longo do texto da Convenção, que dispõe, em seus artigos 1° e 2.1, que criança é todo ser humano menor de 18 (dezoito) anos, não admitindo discriminações decorrentes de nascimento ou qualquer outra condição da criança”. 13. Mostra-se irremediavelmente equivocada, com a devida vênia, a interpretação do texto do Estatuto do Nascituro, ao se afirmar que se fere o princípio da dignidade humana da mulher, garantida pelo art. 1º, III, da Carta Magna. O constitucionalista Alexandre de Moraes5 leciona que “a dignidade é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que, somente excepcionalmente, possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos”. Não há no texto do Estatuto do Nascituro nenhuma disposição que venha a suprimir direitos humanos fundamentais da mulher. Afirmar-se tal disparate é tentar induzir os incautos a interpretações equivocadas. 14. Embora o Parecer aqui contraposto não explicite que direitos fundamentais da mulher são perdidos, é possível deduzir que os dignos Pareceristas se referem ao direito ao próprio corpo, permitindo-se o abortamento como uma faculdade da mulher, consagrando o que os defensores do aborto chamam de autonomia da mulher em matéria de sexualidade e reprodução. Há um conceito básico em Direito, que afirma que “o direito de uma pessoa termina quando começa o de outra”. A dita autonomia reprodutiva da mulher encontra amparo no ordenamento jurídico, à medida que lhe é facultado o controle de natalidade, por meio dos variados recursos contraceptivos existentes. A mulher não pode ser obrigada a reproduzir e para tanto lhe é assegurada a defesa da autonomia e liberdade de agir. No entanto, uma vez concebido um filho, esse direito cede lugar, inevitavelmente, ao direito à vida do outro ser gerado. São duas vidas distintas e, portanto, igualmente sujeitas de direitos. A autonomia sexual e reprodutiva da mulher não pode dar ensejo à supressão do direito à vida do seu filho. 15. É patente que a mulher não perde esse direito, uma vez que esse direito o ordenamento jurídico jamais lhe conferiu. Não se perde senão aquilo que se tem. Os direitos da mulher – e, de resto, de todo ser humano – ao seu próprio corpo, como direito da personalidade, não se estende ao corpo de um outro ser humano, seu filho, seja em que fase de desenvolvimento ele se encontre. Como já dito e reafirmado insistentemente, a ciência estabelece o momento da concepção como o marco inicial da vida humana, de sorte que, uma vez concebido, o ser é titular da proteção estatal, não se podendo, sob o pálio da dignidade da pessoa humana, transigir quanto a essa vida em formação. Não há, portanto, qualquer violação ao princípio da dignidade humana. 16. A mulher não deve se colocar, como pretendem os Pareceristas ora questionados, como mera “incubadora”. Esse papel somente será exercido se a mulher assim o desejar. Como 5 Direitos Humanos Fundamentais. Teoria Geral. São Paulo: Atlas. 8ª edição. 2007. p. 46.
  • 5. esclarecido no item 14, acima, cabe à mulher decidir sobre a reprodução de filhos. Direito, aliás, não exclusivo, pois na dicção do art. 226, § 7º, da Constituição Federal, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas. Tal dispositivo constitucional encontra-se regulamentado pela Lei nº 9.263/96, que estabelece que “O planejamento familiar é parte integrante do conjunto de ações de atenção à mulher, ao homem ou ao casal, dentro de uma visão de atendimento global e integral à saúde”. Merece repúdio a alegação de que o Estatuto do Nascituro nega o direito ao planejamento familiar, previsto no art. 226 da Constituição Federal. Nada impede que um casal ou uma mulher possam recorrer às técnicas de reprodução assistida para ter filhos ou que se socorram dos métodos contraceptivos para evitá- los. O que se busca impedir é que esse planejamento familiar esteja atrelado à irresponsabilidade de sacrificar a vida do ser concebido in vitro, portanto a vida de um ser humano, do mesmo modo como também não é lícito à mulher matar esse filho já no seu ventre, por meio do abortamento, em nome de sua autonomia reprodutiva e do seu direito ao planejamento familiar. 17. O texto proposto no Estatuto do Nascituro em nada suprime direitos da mulher ou cria prevalência ou prioridade do embrião sobre a mulher. É um sofisma afirmar-se que a mulher “teria de ser praticamente monitorada e ter a sua gravidez registrada e supervisionada ou vigiada para cumprir os dispositivos do ‘Estatuto do nascituro’”. Não há em todo o texto do PL 478/2007 algum dispositivo que imponha tal fiscalização. O ordenamento jurídico atualmente em vigor no Brasil já impede a prática do aborto, tipificando-o como crime, exceto nas hipóteses previstas no art. 128 do Código Penal, nos casos de aborto necessário, quando não há outro meio de salvar a vida da gestante, ou nos casos de gravidez resultante de estupro. E nem por isso o Estado monitora a mulher, ou exige o registro e supervisão da gestação. 18. Não há qualquer mudança de paradigma no trato e respeito à mulher gestante, apenas se evolui no ordenamento jurídico para ampliar os direitos do nascituro. E não soa razoável imaginar que a mulher que gera um filho em seu ventre se sinta tão indigna e desprestigiada a ponto de se considerar mero instrumento para seu nascimento. Quem assim se sinta e não pretenda gerar filhos, que se precavenha com os meios lícitos de contracepção que lhe são disponibilizados. E com isso não se estabelece nenhuma gradação entre a mulher e o feto, colocando-se aquela em situação de inferioridade ou desproporcionalidade. Como dito, não se suprimem direitos da mulher, apenas se acrescentam direitos, de forma proporcional e equânime, ao embrião. 19. Também se revela totalmente descabida a afirmação de que o Estatuto do Nascituro obriga a mulher a ter todos os filhos gerados na fertilização in vitro. Trata-se de mais um sofisma criado para induzir em erro os incautos. Não há previsão legal para tamanha insensatez. O que se preserva é, tão-somente, a vida dos embriões fertilizados in vitro, evitando-se o seu descarte irresponsável, tratando-se o embrião como coisa, em detrimento de sua natureza humana. 20. Outro ponto que soa no mínimo equivocado no Parecer da CBB/OABRJ, diz respeito à afirmação de que a gestante “deve obrigatoriamente se submeter a todos os tratamentos terapêuticos ou profiláticos existentes, mesmo que isso implique em sérios riscos para sua
  • 6. saúde psíquica, com o objetivo único de assegurar o desenvolvimento e a integridade do feto ou embrião, cuja inviabilidade a ciência médica comprova e atesta” e que o Projeto “tenta impor compulsoriamente a maternidade em caso de risco de vida e à saúde das mulheres”. O que o art. 10 do EN estabelece é que “O nascituro terá à sua disposição os meios terapêuticos e profiláticos disponíveis e proporcionais para prevenir, curar ou minimizar deficiências ou patologia”. O atual ordenamento jurídico já prevê o abortamento no caso de risco iminente de morte para a gestante e quando não houver outro meio de lhe salvar a vida (aborto necessário), no art. 128, I, do Código Penal. Deste modo, em sobrevindo diagnóstico (não um mero prognóstico) de risco imediato de morte da gestante, o abortamento é permitido, e tão-somente neste caso. E o Projeto também não obriga a gestante a um tratamento desumano ou degradante, equiparado à tortura, como afirmam, de modo absolutamente indefensável, os nobres Pareceristas. Ao contrário, assim dispõem os §§ 1º e 2º do art. 10 do PL nº 478/2007: § 1º O diagnostico pré-natal deve ser precedido de consentimento informado da gestante. § 2º É vedado o emprego de métodos para diagnóstico pré-natal que causem à mãe ou ao nascituro, riscos desproporcionais ou desnecessários. A dignidade humana serve para proteger a gestante, como também o nascituro. Ninguém, em sã consciência, poderá imaginar que a gestação de um feto com má-formação neurológica não venha a trazer sofrimento à gestante. É absolutamente natural que haja um abalo psicológico não apenas para a gestante como para toda a família. Porém, o abortamento desse feto, por anencefalia ou outra anomalia qualquer, não pode ser a solução para a questão, cabendo ao Estado garantir a essa gestante o devido acompanhamento psicológico que lhe minimize a dor. O abortamento, nesses casos, como o comprova a ciência médica, também é fonte de sofrimento intenso, remorso, arrependimento, um abalo psicológico que pode e deve ser evitado, além de salvaguardar o direito à vida do nascituro. Nas sábias palavras do Min. Cezar Peluso, do STF, em seu voto proferido quando da cassação da liminar na ADPF nº 54, que tratava da autorização para o abortamento de fetos anencefálicos, “O sofrimento não degrada a dignidade humana. É, ao contrário, essencial. O remorso também é sofrimento. O sistema judiciário só repudia o sofrimento por atos injustos, o que não é o caso”. 21. O art. 13 do Estatuto do Nascituro, por outro lado, em nenhum momento obriga a mulher que seja vítima de um estupro, do qual resulte uma gravidez, a levar adiante a gestação. A autonomia da gestante é preservada nesses casos, aplicando-se o disposto no art. 128, II, do Código Penal, se assim o desejar a gestante. E a previsão de atendimento prioritário à assistência pré-natal nos casos de fetos resultantes de estupro não caracteriza violação ao princípio da isonomia em relação aos demais fetos gerados de forma lícita, mesmo porque é evidente que essa prioridade somente seria exercida acaso não houvesse uma situação de urgência ou emergência a demandar a priorização de outros casos. De todo modo, no Substitutivo aprovado na CSSF da Câmara dos Deputados foi suprimida essa previsão, de modo a não haver qualquer mácula ao texto constitucional. 22. Também não passa de sofisma a alegação de que o Estatuto legitima a violência contra a mulher. Esta continua com a autonomia para decidir quanto à manutenção ou não da gestação resultante de estupro, assim como o ordenamento jurídico ainda preservará a tipificação do crime de estupro, conforme previsto no art. 213 do Código Penal. O que pretende o Projeto em questão é apenas assegurar à gestante, na elevada hipótese de optar por dar prosseguimento à gestação, todo o atendimento médico, psicológico e hospitalar, além da assistência social e
  • 7. financeira para que a vida humana seja preservada, vida humana que não tem nenhuma responsabilidade pelo ato delituoso perpetrado por seu genitor e, portanto, não pode ser submetida à pena de morte por ato de terceiro. Isto porque deve ser levada em consideração a garantia fundamental prevista no art. 5º XLV, da Lei Maior, que afirma que “nenhuma pena passará da pessoa do condenado”. Nas circunstâncias estabelecidas pelo Estatuto, prevalecerá o princípio da dignidade da pessoa humana e se cumpre o disposto no caput do art. 5º da Carta Magna, atinente à inviolabilidade do direito à vida, mesmo porque no chamado aborto sentimental ou humanitário, nas hipóteses de gestação decorrente de estupro, no dizer do penalista Luiz Regis Prado6 , “o mal causado é maior do que aquele que se pretende evitar”. 23. Outro grave equívoco, fruto da má-vontade interpretativa do texto do Projeto, está em se afirmar que o Estatuto obriga a mulher a “desenvolver relações pessoais com aquele que lhe dirigiu nefasta violência sexual, em virtude do reconhecimento legalmente determinado de qualidade de pai do(a) filho(a) que ela potencialmente carrega”. Mesmo numa leitura superficial do texto do Projeto pode-se concluir que não se trata de uma imposição legal, mas de uma faculdade que assiste à mulher. Em caso de identificação do estuprador, este poderá, se assim o desejar a mulher, ser submetido à obrigação de prestar alimentos. Como o recebimento de pensão de seus pais ou responsáveis constitui um direito de qualquer indivíduo, tal dispositivo apenas contempla o princípio da isonomia, mesmo porque o art. 1.707 do Código Civil dispõe que o direito a alimentos é irrenunciável (Art. 1707, CC: Pode o credor não exercer, porém lhe é vedado renunciar o direito a alimentos, sendo o respectivo crédito insuscetível de cessão, compensação ou penhora). Ocorre que, embora irrenunciável, a parte credora (no caso o filho ou sua representante legal) poderá não exercer o direito aos alimentos. Com isso, basta que a mulher, vítima de um estupro do qual foi gerado um filho, mesmo com a identificação do criminoso, não exerça o direito a alimentos, não ingressando com a respectiva ação. 24. O que o Estatuto do Nascituro prevê é apenas aquilo que a legislação já proclama (a irrenunciabilidade do direito a alimentos e o princípio da isonomia), porém não se vislumbra prejuízo para a vítima do estupro ou para o seu filho, desde que esta não procure a percepção dos alimentos. Mas se o quiser, terá esse direito assegurado. É uma faculdade que lhe assiste (embora se possa presumir que na maioria dos casos a vítima não quererá enfrentar uma batalha judicial pelos alimentos, tendo inevitável contato com o ofensor). 25. As estatísticas, no entanto, demonstram que os crimes de violência sexual contra a mulher ocorrem, em grande proporção, no próprio ambiente doméstico, no âmbito das próprias relações familiares, por um pai, um avô, um tio, um irmão, um padrasto, ou até mesmo pelo próprio esposo. O vínculo entre vítima e agressor já existia e continuará a existir. Tal circunstância não pode ser modificada. O Estatuto do Nascituro proposto, longe de criar constrangimentos para as vítimas desse abuso sexual, assegura-lhe o sustento e à prole, mediante a prestação alimentícia pelo agressor, desde que assim o queira. E o Estatuto vai além: no caso de a mulher optar por não buscar a prestação alimentícia pelo ofensor, caberá ao Estado oferecer as mínimas condições para o sustento desse filho, a menos que a mulher-vítima opte por entregá-lo para adoção. Afigura-se, desta forma, uma opção legislativa em favor da vida, mesmo em circunstâncias adversas e dolorosas, sem qualquer eiva de violação aos direitos da gestante. 6 Comentários ao Código Penal. São Paulo: RT. 3ª edição. 2006. p. 422.
  • 8. 26. Não merece também albergue a preocupação em relação ao texto previsto no art. 18, § 1º, do PL nº 478/2007, na redação da proposta originária, quanto a eventuais prejuízos para os herdeiros que concorreriam com o nascituro à herança. A uma, porque tal expectativa de direito do nascituro já encontra guarida no Código Civil (art. 2º); a duas, porque o Substitutivo aprovado na CSSF suprimiu do Estatuto os arts. 14 a 21, justamente por já haver previsão legal de mesmo teor. 27. A preocupação, igualmente, com os dispositivos penais previstos no Projeto originário, não se justifica, uma vez que também foram suprimidos todos os artigos que tratavam de matéria penal, no Substitutivo aprovado na CSSF, de autoria da Dep. Solange Almeida. 28. Quanto ao art. 25 do Projeto originário, também suprimido no Substitutivo da mencionada Deputada Federal, este não viola nem contraria a decisão do Supremo Tribunal Federal, na ADI nº 3510, que considerou constitucional a realização de pesquisas com células-tronco embrionárias. Isto porque aquela decisão foi tomada à míngua de legislação infraconstitucional que dispusesse expressamente a respeito. No entanto, nada impede que o legislador possa deliberar de modo diverso, suprindo a lacuna legislativa hoje existente. De todo modo, ao suprimir o dispositivo que criminalizava a manipulação do material genético, não há mais o que se discutir a respeito. 29. A livre manifestação do pensamento também não é objeto do Estatuto do Nascituro. O que o Projeto originário previa era a incriminação da apologia ou a incitação ao aborto. Fazer apologia é muito mais do que simplesmente defender o ponto de vista; incitar é ir além do mero discurso teórico. De todo modo, como já reafirmado, as disposições penais do PL em questão já foram suprimidas pelo Substitutivo já aprovado, o que não é mais motivo para discussão. 30. Carece de boa interpretação o texto do Regimento Interno da Câmara dos Deputados, especificamente no art. 191, levantado pelos ilustres Pareceristas para justificar a preocupação com a reativação, na Comissão de Finanças e Tributação, do Projeto originário do Estatuto do Nascituro. De fato, argumenta-se que, de acordo como art. 191, inciso V, do referido Regimento Interno, o projeto originário ainda poderá ser submetido ao Plenário ou restabelecido. Não é verdade. O inciso V, que deve ser aplicado apenas na hipótese de o inciso IV não se aplicar, assim está redigido: V - na hipótese de rejeição do substitutivo, ou na votação de projeto sem substitutivo, a proposição inicial será votada por último, depois das emendas que lhe tenham sido apresentadas; E assim se apresenta o inciso IV, do mesmo dispositivo legal: IV - aprovado o substitutivo, ficam prejudicados o projeto e as emendas a este oferecidas, ressalvadas as emendas ao substitutivo e todos os destaques; Ora, uma vez já tendo tramitado o PL nº 478/2007 na Comissão de Seguridade Social e Família- CSSF, sendo ali aprovado o Substitutivo da Relatora, Dep. Solange Almeida, aplicou-se ali o inciso IV, de modo que ficaram prejudicados o projeto e as emendas a este oferecidas. Seguindo sua tramitação, agora, pela Comissão de Finanças e Tributação-CFT, apenas o Substitutivo já aprovado na Comissão precedente será submetido à apreciação, a menos que novo Substitutivo lhe seja apresentado na CFT, substitutivo esse que, em sendo rejeitado (inciso V), a proposição inicial a que se refere dito inciso corresponde exatamente ao Substitutivo aprovado na CSSF e
  • 9. não o projeto originário. Essa é a interpretação mais consentânea dos referidos dispositivos legais, sob pena de se permitir idas e vindas na tramitação dos projetos de lei, com aprovação e rejeição do mesmo substitutivo, sequencialmente, em várias Comissões ou no Plenário. Deste modo, o que atualmente prevalece e que será submetido ao crivo da CFT, e posteriormente da CCJ e do Plenário da Câmara dos Deputados é apenas o Substitutivo aprovado pela CSSF, ou os que forem apresentados posteriormente, jamais o mesmo texto originário do PL nº 478/2007, que se encontra prejudicado, conforme dispõe o art. 163, V, do RI da Câmara dos Deputados: “Art. 163. Consideram-se prejudicados: (...) V - a proposição, com as respectivas emendas, que tiver substitutivo aprovado, ressalvados os destaques”. Cai por terra, portanto, toda a discussão acerca de dispositivos já suprimidos do texto originário do PL em tela. 31. Interpretação no sentido de que o texto do Estatuto do Nascituro derrogou tacitamente a previsão legal para o abortamento nos casos de risco de vida para a gestante é, no mínimo, equivocada. Não resiste à mais rasteira técnica de hermenêutica. Nos termos do art. 2º, inciso I, da Lei de Introdução ao Código Civil, “A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior”. Nenhuma dessas hipóteses é alcançada pelo texto legal em comento. É que não há expressa revogação do art. 128 do Código Penal, nem se apresenta nenhuma incompatibilidade entre o Estatuto e o dispositivo penal em tela, como também o Estatuto não regula a matéria penal, de modo que a disposição penal a respeito das hipóteses de abortamento legal permanece hígida, até que uma outra lei nova a extirpe do ordenamento jurídico. Parte da doutrina entende, todavia, que o art. 128 do Código Penal não foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988, por violar a garantia da inviolabilidade do direito à vida. 32. A vedação prevista no art. 12 do PL em debate, ao estabelecer que é vedado “ao Estado ou a particulares causar dano ao nascituro em razão de ato cometido por qualquer de seus genitores”, apesar da imprecisão e da técnica redacional pouco escorreita, não é motivo para perplexidades ou para arguição de inconstitucionalidade. Nada impede que, ao longo da tramitação do PL haja algum aclaramento, mediante emenda modificativa ou aditiva, aprimorando-se a técnica redacional. 33. Por fim, o argumento de que o Projeto de Lei em relevo cria despesa pública sem indicar as receitas orçamentárias legalmente previstas, em violação ao art. 165, parágrafos 5º, I, e 9º, art. 167, II, e art. 168, da Constituição Federal, não merece amparo. De fato, há uma omissão na Justificativa do mencionado Projeto a esse respeito. Ocorre que tal omissão não representa óbice à aprovação do texto proposto, bastando, para isso, que haja uma correção desse vício formal, como já o fez, aliás, o nobre Deputado Eduardo Cunha, Relator do PL na CFT da Câmara, ao propor emenda de adequação no intuito de permitir a adequação financeira e orçamentária das propostas, votando pela adequação orçamentária e financeira, nos termos da emenda de adequação que se anexa ao seu Parecer. 34. Deste modo, não há no Estatuto do Nascituro em tramitação na Câmara dos Deputados qualquer vício formal ou material que impeça a sua aprovação na CFT, na CCJ ou no Plenário. Considerando, de antemão, a honestidade científica dos eminentes juristas signatários do Parecer da CBB/OABRJ, as conclusões por eles alcançadas não resistem a uma análise mais rigorosa e desprovida de conceitos preconcebidos em favor do aborto. As inconstitucionalidades arguidas constituem, concessa venia, meros sofismas, sem qualquer lastro na doutrina ou na jurisprudência, sem amparo fático ou jurídico. A extensão das garantias essenciais já consagradas no texto constitucional aos nascituros, abrangendo-se nestes os embriões
  • 10. fertilizados in vitro, apenas vem a corrigir uma lacuna histórica na legislação brasileira, que é signatária de diversos tratados e pactos internacionais que preveem direitos e garantias aos nascituros, desde a concepção. O próprio constituinte de 1988, ao estabelecer a garantia suprema da inviolabilidade do direito à vida, em contraposição aos últimos textos constitucionais brasileiros que lhe antecederam, que se limitavam a assegurar a “inviolabilidade dos direitos concernentes à vida...” (art. 153, CF/67 e art. 141, CF/46), introduziu uma nova e significativa amplitude a essa garantia, a mais relevante de todas, que é a do direito à vida, e não apenas os direitos a ela concernentes (direitos de personalidade). É a própria vida que foi alçada a uma garantia fundamental e todo o ordenamento jurídico deve se adequar a esse contexto. O Estatuto do Nascituro vem, portanto, resgatar a mens legislatoris do constituinte originário, salvaguardando o direito à vida em todas as suas manifestações e em todas as fases de seu desenvolvimento, a partir da concepção, coadunando-se, ademais, com a chancela científica a respeito do tema. 35. A aprovação do Estatuto do Nascituro, portanto, é um enorme avanço na legislação brasileira, merecendo dos Senhores Deputados o máximo de atenção e boa vontade, por refletir os anseios da imensa maioria da população brasileira, desfavorável ao aborto, e por constituir uma tendência marcante nas legislações estrangeiras. Kéops de Vasconcelos Amaral Vieira Pires Juiz de Direito/PB Delegado da Associação Brasileira dos Magistrados Espíritas na Paraíba Federação Espírita Brasileira-FEB - Comissão de Direito e Acompanhamento Legislativo – Fórum das Entidades Especializadas Espíritas de Âmbito Nacional MEMBROS Helio Ribeiro Loureiro Associação Jurídico-Espírita do Brasil (AJE) Kéops de Vasconcelos Amaral Vieira Pires Associação Brasileira dos Magistrados Espíritas (ABRAME) Marcelo Henrique Pereira Associação Brasileira de Divulgadores do Espiritismo (ABRADE) Waldir Antonio Silvestre Associação Brasileira de Esperantistas-Espíritas (ABEE)