1. O Indivíduo e o Estado
A justiça social: três perspectivas
2. Aristóteles: o homem como animal político.
Segundo Aristóteles, o homem é um animal político:
A Pólis (a cidade/a sociedade), o Estado, é algo de necessário à
natureza humana, pois o homem, enquanto indivíduo, só se realiza
plenamente em sociedade e a sua existência seria impensável sem ser
em sociedade.
A própria racionalidade que diferencia o homem dos restantes animais só
se pode afirmar em diálogo, em confronto, em partilha...
3. “A razão pela qual o ser humano, de
forma mais intensa do que uma
abelha ou qualquer outro animal
gregário, é, plenamente, um animal
político, é evidente: a natureza não
faz nada por acaso, e só o homem
é um animal que possui Lógos
(Palavra; Razão). Assim como as
vocalizações dos animais indicam o
prazer e o sofrimento, o discurso
serve para indicar aquilo que tem
utilidade. É que, em comparação
com os outros animais, o homem
tem as suas especificidades: tem
noção do bem e do mal, do justo e
do injusto; e são estes sentimentos
que dão origem à família e à Pólis.”
Aristóteles, Política, 1253a
4. “Visto que todas as cidades são associações e que toda
a associação se forma com vista a algum bem (porque
os homens quando agem visam sempre alcançar o que
lhes parece ser um bem), daqui se conclui que, se as
associações visam um bem, aquela que é mais
importante e que engloba todas as demais é a que visa o
bem mais importante; ela designa-se como 'cidade'
(Pólis), ou comunidade política.”
Aristóteles, Idem.
5. Tal como se passa em
relação ao corpo humano,
em que cada parte existe e
só tem sentido na sua
relação com o todo:
“O mesmo se passa com
os membros de uma
Cidade, nenhum é auto-
suficiente. Quem não sentir
necessidade de viver em
sociedade, não será um
homem, mas um animal ou
um deus. A própria
natureza conduz cada um
dos homens a este tipo
de associação.”
Aristóteles, Idem.
6. Síntese:
Para Aristóteles, o estado natural do homem é a
vida em comunidades políticas
(cidades/estados).
A Justiça é uma virtude, pertencendo,
portanto, ao campo da ética. Só pela educação e
pela melhoria da consciência ética dos cidadãos
se poderá instituir uma sociedade justa, de
acordo com o modelo aristotélico.
O objectivo principal da ética aristotélica é a
felicidade e neste sentido, a comunidade
política, a Cidade, é um instrumento fundamental
para a obtenção da felicidade, não podendo ser
um obstáculo à obtenção da felicidade por parte
de cada um dos cidadãos.
A autoridade do Estado é natural, bem como a
legitimidade das leis.
Para Aristóteles, as mulheres, as crianças, os
estrangeiros e os escravos, devido à sua
condição natural, não eram cidadãos.
“Assim como o homem civilizado é o mais excelente dos animais,
também aquele que não conhece nem leis, nem justiça é o pior de todos.”
Aristóteles
7. John Locke: o Estado contratualista
Para John Locke, existe um estado de natureza em que
os homens podem viver sem estarem submetidos à
autoridade do Estado. Esse estado de natureza é anterior
à constituição da sociedade civil.
A sociedade civil constitui-se com base num contrato
social livremente estabelecido entre os cidadãos, de
acordo com o qual cada um dos indivíduos abdica de
parte da sua liberdade natural para se submeter ao
império da lei e da autoridade do Estado.
8. No Estado de Natureza o indivíduo está na posse
plena da sua Liberdade Natural e mesmo que viva em
associação com outros indivíduos (em famílias ou
tribos), não há nada que se sobreponha à vontade
individual, nem nenhum poder a que os indivíduos
possam recorrer se a sua segurança for ameaçada.
Mesmo assim, os indivíduos no Estado de Natureza
são portadores de direitos (o direito à vida, a liberdade
e à propriedade) e de deveres (de respeitar a vida/a
saúde, a liberdade e a propriedade dos outros), de
acordo com a Lei Natural instituída por Deus.
Mas não há qualquer instância que faça respeitar
esses direitos e restabeleça a justiça de forma
imparcial, caso existam transgressões.
Por isso os indivíduos preferem associar-se de
forma a constituírem sociedades civilizadas, onde a
autoridade do Estado possa garantir a segurança, o
gozo dos direitos naturais e a justiça.
O Estado é o garante da justiça social, pois assume-
se como um poder superior à vontade individual,
capaz de fazer respeitar os direitos individuais, quer
através da formulação de leis, como através da
execução de mandatos e da aplicação da justiça.
9. John Rawls: a justiça como base
da estruturação das sociedades
10. Rawls é contratualista:
Na base da constituição das sociedades está um acordo feito entre
hipotéticos fundadores que, ao estabelecerem os princípios basilares
da estruturação da sociedade, estão sujeitos ao que Rawls chama o
“véu da ignorância”, ou seja, instituem a sociedade sem saberem
quais as condições a que a sociedade irá estar sujeita no futuro.
E nesse sentido, esse “véu da ignorância” garante a equidade da
actuação dos fundadores, pois estes desconhecem qual o seu
estatuto e quais os seus interesses no seio da sociedade. Daí a sua
actuação ser justa e imparcial.
Embora esta situação seja meramente hipotética, servindo de base à
legitimação das decisões constituintes que são tomadas sempre que
os poderes políticos fazem as leis e instituem deveres e direitos (os
agentes do Estado colocam-se no lugar desses hipotéticos
fundadores), a ideia que está na sua base está ligada à forma como
os Estados Unidos da América se instituiriam como um país
independente. Na América os “pais fundadores” são uma referência
sempre que se discutem direitos, liberdade e garantias dos cidadãos.
11. Rawls defende uma concepção de justiça que obedece ao seguinte:
todos os bens sociais primários — liberdades, oportunidades,
riqueza, rendimento e as bases sociais da auto-estima — devem ser
distribuídos de maneira igual a menos que uma distribuição desigual
de alguns ou de todos estes bens beneficie os menos favorecidos.
12. Rawls defende que a sua concepção de justiça assenta nos seguintes
princípios:
Princípio da liberdade igual: A sociedade deve assegurar a máxima liberdade
igual
para cada pessoa compatível com uma liberdade igual para todos os outros.
Princípio da diferença: A sociedade deve promover a distribuição igual da
diferença
riqueza, excepto se a existência de desigualdades económicas e sociais
beneficiar os menos favorecidos.
Princípio da oportunidade justa: As desigualdades económicas e sociais
justa
devem estar ligadas a postos e posições acessíveis a todos em condições de
justa igualdade de oportunidades.
13. Estas concepções acerca da justiça
social e da organização política das
sociedades permitem enfrentar os
problemas que afectam o mundo
contemporâneo?
Aristóteles, Locke e Rawls,
apresentam teorias muito diferentes
e podemos pensar que não há nada
em comum entre elas, ou que de
Aristóteles até Rawls há uma
evolução em direcção a uma
concepção mais humana do Estado
e das relações entre os indivíduos
no seio da sociedade civil.
14. No entanto, hoje vivemos num mundo cada
vez mais globalizado e enfrentamos
problemas que exigem medidas globais.
A civilização Ocidental privilegiou, ao longo
da sua história, uma concepção de
sociedade encarada como um todo isolado
do exterior, entre muralhas e fronteiras,
com um conjunto de instrumentos bélicos e
de repressão interna.
Talvez hoje faça mais sentido falar
numa cidadania global que
reconheça cada ser humano como
um cidadão do mundo, com o
direito a viver onde quiser e a ver a
sua dignidade respeitada em
qualquer parte do mundo...
15. Mas este ideal ainda parece muito longínquo:
Vivemos num planeta dividido em dois blocos separados por um
fosso aparentemente intransponível: o hemisfério sul vive
mergulhado na fome e no desespero, enquanto que o hemisfério
norte, principalmente na sua vertente ocidental, detém uma
riqueza nunca antes vista; enquanto nos países do sul milhões
de pessoas morrem de fome e de doenças facilmente evitáveis,
no norte destroem-se toneladas e toneladas de alimentos que
são produzidos em excesso e não têm quem os compre...
16. Esta situação é sustentável?
É aceitável?
Pode haver justiça social dentro de cada um dos estados,
sem que o mundo seja mais justo?
17. O que é que cada um dos outros
seres humanos é a mais ou a
menos do que nós?
18. A pobreza
aqui...
...ou em qualquer parte do mundo
É aceitável?