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Sheila Raposo – Jornalista

VERGONHA QUE NÃO TENHO
   DE SER NORDESTINA




  Sheila Raposo - Jornalista
       Inês Vieira                    Automático
Cultivado entre os cascalhos do chão seco
e as cercas de aveloz que se perdem no horizonte,
      cresceu, forte e robusto, o meu orgulho
        de pertencer a esse pedaço de terra
                 chamado Nordeste.
Sou nordestina.
         Nasci e me criei
          no coração do
        Cariri paraibano,
     correndo de boi brabo,
brincando com boneca de pano,
    comendo goiaba do pé e
  despertando com o primeiro
       canto do galo para,
       ainda com os olhos
       tapados de remela,
       desabar pro curral
   e esperar pacientemente,
       o vaqueiro encher
      o meu copo de leite,
    morninho e espumante,
    direto das tetas da vaca
       para o meu bucho.
Sou nordestina.
  Falo oxente, vôte e danou-se.
 Vige, credo, Jesus-Maria - José!
Proseio com minha língua ligeira,
   que engole silabas e atropela
     a ortoépia das palavras.
O meu falar é o mais fiel retrato.
Os amigos acham até engraçado
      e dizem sempre que eu
           “saí do mato,
  mas o mato não saiu de mim”.
         Não saiu mesmo!
              E olhe:
  acho que não vai sair é nunca!
Sou nordestina.
             Lambo os beiços quando
        me deparo com uma mesa farta,
              atarracada de comida.
               Pirão, arroz-de-festa,
               galinha de capoeira,
         feijão de arranca com toucinho,
              buchada, carne de sol…
       E mais uma ruma de comida boa,
daquela que, quando a gente termina de engolir,
  o suor já está pingando pelos quatro cantos.
           E depois ainda me sirvo de
          um bom pedaço de rapadura
      ou uma cumbuca de doce de mamão,
            que é pra adoçar a língua.
         E no outro dia, de manhãzinha,
 me esbaldo na coalhada, no cuscuz, na tapioca,
   no queijo de coalho, no bolo de mandioca,
             na tigela de umbuzada,
   na orêa de pau com café torrado em casa!
Sou nordestina.
    Choro quando escuto a voz de
             Luiz Gonzaga
ecoar no teatro de minhas memórias.
        De suas músicas guardo
      as mais belas recordações.
        As paisagens, os bichos,
         os personagens, a fé e
 a indignação com que ele costurava
            as suas cantigas
     e que também são minhas.
Também estavam (e estão) presentes
    em todos os meus momentos,
  pois foi em sua obra que se firmou
     a minha identidade cultural.
Sou nordestina.
   Me emociono quando assisto
          a uma procissão
e observo aqueles rostos sofridos,
   curtidos de sol do meu povo.
     Tudo é belo neste ritual.
 A ladainha, o cheiro de incenso.
         Os pés descalços,
       o véu sobre a cabeça,
      o terço entre os dedos.
    O som dos sinos repicando
         na torre da igreja.
      A grandeza de uma fé
         que não se abala.
Sou nordestina.
      Gosto de me lascar numa farra boa,
         ao som do xote ou do baião.
           Sacolejo e me pergunto:
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além da sanfona, do triangulo e da zabumba?
  No máximo, um pandeiro ou uma rabeca.
Mas dançar ao som desse trio é bom demais.
E fico nesse rela-bucho até o dia amanhecer,
           sem ver o tempo passar e
   tampouco sentir os quartos se arriando,
          as canelas se tremelicando,
          o espinhaço se quebrando
       e os pés se queimando em brasa.
                Ô negócio bom!
Sou nordestina.

       Admiro e me emociono
          com a minha arte,
 com o improviso do poeta popular,
 com a beleza da banda de pífanos,
     com o colorido do pastoril,
com a pegada forte do côco-de-roda,
  com a alegria da quadrilha junina.
   O artista nordestino é um herói,
       e nos cordéis do tempo
       se registra a sua história.
Sou nordestina.
E não existe música mais bonita
       para meus ouvidos
do que a tocada por São Pedro,
     quando ele se invoca
       e mete a mãozona
    nas zabumbas lá do céu,
 fazendo uma trovoada bonita
   que se alastra pelo Sertão,
     clareando o mundo e
   inundando de esperança
     o coração do matuto.
       A chuva é bendita.
Sou nordestina.
Sou apaixonada pela minha terra,
       pela minha cultura,
     pelos meus costumes,
         pela minha arte,
        pela minha gente.
     Só não sou apaixonada
    por uma pequena parcela
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   que se enche de poderes e
       promete resolver os
     problemas de seu povo,
     mentindo, enganando,
           ludibriando,
  apostando no analfabetismo
   de quem lhe pôs no poder,
    tirando proveito da seca
           e da miséria
    para continuar enchendo
 os próprios bolsos de dinheiro.
Mas, apesar de tudo,
eu ainda sou nordestina,
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         Não me envergonho
           da minha história,
     não disfarço o meu sotaque,
    não escondo as minhas origens.
      Eu sou tudo o que escrevi,
   sou a dor e a alegria dessa terra.
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envergonhados de sua nordestinidade.
    Para eles, ofereço estas linhas.
Música: Xote das meninas e Qui nem Jiló
  Marco Pereira e Hamílton Holanda
           Imagens: Internet
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Sou nordestina

  • 1. Sheila Raposo – Jornalista VERGONHA QUE NÃO TENHO DE SER NORDESTINA Sheila Raposo - Jornalista Inês Vieira Automático
  • 2. Cultivado entre os cascalhos do chão seco e as cercas de aveloz que se perdem no horizonte, cresceu, forte e robusto, o meu orgulho de pertencer a esse pedaço de terra chamado Nordeste.
  • 3. Sou nordestina. Nasci e me criei no coração do Cariri paraibano, correndo de boi brabo, brincando com boneca de pano, comendo goiaba do pé e despertando com o primeiro canto do galo para, ainda com os olhos tapados de remela, desabar pro curral e esperar pacientemente, o vaqueiro encher o meu copo de leite, morninho e espumante, direto das tetas da vaca para o meu bucho.
  • 4. Sou nordestina. Falo oxente, vôte e danou-se. Vige, credo, Jesus-Maria - José! Proseio com minha língua ligeira, que engole silabas e atropela a ortoépia das palavras. O meu falar é o mais fiel retrato. Os amigos acham até engraçado e dizem sempre que eu “saí do mato, mas o mato não saiu de mim”. Não saiu mesmo! E olhe: acho que não vai sair é nunca!
  • 5. Sou nordestina. Lambo os beiços quando me deparo com uma mesa farta, atarracada de comida. Pirão, arroz-de-festa, galinha de capoeira, feijão de arranca com toucinho, buchada, carne de sol… E mais uma ruma de comida boa, daquela que, quando a gente termina de engolir, o suor já está pingando pelos quatro cantos. E depois ainda me sirvo de um bom pedaço de rapadura ou uma cumbuca de doce de mamão, que é pra adoçar a língua. E no outro dia, de manhãzinha, me esbaldo na coalhada, no cuscuz, na tapioca, no queijo de coalho, no bolo de mandioca, na tigela de umbuzada, na orêa de pau com café torrado em casa!
  • 6. Sou nordestina. Choro quando escuto a voz de Luiz Gonzaga ecoar no teatro de minhas memórias. De suas músicas guardo as mais belas recordações. As paisagens, os bichos, os personagens, a fé e a indignação com que ele costurava as suas cantigas e que também são minhas. Também estavam (e estão) presentes em todos os meus momentos, pois foi em sua obra que se firmou a minha identidade cultural.
  • 7. Sou nordestina. Me emociono quando assisto a uma procissão e observo aqueles rostos sofridos, curtidos de sol do meu povo. Tudo é belo neste ritual. A ladainha, o cheiro de incenso. Os pés descalços, o véu sobre a cabeça, o terço entre os dedos. O som dos sinos repicando na torre da igreja. A grandeza de uma fé que não se abala.
  • 8. Sou nordestina. Gosto de me lascar numa farra boa, ao som do xote ou do baião. Sacolejo e me pergunto: pra quê mais instrumento nesse grupo além da sanfona, do triangulo e da zabumba? No máximo, um pandeiro ou uma rabeca. Mas dançar ao som desse trio é bom demais. E fico nesse rela-bucho até o dia amanhecer, sem ver o tempo passar e tampouco sentir os quartos se arriando, as canelas se tremelicando, o espinhaço se quebrando e os pés se queimando em brasa. Ô negócio bom!
  • 9. Sou nordestina. Admiro e me emociono com a minha arte, com o improviso do poeta popular, com a beleza da banda de pífanos, com o colorido do pastoril, com a pegada forte do côco-de-roda, com a alegria da quadrilha junina. O artista nordestino é um herói, e nos cordéis do tempo se registra a sua história.
  • 10. Sou nordestina. E não existe música mais bonita para meus ouvidos do que a tocada por São Pedro, quando ele se invoca e mete a mãozona nas zabumbas lá do céu, fazendo uma trovoada bonita que se alastra pelo Sertão, clareando o mundo e inundando de esperança o coração do matuto. A chuva é bendita.
  • 11. Sou nordestina. Sou apaixonada pela minha terra, pela minha cultura, pelos meus costumes, pela minha arte, pela minha gente. Só não sou apaixonada por uma pequena parcela dessa mesma gente que se enche de poderes e promete resolver os problemas de seu povo, mentindo, enganando, ludibriando, apostando no analfabetismo de quem lhe pôs no poder, tirando proveito da seca e da miséria para continuar enchendo os próprios bolsos de dinheiro.
  • 12. Mas, apesar de tudo, eu ainda sou nordestina, e tenho orgulho disso. Não me envergonho da minha história, não disfarço o meu sotaque, não escondo as minhas origens. Eu sou tudo o que escrevi, sou a dor e a alegria dessa terra. E tenho pena, muita pena, dos tantos nordestinos que vejo por aí, imitando chiados e fechando vogais, envergonhados de sua nordestinidade. Para eles, ofereço estas linhas.
  • 13. Música: Xote das meninas e Qui nem Jiló Marco Pereira e Hamílton Holanda Imagens: Internet inesdedes@gmaill.com