O documento discute a avaliação de pacientes urológicos, incluindo sintomas comuns de doenças do trato geniturinário como dor, alterações miccionais e alterações no aspecto da urina. Também aborda instrumentos usados em urologia como cateteres e sondas.
1. Capítulo 1
Avaliação do Paciente Urológico
Milton Borrelli
Milton Borrelli Jr.*
O avanço científico e a facilidade de acesso às informa-
ções nos têm permitido compreender melhor as doenças uro-
Tabela 1 SINTOMAS DE DOENÇAS DO
TRATO GENITURINÁRIO
lógicas. Concomitantemente, são introduzidos meios diagnós-
ticos e terapêuticos cada vez mais eficazes e menos agressi- SISTÊMICAS ESPECÍFICAS
vos aos doentes.
Entretanto, meios diagnósticos mais modernos são one- • Febre • Alterações miccionais
rosos, devendo-se utilizá-los de forma racional. Quanto mais
bem feitos forem a história e o exame físico dos pacientes • Emagrecimento • Alterações no aspecto da urina
melhor será a investigação através de exames laboratoriais. A
objetividade da investigação proporcionará, portanto, um diag- • Hipertensão • Dor: - Renal
nóstico mais rápido e preciso. - Ureteral
• Prostração - Vesical
Sintomas - Prostática
- Testicular
Dor
Comumente, a dor nas afecções urológicas apresenta-se
sob as seguintes formas:
Muitas doenças renais urológicas são indolores ou pouco
nRenal - a cólica nefrética típica origina-se no ângu- sintomáticas, tais como a tuberculose, pielonefrite crônica, cân-
lo costovertebral de um dos lados, ocorrendo como cer e litíase coraliforme.
cólica, e se irradia seguindo o trajeto dos nervos gran-
de e pequeno abdominogenitais, ou seja, obliquamen- nUreteral - Dependendo da posição do cálculo podem-
te para baixo e ipsilateralmente ao lado da dor. Di- se ter manifestações diversas. Quando o cálculo encon-
funde-se pelo flanco atingindo o hipogástrio, testí- tra-se no terço superior do rim a dor é semelhante à
culo ou grandes lábios e face interna e superior da renal. Na porção média, à direita, pode ser confundida
coxa. Pode-se acompanhar de polaciúria, palidez cu- com a dor da apendicite aguda e na porção terminal,
tânea e sintomas gastrintestinais como diarréia e com a da cistite bacteriana, já que observam-se sinto-
vômitos. Ocorre por hipertensão paroxística pielo- mas urinários irritativos associados.
calicial ou pieloureteral por calculose mais freqüen-
temente. Em alguns pacientes observamos tais quei- nVesical - A hiperdistensão vesical é causa de dor ve-
xas após sobrecarga hídrica, podendo levantar sus- sical. Sua sede é suprapúbica e definida caracteristi-
peita de estenose na junção ureteropiélica. Em ou- camente como em peso. Ocorre nas retenções por
tros casos, tais sintomas podem ocorrer durante a aumento prostático, nos casos de litíase vesical e
micção, necessitando-se excluir a presença de reflu- uretral, quando o cálculo impacta-se no colo vesical
xo vesicoureteral. O edema renal causado por infec- e na uretra prostática respectivamente. Infecção é a
ções febris agudas como a pielonefrite e papilite agu- causa mais comum de dor vesical, que se exacerba
da pode gerá-los também. durante o ato da micção.
nProstática - De origem inflamatória na maior parte das
vezes, caracteriza-se por um desconforto perineal e
* Endereço para correspondência: pelos sintomas da dor vesical.
Av. Cons. Rodrigues Alves, 1.021 / 61
04014-010 - São Paulo - SP Quando acompanhada de febre e retenção urinária, sus-
Tel.: (0--11) 575-5053 peita-se de uma prostatite bacteriana aguda, devendo-se evitar
GUIA PRÁTICO DE UROLOGIA 1
2. necessidade imperiosa de urinar é denominada urgência mic-
Tabela 2 SINTOMAS MICCIONAIS
cional. Disúria é quando existe dor ao urinar. Nictúria é a ocor-
rência de micções noturnas, momento no qual o hormônio
IRRITATIVOS OBSTRUTIVOS antidiurético está em ação.
• Disúria • Diminuição do jato urinário nSintomas obstrutivos - comumente relacionados ao
efeito mecânico da próstata. Outros fatores que pode-
• Polaciúria • Hesitação riam contribuir para o surgimento desses sintomas se-
riam as estenoses de uretra e os distúrbios neurológi-
• Urgência miccional • Gotejamento terminal cos que determinam uma obstrução funcional.
• Nictúria • Sensação de esvaziamento Alterações no aspecto da urina
incompleto
Normalmente, adultos urinam de 700 a 2000 ml/dia. A
coloração pode ser clara ou amarelo-escura, dependendo de
sua concentração. A excreção de pigmentos alimentares ou
corantes presentes em algumas drogas pode determinar alte-
rações em sua coloração. Excluídas tais possibilidades, as al-
o toque prostático e o alívio vesical por via uretral. A manipu- terações de coloração sugerem presença de doenças. A aná-
lação inadvertida pode gerar bacteriemia. lise do sedimento urinário determinará a causa. Pode-se ob-
servar hematúria, hemoglobinúria, mioglobinúria e piúria.
nTesticular - a dor testicular pode ser causada por trau-
ma ou por processos infecciosos. Nesses casos a dor é nHematúria - a coloração determinada pela presença
intensa e irradia-se para o abdome, em especial o hipo- de sangue dependerá da acidez da urina, da quantidade
gástrio e fossas ilíacas. de sangue e da origem do mesmo. Denomina-se mi-
croscópica quando determinada apenas através de exa-
O aumento do volume da bolsa testicular por hidrocele mes laboratoriais. A associação da hematúria e dor su-
ou o aumento do testículo por câncer, normalmente, não de- gere litíase ou eliminação de coágulos. Em associação
terminam dor. Quadros de dor de instalação súbita sugerem a disúria sugere processo infeccioso ou, menos freqüen-
torção testicular e devem ser investigados prontamente. A dor temente, litíase. Quando inicial, sugere uma origem ure-
testicular pode ser o primeiro sintoma de uma hérnia inguinal. tral ou vesical. Se terminal, sua origem poderá ser ve-
sical ou de uretra posterior. Quando a hematúria ocor-
nEpididimária - O epidídimo é sítio principalmente de re durante toda a micção, é denominada total, e sua
processos inflamatórios. Pode ou não haver compro- origem é invariavelmente renal. Não se deve esquecer
metimento testicular concomitante. Nos jovens, tais pro- dos distúrbios de coagulação ou de drogas, como a ci-
cessos associam-se às doenças sexualmente transmis- clofosfamida e anticoagulantes, que podem justificar
síveis, e, nos idosos, à hiperplasia benigna da próstata, o quadro.
tendo, portanto, agentes bacterianos distintos.
A hematúria sem dor pode ser de origem renal, vesical
Alterações miccionais ou prostática. Na ausência de cilindros hemáticos ou dismor-
fismo eritrocitário, que caracterizaria doença glomerular, a
As alterações miccionais caracterizam-se por duas clas- hematúria silenciosa pode ser causada por tumor renal ou ve-
ses distintas de sintomas (tabela 2). A incontinência tem capí- sical. Os sangramentos tumorais são normalmente intermi-
tulo à parte. tentes e, na sua primeira manifestação, devem ser investiga-
dos. Outras causas possíveis seriam a doença policística, cis-
nSintomas irritativos - são geralmente secundários a tos renais, hiperplasia prostática benigna e anemia falcifor-
uma alteração vesical. O número de micções diárias me.
dependerá da quantidade de líquido ingerido, mas em
média urina-se de quatro a seis vezes ao dia. Infecção, Conclusão
corpos estranhos (normalmente observados em pacien-
tes psiquiátricos), cálculos, tumores (carcinoma in situ Ao final da anamnese, através da disciplina do raciocí-
de bexiga), doenças neurológicas de sistema nervoso nio, formulamos uma interpretação fisiopatológica e prope-
central ou medulares podem causar tais sintomas. dêutica dos sintomas, estabelecendo possibilidades. Só então
passaremos ao exame físico. Os exames subsidiários serão
Quando há um aumento na freqüência não-associado a pedidos depois, no sentido de confirmar ou complementar
um aumento do volume, caracterizamos como polaciúria. A nossas suspeitas.
2 GUIA PRÁTICO DE UROLOGIA
3. Capítulo 2
Instrumentação
Carlos Ary Vargas Souto
Introdução Figura 1
Queixas urológicas acompanham a humanidade des-
de sua origem. A inventividade do homem, no entanto, es-
teve à altura do desafio. Cateteres sobreviveram aos sécu-
los como testemunhas da solução encontrada para as re-
tenções urinárias (figura 1).
A litotomia (figura 2) é uma operação incrível já pra-
ticada pelos gregos, como se vê no juramento de Hipócra-
tes. Os cálculos vesicais eram muito freqüentes até o sécu- Ilustração de manuscrito
lo XIX. Seu tratamento era feito cortando-se o períneo até mostrando cateterização
encontrar-se o cálculo, que era imobilizado pelo cirurgião para cálculos vesicais.2
por via transretal, o que é surpreendente numa era pré-anes-
tesia e na ausência de antibióticos. Não é de se admirar Figura 2
que a mortalidade fosse de “apenas” 40%!1 No mesmo sé-
culo XIX surgiu a litotripsia realizada através de instru-
mentos introduzidos pela uretra. O cálculo era apreendido
às cegas e esmagado. Isto representou um progresso imen-
so. O mais famoso dos cirurgiões desta especialidade na
época era Jean Civiale (1792-1867) (figura 4), que rece- Paciente na posição
de litotomia para
beu leitos no hospital Necker, em Paris, para internar seus
operação de remoção
pacientes. Surgiu assim o primeiro Serviço de Urologia do de cálculo vesical.3
mundo.
Figura 3
Cateteres
A cateterização uretral pode ser realizada com finali-
dade diagnóstica ou terapêutica. A coleta de urina para cul- Litotripsia
tura em crianças antes do controle miccional é feita com transuretral com
punção suprapúbica; quando a bexiga está vazia, no entan- instrumentos
desenvolvidos por
to, a passagem de um cateter uretral é uma opção. A medida
Jean Civiale. 4
do resíduo pós-miccional se faz pela ecografia, porém este
equipamento pode não estar disponível, exigindo a catete-
rização. A uretrocistografia no adulto é feita injetando-se o Figura 4
contraste ao nível do meato uretral. Na criança é preciso
passar um cateter até a bexiga. No transoperatório de di-
Jean Civiale, chefe do
primeiro Serviço de Urologia
do mundo.
Endereço para correspondência:
Rua 24 de Outubro, 435 - sl. 212
90510-002 - Porto Alegre - RS
Tel.: (0--51) 222-0471
Fax.: (0--51) 222-8610
GUIA PRÁTICO DE UROLOGIA 3
4. Figura 5 Sonda de Nélaton.
Figura 6 Sonda de Foley 2 e 3 vias.
Figura 7 Sonda filiforme e Sonda
dilatadora de Philips.
Figura 8 Sonda metálica de Beniqué.
Figura 9 Sonda de Pezzer.
Figura 10 Sonda de Malecot.
versas cirurgias faz-se a sondagem vesical tanto para mo- Existem sondas metálicas, maciças, chamadas
nitorar a diurese como para melhor identificar os órgãos “beniqués” (figura 8), também usadas para dilatar a ure-
pélvicos. O cateterismo terapêutico tem várias indicações. tra. Estas sondas são numeradas conforme seu calibre, de
A primeira delas é o alívio da retenção urinária provocada acordo com uma escala própria – a escala Beniqué, que é o
pela hiperplasia da próstata, estenose uretral e tampona- dobro da escala Charriere. Assim, um beniqué 40 equivale a
mento vesical por coágulos. O cateterismo intermitente é o um cateter 20 Fr.
tratamento de escolha da bexiga neurogênica. Há situações em que é preciso drenar a bexiga por via
Os cateteres, ou sondas, são numerados de acordo com suprapúbica. Podemos usar então uma sonda de Foley, com
a escala Charriere ou francesa (Fr), sendo que 1 Fr equiva- balão, ou as sondas autofixadoras de Pezzer (figura 9) e
le a um diâmetro de 0,33 mm. Malecot (figura 10).
A sonda usada para o cateterismo de alívio é a Nélaton
(figura 5), feita de látex e com abertura lateral. Para o ca- Endoscopia
teterismo de demora se usa a sonda de balão, ou Foley, que
é muito versátil e da qual há dois tipos: duas e três vias O número de instrumentos endoscópicos é muito gran-
(f igura 6). A sonda de três vias é usada para a lavagem de. Descreveremos apenas aqueles que usamos no dia-a-
contínua da bexiga na vigência de hematúria, especialmente dia.
no pós-operatório de cirurgia da próstata. As sondas plás- O uretrocistoscópio é o grande instrumento diagnós-
ticas são também usadas, especialmente para crianças. tico do urologista. Pode ser rígido (figura 11) ou flexível
Em caso de estenose uretral é necessário fazer uma (figura 12). O último permite examinar o paciente em de-
dilatação uretral e se usam as filiformes, sondas finas de cúbito dorsal, mas sua óptica é inferior. Existem várias
vários calibres. A melhor é a 3 Fr, que numa extremidade marcas de endoscópio rígido, mas suas características são
termina por um parafuso com rosca fêmea que permite semelhantes. Há bainhas de diversos calibres, e as mais
acoplar a sonda Philips com rosca macho (figura 7). Há usadas são a 15,5 ou a 17 Fr. Um mandril, uma ponte, uma
cateterismo em feixe se uma ou várias filiformes são intro- óptica 30o e outra 70 o completam o aparelho. Após ade-
duzidas na uretra. Quando uma delas ultrapassa a zona es- quada anestesia local o aparelho é introduzido sob visão
treitada, sondas de Philips, de calibre crescente, são no homem, usando-se a óptica 30o. Na mulher, como a ure-
atarrachadas na filiforme e o comboio filiforme-Philips é tra é curta e reta, passa-se o cistoscópio às cegas, com o
avançado pela uretra, realizando a dilatação. mandril colocado. Na uretra masculina aprecia-se o cali-
4 GUIA PRÁTICO DE UROLOGIA
5. Figura 11 Figura 13
Ponte ou
unha de
Albarran.
Figura 14
Uretrocistoscópio.
Figura 12
Sonda de Dormia.
Figura 15
Uretroscópio flexível 1.
bre, o veru montanum, a uretra prostática e o colo vesical. Uretrótomo óptico com a faca de Sachse.
Uma vez na bexiga, mede-se o resíduo urinário, se houver.
A seguir a bexiga é distendida com água estéril ou soro Figura 16
fisiológico até que o paciente acuse vontade forte de uri-
nar. Anota-se este volume como a capacidade vesical. Toda
a bexiga é examinada com a óptica 70o; os meatos ureterais
são observados bem como a ejaculação da urina. Ao reti-
rar-se o aparelho, o colo vesical e a uretra são examinados
na mulher. O cistoscópio é também utilizado para
cateterizar o ureter, usando-se um acessório chamado ponte
ou unha de Albarran (figura 13), que permite sob visão
dirigir a sonda ureteral para dentro do meato. Ao injetar
contraste teremos a ureterografia e a pielografia ascenden-
te (retrógrada). A sonda de Dormia (figura 14) é um cate-
ter ureteral que contém em sua luz uma pequena cesta de
Ressector endoscópico.
fios de aço. Ultrapassado o cálculo ureteral pela sonda, a
cesta é aberta. Sob controle fluoroscópico, tenta-se aprisi-
onar e extrair o cálculo. Figura 17
Os estreitamentos de uretra de difícil manejo são tra-
tados por uretrotomia, que consiste em cortar a frio e sob
visão o anel fibroso da estenose uretral. Para isso há um
endoscópio rígido com óptica de 0o, munido da faca móvel
de Sachse (figura 15).
A cirurgia endoscópica da próstata e bexiga se cons-
titui no dia-a-dia do urologista. Vários instrumentos e mo-
dificações do cistoscópio foram desenvolvidos com esta Litotritor endoscópico vesical.
GUIA PRÁTICO DE UROLOGIA 5
6. Figura 18 Figura 23
Fonte de ultra-som e aspirador para litotripsia endoscópica.
Figura 19 Nefroscópio percutâneo com equipamento de litotripsia ultra-
sônica e dilatadores telescópicos.
finalidade. O primeiro deles é o ressector endoscópico (fi-
gura 16). É um aparelho formado por uma bainha, um
mandril e um elemento de trabalho. Este último é um ins-
Fonte de energia eletroidráulica endoscópica. trumento complexo ao qual se adapta uma alça metálica e
um fio que é conectado ao bisturi elétrico. Este bisturi tem
um pedal que permite ao cirurgião cortar ou coagular. Tem
Figura 20 também um mecanismo de mola que permite mover livre-
mente a alça. Por dentro do elemento de trabalho passa-se
uma óptica de 30o. Como no cistoscópio, há um sistema de
irrigação que permite a visão interna da bexiga, próstata e
uretra. O líquido de irrigação tem que ser não-condutor de
eletricidade. A água estéril pode ser utilizada. No entanto,
pode ocorrer raramente absorção de líquido e provocar a
Ureterorrenoscópio tipo Perez-Castro, calibre 12,5 Fr. síndrome de intoxicação hídrica, que é muito grave, por
Fabricação Storz. isso usamos a solução de glicina. O material ressecado se
deposita no fundo da bexiga e precisa ser extraído por as-
piração. Para isso há um aparelho engenhoso, conhecido
Figura 21 como aspirador de Ellik, que retira todo o material que vai
para exame anatomopatológico e evita obstrução do cate-
ter no pós-operatório.
Guia angiográfica metálica e flexível. O cálculo vesical tem novas tecnologias à disposição.
O litotritor vesical (figura 17) permite aplicar, sob visão, a
broca ultra-sônica ao cálculo (figura 18), que é fragmen-
Figura 22 tado. Os fragmentos são retirados com aspirador de Ellik.
Outra forma de energia para tratar a litíase vesical é a
eletroidráulica (figura 19), que é transmitida através de um
“probe” semelhante a um cateter ureteral, o que significa
uma vantagem, pois passa através de um cistoscópio, en-
quanto o litotritor é um aparelho mais traumático para a
uretra. O líquido de irrigação para o eletroidráulico tem
que ser o soro fisiológico. O velho litotritor mecânico ain-
da é usado nos hospitais que não dispõem de versões mo-
dernas dos aparelhos. Ele é eficiente, mas muito traumáti-
co.
O ureteroscópio alargou o horizonte do urologista, pois
Sonda ureteral dilatadora com balão. não se podia enxergar além da bexiga. É um instrumento lon-
6 GUIA PRÁTICO DE UROLOGIA
7. Figura 24
Conjunto de
dilatadores e bainhas
de Amplatz.
go e fino que permite ver o interior do ureter e, às vezes, a localiciais são acessíveis ao exame. O acesso percutâneo ao
pelve renal. Tenho experiência com o ureterorrenoscópio Storz rim foi um subproduto da radiologia intervencionista. O ure-
(figura 20), calibre 12,5 Fr. A ureteroscopia começa com o ter é cateterizado para a realização de uma pielografia ascen-
cateterismo do ureter com uma guia angiográfica 0,38 pole- dente. Com o auxílio de um arco em C (fluoroscopia), intro-
gada (figura 21). A seguir, passa-se um cateter ureteral de ba- duz-se uma agulha de aortografia (TLA) que penetra no cáli-
lão (figura 22) ao redor da guia para dilatar e permitir a entra- ce escolhido. Ao retirar-se o mandril, a urina sai, comprovan-
da do endoscópio no ureter. Os aparelhos mais novos são mais do sua localização dentro da via excretora. Uma guia angio-
finos e mais curtos, o que facilita o manejo, uma vez que o gráfica de 0,38 polegada é introduzida e guiada para o ureter.
ureteroscópio é mais útil no terço inferior e, sendo mais fino, Ao redor desta guia passam-se cateteres dilatadores de até 10
não precisa dilatar o ureter. Não tenho experiência com o ure- Fr. Neste ponto usamos o mandril metálico, ao redor do qual
teroscópio flexível. A ureteroscopia é usada principalmente passamos os dilatadores de Amplatz e por fim a bainha de
para tratar o cálculo ureteral, que é retirado sob visão. É tam- Amplatz 33 Fr. (figura 24), que permite a passagem folgada
bém usada para o diagnóstico de um defeito de enchimento no de um nefroscópio. Através deste retiram-se os coágulos e os
ureter. Na suspeita de tumor, pode-se fazer biópsia endoscó- cálculos. Quando estes não passam pela bainha são fragmen-
pica. tados usando-se o ultra-som ou o eletroidráulico. O procedi-
O nefroscópio (figura 23) derrubou a última bar reira mento termina com a colocação de uma sonda de nefrostomia,
à endoscopia do aparelho urinário. Hoje, as cavidades pie- que em geral permanece por 24 horas.
Bibliografia recomendada
1. JARDIN A. The history of urology in France. In: Mattelaer JJ (ed.). De Historia Urologiae Europeae
3. 1996. European Association of Urology. Kortrijk, Bélgica, p. 16.
2. LYONS AS, PETRUCELLI RJ. Medicine. Museu Britânico de Londres. Harry N. Abrams, Inc.,
Publishers, New York, 1978, p. 396.
3. LYONS AS, PETRUCELLI RJ. Medicine. Dez Livros de Cirurgia (1564), de Ambroisi Paré. New York
Academy of Medicine. Harry N. Abrams, Inc., Publishers, New York, 1978, p. 396.
4. MATTELAER JJ. De Historia Urologiae Europeae, Vol. 3. Historical Committee European Association
of Urology, p. 17.
GUIA PRÁTICO DE UROLOGIA 7
8. Capítulo 3
Radiologia Convencional
José Carlos Souza Trindade
Introdução Os contrastes atualmente em uso são iodetos orgânicos,
e o conteúdo em iodo é que confere a radiopacidade. Existem
As técnicas radiológicas convencionais podem ser repre- dois tipos de meios radiopacos: os iônicos e os não-iônicos.
sentadas pela radiografia simples do abdome, urografia ex- Os iônicos, utilizados nos últimos 40 anos, têm alta
cretora, nefrotomografia, pielografia retrógrada, cistografia, osmolaridade e são representados por diatrizoatos e iotalama-
uretrocistografia miccional e uretrografia retrógrada. A arte- tos. Os não-iônicos têm baixa osmolalidade, estando disponí-
riografia, a deferentografia e a radiografia dos cistos renais veis o iopamidol e o ioexol, mais indicados para uso mielo-
por punção percutânea fazem parte das técnicas radiológicas gráfico e intravascular.
intervencionistas. Na experiência clínica, os não-iônicos provocam 20% a
Antes do advento dos novos métodos de imagem, isto é, da 30% menos reações que os iônicos, respectivamente 3,13%
ultra-sonografia, da tomografia computadorizada, da ressonân- versus 12,66%. A incidência de reações graves é de 0,22% para
cia magnética e de técnicas em medicina nuclear, o raio X sim- os contrastes iônicos e de 0,04% para os não-iônicos. As taxas
ples e a urografia excretora (UGE) eram o ponto de partida no de mortalidade são de 1:40.000 para os iônicos e de 1:160.000
diagnóstico por imagem do trato urinário. Nos últimos 20 anos para os não-iônicos. O fator limitante ao uso generalizado dos
houve diminuição do uso da radiologia convencional. contrastes não-iônicos é o elevado custo dos mesmos.
A seleção dos exames a serem solicitados, bem como a A dose dos contrastes iônicos para adultos é de 400 mg
ordem de realização dos mesmos, vai depender da hipótese de iodeto por kg de peso corpóreo, o que representa uma dose
diagnóstica principal, dos diagnósticos diferenciais a serem média total de 20 a 30 g de iodeto. Nas crianças, as doses são
excluídos, do provável tratamento a que o paciente deverá ser calculadas em função da superfície corpórea. O limite máxi-
submetido e do valor informativo dos diferentes métodos de mo utilizado em prematuros e recém-nascidos é de 4 ml/kg de
imagem atualmente disponíveis. peso corpóreo para crianças com menos de 2,5 kg.
Neste capítulo, daremos destaque às principais informa-
ções fornecidas pelos métodos radiológicos convencionais no Reações aos contrastes
diagnóstico das patologias mais freqüentes do trato urinário,
comparando-os com outros métodos de imagem e sugerindo a As reações aos contrastes têm gravidade variável. As rea-
seqüência exploratória mais adequada nas diferentes situações ções brandas, em geral autolimitadas, ocorrem em 5% a 10%
estudadas. dos casos e são representadas por urticária, prurido, náuseas
ou vômitos.
Contrastes radiológicos Há reações graves, com instalação abrupta de colapso car-
diovascular, que podem progredir rapidamente até a parada
O desenvolvimento da radiologia convencional e, em cardíaca se não forem tratadas imediatamente. Outras vezes,
particular, da UGE está intimamente associado ao aperfeiçoa- mais raramente, as manifestações são de colapso do sistema
mento dos meios de contraste radiopacos. Estes, uma vez ad- respiratório ou do sistema nervoso central, que também po-
ministrados intravenosamente, devem ser rapidamente dem progredir para a morte.
excretados por filtração glomerular, transitar ao longo dos O mecanismo dessas reações é obscuro. Elas não são rea-
néfrons e ser eliminados através dos cálices. Nesta etapa são ções alérgicas clássicas do tipo antígeno-anticorpo. Por isso
concentrados cerca de 50 vezes e produzem pielogramas rela- não existem testes seguros indicativos da probabilidade de
tivamente densos, tornando visíveis as vias excretoras. ocorrência de reações importantes ou tratamentos profiláti-
cos eficazes.
Os pacientes com maior risco de apresentar reações são:
Endereço para correspondência:
Rodovia Domingos Sartori, km 1 • os que tiveram reação anterior ao contraste;
Departamento de Urologia
• os asmáticos;
18607-741 - Botucatu - SP
Tel.: (0--14) 820-6271 • os portadores de doença grave renal ou cardíaca;
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9. • os portadores de hiperviscosidade (macroglobulinemia O contraste é, em geral, injetado por via intravenosa em
ou mieloma múltiplo); bolo (vida média plasmática de 30 minutos), mas pode-se op-
tar pela injeção gota a gota (vida média plasmática de várias
• as desidratações graves;
horas). Esta última técnica distende mais o sistema pielocali-
• os pacientes ansiosos. cial e os ureteres, permitindo boa visualização de toda a via
excretora por tempo mais prolongado, não sendo necessário o
Dependendo da gravidade das reações, as drogas mais uso de compressão abdominal.
utilizadas no tratamento são: difenidramina, epinefrina, Eventualmente são realizadas radiografias oblíquas para
aminofilina, cimetidina, dopamina, atropina e oxigenoterapia. melhor definição de lesões ureterais duvidosas, para diferen-
Também está indicada a intubação se houver risco de obstrução ciação de massas ou calcificações intrínsecas ou extrínsecas
das vias aéreas. Os corticosteróides administrados dois ou três nos rins ou ureteres, ou para demonstração de alterações nas
dias antes do exame parecem exercer algum efeito protetor. faces póstero-laterais da bexiga.
Radiografias tardias podem ser obtidas entre uma e 48
Principais exames radiológicos horas após administração do contraste. São indicadas em ca-
do trato urinário sos de nefrograma retardado para identificar o local da obs-
trução do trato urinário ou na avaliação de hidronefroses de
Radiografia simples longa duração. A ausência total de nefrograma na fase preco-
Radiografia simples, em decúbito dorsal, incluindo rins, ce da UGE não justifica a solicitação de radiografias tardias.
projeções ureterais e vesical, constitui o exame inicial de qual- A administração do contraste intravenoso acarreta im-
quer avaliação radiológica do trato urinário. portantes trocas iônicas e de fluidos nos espaços intra e extra-
Este exame fornece informações das sombras renais e vasculares. Há rápido aumento da osmolaridade plasmática, e
avalia o tamanho, a forma e a posição dos rins. Pode revelar o volume sangüíneo aumenta cerca de 16%, bem como o dé-
cálculos urinários radiopacos (nos rins, ureteres ou bexiga) ou bito cardíaco. As alterações hemodinâmicas consistem de va-
calcificações de cistos renais, de nefrocalcinoses, de tumores, sodilatação periférica, hipotensão transitória, aumento da pres-
de gânglios linfáticos, de flebólitos ou calcificações vascula- são na artéria pulmonar e taquicardia. Devido aos agentes
res (aneurismas calcificados da artéria renal). quelantes existentes nos contrastes, pode ocorrer discreta
As sombras do músculo psoas são normalmente bem hipocalcemia, que é responsável por eventuais crises de tetania.
delineadas. O apagamento do psoas ocorre em abscessos As alterações fisiológicas, provocadas principalmente pe-
perinéfricos, nos grandes tumores renais, nos processos infla- los contrastes iônicos, podem gerar situações de risco em pa-
matórios do retroperitônio, nas pancreatites agudas, nas psoites cientes com descompensação cardíaca, em diabéticos
e nas apendicites retrocecais. azotêmicos, em portadores de mieloma múltiplo, nos hiperu-
As malformações ósseas da coluna ou da pélvis, tais como ricêmicos ou em pacientes desidratados, principalmente crian-
espinhas bífidas, agenesias do sacro ou afastamento do púbis ças. Os contrastes têm discreta ação nefrotóxica, que se acen-
na extrof ia vesical, são importantes elementos diagnósticos. tua em certas condições clínicas, sobretudo na fase aguda das
As lesões metastáticas nos ossos (osteolíticas ou osteoblásti- pielonefrites.
cas), as fraturas ou os desvios antálgicos da coluna vertebral Em pacientes com insuficiência renal, a ultra-sonografia
constituem dados auxiliares na elaboração de hipóteses diag- é o método ideal de triagem para excluir hidronefrose. Se for
nósticas. utilizada a UGE, deve-se aumentar a dose do contraste (1,5 a
2 ml/kg de peso) para obter melhor visualização do trato uri-
Urografia excretora nário. Entretanto, nesses casos há elevação temporária dos ní-
A urografia excretora (UGE) é a principal indicação quan- veis de uréia e de creatinina sangüínea.
do se pretende a visualização do sistema pielocalicial e dos ure- Nos pacientes com lesão do parênquima renal, quanto
teres na avaliação de cálculos ou de infecções do trato urinário. maior o nível de creatinina pior será a qualidade da UGE. Na
A seqüência radiográfica é variável conforme os objeti- prática, níveis acima de 4,0 mg/100 ml contra-indicam a soli-
vos investigatórios. Após o raio X simples e a injeção intrave- citação do exame.
nosa de contraste radiológico, são em geral realizadas radio- Quando a causa da insuficiência renal é obstrutiva e não
grafias nos seguintes tempos: parenquimatosa, pode-se demonstrar o local da obstrução em
1 - Um minuto após injeção de contraste; radiografias tardias mesmo que os níveis de creatinina san-
güínea estejam mais elevados.
2 - Três minutos;
Quando um rim não excreta o meio radiopaco, diz-se que
3 - Cinco minutos; há exclusão renal ou que o rim não é visualizado. Os termos
4 - Dez minutos; rim não-funcionante e não-excretante não são adequados por-
5 - 20 minutos; que só a UGE não permite este tipo de conclusão.
Atualmente, a UGE é o método de imagem indicado para
6 - 35 minutos;
a investigação das seguintes situações:
7 - Raio X em pé (casos suspeitos de ptose renal);
8 - Raio X pós-miccional (avaliação do volume residual). • Casos de cálculos conhecidos ou suspeitados;
10 GUIA PRÁTICO DE UROLOGIA
10. • Obstrução ureteral; liação da bexiga e da uretra. O controle fluoroscópico aumen-
ta a sensibilidade do exame, que mostra a bexiga na fase de
• Avaliação de anomalias congênitas do trato urinário;
enchimento retrógrado e depois, juntamente com a uretra, na
• Avaliação de infecções urinárias; fase miccional.
Muitas vezes, principalmente em homens, a UCM deve
• Suspeitas de tumores intraluminares (piélicos ou
ser complementada com a uretrografia retrógrada para mos-
ureterais);
trar de modo mais evidente estenoses ou patologias na uretra
• Avaliação de hematúrias macroscópicas ou microscó- anterior.
picas; Embora os princípios técnicos sejam os mesmos, exis-
tem peculiaridades na realização da UCM em crianças e em
• Casos que necessitam de investigação completa do tra-
adultos. Nos recém-nascidos, a capacidade vesical é de 30 a
to urinário;
50 ml. Em meninas, após os três anos, a capacidade vesical é
• Complementação da avaliação do trato urinário quan- de 200 a 250 ml e aumenta após os 12 anos. Nos meninos, a
do outros métodos de imagem fornecerem informações capacidade vesical é menor, isto é, 100 a 150 ml aos cinco ou
duvidosas. seis anos, atingindo 250 ml em idades mais avançadas. Nos
adultos, a capacidade vesical varia entre 450 e 500 ml. Na
Nefrotomografia infância, o contraste é diluído a 30%, e em adultos, a 50% ou
É indicada quando se pretende obter maiores detalhes de 60%.
lesões parenquimatosas ou deformidades caliciais ou piélicas. Inicialmente é realizada radiografia ântero-posterior em
É realizada durante a UGE, no período entre 1 e 5 minutos decúbito dorsal quando a bexiga está cheia; a seguir, durante a
após a injeção do contraste. São feitos no mínimo três cortes fase miccional, são feitas radiografias nas posições oblíquas
tomográficos do rim com intervalos de 1 cm. Planigrafias adi- direita e esquerda, enquadrando todo o abdome, inclusive os
cionais podem ser realizadas a critério do radiologista. rins, para verificar a existência de refluxo vesicoureteral.
Se houver refluxo, na dependência da contrastação do
Pielografia retrógrada ureter ou de todo o sistema coletor e em função da intensidade
Nesta técnica, após cateterização de um ou de ambos os das deformidades demonstradas nos ureteres ou no sistema
ureteres, a via excretora (ureter, pélvis, infundíbulo e cálices) pielocalicial, este pode ser classificado nos graus I, II, III, IV
é demonstrada pela injeção cuidadosa de contraste radiopaco ou V conforme classificação internacional amplamente utili-
,
(diluído a 20% ou 30%), de preferência sob controle fluoros- zada.
cópico. Na infância, as principais indicações de UCM são:
Atualmente, por se tratar de método invasivo e com o
advento dos novos métodos de imagem, é menos utilizado do • Infecções urinárias recorrentes em meninas ou meninos,
que no passado. Entretanto, ainda existem situações de indi- para demonstrar a presença ou não de refluxo vesicoure-
cação precisa, principalmente quando há necessidade de se teral (30% a 50% dos casos);
visualizar o sistema coletor e a UGE não demonstrou essas • Demonstração ou avaliação de anomalias congênitas
estruturas adequadamente. do trato urinário inferior. O refluxo é freqüente em rins
As principais situações são: ectópicos, na duplicidade renal, na meningomielocele,
• Avaliação de causas de hematúria; na agenesia sacral e nas anomalias retais;
• Defeitos persistentes de enchimento do ureter ou do • Crianças com dificuldade miccional, tais como dor, jato
sistema coletor; fino, gotejamento, freqüência e urgência;
• Inexplicável citologia positiva para tumor, colhida do • Investigar dilatações do sistema coletor demonstradas
trato urinário superior; na ultra-sonografia ou na UGE. Nesses casos a UCM
pode revelar refluxo vesicoureteral ou obstrução na jun-
• Fístulas ou obstruções envolvendo o ureter; ção ureteropiélica ou ureterovesical;
• Divertículos ureterais.
• Reavaliação periódica de pacientes em tratamento de
refluxo (clínico ou cirúrgico). Nesses casos pode-se so-
Durante a realização do exame, há risco de desenca-
licitar, no lugar de UCM, cintilografia vesical com ra-
deamento de reações alérgicas pela absorção do contraste
dioisótopos, método menos invasivo e dose de irradia-
ou a possibilidade de sépsis em casos de infecção urinária
ção menor;
ativa pela penetração de bactérias na corrente sangüínea ou
linfática. • Pré-operatório de cirurgia do trato urinário inferior ou
na avaliação pós-operatória de cirurgias da uretra.
Uretrocistografia miccional
A uretrocistografia miccional (UCM) é o exame univer- No adulto, além de situações semelhantes às da infância,
salmente indicado, tanto em crianças como em adultos, na ava- existem algumas condições em que a UCM está indicada:
GUIA PRÁTICO DE UROLOGIA 11
11. • Quando a UGE revela sinais de nefropatia de refluxo ou se é incompleta, evitando-se tentativas de sondagem ure-
em um ou em ambos os rins; tral às cegas, que podem ampliar a lesão uretral.
Em mulheres, a principal indicação é nas suspeitas de
• Seguimento de pacientes com lesão medular que apre- divertículo uretral não-visualizado pela uretroscopia. A técni-
sentam dificuldades urinárias; ca de injeção do contraste para preencher a uretra é mais difí-
cil, devendo ser utilizadas sondas especiais que fechem simul-
• Pré-operatório do transplante renal para avaliar a exis- taneamente o colo vesical e o meato uretral externo.
tência de refluxo ou de lesões obstrutivas da bexiga ou
da uretra que devem ser corrigidas para não compro- Principais indicações dos
meter o prognóstico do transplante;
métodos de imagem em urologia
• Previamente à instilação vesical de substâncias irritan-
tes, como formalina, para excluir existência de refluxo Na avaliação das diversas patologias do trato urinário, mui-
vesicoureteral; tas vezes é necessária a utilização de diferentes métodos de ima-
gem para o estabelecimento de um diagnóstico definitivo.
A definição de uma ordem racional de solicitação desses
• Avaliação de lesões traumáticas do trato urinário inferior.
exames auxiliares deve levar em consideração o valor infor-
mativo do método, a disponibilidade do mesmo em nosso am-
Cistografia biente de trabalho, o grau de invasibilidade da técnica utiliza-
A bexiga pode ser avaliada radiologicamente durante a da e a relação custo/benefício para o paciente.
realização da UGE, nas radiografias mais tardias de enchi- O estabelecimento dessa rotina de investigação é extre-
mento vesical ou nas uretrocistografias miccionais. mamente complexo, e há inúmeros aspectos controvertidos
Atualmente, com o advento da ultra-sonografia associa- nessa área de conhecimento. Deve-se acrescentar a essa difi-
da à capacidade resolutiva das cistoscopias, as indicações de culdade o acelerado avanço tecnológico ocorrido nos últimos
cistografias isoladas foram sensivelmente reduzidas. anos no campo da imagenologia, determinando que o valor
Este exame pode ser solicitado em casos de trauma com relativo desses métodos investigatórios se alterem em interva-
suspeita de ruptura de bexiga (intra ou extraperitoneal) ou na los relativamente curtos, antes mesmo que conceitos anterior-
avaliação de tumores, divertículos, hérnias inguinais com mente firmados tenham sido completamente sedimentados.
protrusão da bexiga ou no diagnóstico de cálculos vesicais Numa tentativa de orientação didática, apresentamos a
radiotransparentes. seguir uma tabela que tem por objetivo estabelecer uma or-
Na propedêutica da incontinência urinária feminina po- dem de solicitação dos diferentes métodos de imagem na in-
dem ser realizadas cistografias com correntinha. Com a pa- vestigação das principais patologias urológicas.
ciente em pé, são feitas radiografias ântero-posteriores e de Ao estabelecer-se esse critério de prioridades deve-se res-
perfil, em repouso e com manobra de valsava, para avaliação saltar que nem sempre o método sugerido na investigação ini-
da posição anatômica da junção uretrovesical e dos ângulos cial é o que oferece maior valor informativo, mas em geral, é
uretrovesicais anteriores e posteriores. Em condições normais, o menos invasivo, o mais simples, o menos dispendioso ou o
o assoalho vesical se projeta 0,5 a 1 cm acima da sínfise púbica. mais freqüentemente disponível em nosso meio.
Mais recentemente, com o advento da videourodinâmica Na leitura da tabela apresentada, deve-se considerar que
e com os novos conceitos fisiopatológicos da incontinência a ordem de solicitação dos exames está discriminada pelas
urinária de esforço, houve sensível redução das indicações das letras A, B, C, D e E, sendo A o método de primeira indicação
cistografias nesta patologia. e E o de última solicitação.
Essas letras são seguidas pelos números 1, 2, 3 ou 4, que
Uretrografia retrógrada representam o valor informativo de cada método de imagem
Apesar da UCM mostrar a uretra, às vezes é necessário na patologia estudada. O número 1 representa o exame que
realizar a uretrografia retrógrada para se obterem imagens mais fornece o maior número de informações ou as imagens mais
evidentes de estenoses ou patologias da uretra anterior. características da referida patologia; o número 4, o método de
A uretrografia retrógrada não é um exame fisiológico, menor valor informativo.
pois na injeção do contraste utiliza-se hiperpressão para ven- A letra X é utilizada para indicar exames que em geral já
cer a resistência uretral. Há risco de refluxo uretrovascular foram realizados pelo paciente, mas que não estão discrimi-
(venoso ou linfático), devendo ser indicada com cautela em nados naquela rotina de investigação. Os números que acom-
pacientes alérgicos ao contraste ou com infecções urinárias panham a letra X – 1, 2, 3 ou 4 –, representam o valor infor-
agudas, principalmente uretrites (risco de sépsis). mativo do referido exame, sendo 1 o de maior valor, e 4, o de
Em homens, além das estenoses e divertículos uretrais, menor valor informativo.
este exame é indicado nos traumas de uretra. O sinal gráfico ( ___ ) usado para um determinado méto-
Nos casos de uretrorragia, o primeiro exame deve ser a do, significa não-utilização do mesmo na rotina de investiga-
uretrografia retrógrada para diagnosticar se a lesão uretral é ção daquela patologia ou ausência de maior informação sobre
completa (o contraste extravasa e não progride para a bexiga) o valor daquele método.
12 GUIA PRÁTICO DE UROLOGIA
12. USO DOS MÉTODOS DE IMAGEM NA AVALIAÇÃO DAS
PRINCIPAIS PATOLOGIAS DO TRATO URINÁRIO
Tipo ou localização de lesão TC US RM UGE Outro Exame Outro Exame
Massa renal B1 A-2 C-2 D-4 Art E-2
Cálculo radiopaco C-1 B-1 D-3 A-1
Cálculo radiotransparente C-1 A-1 E-3 B-2 Pielografia /D-2
Junção corticomedular C-2 A-2 B-1 D-4
Cálices e pélvis B-2 D-3 C-2 A-1
Abscesso renal C-1 A-2 E-2 D-3 Rx simples / B-3
Abscesso perinéfrico D-1 A-2 E-2 C-3 Rx simples / B-3
Hidronefrose C-2 A-1 D-3 B-1
Ureter C-2 D-3 E-2 A-1 Pielografia / B-1
Anomalias renais, ureterais e vesicais
Agenesia renal (rim único) B-1 A-2 _____ C-3 Art / E-2 Veno / D-1
Rim supranumerário C-2 B-3 _____ A-1 Art / D-2
Hipoplasia renal C-3 B-3 _____ A-1 Art / D-2
Rim em ferradura B-1 A-2 E-1 C-2 Art / D-1
Ectopia cruzada B-1 A-1 _____ C-2
Anomalia de rotação _____ B-2 _____ A-1
Nefroptose _____ _____ _____ A-1 _____
Estenose da JUP _____ X-3 _____ A-2 Med nuclear / B1
Duplicação de bacinete e ureter _____ X-3 _____ A-1 UCM± / B-2
Ureter retrocava B-2 X-3 _____ A-1 Cavografia / C-2
Ureterocele _____ _____ _____ A-1 Cistoscopia
Divertículo ureteral _____ _____ _____ A-2 Pielografia / B-1
Cisto de úraco B-1 A-1 _____ _____ Cistografia / C-3
Nefrocalcinose C-1 _____ _____ B-2 Rx simples / A-2
Pielonefrite aguda complicada B-1 A-2 _____ C-3 _____
Pielonefrite crônica atrófica C-2 A-2 _____ B-2 _____
Pielonefrite xantugranulomatosa B-1 _____ _____ A-2 Pielografia / C2 Art / D1
Infecção urinária da gestação _____ A-2 _____ _____
Ureterite cística _____ _____ _____ A-2 Pielografia / B-1
Tuberculose de trato urinário (fase renal) C-2 A-2 _____ B-2 _____ _____
Tuberculose de trato urinário (fase de via excretora) D-3 C-3 _____ A-1 Pielografia / B-1 _____
Candidíase renal C-2 B-2 _____ A-1 Pielografia / D-3 _____
Pequenos traumatismos renais C-1 A-3 _____ B-2
Grandes traumatismos renais A-1 B-3 D-1* C-2 Art / E-1*
Rim displásico multicístico (unilateral) B-1 A-2 C-3
Doença policística renal do jovem (autossômica recessiva) B-1 A-2 C-3
Doença policística renal do adulto (autossômica dominante) B-1 A-2 _____ C-3 _____ _____
Cisto renal simples C-1 A-1 _____ B-2 _____
Cistos multiloculares C-1 A-1 _____ B-2
Rim esponjoso medular _____ _____ _____ B-1 Rx simples / A-2Y
Divertículo calicial _____ _____ _____ A-1 _____ _____
Cisto parapiélico B-1 A-1 _____ C-2 _____ _____
Cisto hidático renal C-1 A-1 B-2 Pielografia / D-2
Alterações vasculares
Aneurisma da artéria renal B-1¯ Rx simples / A-1° Art / C-1
Fístula arteriovenosa renal A-1 C-3 Rx simples / X-3° Art / B-1
Oclusão da artéria renal D-3 A-2v C-3 Art / B-1
Trombose aguda total da veia renal _____ _____ A-2 Art / B-2
Trombose aguda parcial de veia renal A-1 B-2 C-3 Art D-2
Hipertensão renovascular _____ _____ B-2² X-3 Art / C-1ª Medicina Nuclear / A-2µ
Tumores renais e ureterais
Angiomiolipoma renal B-1 A-2 X-3 Art / C-2
Lipomatose do seio renal C-1 A-2 B-3
Carcinoma de células renais B-1 A-2 D-1 C-3 Art / E-2
Tumor de Wilms C-1 A-2 D-1 B-2 Cavografia / E-3
Tumor de bacinete C-2z A-1 Pielografia / B-1 Art / D-3
Tumor ureteral C-2z _____ _____ A-1 Pielografia / B-1 _____
Fibrose retroperitoneal C-3 D-3 E-1 A-2 Pielografia / B-2
± Refluxo - * Suspeita de lesão arterial - Y Cálculos em leque - ¯ TC dinâmica - ° Calcificação - v Doppler - ² Técnica específica - ª Pacientes previamente triados - µ DTPA e teste do captopril - z Estadiamento.
Abreviaturas: TC = tomografia computadorizada, US = ultra-sonografia, RM = ressonância magnética, UGE = urografia excretora, ART = arteriografia, Veno = venografia
GUIA PRÁTICO DE UROLOGIA 13
13. Bibliografia recomendada
1. HRICAK H, TANAGHO EA. Radiologia do trato urinário. In: Tanagho EA, McAninch JW, Smith Urolo-
gia geral. 13 a edição, Rio de Janeiro, 1994. 46-94.
2. KUTCHER R, LAUTIN EM. Genitourinary radiology, a multimodality approach., Philadelphia, 1990.
3. LEE FF Jr., THORNBURY JR. O trato urinário. In: Juhl JH, Crummy AB, Paul & Juhl. Interpretação
radiológica. 6a edição, Rio de Janeiro, 1996. 533-612.
4. PAPANICOLAOU NP. Urinary tract imaging and intervention: basic principles. In: Walsh PC, Retik
AB, Vaughan ED Jr., Wein AJ. Campbell’s urology. 7th edition, Philadelphia, 1998. 170-260.
5. POLLAK HM. Imaging of urinary tract. In: Walsh PC, Retik AB, Stamey TA, Vaughan ED Jr.
Campbell’s urology. 6th edition, Philadelphia, 1992. 394-495.
14 GUIA PRÁTICO DE UROLOGIA
14. Capítulo 4
Ultra-sonografia em Urologia
Renato Scaletscky*
Marcelo L. Bendhack
Introdução percebida como artefato e pode ser medida com o uso da ul-
tra-sonografia. De acordo com a profundidade de penetração
A ultra-sonografia é utilizada na medicina desde 1950. das ondas em um determinado meio, a energia das ondas será
O termo refere-se a ondas sonoras fora do limite da audição, absorvida pelas moléculas do meio. Esta diminuição, na ul-
ou seja, com freqüência superior a 20.000 Hz. No diagnóstico tra-sonografia, é calculada como sendo 1 dB/cm/MHz. Na prá-
por imagem com ultra-sonografia são utilizadas ondas entre 1 tica isto significa que para órgãos localizados mais profunda-
e 10 MHz. Mais recentemente, para uso endourológico, a fre- mente, devem ser utilizadas freqüências diferentes das utili-
qüência de 20 MHz tem sido empregada. zadas para órgãos localizados superficialmente.
No momento em que as ondas sonoras atingem uma su- Na Urologia utilizam-se no diagnóstico ultra-sonográfico
perfície de transição entre dois meios – por exemplo, entre a exclusivamente os métodos B (B = “brightness”), para apre-
água e o ar – são submetidas a quatro fenômenos físicos: re- sentação visual dos órgãos, e o A (A = amplitude), na ultra-
flexão, desvio, dispersão e absorção. Em meios homogêneos sonografia com Doppler.
o som é propagado em linha reta. Quando o som encontra Para a produção de ondas ultra-sônicas são utilizados cris-
uma interface entre dois meios diferentes, uma parte das on- tais polares que, ao serem estimulados com uma determinada
das é refletida e a outra é desviada. A quantidade da reflexão energia e devido a efeito piezelétrico, iniciam movimentos de
depende da chamada impedância de ondas dos dois meios em vibração. Estes movimentos emitem ondas ultra-sônicas que
contato. se irradiam em forma de onda. Da mesma forma estes cristais
podem receber as ondas que são refletidas em sentido contrá-
I.A. = Dm x Vm rio, as quais também podem ser medidas. Assim é possível que
um cristal simultaneamente funcione como emissor e receptor.
(I.A.= impedância acústica; Dm = densidade de um material;
De modo geral o cristal recebe em 99% do tempo e apenas em
Vm = velocidade do som em um material)
uma pequena parte deste funciona como emissor.
A ultra-sonografia aplicada à Urologia pode ser conside-
A impedância ou resistência ao som deve ser entendida rada uma extensão do exame físico, pois as indicações são
como o produto entre a densidade e a velocidade do som nos muitas e os efeitos colaterais, ausentes. Devido aos aspectos
meios correspondentes. Quanto maior a impedância, maior é práticos deste capítulo, serão apresentados a seguir os princi-
a parte refletida. Também o desvio, ou seja, a modificação da pais achados da ultra-sonografia em Urologia.
direção das ondas, é diretamente proporcional à impedância.
A reflexão corresponde ao fenômeno físico mais impor- Ultra-sonografia do rim
tante no diagnóstico por ultra-som, pois as informações obti-
das devem-se sobretudo às ondas refletidas. No sentido de e do ureter superior
manter mínima a reflexão das ondas quando da entrada delas
no corpo humano, utiliza-se o gel de contato entre o transdu- Utilizam-se transdutores setoriais ou convexos com fre-
tor e a pele. Quando as ondas entram em uma superfície não qüências de 2,5 a 5 MHz.
absolutamente lisa (que é o que ocorre em tecidos orgânicos),
as ondas são refletidas de maneira irregular. Esta dispersão é Preparo - Um preparo específico do paciente não é ne-
cessário. Deve-se evitar alimentação recente pois o estômago
cheio pode atrapalhar a visualização do rim esquerdo.
*Endereço para correspondência: Técnica - O exame é realizado inicialmente em posição
Hospital de Clínicas de Porto Alegre de decúbito dorsal. Se houver sobreposição de alças intesti-
Rua Ramiro Barcelos, 2.350 - 8o andar nais, o paciente é então colocado em decúbito lateral direito
90035-003 - Porto Alegre - RS ou esquerdo, pois assim os rins podem ser melhor apresenta-
Tel.: (0--51) 346-1367 - Fax: (0--51) 330-9700 dos. Para o exame dos rins o transdutor é posicionado, inicial-
E-mail: rscalet@zaz.com.br mente, distal ao arco costal sobre uma das linhas axilares, sendo
GUIA PRÁTICO DE UROLOGIA 15
Cap 04 - Ultra-sonografia.pm6 15 13/06/00, 13:10
15. que o ângulo de emissão das ondas deve ser orientado obli- Achados patológicos
quamente no sentido ventral. Estruturas que podem auxiliar o (rim e ureter superior)
exame, funcionando como “janelas”, são o fígado, o baço e o O ultra-som é o método ideal para a detecção de obstru-
músculo psoas. Outras estruturas, como a aorta e a veia cava, ção urinária, principalmente em crianças, por ser não-invasi-
podem ser identificadas. O rim é inicialmente examinado em vo, rápido e não utilizar radiação ionizante ou meio de contras-
posição longitudinal (maior diâmetro). te. Entretanto o ultra-som convencional não fornece dados fun-
cionais ou fisiológicos acerca da obstrução. Outras condições,
Achados: que não a obstrução, podem causar ou mimetizar dilatação e
dar um achado falso-positivo, tais como: pelve extra-renal, re-
n Zona de ecogenicidade central – corresponde princi- fluxo, megacalicose, megaureter, pielonefrite, bexiga
palmente ao sistema coletor. distendida, necrose papilar, obstrução prévia e Diabetes insi-
pidus, entre outras. Até 30% dos rins agudamente obstruídos
n Parênquima renal – corresponde aproximadamente ao
podem não demonstrar dilatação piélica, sendo que por outras
padrão de ecogenicidade do fígado.
vezes pode ocorrer tardiamente na obstrução (Platt et al.).
n Cápsula hiperecogênica do rim. A identificação de um ureter dilatado indica, freqüente-
mente, a presença de uma uropatia obstrutiva e permite a dife-
n Tamanho aproximado de 10-11 x 5 x 5 cm (adultos). renciação de lesões císticas na área do seio renal. Uma exce-
ção a esta situação é a estenose de junção ureteropiélica. Aqui
n Definição dos limites renais com contorno externo o ureter proximal não está dilatado e desta forma não pode ser
regular em todos os lados. visualizado com a ultra-sonografia.
Na definição de obstrução ao fluxo urinário, é digno de
n Seio renal hiperecogênico. nota que, com a ultra-sonografia, apenas o grau de dilatação
do sistema coletor pode ser identificado, e não o grau funcio-
n Reflexo do parênquima homogêneo. nal da obstrução. Se uma obstrução urinária se faz de maneira
aguda, pode existir dificuldade em se visualizar uma dilata-
n Movimentação à respiração de cerca de 2 ou 3 cm. ção do sistema coletor com a ultra-sonografia. É o que pode
acontecer com um cálculo ureteral com obstrução do fluxo
Comentários urinário. Nesta situação, apesar de uma pequena dilatação do
Em cerca de 20% dos casos, a banda de ecogenicidade sistema coletor à ultra-sonografia, pode haver um retardo im-
central se apresenta dividida pelas chamadas pontes paren- portante à urografia excretora. Da mesma forma pode ocor-
quimatosas. A presença de duplicação renal com duplicação rer, em pacientes com uropatia obstrutiva crônica, um grau de
ureteral parcial ou completa pode não ser avaliada em sua to- dilatação significativo, sem que uma obstrução urinária im-
talidade e com segurança através da ultra-sonografia, necessi- portante ao fluxo se faça presente, como, por exemplo, na di-
tando melhor definição pela urografia excretora. latação gravídica. A combinação ausência de dilatação à
Cerca de 10% dos pacientes apresentam anomalias de ultra-sonografia e ausência de excreção à urografia excre-
posição em um ou ambos os rins, mais freqüentemente um tora pode nos indicar a presença de um processo vascular, o
posicionamento mais caudal, indo de lombar distópico até rim qual pode exigir um tratamento cirúrgico imediato, tal como
pélvico. Simultaneamente existe uma anomalia de rotação.
em casos de embolia da artéria renal.
Uma agenesia ou aplasia renal é muito rara. Assim, quan-
A ultra-sonografia não permite uma informação precisa,
do o rim não é encontrado no ultra-som, deve-se pensar inicial-
segura, sobre as conseqüências funcionais da obstrução. Ela
mente em distopia renal.
Malformações renais têm uma incidência de 1:3000. Com se presta, no entanto, para um diagnóstico rápido e seguro e,
freqüência existe, simultaneamente, uma uropatia obstrutiva. sobretudo, para controle de seguimento de uma obstrução uri-
O rim em ferradura freqüentemente é difícil de ser reconheci- nária alta. Pode-se comparar mudanças no grau de dilatação
do ao ultra-som. Indícios dessa patologia são a presença de medindo-se o diâmetro caliceal.
um eixo renal paralelo à coluna vertebral e a impossibilidade Uma uropatia obstrutiva de longa duração determina uma
de delimitar o pólo renal inferior. A ponte parenquimatosa que redução progressiva do parênquima até chegar a um rim
se situa ventralmente sobre a aorta nem sempre pode ser de- hidronefrótico sem função. Uma relação estreita entre a di-
monstrada, pois freqüentemente esta é composta somente de mensão do parênquima renal e a função residual do rim dila-
tecido conjuntivo. tado não é verificada. Um rim normal apresenta uma espessu-
Em pacientes mais idosos é possível identificar, com fre- ra do parênquima de 1,5 a 2,5 cm, e pode-se dizer que este
qüência, porções de maior ecogenicidade na região do seio está diminuído, com segurança, quando possui cerca de 1 cm
renal. As causas podem ser calcificação do parênquima renal ou menos.
(nefrocalcinose, síndromes de hipercalcemia, tuberculose),
calcificação das papilas renais (abuso de analgésicos, diabete Litíase renal
melito) e calcificação de vasos (arteriosclerose, hipertensão
arterial, diabete melito). Em caso de dúvida recomenda-se uma Cálculos renais ou ureterais correspondem a uma das
complementação com estudos radiológicos. doenças mais comuns de uma sociedade moderna. A incidên-
16 GUIA PRÁTICO DE UROLOGIA
Cap 04 - Ultra-sonografia.pm6 16 13/06/00, 13:10
16. cia corresponde a cerca de 500 pacientes novos a cada 100 mil Quando da presença de cistos múltiplos deve-se pen-
habitantes/ano. Enquanto cálculos renais podem ser detecta- sar, em termos de diagnóstico diferencial, em rim cístico
dos ao acaso durante o exame ultra-sonográfico, os cálculos displásico e rim policístico hereditário na fase inicial da
ureterais normalmente se apresentam através de cólicas agu- doença.
das e sintomas típicos. A punção de um cisto renal com agulha fina, guiada por
Os critérios morfológicos da ultra-sonografia são: ultra-som, é tecnicamente simples. O exame bioquímico e cito-
n Estrutura hiperecogênica. lógico do líquido aspirado auxilia no diagnóstico diferencial
em relação à presença de um carcinoma: o cisto renal apresenta
n Sombra acústica posterior. líquido amarelo-hialino, enquanto um tumor ou cisto hemorrá-
gico tem coloração escura ou sanguinolenta. Uma dissemina-
n Posição dentro do sistema coletor ou de um ureter di- ção de células tumorais ao longo do canal de punção não foi,
latado. até o presente, comprovada.
n Movimentação idêntica ao rim durante a respiração.
Tumores sólidos
n Possibilidade de verificação em vários eixos.
O tumor renal sólido mais freqüente é o carcinoma de
células renais. Nestes casos o padrão ecográfico é de reflexos
Dificuldades diagnósticas podem existir sobretudo em
internos não-homogêneos, projeção ou extensão para além do
pacientes mais idosos, nos quais podem existir calcificação
contorno externo do rim e formação de massa. Devido a estas
dos vasos e cicatrizes inflamatórias. Podem apresentar difi-
características, um tumor renal permite um bom diagnóstico
culdade também o cisto calcificado e a nefrocalcinose. Desta
ecográfico. Atualmente, devido ao uso freqüente da ultra-
forma, o diagnóstico ultra-sonográfico de cálculo sempre exi-
sonografia, cerca de 50% a 80% dos carcinomas renais são
ge uma complementação com estudo radiológico.
achados ocasionais antes do aparecimento de sintomas. Antes
Ao contrário do ureter distal, o ureter proximal pode ser
do advento da ultra-sonografia, isto ocorria em 20% dos ca-
mais facilmente estudado. Neste caso os cálculos podem, na
sos. No diagnóstico diferencial existe o angiomiolipoma, o
grande maioria das vezes, ser documentados com precisão,
qual apresenta uma estrutura arredondada com ecos de maior
pois o ureter proximal se apresenta dilatado e assim é fácil sua
intensidade, e o oncocitoma. Outros tumores sólidos, como
identificação. Com a associação do reflexo típico causado pelo
hematoma, cisto hemorrágico, metástases e a pielonefrite xan-
cálculo ao final da coluna de líquidos, dificilmente existem
togranulomatosa, não podem ser diferenciados com precisão
problemas em relação ao diagnóstico diferencial.
através da ultra-sonografia.
A presença de tumor urotelial do sistema coletor difi-
Lesões císticas
cilmente pode ser detectada pela ultra-sonografia quando
Cistos renais solitários são achados ocasionais freqüen-
não há dilatação deste sistema. Na presença de uma dilata-
tes. A incidência aumenta com a idade, chegando a de cerca
ção pielocalicial e do ureter pode-se verificar, por vezes, a
de 50% para pacientes com mais de 50 anos de idade.
existência de tumor exofítico projetado para o interior do
Os critérios morfológicos, na ultra-sonografia, para um
sistema coletor.
cisto renal solitário são:
Inflamações renais
n Ausência de reflexos ecográficos internos.
Inflamações provenientes do sistema coletor renal não
n Forma redonda a oval, lisa e bem delimitada. apresentam achado ultra-sonográfico típico. No caso de o pa-
rênquima renal ter sido atingido, pode-se verificar, devido ao
n Contorno ecorrefringente. edema, uma diminuição na ecogenicidade, sobretudo na re-
gião das papilas. No caso de uma pionefrose pode-se verifi-
n Ecogenicidade dorsal aumentada. car um padrão de reflexo predominantemente anecóico com
reflexos internos pequenos e móveis no interior do sistema
Problemas de diagnóstico diferencial com a dilatação do coletor. No caso de um abscesso renal pode-se verificar uma
sistema pielocalicial podem ocorrer, principalmente, quando se estrutura hipoecogênica arredondada na projeção do parên-
tratam de muitos cistos renais em seio renal. Em caso de dúvida quima, eventualmente com abaulamento do contorno re-
deve-se indicar a realização de uma urografia excretora ou to- nal. No entanto, qualquer processo inflamatório, com con-
mografia computadorizada. Cistos renais solitários são, em ge- teúdo purulento, pode produzir reflexos internos mais den-
ral, assintomáticos. Um carcinoma na parede do cisto é um achado sos, no interior da lesão.
raro. Mais freqüentemente pode-se verificar a presença de um Inflamações crônicas sem uropatia obstrutiva conco-
carcinoma de células renais com áreas císticas por necrose. mitante determinam uma destruição do sistema coletor re-
Um tratamento para cisto renal simples pode estar indicado nal e formação de cicatrizes na região do parênquima. O
quando existem sintomas importantes (dor lombar), uropatia órgão tem geralmente o tamanho reduzido (pielonefrite crô-
obstrutiva (pressão em nível de colo calicial, pélvis renal e/ou ure- nica) e o contorno não é tão evidente. Uma diferenciação
ter) ou com suspeita de tumor (cápsula muito espessa/irregular, em relação ao tipo de inflamação não é possível com o uso
reflexos internos no cisto, contorno externo mal definido). do ultra-som.
GUIA PRÁTICO DE UROLOGIA 17
Cap 04 - Ultra-sonografia.pm6 17 13/06/00, 13:10
17. Retroperitônio superior n Bexiga
• urina residual,
Nesta localização temos os seguintes órgãos: aorta abdo- • alterações da parede vesical (hipertrofia, pseudo-
minal, veia cava inferior, linfonodos, rins, adrenais, pâncreas, divertículo),
ureter proximal e partes do duodeno.Tecnicamente pode-se
utilizar o acesso posterior, aproveitando-se parcialmente os • corpos estranhos (cálculo vesical),
órgãos parenquimatosos como “janela” ecográfica. • tamponamento vesical por coágulos,
O preparo intestinal prévio pode facilitar o estudo por • tumores vesicais.
via ventral, pois no momento em que o transdutor determina
uma pressão abdominal, as alças intestinais podem ser assim n Ureter distal
afastadas e a visualização do retroperitônio se torna possível.
Para identificação e estudo dos vasos retroperitoneais deve-se • cálculos,
preferir a ultra-sonografia com Doppler colorido. Nas mãos • dilatação ureteral (uropatia obstrutiva, megaureter),
de examinadores treinados a ultra-sonografia convencional • ureterocele,
permite diagnósticos importantes nesta região anatômica.
• corpo estranho (“stent”, cateter duplo J).
Adrenais
O achado normal da bexiga é uma parede lisa e conteúdo
Ao contrário do pâncreas e dos rins, o tamanho das adre-
anecóico. O diâmetro da parede vesical mede poucos milíme-
nais é variado. O tamanho longitudinal varia de 2 a 7 cm e o
tros (máximo de 5 mm com enchimento maior que 100 ml de
transversal de 1,5 a 4 cm. A transição entre achado normal e
urina). Em homens, pode ser verificada a próstata, a qual é
hiperplasia pode ser difícil de ser caracterizada. Podem ser
mais ou menos proeminente. Com boa qualidade e exame par-
sede de metástases em vários tipos de neoplasias e tumores
cimonioso é possível verificar ejaculação urinária através dos
primários.
meatos ureterais. As vesículas seminais situam-se póstero-in-
feriormente ao trígono vesical, sendo visualizadas como ór-
Hematomas gãos simétricos e com estrutura central anecóica.
Hematomas podem ser visualizados como conseqüência
de cirurgias, traumatismos ou sangramentos espontâneos, como
no caso de tumores, aneurismas e distúrbios de coagulação.
Determinação da urina residual e volumes
A medição de urina residual por ultra-sonografia substi-
tuiu a utilização de cateterismo pós-miccional. Para isto me-
Abscesso dem-se as distâncias das paredes vesicais, após a micção, em
Abscesso retroperitoneal é raro. Pode ser conseqüência três eixos (longitudinal, transversal e ântero-posterior). O vo-
de inflamações perfurantes do pâncreas e do rim, bem como lume pode ser obtido pela multiplicação destes valores pelo
por osteomielite e espondilite da coluna vertebral. Outros acha-
fator 0,5236. Na prática, utiliza-se o fator 0,52. Deve-se notar
dos possíveis são coleção de urina, linfocele, tumores e fribose que se a avaliação da urina residual for feita com a bexiga
retroperitoneal. superdistendida ou com muito pequeno volume, o resultado
obtido poderá ser errôneo. Devido ao fato de que também o
Bexiga e ureter distal cateterismo demonstra valores variáveis de urina residual para
um mesmo paciente e é invasivo, pode-se considerar a ultra-
Utiliza-se a freqüência entre 3,5 e 5 MHz. Para um exa- sonografia o método indicado para este tipo de avaliação.
me adequado da parede vesical é necessária uma repleção O estudo ultra-sonográfico transabdominal da próstata
parcial da bexiga. Dificuldades técnicas ocorrem com pre- e vesículas seminais permite avaliação do tamanho dessas es-
sença de pequeno volume urinário e adiposidade. Quando truturas, porém não apresenta a qualidade da via transretal. O
da presença de pouco líquido na bexiga, recomenda-se a rea- ultra-som abdominal é útil para medir o volume da próstata,
lização do exame após o enchimento fisiológico da mesma. embora possa haver disparidade com a mesma medição pela
Uma bexiga parcialmente vazia pode produzir dobras e pre- via transretal, em 10% a 20% do valor. Pode mostrar calcifica-
gas de mucosa, que não devem ser confundidas com lesões ções prostáticas. Não é útil para avaliar neoplasia da próstata.
exofíticas.
O exame ultra-sonográfico da bexiga e ureter distal se Outros achados patológicos na bexiga
faz por via suprapúbica, com o paciente em decúbito dorsal. Os cálculos vesicais apresentam um achado típico com
O transdutor é colocado em posição paralela e superior à sín- estruturas hiperecogênicas ao nível do assoalho vesical com
fise púbica (transversal), além de longitudinal. Examina-se a formação de sombra acústica dorsal. Diagnóstico diferencial
espessura da parede, contorno liso do urotélio, forma, além inclui tumores vesicais calcificados.
de se medirem dimensões. Tamponamento vesical com coágulos pode ser reconhe-
As possibilidades de diagnóstico ecográfico da bexiga e cido através de formações ecorrefringentes não-homogêneas
ureter distal são as seguintes: e irregulares.
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