2. O poeta Luiz Gonzaga Pinheiro disse
certa vez: não entendo porque sendo a
infância a época em que mais sofri, seja
considerada hoje, a que fui mais feliz.
No lugar de curtir minha maturidade,
estou sempre tentando encarnar o
menino que fui. Que mágica tem a
infância que nos prende e não nos deixa
envelhecer?
3. Por isso seus poemas
sempre nos remetem
à infância. São como
algodão doce, a primeira
vez que vemos o mar,
barulho de chuva no
telhado quando se está
sob lençol quentinho
4. O palhaço
O velho palhaço subiu no picadeiro com um
enorme saco de algodão cheio de
macaquices.
Deu uma flor para a Lívia
um sorriso para o Neo
uma pirueta para meus netos
escorregou em uma lágrima e caiu de pernas
para o ar.
Depois imitou um coxo
fingiu-se de médico
disse que falava com Deus
e quase fez uma criança saltar da cadeira
de rodas.
Quando desceu do picadeiro
foi que a vida voltou a fechar as
mandíbulas.
5. O vento
O vento vinha ventando alucinado,
incomodando as folhas e os pequenos
grãos de areia. Ao encontrar a fresta da
minha janela se espremeu, assobiou e
entrou uivando como um fantasma.
Tudo isso apenas para beijar meu rosto.
6. Escolas
Falta às escolas da minha terra a metade
da vida.
O verbo frio
equações certeiras
meandros de serras e de corpos lá estão.
Mas falta o imponderável
O Espírito
para dançar sobre as infinitas
possibilidades
de utilização do que é ensinado.
7. O tempo
O tempo, com sua fome voraz
desgasta todas as pedras
das catedrais.
Deixa os telhados limosos
os corpos velhos, nodosos,
com espirais.
O tempo come toda mentira
puxa, encolhe, estira
no seu leva e traz.
Vomita qualquer ofensa
e ao mostrar que o amor compensa
se satisfaz.
8. O cata-vento
O cata-vento pega qualquer
vento
seja fraco, seja forte
venha do sul, caia do
norte
só não pega
o vento frio da morte.
9. Passarinho
Quando fazia o curso de engenharia na
Universidade Federal do Ceará, ao
passar sob uma árvore, um filhote de
passarinho caiu do ninho e ficou
balançando junto aos meus pés. Botei os
livros no chão, tirei os surrados sapatos
e quase me esborrachei tentando
recolocá-lo no ninho. Esse presente que
eu dei à vida jamais esqueci.
10. Persistência
Mesmo com todas as
desesperanças a
espreitar-me a cada esquina o
menino que
teima em morar em mim ainda
persiste.
11. Seja o que quer que fizeres
Se colocas Deus à parte
Terás feito o que quiseres
Nunca uma obra de arte.
Romélia e Luiz
12. Espera
Dor já sofri tanta
Ora no corpo, ora na alma
Que hoje nada mais me espanta
Nem uma possível calma
13. Meu olhar ainda
persegue as pipas; o que
me resta de cabelos, o
vento livre; os pés
gostam da água do mar,
da areia. Parece que
ainda espero a
adolescência chegar.