Entre os contributos que os sistemas de informação geográfica (SIGs) trazem ao campo da saúde, nomeadamente à gestão das doenças tropicais, incluindo a dengue, uma doença emergente com uma distribuição geográfica, incidência e severidade crescentes em todas as regiões tropicais e subtropicais do mundo que afeta cerca de 40% da população, destacam-se a análise da deteção precoce e progressão da doença, a sua distribuição geográfica, a comunicação de risco e a divulgação da informação.
Na Ilha da Madeira é conhecida a presença do mosquito Aedes aegypti, vetor primário de transmissão de dengue, desde 2005. Passados 7 anos, após a identificação do vetor, entre 26 de setembro de 2012 e 3 de fevereiro de 2013 ocorreu o primeiro surto de febre de Dengue nesta ilha, o primeiro na Europa desde 1928.
Os dados em estudo, climatológicos, entomológicos, epidemiológicos e demográficos recolhidos junto do Instituto Português do Mar e Atmosfera (IPMA), sistema de vigilância entomológico e Madeira Dengue Surveillance System (MDSS) e censos 2011, respetivamente, foram combinados através dos SIGs no sentido de implementar uma plataforma de base geográfica, que permita difundir informação de apoio à tomada de decisão para uma estratégia de prevenção e controlo da dengue na RAM.
Vigilância epidemiológica e entomológica da Dengue na Ilha da Madeira usando SIG
1. Silva et al. As ciências geográficas e a vigilância epidemiológica e entomológica das
doenças provocadas por mosquitos vetores - O caso da Dengue na Ilha da Madeira
1
Título: As ciências geográficas e a vigilância
epidemiológica e entomológica das doenças
provocadas por mosquitos vetores
Sub-título: O caso da Dengue na Ilha da Madeira
Ana Clara SILVA1
; Márcia BAPTISTA1
; Margarida CLAIROUIN1
;
Marco MAGALHÃES1
; Catarina VALENTE1
; Luís ANTUNES2
; Duarte
ARAUJO2
1
IASAÚDE,IP-RAM; 2
DROTA – Governo Regional da Madeira;
Ana.Clara@iasaude.sras.gov-madeira.pt
Palavras-chave: Dengue, Vigilância Epidemiológica, Vigilância
Entomológica, sistemas de informação geográfica, Aedes aegipty
Introdução
Entre os contributos que os sistemas de informação geográfica (SIGs)
trazem ao campo da saúde, nomeadamente à gestão das doenças tropicais,
incluindo a dengue, uma doença emergente com uma distribuição
geográfica, incidência e severidade crescentes em todas as regiões
tropicais e subtropicais do mundo que afeta cerca de 40% da população,
destacam-se a análise da deteção precoce e progressão da doença, a sua
distribuição geográfica, a comunicação de risco e a divulgação da
informação(1)(2) (3)
Na Ilha da Madeira é conhecida a presença do mosquito Aedes aegypti,
vetor primário de transmissão de dengue, desde 2005. Passados 7 anos,
após a identificação do vetor, entre 26 de setembro de 2012 e 3 de
fevereiro de 2013 ocorreu o primeiro surto de febre de Dengue nesta ilha,
o primeiro na Europa desde 1928.
Os dados em estudo, climatológicos, entomológicos, epidemiológicos e
demográficos recolhidos junto do Instituto Português do Mar e Atmosfera
(IPMA), sistema de vigilância entomológico e Madeira Dengue Surveillance
System (MDSS) e censos 2011, respetivamente, foram combinados através
dos SIGs no sentido de implementar uma plataforma de base geográfica,
que permita difundir informação de apoio à tomada de decisão para uma
estratégia de prevenção e controlo da dengue na RAM.
Objetivo
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O presente trabalho tem por objetivo apresentar a aplicação dos SIGs
em vigilância entomológica e epidemiológica no âmbito da prevenção e
controlo de dengue na RAM.
Metodologia
Os dados epidemiológicos em estudo são originários num sistema de
vigilância montado em dois tempos, designadamente numa análise
retrospetiva de casos registados no processo clínico integrado do
SESARAM,E.P.E, durante o período de 26 de setembro até 28 de outubro. A
partir da semana 44,o MDSS, baseado nos dados reportados por hospitais
públicos, centros de saúde e unidades do sector privado, considera os
dados de diagnóstico clínico e laboratorial e ainda a recolha de informação
sociodemográfica: morada de residência, atividade diária e link
epidemiológico, permanência ou viagem recente a zona endémica de
dengue.
Foi realizado o Geocoding das moradas de trabalho, dos locais visitados
e da residência conforme dados contidos nos inquéritos epidemiológicos
dos primeiros 160 casos confirmados. Através do cruzamento das linhas que
ligavam os diversos locais por cada caso, no sentido de identificar os
possíveis primeiros locais de contágio. Ao longo do surto continuou-se a
realizar o Geocoding da morada de residência dos casos prováveis
contabilizando um total de 2.165 pontos desde o início do surto.
A partir das moradas de residência dos casos prováveis de dengue
foram calculados os 10 principais Clusters geográficos, segundo raio
máximo de 500 metros, análise retrospetiva espácio-temporal com 7 dias
de agregação, e o scanning pelo modelo discreto de Poisson.
Os casos expetáveis (CE) e a taxa de incidência expectável (TIE) para
novo surto, representados na fórmulas (1) e (2) respetivamente, por
subsecção estatística, foram calculados tendo em conta os casos prováveis
observados (CPO) e a taxa de incidência por subsecção (TI) e total (TITol)
no 3 concelhos com maior TI, com os seguintes dados:
(1)
(2)
A vigilância entomológica baseia-se numa rede geolocalizada de
armadilhas de ovos e de formas adultas de mosquito, que permite o
geoprocessamento dos dados da atividade do mosquito. Usou-se o método
de geotagging de fotografias para escrever as coordenadas na informação
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das imagens. Procedeu-se à sua posterior conversão automática em
ficheiro de pontos.
Para uma melhor identificação da distribuição da doença procedeu-se
ao cálculo de clusters espácio-temporais nos municípios de Funchal, Santa
Cruz e Câmara de Lobos identificando um total de 10, entre os quais foi
identificado o Cluster primário de Santa Luzia, no qual o primeiro caso
ocorreu a 01 de outubro e o último a 23 de novembro de 2012. Os dados
entomológicos e epidemiológicos relativos a este cluster, foram integrados
ao nível da subsecção estatística. Foram considerados os seguintes dados
entomológicos: número de criadouros e número de residências
inspecionadas, cuja morada foi submetida a Geoconding. Os dados
epidemiológicos foram: nº de casos prováveis e TI por subsecção
estatística.
Os dados entomológicos foram usados para calcular os seguintes
índices: Índice de casa, Índice de recipiente, Índice de Breteau e Índice
Stegomya. Procedeu-se a um estudo de correlação linear (coeficiente de
correlação de Spearman), entre a variável índice entomológico e a TI de
casos de dengue por forma a encontrar medida entomológica mais
adequada para avaliar os níveis de infestação nos municípios que registam
a atividade do vetor.
O IASAÚDE,IP-RAM disponibilizou uma plataforma de geolocalização na
Internet para, através da declaração voluntária de presença de mosquito e
apresentação semanal dos resultados da vigilância entomológica, obter
uma visão global da atividade do vetor Aedes aegypti
(http://iasaude.sras.gov-madeira.pt/naomosquito/). A tecnologia usada
foi a Google API com Bibilioteca de visualização de HeatMap e Google Map
com linguagem em JavaScript e JQuery.
O processamento e análise de dados a nível espacial e estatístico do
presente trabalho foram realizados com recurso a programas gratuitos
e/ou de código aberto tais como o QuatumGis, R-Project, Geotag,
batchgeo.com, SatSCan, OpenOfice,
Resultados
O estudo retrospetivo das variáveis climáticas e entomológicas indicam
que os períodos de temperatura ideal para a oviposição ocorrem entre
Julho e Outubro.
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Figura 1 – Gráfico com cruzamento das variáveis climáticas, entomológicas e
epidemiológicas.
A TITol para os três concelhos com mais casos prováveis de Dengue:
Funchal, Santa Cruz e Câmara de Lobos é 108,05 (por 10.000 habitantes).
A TIE por subsecção estatística estimou a ocorrência de doença na
reemergência de um novo surto de acordo com os intervalos: <1 TIE será
abaixo do expectável; =1 TIE será de acordo com o expectável; > 1 TIE será
superior ao expectável (Mapa 1).
O Índice Stegomyia obteve uma correlação linear com a TI de casos
prováveis moderada (p-value<0,05).
Nos Clusters geográficos, o grupo etário com maior TI (15-24 anos), é o
menos representado, em percentagem, dentro dos Clusters de residência
(29%).
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Mapa1 : Mapa de risco relativo na ocorrência de um novo surto de Dengue nos
Concelhos de Câmara de Lobos, Funchal e Santa Cruz.
Conclusões
Os SIGs são fundamentais na investigação em Saúde Pública. Estes têm
sido amplamente utilizados na vigilância da doença, na definição de
hipóteses de investigação, na identificação de áreas e população de risco e
ainda na alocação de recursos e supervisão das intervenções.(5)
A análise espacial de clusters permitiu identificar o cluster primário
centrado na freguesia de Santa Luzia e outros nove secundários que
ocorreram entre outubro e novembro de 2012, sendo que estes clusters
representam mais de 50% dos casos prováveis de todo o surto.
O conhecimento atempado da localização de áreas geográficas com
maior incidência de casos de dengue permitiu orientar e adotar medidas de
controlo mecânico sobre potenciais criadores de mosquitos nessas zonas.
O índice Stegomyia parece configurar-se como a melhor medida
entomológica com potencial de predição de risco de eclosão de novo surto
na Ilha da Madeira.
A baixa representatividade percentual da população do grupo etário 15-
24 anos nos clusters residência, pode indiciar maior risco de infeção
associado à atividade diária, designadamente escola, pelo que programou-
se uma intervenção nas escolas, com a implementação de projetos de
prevenção e controlo do vetor Aedes aegypti integrados nos currículos
escolares.
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Os resultados da TIE face a um novo surto, devem ser analisados
segundo a possibilidade de reemergência do serotipo DEN1 ou introdução
de um novo serotipo e desse modo deve ser equacionada a preparação de
resposta, em função dos dois cenários.
Agradecimentos
Os autores agradecem à equipa da 1ª e 2ª missão do European Centre
for Disease Prevention and Control (ECDC), em particular ao Dr. Bertrand
Sudre.
À professora doutora Carla Sousa do Instituto de Higiene e Medicina
Tropical (IHMT) pelo apoio incondicional a todo o trabalho de
monitorização e controlo vetorial que vem sendo realizado na RAM.
À equipa do Museu de História Natural da Câmara Municipal do Funchal.
Ao Diretor Regional de Ordenamento do Território e Ambiente pelo
apoio total ao projeto de implementação do SIGs para dengue na RAM.
Referências
[1] Khan O.A., Davenhall W., Ali M., Castillo-Salgado C., Vazquez-Prokopec G.,
Kitron U., et al. (2010) Geographical information systems and tropical
medicine. Ann Trop Med Parasitol. 104(4):303–18.
[2] [Fay, R.W. ; Eliason D.A. (1965), A preferred oviposition site as surveillance
method for Aedes aegypti. Mosquito News 1966, 26(4), pp.531-535
[3] Gomes, A.C. (1998) Medidas dos níveis de infestação urbana para Aedes
(Stegomyia) aegypti e Aedes (Stegomyia) albopictus em programa de Vigilância
entomológica, Informe Epidemiológico do Sus, 1998, 7(3), pp.49-57
[4] Bivand, R.S. ; Pebesma, E.J. ; Gómez-Rubio, V. (2008), Applied Spatial Data
Analusis with R, Springer Science+Business Media.
[5] Seng SB, Chong AK, Moore A, Moore A. (2005) Geostatistical Modelling,
Analysis and Mapping of Epidemiology of Dengue Fever in Johor State, Malaysia.
2005;
Eixo Estratégico|Tema: T7
Tipo de comunicação: 1