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36
CAPA
Alguns restaurantes cobram pelos vinhos
de sua carta até três vezes o preço da importadora
PitiReali
37
Rolhas em Restaurantes:
uma polêmica
por Fernando Roveri e Roberto Rodrigues
L
evar ou não levar uma garrafa
de vinho a um restaurante?
Essa é uma questão freqüente
que surge em conversas entre enófilos
e restauranteurs. Mas, raramente, existe
um consenso sobre o assunto.
Sem a pretensão de encontrar a “solu-
ção”, apresentaremos alguns dos prin-
cipais aspectos ligados à polêmica e
diversas opiniões divergentes.
Todos os enófilos possuem, em
suas adegas, vinhos raros ou de safras
excepcionais, reservados para ocasiões
especiais, e muitas vezes gostariam de
desarrolhar a garrafa em bons restau-
rantes. Numa outra situação, clientes
de um determinado restaurante con-
sideram que a carta de vinhos não
está à altura da qualidade dos pratos e
preferem levar a garrafa. Não se pode
esquecer que, muitas vezes, a margem
de lucro que o restaurante coloca sobre
os vinhos da carta é muito alta e deses-
timula o consumo.
Nas metrópoles brasileiras encon-
tramos restaurantes com políticas (no
bom sentido, por favor) diversas sobre
o tema:
● os que proíbem terminantemente que
seus clientes levem os próprios vinhos;
● os que permitem que os clientes levem
seu próprio vinho, cobrando uma “taxa
de rolha”, ou seja, um determinado valor
correspondente ao serviço do vinho;
● os que permitem que os clientes levem
seu próprio vinho desde que também
consumam vinhos de sua carta;
● os que permitem que seus clientes
levem seu próprio vinho sem qualquer
restrição ou cobrança (existem, embora
raros!).
A seguir veremos o que pensam sobre
o assunto proprietários de restaurantes
e clientes.
O ponto de vista dos
restauranteurs cariocas
Jorge Renato, sócio do Restaurante
Garden, de Ipanema, salienta que os
impostos pesam muito para os restau-
rantes. “No fundo, o que importa é ter
uma margem de lucro que dê retorno ao
capital investido”, diz. Ele explica que
o restaurante tem determinado número
de lugares, um giro e um custo e que
para determinado número de clientes
haverá uma margem de lucro; se algo
não for pago (como o não consumo
de vinho da carta) a margem deve vir
de outro lugar, o que pode significar,
por exemplo, um aumento no preço
de seus pratos. “Nenhum restaurante é
uma instituição de caridade”, polemiza
Jorge Renato.
Já João Carlos Aleixo, proprietário
dos restaurantes Artigiano em Ipanema,
Pomodorino na Lagoa e Fiorino na
Tijuca, diz que cobrar a rolha é um “ato
simpático”, mas prefere que as pessoas
não levem a garrafa. Ele deixa clara
a sua política: “Procuro colocar uma
margem pequena sobre os vinhos, ter
sempre uma variedade grande na carta
e colocar vinhos para todas as faixas de
clientes, desde o mais exigente até os
iniciantes e sempre vinhos de qualida-
de”. Por outro lado, declara que não tem
vinhos caríssimos em seus restaurantes.
“Se um cliente quiser trazer um vinho
raro ou caro será bem recebido, pode
trazer à vontade vinhos acima de R$
1000 e não vou cobrar taxa de rolha”,
completa Aleixo. Ele salienta que procu-
ra comprar vinhos em quantidades gran-
des para obter o melhor preço e repassar
o benefício para ao cliente. “Pago sem-
pre à vista para obter o melhor preço”,
salienta ele. Pelo menos nove em cada
dez clientes pedem vinho em seus res-
taurantes, o que comprova o sucesso de
sua política.
Outros restaurantes preferem colocar
margens absurdas nos vinhos de suas
cartas. Existem casos em que a margem
é tão alta que o preço na carta chega
a ser três vezes o preço do importa-
dor. Nesses restaurantes, como é de se
esperar, o consumo de vinho é muito
menor.
Saiba tudo para não passar vergonha na hora de levar sua própria garrafa
Rolhas em Restaurantes: uma polêmica
CAPA
38
As diversas opiniões dos
sommeliers e chefs paulistanos
No D.O.M., um dos restaurantes mais
badalados de São Paulo, o sommelier
José Maria Lopes, que cobra R$ 50 pelo
serviço, acredita que a carta de vinhos
da casa tem uma ótima relação custo-
benefício. “Tenho vinhos cujo preço é
praticamente o mesmo da importadora.
Oferecemos o chileno “Don Melchor
1999” por R$ 249, encontrado na im-
portadora por R$ 247, ou seja, pra-
ticamente o mesmo preço”, ressalta ele,
que acredita na cobrança da taxa da
rolha como forma de “educar o cliente”.
“Se não cobrarmos, todos irão trazer o
vinho. Algumas pessoas recusam até
o couvert, pensando que é o valor
cobrado pelo pão e patê servidos antes
do prato, mas o couvert envolve todo o
serviço prestado, desde o manuseio do
garçom até o trabalho do sommelier”,
esclarece Lopes.
Um caso interessante é o do res-
taurante La Brasserie Erick Jacquin.
O valor da taxa varia de acordo com
a qualidade do vinho do cliente. “Se
o cliente traz um vinho que custa R$
40, cobramos R$ 20, e se ele traz, por
exemplo, algum Supertoscano, cobra-
mos R$ 100, o valor máximo”, declara
o sommelier da casa, Mauro Nilson
Monteiro. O restaurante, com ênfase
em rótulos franceses, tem aproximada-
mente 170 vinhos na carta, e o valor
é 25% maior do que o encontrado na
importadora. Para Monteiro, este per-
centual é justo, visto que alguns restau-
rantes dobram o preço do vinho.
No entanto, há quem louve o direito
do cliente em levar seu próprio vinho.
“Meu interesse é vender os vinhos que
tenho na carta, mas deixo o cliente à
vontade para trazer a bebida de sua
preferência”, diz Eduardo Borges, um
dos sócios do restaurante Allez, Allez!, a
sensação gastronômica paulistana. Para
ele, o valor de R$ 40 cobrado pela casa
é apenas uma taxa de conveniência e
proporciona uma boa relação custo-
benefício para o cliente. Mas Eduardo
diz que essa relação também está na
carta de vinhos. “Tenho bons vinhos
a preços acessíveis que proporcionam
uma ótima relação custo-benefício,
como um “Château de Haute Serre
1989”, um vinho safrado, por R$ 189, e
um “Cotes du Rhone Parallel 45”, safra
de 2003, por R$ 78”.
Com uma postura ainda mais
extrema – e amistosa para os enófilos
–, Neriton Vasconcelos, proprietário
do From The Galley, permite que os
clientes levem seus próprios vinhos
sem pagar nada. “Como consumidor,
detesto pagar a rolha; acho natural
pagar uma gorjeta para o garçom,
principalmente se alguém leva um
vinho que vale R$ 2000”, ressalta ele.
O mais surpreendente é que, apesar de
não cobrar pelo serviço, pouquíssimos
clientes levam seus vinhos.
A justificativa de Neriton para o fato
é o valor justo cobrado pelos vinhos no
restaurante. Um “Catena Chardonnay”,
por exemplo, custa R$ 65 na carta,
contra R$ 53,78 na importadora; ou
um “Montes Alpha Syrah 2004”, por R$
75, ao passo que na importadora custa
R$ 68,90. Essa atitude é, também, um
investimento de marketing, pois deixa
o cliente à vontade. “A pessoa paga o
que quer. Recentemente, uma cliente
trouxe um vinho que valia R$ 2000 e
deixou vinte de gorjeta para o garçom”,
diz Vasconcelos.
Um caso excepcional nesse ínterim
é o do restaurante Nakombi. O cliente
paga R$ 38 pelo serviço e é presenteado
com um vinho. Para o proprietário
Paulo Barossi, essa política incentiva
o retorno do cliente. “A pessoa toma
o vinho que quer e ainda leva uma
garrafa para casa. Não há prejuízo,
pois o cliente, indiretamente, compra
um vinho meu”, explica Barossi. Casos
como esse são raros.
Apesar do número crescente de res-
taurantes que permitem ao cliente levar
o próprio vinho, há alguns estabeleci-
mentos tradicionais da cidade que se
recusam a oferecer o serviço, como
os consagrados Fasano e Massimo.
Manoel Beato, sommelier do Fasano,
considera o serviço como uma desvan-
tagem. “O vinho faz parte da receita
do restaurante, que tem uma carta de
vinhos à altura de seu cardápio. Se for
39
AnnalisaViolaeEminOzkan/Stock.Xchng
permitido ao cliente trazer o próprio
vinho, o que pode ocorrer é que as pes-
soas podem passar no supermercado,
comprar uma garrafa qualquer e trazer
para cá. Se há um grande investimento
na carta, o estabelecimento precisa ter
o retorno”, justifica Beato.
Uma boa carta atrai os clientes mais
esclarecidos e de bom gosto. Essa é
a filosofia do restaurante Vinheria
Percussi, que contém cerca de 300
opções de vinho. O estabelecimento
não permite que clientes levam o pró-
prio vinho e abre exceções somente em
comemoraçõesespecíficasouencontros
de confrarias, com consentimento pré-
vio. Nesses casos excepcionais, cobra-
se R$ 30 como taxa da rolha. Em casos
extremamente especiais, o valor não
é cobrado. “Quando grandes vinhos
são trazidos, não fazemos sequer a
cobrança das rolhas. Normalmente, os
amantes da boa mesa e dos bons vinhos
têm conhecimento e bom senso para
consumir algum vinho da nossa carta”,
diz o proprietário Lamberto Percussi.
A carta da Vinheria Percussi oferece
opções com valores diferenciados para
que os clientes tenham liberdade de
escolha. No caso dos champagnes, por
exemplo, oferecem desde um “Möet &
Chandon Brut Imperial”, de 200ml, por
54 reais, até um “Louis Roederer Brut
Cristal 1990”, por R$ 1800.
Saber levar o vinho adequado é fun-
damental, segundo o mâitre do Le Chef
Rouge, Eudes Marques. “Deixamos o
cliente à vontade para trazer o vinho
que quiser, mas o importante é trazer
um vinho diferenciado”, diz Marques.
Além disso, o restaurante também deve
investir em uma carta de vinhos dife-
renciada, primando pela exclusividade.
“Se temos um vinho em nossa carta
que é facilmente encontrado em super-
mercados, nós o retiramos da carta”,
salienta Marques.
O ponto de vista além do
eixo Rio – São Paulo
Em Brasília, a proprietária da importa-
dora Vintage Vinhos, Tatiana Dualibe,
defende o serviço de rolha. Para ela,
o estabelecimento só tem a ganhar.
“Se o proprietário de um restaurante
cobra o serviço de rolha, pode investir
em uma carta de vinhos menor, porém
mais requintada, e isso também atrai o
cliente”, afirma Dualibe. Segundo ela,
o restauranteur também pode investir
na melhoria do serviço e na valoriza-
ção do cardápio oferecido pelo chef.
No entanto, a empresária ressalta que o
cliente deve ter a sensibilidade neces-
sária e um bom senso de escolha para
levar o próprio vinho. “É importante
ligar para o restaurante, pedir para dis-
ponibilizar a carta, pesquisar e, dessa
forma, levar um vinho especial. Se hou-
ver cooperação de ambas as partes, sou
super favorável ao serviço e vejo isso
de uma forma positiva”, diz ela.
CAPA
40 Rolhas em Restaurantes: uma polêmica
Em Belém, o chef Paulo Martins,
do restaurante Lá em Casa, adotou
uma política diferenciada: se o vinho
trazido pelo cliente for superior ao
oferecido na carta, o valor não é
cobrado. Segundo Martins, em Belém,
o hábito de se tomar vinho não é
tão grande como em outras capitais.
“Por enquanto ainda não faço grandes
investimentos, tenho vinhos bem usu-
ais, mas aos poucos vou aprimorando
a carta”, diz ele, que não vê proble-
mas em cobrar pelo serviço, mas tem
a mesma opinião de Tatiana Dualibe,
ou seja, o cliente deve saber escolher
a garrafa. “A pessoa tem a liberdade
de levar a garrafa que desejar, mas
se for um vinho que é oferecido em
minha carta, eu cobro”, afirma o
chef.
Já Pedro Corrêa, proprietário da
importadora Porto a Porto, de Curitiba,
afirma que no meio gastronômico do
país deve-se combater a “ditadura
do vinho”, ou seja, restaurantes que
fazem acordo de exclusividade com
uma única importadora e cobram
valores exorbitantes na carta. “Se há
concorrência entre as importadoras,
o preço cai e beneficia o cliente e o
restaurante. Ao cobrar um valor muito
alto, cria-se essa espécie de ditadura”,
explica Corrêa. Para o importador,
uma carta bem elaborada, com uma
margem correta e justa, é um atrativo
da casa.
O ponto de vista dos enófilos
Ricardo Farias, presidente da
Associação Brasileira de Sommeliers,
do Rio de Janeiro, lista alguns dos
motivos pelos quais costuma preferir
restaurantes em que possa levar seu
próprio vinho. “O custo quando se
leva o vinho é menor, mas o principal
é que se pode beber o vinho que se
quer em uma oportunidade de jantar
fora”, diz ele. Ricardo revela que nem
sempre leva vinho. “Experimentar as
novidades disponíveis nos restauran-
tes é uma outra faceta importante”,
salienta. Ele se diz favorável ao servi-
ço e aumenta a gorjeta quando leva o
vinho, pois os funcionários do restau-
rante têm o mesmo trabalho caso fosse
consumido um vinho da casa.
Um connaisseur radical, que sequer
olha a carta de vinhos, é o músico
Ed Motta. Sempre que sai para jantar,
leva sua garrafa. E salienta: se alguém
vier lhe cobrar a tarifa, não volta ao
restaurante, por mais que goste do
cardápio. Para o músico, o serviço
dos restaurantes não é tão bom para
cobrar o valor. “Se o lugar quer cobrar
pelo menos R$ 50, precisa ter copos
melhores e um decanter limpo, pois
99% dos restaurantes tem um decan-
ter sujo”, polemiza. Além disso, os
restaurantes devem diminuir a mar-
gem do valor cobrado pelos vinhos,
que, segundo o músico, é abusiva.
Segundo a etiqueta, o cliente só deve levar ao
restaurante vinhos de qualidade compatível
com os de sua carta
fotos:PitiReali
39
Qual a solução?
Apesar da polêmica e das diversas
opiniões, o serviço de rolha é cada
vez mais adotado pelos restaurantes
em todo o país. Se é benefício ou não
para o estabelecimento, ou uma forma
de atrair mais freqüentadores, o leitor,
a partir de agora, estará mais atento
quando optar por levar a própria garra-
fa ao visitar um restaurante. Afinal, não
é tão simples encontrar soluções que
atendam aos interesses tanto dos enófi-
los quanto dos restauranteurs. Todavia,
fica claro que o bom senso, em hipó-
tese alguma, deve ser abandonado em
nome das regras de mercado. Mas uma
coisa é certa, não deve-se abrir mão
dos bons restaurantes. E nem dos bons
vinhos. Santé!
1O cliente deve ligar antes para o restau-
rante e fazer sua reserva informando que
levará o próprio vinho. Deve também
aproveitar a ocasião para combinar as
condições (“taxa de rolha” ou similar) e
se certificar de que seu vinho não consta
na carta do restaurante (do contrário, não
é elegante levar a garrafa).
2 Os vinhos devem ser escolhidos para
acompanhar a refeição, ou seja, um vi-
nho para cada prato é o limite adequado.
O restaurante não é um lugar de degusta-
ção de vários rótulos, e sim para se fazer
uma refeição agradável.
3 Só se leva ao restaurante um vinho
de qualidade compatível com os de sua
carta.
4 Se o foco principal de uma casa é a
bebida – no caso de um bar a vin, por
exemplo – não cabe levar vinho.
5 O cliente deve ser discreto ao chegar
ao restaurante com seu vinho. A garra-
fa deve estar acondicionada em uma
bolsa própria para o transporte. Se pos-
sível, deve ser entregue ao sommelier ou
maître antes de se sentar à mesa.
6 O cliente deve considerar seriamente
a possibilidade de consumir também um
vinho do restaurante. Um espumante
para o início da refeição ou um vinho de
sobremesa, por exemplo.
7A gorjeta deve ser sempre acrescida de
um valor equivalente ao que seria dado
caso fossem consumidos vinhos da casa,
pois a equipe do restaurante prestou um
serviço e deve receber sua gratificação
por ele.
Etiqueta para a “Taxa de Rolha”
O que se deve fazer e evitar para levar
seu próprio vinho a um restaurante

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  • 1. 36 CAPA Alguns restaurantes cobram pelos vinhos de sua carta até três vezes o preço da importadora PitiReali
  • 2. 37 Rolhas em Restaurantes: uma polêmica por Fernando Roveri e Roberto Rodrigues L evar ou não levar uma garrafa de vinho a um restaurante? Essa é uma questão freqüente que surge em conversas entre enófilos e restauranteurs. Mas, raramente, existe um consenso sobre o assunto. Sem a pretensão de encontrar a “solu- ção”, apresentaremos alguns dos prin- cipais aspectos ligados à polêmica e diversas opiniões divergentes. Todos os enófilos possuem, em suas adegas, vinhos raros ou de safras excepcionais, reservados para ocasiões especiais, e muitas vezes gostariam de desarrolhar a garrafa em bons restau- rantes. Numa outra situação, clientes de um determinado restaurante con- sideram que a carta de vinhos não está à altura da qualidade dos pratos e preferem levar a garrafa. Não se pode esquecer que, muitas vezes, a margem de lucro que o restaurante coloca sobre os vinhos da carta é muito alta e deses- timula o consumo. Nas metrópoles brasileiras encon- tramos restaurantes com políticas (no bom sentido, por favor) diversas sobre o tema: ● os que proíbem terminantemente que seus clientes levem os próprios vinhos; ● os que permitem que os clientes levem seu próprio vinho, cobrando uma “taxa de rolha”, ou seja, um determinado valor correspondente ao serviço do vinho; ● os que permitem que os clientes levem seu próprio vinho desde que também consumam vinhos de sua carta; ● os que permitem que seus clientes levem seu próprio vinho sem qualquer restrição ou cobrança (existem, embora raros!). A seguir veremos o que pensam sobre o assunto proprietários de restaurantes e clientes. O ponto de vista dos restauranteurs cariocas Jorge Renato, sócio do Restaurante Garden, de Ipanema, salienta que os impostos pesam muito para os restau- rantes. “No fundo, o que importa é ter uma margem de lucro que dê retorno ao capital investido”, diz. Ele explica que o restaurante tem determinado número de lugares, um giro e um custo e que para determinado número de clientes haverá uma margem de lucro; se algo não for pago (como o não consumo de vinho da carta) a margem deve vir de outro lugar, o que pode significar, por exemplo, um aumento no preço de seus pratos. “Nenhum restaurante é uma instituição de caridade”, polemiza Jorge Renato. Já João Carlos Aleixo, proprietário dos restaurantes Artigiano em Ipanema, Pomodorino na Lagoa e Fiorino na Tijuca, diz que cobrar a rolha é um “ato simpático”, mas prefere que as pessoas não levem a garrafa. Ele deixa clara a sua política: “Procuro colocar uma margem pequena sobre os vinhos, ter sempre uma variedade grande na carta e colocar vinhos para todas as faixas de clientes, desde o mais exigente até os iniciantes e sempre vinhos de qualida- de”. Por outro lado, declara que não tem vinhos caríssimos em seus restaurantes. “Se um cliente quiser trazer um vinho raro ou caro será bem recebido, pode trazer à vontade vinhos acima de R$ 1000 e não vou cobrar taxa de rolha”, completa Aleixo. Ele salienta que procu- ra comprar vinhos em quantidades gran- des para obter o melhor preço e repassar o benefício para ao cliente. “Pago sem- pre à vista para obter o melhor preço”, salienta ele. Pelo menos nove em cada dez clientes pedem vinho em seus res- taurantes, o que comprova o sucesso de sua política. Outros restaurantes preferem colocar margens absurdas nos vinhos de suas cartas. Existem casos em que a margem é tão alta que o preço na carta chega a ser três vezes o preço do importa- dor. Nesses restaurantes, como é de se esperar, o consumo de vinho é muito menor. Saiba tudo para não passar vergonha na hora de levar sua própria garrafa
  • 3. Rolhas em Restaurantes: uma polêmica CAPA 38 As diversas opiniões dos sommeliers e chefs paulistanos No D.O.M., um dos restaurantes mais badalados de São Paulo, o sommelier José Maria Lopes, que cobra R$ 50 pelo serviço, acredita que a carta de vinhos da casa tem uma ótima relação custo- benefício. “Tenho vinhos cujo preço é praticamente o mesmo da importadora. Oferecemos o chileno “Don Melchor 1999” por R$ 249, encontrado na im- portadora por R$ 247, ou seja, pra- ticamente o mesmo preço”, ressalta ele, que acredita na cobrança da taxa da rolha como forma de “educar o cliente”. “Se não cobrarmos, todos irão trazer o vinho. Algumas pessoas recusam até o couvert, pensando que é o valor cobrado pelo pão e patê servidos antes do prato, mas o couvert envolve todo o serviço prestado, desde o manuseio do garçom até o trabalho do sommelier”, esclarece Lopes. Um caso interessante é o do res- taurante La Brasserie Erick Jacquin. O valor da taxa varia de acordo com a qualidade do vinho do cliente. “Se o cliente traz um vinho que custa R$ 40, cobramos R$ 20, e se ele traz, por exemplo, algum Supertoscano, cobra- mos R$ 100, o valor máximo”, declara o sommelier da casa, Mauro Nilson Monteiro. O restaurante, com ênfase em rótulos franceses, tem aproximada- mente 170 vinhos na carta, e o valor é 25% maior do que o encontrado na importadora. Para Monteiro, este per- centual é justo, visto que alguns restau- rantes dobram o preço do vinho. No entanto, há quem louve o direito do cliente em levar seu próprio vinho. “Meu interesse é vender os vinhos que tenho na carta, mas deixo o cliente à vontade para trazer a bebida de sua preferência”, diz Eduardo Borges, um dos sócios do restaurante Allez, Allez!, a sensação gastronômica paulistana. Para ele, o valor de R$ 40 cobrado pela casa é apenas uma taxa de conveniência e proporciona uma boa relação custo- benefício para o cliente. Mas Eduardo diz que essa relação também está na carta de vinhos. “Tenho bons vinhos a preços acessíveis que proporcionam uma ótima relação custo-benefício, como um “Château de Haute Serre 1989”, um vinho safrado, por R$ 189, e um “Cotes du Rhone Parallel 45”, safra de 2003, por R$ 78”. Com uma postura ainda mais extrema – e amistosa para os enófilos –, Neriton Vasconcelos, proprietário do From The Galley, permite que os clientes levem seus próprios vinhos sem pagar nada. “Como consumidor, detesto pagar a rolha; acho natural pagar uma gorjeta para o garçom, principalmente se alguém leva um vinho que vale R$ 2000”, ressalta ele. O mais surpreendente é que, apesar de não cobrar pelo serviço, pouquíssimos clientes levam seus vinhos. A justificativa de Neriton para o fato é o valor justo cobrado pelos vinhos no restaurante. Um “Catena Chardonnay”, por exemplo, custa R$ 65 na carta, contra R$ 53,78 na importadora; ou um “Montes Alpha Syrah 2004”, por R$ 75, ao passo que na importadora custa R$ 68,90. Essa atitude é, também, um investimento de marketing, pois deixa o cliente à vontade. “A pessoa paga o que quer. Recentemente, uma cliente trouxe um vinho que valia R$ 2000 e deixou vinte de gorjeta para o garçom”, diz Vasconcelos. Um caso excepcional nesse ínterim é o do restaurante Nakombi. O cliente paga R$ 38 pelo serviço e é presenteado com um vinho. Para o proprietário Paulo Barossi, essa política incentiva o retorno do cliente. “A pessoa toma o vinho que quer e ainda leva uma garrafa para casa. Não há prejuízo, pois o cliente, indiretamente, compra um vinho meu”, explica Barossi. Casos como esse são raros. Apesar do número crescente de res- taurantes que permitem ao cliente levar o próprio vinho, há alguns estabeleci- mentos tradicionais da cidade que se recusam a oferecer o serviço, como os consagrados Fasano e Massimo. Manoel Beato, sommelier do Fasano, considera o serviço como uma desvan- tagem. “O vinho faz parte da receita do restaurante, que tem uma carta de vinhos à altura de seu cardápio. Se for
  • 4. 39 AnnalisaViolaeEminOzkan/Stock.Xchng permitido ao cliente trazer o próprio vinho, o que pode ocorrer é que as pes- soas podem passar no supermercado, comprar uma garrafa qualquer e trazer para cá. Se há um grande investimento na carta, o estabelecimento precisa ter o retorno”, justifica Beato. Uma boa carta atrai os clientes mais esclarecidos e de bom gosto. Essa é a filosofia do restaurante Vinheria Percussi, que contém cerca de 300 opções de vinho. O estabelecimento não permite que clientes levam o pró- prio vinho e abre exceções somente em comemoraçõesespecíficasouencontros de confrarias, com consentimento pré- vio. Nesses casos excepcionais, cobra- se R$ 30 como taxa da rolha. Em casos extremamente especiais, o valor não é cobrado. “Quando grandes vinhos são trazidos, não fazemos sequer a cobrança das rolhas. Normalmente, os amantes da boa mesa e dos bons vinhos têm conhecimento e bom senso para consumir algum vinho da nossa carta”, diz o proprietário Lamberto Percussi. A carta da Vinheria Percussi oferece opções com valores diferenciados para que os clientes tenham liberdade de escolha. No caso dos champagnes, por exemplo, oferecem desde um “Möet & Chandon Brut Imperial”, de 200ml, por 54 reais, até um “Louis Roederer Brut Cristal 1990”, por R$ 1800. Saber levar o vinho adequado é fun- damental, segundo o mâitre do Le Chef Rouge, Eudes Marques. “Deixamos o cliente à vontade para trazer o vinho que quiser, mas o importante é trazer um vinho diferenciado”, diz Marques. Além disso, o restaurante também deve investir em uma carta de vinhos dife- renciada, primando pela exclusividade. “Se temos um vinho em nossa carta que é facilmente encontrado em super- mercados, nós o retiramos da carta”, salienta Marques. O ponto de vista além do eixo Rio – São Paulo Em Brasília, a proprietária da importa- dora Vintage Vinhos, Tatiana Dualibe, defende o serviço de rolha. Para ela, o estabelecimento só tem a ganhar. “Se o proprietário de um restaurante cobra o serviço de rolha, pode investir em uma carta de vinhos menor, porém mais requintada, e isso também atrai o cliente”, afirma Dualibe. Segundo ela, o restauranteur também pode investir na melhoria do serviço e na valoriza- ção do cardápio oferecido pelo chef. No entanto, a empresária ressalta que o cliente deve ter a sensibilidade neces- sária e um bom senso de escolha para levar o próprio vinho. “É importante ligar para o restaurante, pedir para dis- ponibilizar a carta, pesquisar e, dessa forma, levar um vinho especial. Se hou- ver cooperação de ambas as partes, sou super favorável ao serviço e vejo isso de uma forma positiva”, diz ela.
  • 5. CAPA 40 Rolhas em Restaurantes: uma polêmica Em Belém, o chef Paulo Martins, do restaurante Lá em Casa, adotou uma política diferenciada: se o vinho trazido pelo cliente for superior ao oferecido na carta, o valor não é cobrado. Segundo Martins, em Belém, o hábito de se tomar vinho não é tão grande como em outras capitais. “Por enquanto ainda não faço grandes investimentos, tenho vinhos bem usu- ais, mas aos poucos vou aprimorando a carta”, diz ele, que não vê proble- mas em cobrar pelo serviço, mas tem a mesma opinião de Tatiana Dualibe, ou seja, o cliente deve saber escolher a garrafa. “A pessoa tem a liberdade de levar a garrafa que desejar, mas se for um vinho que é oferecido em minha carta, eu cobro”, afirma o chef. Já Pedro Corrêa, proprietário da importadora Porto a Porto, de Curitiba, afirma que no meio gastronômico do país deve-se combater a “ditadura do vinho”, ou seja, restaurantes que fazem acordo de exclusividade com uma única importadora e cobram valores exorbitantes na carta. “Se há concorrência entre as importadoras, o preço cai e beneficia o cliente e o restaurante. Ao cobrar um valor muito alto, cria-se essa espécie de ditadura”, explica Corrêa. Para o importador, uma carta bem elaborada, com uma margem correta e justa, é um atrativo da casa. O ponto de vista dos enófilos Ricardo Farias, presidente da Associação Brasileira de Sommeliers, do Rio de Janeiro, lista alguns dos motivos pelos quais costuma preferir restaurantes em que possa levar seu próprio vinho. “O custo quando se leva o vinho é menor, mas o principal é que se pode beber o vinho que se quer em uma oportunidade de jantar fora”, diz ele. Ricardo revela que nem sempre leva vinho. “Experimentar as novidades disponíveis nos restauran- tes é uma outra faceta importante”, salienta. Ele se diz favorável ao servi- ço e aumenta a gorjeta quando leva o vinho, pois os funcionários do restau- rante têm o mesmo trabalho caso fosse consumido um vinho da casa. Um connaisseur radical, que sequer olha a carta de vinhos, é o músico Ed Motta. Sempre que sai para jantar, leva sua garrafa. E salienta: se alguém vier lhe cobrar a tarifa, não volta ao restaurante, por mais que goste do cardápio. Para o músico, o serviço dos restaurantes não é tão bom para cobrar o valor. “Se o lugar quer cobrar pelo menos R$ 50, precisa ter copos melhores e um decanter limpo, pois 99% dos restaurantes tem um decan- ter sujo”, polemiza. Além disso, os restaurantes devem diminuir a mar- gem do valor cobrado pelos vinhos, que, segundo o músico, é abusiva. Segundo a etiqueta, o cliente só deve levar ao restaurante vinhos de qualidade compatível com os de sua carta fotos:PitiReali
  • 6. 39 Qual a solução? Apesar da polêmica e das diversas opiniões, o serviço de rolha é cada vez mais adotado pelos restaurantes em todo o país. Se é benefício ou não para o estabelecimento, ou uma forma de atrair mais freqüentadores, o leitor, a partir de agora, estará mais atento quando optar por levar a própria garra- fa ao visitar um restaurante. Afinal, não é tão simples encontrar soluções que atendam aos interesses tanto dos enófi- los quanto dos restauranteurs. Todavia, fica claro que o bom senso, em hipó- tese alguma, deve ser abandonado em nome das regras de mercado. Mas uma coisa é certa, não deve-se abrir mão dos bons restaurantes. E nem dos bons vinhos. Santé! 1O cliente deve ligar antes para o restau- rante e fazer sua reserva informando que levará o próprio vinho. Deve também aproveitar a ocasião para combinar as condições (“taxa de rolha” ou similar) e se certificar de que seu vinho não consta na carta do restaurante (do contrário, não é elegante levar a garrafa). 2 Os vinhos devem ser escolhidos para acompanhar a refeição, ou seja, um vi- nho para cada prato é o limite adequado. O restaurante não é um lugar de degusta- ção de vários rótulos, e sim para se fazer uma refeição agradável. 3 Só se leva ao restaurante um vinho de qualidade compatível com os de sua carta. 4 Se o foco principal de uma casa é a bebida – no caso de um bar a vin, por exemplo – não cabe levar vinho. 5 O cliente deve ser discreto ao chegar ao restaurante com seu vinho. A garra- fa deve estar acondicionada em uma bolsa própria para o transporte. Se pos- sível, deve ser entregue ao sommelier ou maître antes de se sentar à mesa. 6 O cliente deve considerar seriamente a possibilidade de consumir também um vinho do restaurante. Um espumante para o início da refeição ou um vinho de sobremesa, por exemplo. 7A gorjeta deve ser sempre acrescida de um valor equivalente ao que seria dado caso fossem consumidos vinhos da casa, pois a equipe do restaurante prestou um serviço e deve receber sua gratificação por ele. Etiqueta para a “Taxa de Rolha” O que se deve fazer e evitar para levar seu próprio vinho a um restaurante