4. Em síntese:
Características gerais:
* Racionalidade
* Rigor Científico
* Dignidade do Ser Humano
* Ideal Humanista
* Reutilização das artes greco-romana
a) Racionalismo – a razão é o único caminho para se chegar ao conhecimento.
b) Experimentalismo – todo o conhecimento deverá ser demonstrado
racionalmente.
c) Antropocentrismo – colocava o homem como a suprema criação de Deus e como
o centro do universo.
d) Humanismo – glorificação do homem e da natureza humana, em contraposição
ao divino e ao sobrenatural.
e) Classicismo - movimento cultural que valoriza e recupera os elementos artísticos
da cultura clássica (greco-romana). Ocorreu nas artes plásticas, teatro e literatura,
nos séculos XIV ao XVI.
5. As características da epopeia:
• A epopeia é um género narrativo em verso;
• visa celebrar feitos grandiosos de heróis fora do comum reais ou lendários.;
• tem pois sempre um fundo histórico;
• é um género narrativo e que exige a presença de uma acção, desempenhada por
personagens num determinado tempo e espaço.
• O estilo é elevado e grandioso e possui uma estrutura própria, cujos principais aspectos
são:
PROPOSIÇÃO - em que o autor apresenta a matéria do poema;
INVOCAÇÃO – pedido de inspiração às musas ou outras divindades e entidades míticas
protectoras das artes;
DEDICATÓRIA - em que o autor dedica o poema a alguém, sendo esta facultativa;
NARRAÇÃO - a acção é narrada por ordem cronológica dos acontecimentos, mas inicia-se já
no decurso dos acontecimentos (“in medias res”), sendo a parte inicial narrada
posteriormente num processo de retrospectiva, “flash-back” ou “analepse”;
PRESENÇA DE MITOLOGIA GRECO-LATINA - contracenando heróis mitológicos e heróis humanos.
6. A narrativa organiza-se em quatro planos:
Plano da viagem - A viagem de Vasco da Gama de Lisboa até à Índia.
Saída de Belém, paragem em Melinde e chegada a Calecut
Plano Mitológico, em alternância, ocupam uma posição importante.
Plano da História de Portugal – Quando Vasco da Gama ou outro
narrador conta, por exemplo ao rei de Melinde, a História de Portugal.
Está encaixada na viagem.
Plano do Poeta – ou as considerações pessoais aparecem normalmente
nos finais de canto e constituem, de um modo geral, a visão crítica do
poeta sobre o seu tempo.
A narrativa organiza-se de forma anacrónica:
Passado – reconto da História de Portugal desde as origens até D. Manuel I. (analepse)
Presente – tempo da acção central do poema, ou seja, da viagem de Vasco da Gama,
iniciada “ in media res”.
Futuro – Profecias . (prolepse)
9. Proposição I
As armas, e os barões assinalados Todos os homens ilustres
Sinédoque – Que, saíram de Portugal
apresentar a Que, da Ocidental praia Lusitana,
parte pelo E foram por mares desconhecidos -
todo
Por mares nunca dantes navegados, navegadores
Passaram além da já conhecida ilha de
Passaram ainda além da Taprobana, Ceilão
Em perigos e guerras esforçados Enfrentaram perigos enormes,
Mesmo superiores ao seu estatuto de
Hipérbole –
exagero da Mais do que prometia a força humana, ser humano – afasta-os do comum
realidade mortal
E entre gente remota edificaram Construíram um novo império em
terras distantes. Um reino que tanto
Novo Reino, que tanto sublimaram; desejaram
O sujeito poético começa por apresentar os destinatários da epopeia, valorizando já os
seus feitos e aproximando-os já de um estatuto acima do humano.
Fazem-se referências a factos históricos e locais concretos.
10. Gerúndio –
processo de
enumeração continuidade
II
E também as memórias gloriosas E aqueles reis que estiveram
envolvidos na reconquista cristã
Daqueles Reis que foram dilatando /nas cruzadas contra os
Conjunção
coordenativa mouros/infiéis em África e na
copulativa – A Fé, o Império, e as terras viciosas
Ásia
enumeração de
figuras a ser De África e de Ásia andaram devastando;
exaltadas
E aqueles que fazem obras com
E aqueles que por obras valerosas valor e que, por isso, não cairão
no esquecimento – se vão
Se vão da lei da Morte libertando. imortalizando
Cantando espalharei por toda aaparte,
Cantando espalharei por toda parte, O sujeito poético compromete-
se a exaltar a louvar, a cantar os
Se a tanto me ajudar ooengenho eearte.
Se a tanto me ajudar engenho arte.
feitos daqueles que enumerou
anteriormente. Usando a
1ª pessoa do primeira pessoa – plano do
singular – poeta.
envolvimento do
poeta
11. Herói de Herói de
Odisseia - Eneida -
III Ulisses Eneias
Cessem do sábio Grego e do Troiano Num tom imperativo, de ordem
As navegações grandes que fizeram; manda suspender/cessar a fama
Imperativo dos gregos e romanos
de Alexandro e de Trajano
Manda suspender a fama das
A fama das vitórias que tiveram; vitórias de reis e imperadores
clássicos
Que eu canto o peito ilustre Lusitano,
Porque o poeta louva o povo
A quem Neptuno e Marte obedeceram. lusitano ao qual pertence.
Conjunção Povo esse que dominou o mar
subordinativa Cesse tudo o que a Musa antiga canta, (Neptuno)e a guerra (Marte).
causal (= porque)
. Apresenta a Que outro valor mais alto se alevanta.
causa da Continua em tom imperativo,
desvalorização ordenando que os clássicos
dos clássicos
Neptuno – deus do mar suspendam a sua fama, porque
Marte – deus da guerra agora há um novo povo que
1ª pessoa do
Patriotismo, apresenta feitos ainda mais
singular –
valores
envolvimento
nacionais valerosos.
do poeta
Para demonstrar a superioridade e a legitimidade da realização desta epopeia, o
poeta compara os feitos dos Portugueses aos de Ulisses, herói da Odisseia de Homero e
aos de Eneias, o troiano que, na Eneida de Virgílio, chegou ao Lácio e fundou Roma, ou
seja compara o seu herói com os heróis das epopeias de referência.
12. Proposição
Canto I, est. 1-3,
• Camões proclama ir cantar as grandes vitórias e os homens ilustres –
“as armas e os barões assinalados”;
•as conquistas e navegações no Oriente (reinados de D. Manuel e de D. João III);
•as vitórias em África e na Ásia desde D. João a D. Manuel, que dilataram “a fé e o
império”;
• e, por último, todos aqueles que pelas suas obras valorosas “se vão da lei da morte
libertando”, todos aqueles que mereceram e merecem a “imortalidade” na memória
dos homens.
13. A proposição aponta também para os “ingredientes” que constituíram os quatro planos
do poema:
Plano da Viagem - celebração de uma viagem:
"...da Ocidental praia lusitana / Por mares nunca dantes navegados
/ Passaram além da Tapobrana...";
Plano da História - vai contar-se a história de um povo:
"...o peito ilustre lusitano..."."...as memórias gloriosas /
Daqueles Reis que foram dilatando / A Fé, o império e as
terras viciosas / De África e de Ásia...";
Plano dos Deuses (ou do Maravilhoso) aos quais os Portugueses se equiparam:
"... esforçados / Mais do que prometia a força humana..."."A quem Neptuno e Marte
obedeceram...";
Plano do Poeta - em que a voz do poeta se ergue, na primeira pessoa:
"...Cantando espalharei por toda a parte. / Se a tanto me ajudar o engenho e
arte..."."...Que eu canto o peito ilustre lusitano...".
14. Funcionamento da língua
Identificação de orações subordinadas relativas
I
As armas, e os barões assinalados
Que, da Ocidental praia Lusitana,
Por mares nunca dantes navegados,
Passaram ainda além da Taprobana,
Em perigos e guerras esforçados
Mais do que prometia a força humana,
E entre gente remota edificaram
Novo Reino, que tanto sublimaram;
15. Funcionamento da língua
Identificação de orações subordinadas causais / relativas
III
Cessem do sábio Grego e do Troiano
As navegações grandes que fizeram;
de Alexandro e de Trajano
A fama das vitórias que tiveram;
porque Que eu canto o peito ilustre Lusitano,
A quem Neptuno e Marte obedeceram.
Cesse tudo o que a Musa antiga canta,
porque Que outro valor mais alto se alevanta.
16. Funcionamento da língua
Identificação de Conjugação perifrástica
II
E também as memórias gloriosas
Daqueles Reis que foram dilatando
A Fé, o Império, e as terras viciosas
De África e de Ásia andaram devastando;
E aqueles que por obras valerosas
Se vão da lei da Morte libertando.
c
17. Funcionamento da língua
Nome próprio
Identificação de classes e subclasses de palavras
Nome comum
I
As armas, e os barões assinalados
Conjunção
Que, da Ocidental praia Lusitana,
Por mares nunca dantes navegados,
Passaram ainda além da Taprobana, Preposição
Em perigos e guerras esforçados
Mais do que prometia a força humana, Pronome relativo
E entre gente remota edificaram
Novo Reino, que tanto sublimaram; Determinante artigo definido
Determinante demonstrativo
II
Pronome demonstrativo
E também as memórias gloriosas
Daqueles reis que foram dilatando Advérbio
A Fé, o Império, e as terras viciosas
De África e de Ásia andaram devastando; Adjectivo
E aqueles que por obras valerosas
Se vão da lei da Morte libertando.
18. Funcionamento da língua
Graus dos adjectivos
Elabora frases onde uses os adjectivos nos graus indicados
adjectivo Grau
valorosas Grau normal
remotas Grau comparativo de superioridade
glorioso Grau comparativo de inferioridade
famoso Grau comparativo de igualdade
importante Grau superlativo relativo de superioridade
conhecido Grau superlativo relativo de nferioridade
falador Grau superlativo absoluto analítico
famoso Grau superlativo absoluto sintético
19. Correcção
adjectivo Grau
valorosas Grau normal
… mais remotas do que… Grau comparativo de superioridade
… menos glorioso do que… Grau comparativo de inferioridade
…tão famoso como… Grau comparativo de igualdade
… o mais importante… Grau superlativo relativo de superioridade
… o menos conhecido… Grau superlativo relativo de nferioridade
… muito falador…. Grau superlativo absoluto analítico
…famosíssimo… Grau superlativo absoluto sintético
Seguir para a Invocação
20. Invocação
Canto I, est. 4-5, o poeta pede ajuda a entidades mitológicas, chamadas musas. Isso
acontece várias vezes ao longo do poema, sempre que o autor precisa de inspiração:
Tágides ou ninfas do Tejo (Canto I, est. 4-5);
Calíope - musa da eloquência e da poesia épica (Canto II, est. 1-2);
Ninfas do Tejo e do Mondego (Canto VII, est. 78-87);
Calíope (Canto X, est. 8-9);
Calíope (Canto X, est. 145).
21. Anáfora - é uma figura de estilo
que consiste em repetir a mesma Metáfora –
palavra no princípio de várias frases. Aposto Perífrase dar coragem
Invocação estrofes 4-5 Apóstrofe
E vós, Tágides minhas, pois criado
Invocar significa apelar, pedir, suplicar.
Tendes em mi um novo engenho ardente Daí a presença do Imperativo.
Se sempre, em verso humilde, celebrado
Foi de mi vosso rio alegremente, Nestas estrofes, Camões dirige-se às
Tágides, as ninfas do Tejo, pedindo-lhes
Dai-me agora um som alto e sublimado que o ajudem a cantar os feitos dos
Um estilo grandíloco e corrente, portugueses de uma forma sublime.
Por que de vossas águas Febo ordene Até aí apenas usou a inspiração na
humilde lírica, mas agora precisa de
Que não tenham enveja às de Hipocrene.
uma inspiração superior.
Dai-me hua fúria grande e sonorosa, O estilo da epopeia aparece aqui descrito:
E não de agreste avena ou frauta ruda, “alto e sublimado”
”Um estilo grandíloco e corrente.“
Mas de tuba canora e belicosa,
“fúria grande e sonorosa”
Que o peito acende e a cor ao gesto muda. “tuba canora e belicosa”
Dai-me igual canto aos feitos da famosa “Que se espalhe e se cante no Universo”
Gente vossa, que a Marte tanto ajuda;
-“Que se espalhe e se cante no Universo, Se
Que se espalhe e se cante no Universo tão Sublime preço cabe em verso” Ou seja
Se tão sublime preço cabe em verso. ,Camões quer que a mensagem se espalhe e
que cante ao universo os feitos dos
Conjunção Imperativo portugueses
subordinativa
condicional
22. Dedicatória ***(sem leitura obrigatória)
Canto I, est. 6-18, é o oferecimento do poema a D.
Sebastião, que encara toda a esperança do poeta,
que quer ver nele um monarca poderoso, capaz de
retomar “a dilatação da fé e do império” e de
ultrapassar a crise do momento.
Termina com uma exortação ao rei para que
também se torne digno de ser cantado,
prosseguindo as lutas contra os Mouros.
Exórdio (est. 6-8) - início do discurso;
Exposição (est. 9-11) - corpo do discurso;
Confirmação (est. 12-14) - onde são apresentados os exemplos;
Peroração (est. 15-17) - espécie de recapitulação ou remate;
Epílogo (est. 18) - conclusão.
23. Dedicatória estrofes 6-8
E vós, ó bem nascida segurança
Metáfora e Apóstrofe : Vós, tenro e novo ramo
Da Lusitana antiga liberdade, florecente”,
E não menos certíssima esperança
De aumento da pequena Cristandade, -“E vós” 6estrofe-1linha: A D.Sebastião
Vós, ó novo temor da Maura lança, -“Maravilha Fatal da Nossa Idade”: Elogio a
Maravilha fatal da nossa idade, D.Sebastião
Dada ao mundo por Deus, que todo o mande,
Pera do mundo a Deus dar parte grande.
Vós, tenro e novo ramo florecente,
De hua árvore, de Cristo mais amada
Que nenhua nascida no Ocidente,
Cesária ou Cristianíssima chamada,
Vede-o no vosso escudo, que presente
Vos amostra a vitória já passada,
Na qual vos deu por armas e deixou
As que Ele pera Si na Cruz tomou;
Vós, poderoso Rei, cujo alto Império
O Sol, logo em nascendo, vê primeiro;
Vê-o também no meio do Hemisfério,
E, quando dece, o deixa derradeiro;
Vós, que esperamos jugo e vitupério
Do tope Ismaelita cavaleiro,
Do Turco Oriental e do Gentio
Que inda bebe o licor do santo Rio: (...)
24. Narração
Começa no Canto I, est. 19
• constitui a acção principal que, à maneira clássica, se inicia “in medias res”, isto é,
quando a viagem já vai a meio, “Já no largo oceano navegavam”, encontrando-se já
os portugueses em pleno Oceano Índico.
• Este começo da acção central, a viagem da descoberta do caminho marítimo para a
Índia, quando os portugueses se encontram já a meio do percurso do canal de
Moçambique vai permitir:
A narração do percurso até Melinde (narrador heterodiegético);
A narração da História de Portugal até à viagem (por Vasco da Gama);
A inclusão da narração da primeira parte da viagem;
A apresentação do último troço da viagem (narrador heterodiegético).
27. Consílio dos Deuses - plano mitológico Canto I – 19-41c
Os Deuses reúnem-se para decidir se ajudam ou não os portugueses a chegar à Índia.
Esta reunião foi presidida por Júpiter, tendo estado presentes todos os Deuses convocados.
Os Deuses sentem a necessidade de reunir face aos feitos gloriosos conseguido até ao
momento.
Júpiter decide ajudá-los, pois considera que os portugueses, pelos seus feitos passados,
são dignos de tal ajuda.
Baco, pelo contrário, não queria que os portugueses fossem para a Índia, com medo
de perder a sua fama no Oriente.
Vénus apoia Júpiter, pois vê reflectida nos portugueses a força e a coragem do seu filho
Eneias e dos seus descendentes, os romanos. Vénus defende os portugueses não só por se
tratar de uma gente muito semelhante à do seu amado povo latino e com uma língua
derivada do Latim, como também por terem demonstrado grande valentia no norte de
África.
Marte - deus defensor desta gente lusitana, porque o amor antigo que o ligava a Vénus o
leva a tomar essa posição e porque reconhece a bravura deste povo. Marte consegue
convencer Júpiter a não abdicar da sua decisão e assim, os portugueses serão recebidos
num porto amigo. Pede a Mercúrio - o Deus mensageiro - que colha informações sobre a
Índia, pois começa a desconfiar da posição tomada por Baco.
Este consílio termina com a decisão favorável aos portugueses e cada um dos deuses regressa
ao seu domínio celeste.
28. Consílio dos Deuses - plano mitológico Canto I – 19-41
Já no largo Oceano navegavam, A narração começa “in média”. Já no oceano
Pacífico.
As inquietas ondas apartando;
Faz-se referência ao domínio da técnica da
Os ventos brandamente respiravam, navegação, dominada pelos portugueses.
Das naus as velas côncavas inchando;
Da branca escuma os mares se mostravam
Cobertos, onde as proas vão cortando
As marítimas águas consagradas,
Que do gado de Próteu são cortadas,
Perífrase
Quando os Deuses no Olimpo luminoso, Apresenta-se então:
Conjunção - o local da reunião - Olimpo;
Onde o governo está da humana gente,
subordinativa
- o objectivo da reunião – decisão sobre as
temporal Se ajuntam em consílio glorioso, coisas do Oriente.
Sobre as cousas futuras do Oriente.
Pisando o cristalino Céu fermoso,
Indicação da forma como os deuses foram
Vêm pela Via Láctea juntamente, convocados: foi Mercúrio que avisou todos os
Convocados, da parte de Tonante, deuses cumprindo a vontade de Júpiter.
Pelo neto gentil do velho Atlante.
Perífrase
29. 21
Deixam dos sete Céus o regimento, Reunião dos deuses vindos de
todos os quadrantes: N, S, E, O.
Que do poder mais alto lhe foi dado,
Alto poder, que só co pensamento
Governa o Céu, a Terra e o Mar irado.
Perífrase -
Júpiter Ali se acharam juntos num momento
Os que habitam o Arcturo congelado
Perífrases:
E os que o Austro têm e as partes onde
Norte, Sul,
Oriente e
A Aurora nasce e o claro Sol se esconde.
Ocidente
22
Estava o Padre ali, sublime e dino, É apresentada a descrição de
Júpiter – um deus poderoso,
Que vibra os feros raios de Vulcano, soberano, severo.
Num assento de estrelas cristalino,
Com gesto alto, severo e soberano;
Do rosto respirava um ar divino,
Que divino tornara um corpo humano;
Com ũa coroa e ceptro rutilante,
De outra pedra mais clara que diamante.
30. 23
Descrição Em luzentes assentos, marchetados
de um local Caracterização do espaço
rico, De ouro e de perlas, mais abaixo estavam do Olimpo e Organização
luxuoso, do espaço.
sublime. Os outros Deuses, todos assentados
Os deuses sentam-se
Como a Razão e a Ordem concertavam segundo a sua hierarquia.
(Precedem os antigos, mais honrados,
Mais abaixo os menores se assentavam);
Quando Júpiter alto, assi dizendo, Introdução ao discurso de
Júpiter – Discurso directo.
Cum tom de voz começa grave e horrendo:
24 Apóstrofe, indicação dos
– «Eternos moradores do luzente, destinatários do seu discurso –
Apóstrofe
e perífrase
os restantes deuses
Estelífero Pólo e claro Assento: Início do discurso de Júpiter
Se do grande valor da forte gente
De Luso não perdeis o pensamento,
Júpiter começa por recordar
Deveis de ter sabido claramente que é do conhecimento geral
Como é dos Fados grandes certo intento que os Fados têm a intenção de
tornar este povo luso superior
Que por ela se esqueçam os humanos aos antigos heróis.
Enumeração
De Assírios, Persas, Gregos e Romanos.
31. 25
Já lhe foi (bem o vistes) concedido,
Cum poder tão singelo e tão pequeno,
Tomar ao Mouro forte e guarnecido Júpiter recorda as vitórias e
a protecção concedidas e
Toda a terra que rega o Tejo ameno. realizadas pelos lusos.
Pois contra o Castelhanovtão temido Lutou contra os Mouros e
sinédoque
contra os castelhanos e
Sempre alcançou favor do Céu sereno: sempre foi protegido pelas
Assi que sempre, enfim, com fama e glória, divindades.
Os
inimigos
que teve Teve os troféus pendentes da vitória.
de
enfrentar 26
são
apresenta Deixo, Deuses, atrás a fama antiga,
dos como Júpiter continua a relembra as
“fortes” e Que co a gente de Rómulo alcançaram,
raízes do povo português:
“temidos”,
reforçando Quando com Viriato, na inimiga . Guerra com os Romanos,
o seu valor . A importância e valor de Viriato,
Guerra Romana, tanto se afamaram;
. Lendas romanas.
Também deixo a memória que os obriga
vocativo
A grande nome, quando alevantaram
Um por seu capitão, que, peregrino,
Fingiu na cerva espírito divino.
32. O
27
advérbio
“agora” –
Agora vedes bem que, cometendo Júpiter reconhece a força a
antes
O duvidoso mar num lenho leve, coragem para descobrir e explorar
esteve a territórios em locais tão diferentes.
falar do
passado,
Por vias nunca usadas, não temendo
“agora”
falará do
de Áfrico e Noto a força, a mais s'atreve:
presente
–
Que, havendo tanto já que as partes vendo
Onde o dia é comprido e onde breve,
E diz que agora querem explorar o
Inclinam seu propósito e perfia oriente.
perífrase A ver os berços onde nasce o dia.
28
Prometido lhe está do Fado eterno,
Júpiter reafirma que os Fados já
Cuja alta lei não pode ser quebrada, determinaram a glória dos
portugueses.
Que tenham longos tempos o governo
Do mar que vê do Sol a roxa entrada.
Nas águas têm passado o duro Inverno;
Júpiter considera os portugueses
A gente vem perdida e trabalhada; merecedores de algum recobro e
Já parece bem feito que lhe seja reconforto, pois as tripulações
estão cansadas. Apresenta pois a
Mostrada a nova terra que deseja. sua posição pessoal
33. E porque, como vistes, têm passados A viagem tem levado a enfrentar
Na viagem tão ásperos perigos, perigos, climas, intempéries…
Tantos climas e céus exprimentados,
Tanto furor de ventos inimigos,
Júpiter apresenta a sua
Que sejam, determino, agasalhados determinação em apoiar os
portugueses, mostrando-lhes terra
Nesta costa Africana como amigos;
e assegurando-lhes que serão bem
E, tendo guarnecido a lassa frota, “agasalhados” para que depois
possam seguir viagem.
Tornarão a seguir sua longa rota.»
Final do discurso de Júpiter
Posição de Baco
Estas palavras Júpiter dizia,
Júpiter terminara o seu
Quando os Deuses, por ordem respondendo, discurso e os deuses
apresentam as suas
Na sentença um do outro diferia, posições
Razões diversas dando e recebendo.
O padre Baco ali não consentia
No que Júpiter disse, conhecendo Baco, deus do vinho, teme
perder a sua fama no Oriente.
Que esquecerão seus feitos no Oriente
Se lá passar a Lusitana gente.
34. 31
Ouvido tinha aos Fados que viria
Ũa gente fortíssima de Espanha Baco já tinha ouvido a fama deste povo
e sabe que este povo levará ao
Pelo mar alto, a qual sujeitaria esquecimento dos antigos heróis,
Perífrase- Da Índia tudo quanto Dóris banha, entre eles, o próprio Baco.
Pacífico/
oriente E com novas vitórias venceria E mais uma vez se reforça a ideia de
que perderia a fama que ainda tem no
A fama antiga, ou sua ou fosse estranha. Oriente (Nisa).
Altamente lhe dói perder a glória
De que Nisa celebra inda a memória.
32
Vê que já teve o Indo sojugado Baco nunca fora posto em causa por
nenhum herói ou poeta.
E nunca lhe tirou Fortuna ou caso
Por vencedor da Índia ser cantado
Perífrase - De quantos bebem a água de Parnaso.
poetas
Teme agora que seja sepultado Baco teme agora que o seu nome seja
votado ao esquecimento e à “morte” – este
Metáfora - Seu tão célebre nome em negro vaso medo reforça o valor dos lusos, pois são um
esquecimen
D' água do esquecimento, se lá chegam poder fora de comum.
to
Os fortes Portugueses que navegam.
35. Posição de Vénus
Sustentava contra ele Vénus bela,
Afeiçoada à gente Lusitana Vénus defendia os
portugueses:
Por quantas qualidades via nela -Descendentes dos
romanos;
Da antiga, tão amada, sua Romana; - coragem e força
Nos fortes corações, na grande estrela demonstrada;
-Uso da língua com
Que mostraram na terra Tingitana, origem latina.
E na língua, na qual quando imagina,
Com pouca corrupção crê que é a Latina.
34
Vénus defendia os
Estas causas moviam Citereia, portugueses, pois sabe
que se eles tiverem
E mais, porque das Parcas claro entende
sucesso ela também
Que há-de ser celebrada a clara Deia será louvada.
Onde a gente belígera se estende.
Assi que, um, pela infâmia que arreceia, Enquanto Baco se
opõe, porque não
E o outro, pelas honras que pretende,
quer perder a fama,
Debatem, e na perfia permanecem; Vénus defendia, pois
deseja ser louvada.
A qualquer seus amigos favorecem.
36. Balanço da discussão
Qual Austro fero ou Bóreas na espessura
De silvestre arvoredo abastecida,
Rompendo os ramos vão da mata escura
A agitação dos ventos era
Com ímpeto e braveza desmedida, grande, evidenciando a
Brama toda montanha, o som murmura, agitação da discussão
gerada no Olimpo.
Rompem-se as folhas, ferve a serra erguida: A natureza reflecte o
Tal andava o tumulto, levantado humor dos deuses.
Entre os Deuses, no Olimpo consagrado.
37. Posição de Marte
Mas Marte, que da Deusa sustentava
Marte, porque
Entre todos as partes em porfia, amava Vénus,
ou porque a gente lusa o merecia,
Ou porque o amor antigo o obrigava,
tomou a palavra e uma posição.
Ou porque a gente forte o merecia,
Anáfora De antre os Deuses em pé se levantava:
Merencório no gesto parecia;
O forte escudo, ao colo pendurado,
Deitando pera trás, medonho e irado; Descrição de Marte
37
A viseira do elmo de diamante
Alevantando um pouco, mui seguro,
Por dar seu parecer se pôs diante
De Júpiter, armado, forte e duro;
Descrição de Marte –
E dando ũa pancada penetrante deus forte, decidido, duro.
Co conto do bastão no sólio puro, Faz-se ouvir e respeitar.
O Céu tremeu, e Apolo, de torvado,
Um pouco a luz perdeu, como enfiado;
38. Discurso de Marte
E disse assi: – «Ó Padre, a cujo império
Discurso de Marte –
Tudo aquilo obedece que criaste: Começa por reforçar o
Apóstrofe
Se esta gente que busca outro Hemisfério, poder de Júpiter.
Cuja valia e obras tanto amaste,
Não queres que padeçam vitupério, Começa por reforçar o poder de
Júpiter. Considera que Júpiter é
Como há já tanto tempo que ordenaste, soberano e que não deve ouvir as
Não ouças mais, pois és juiz direito, opiniões dos restantes deuses.
Razões de quem parece que é suspeito. Deuses esses que são “suspeitos”.
39
Que, se aqui a razão se não mostrasse
Vencida do temor demasiado, Marte tenta provar que a opinião de
Baco é fundada na inveja.
Bem fora que aqui Baco os sustentasse,
Pois que de Luso vêm, seu tão privado; Considera ainda que a inveja nunca
poderá roubar as glórias merecidas e
Mas esta tenção sua agora passe,
oferecidas pelo céu, como é o caso
Porque enfim vem de estâmago danado; dos portugueses.
Que nunca tirará alheia enveja
O bem que outrem merece e o Céu deseja.
39. Aposto E tu, Padre de grande fortaleza, Reforça novamente o poder de
Da determinação que tens tomada Júpiter. Considera que Júpiter é
Apóstrofe soberano que se voltar atrás com a
Não tornes por detrás, pois é fraqueza sua posição é uma mostra de
fraqueza.
Desistir-se da cousa começada.
Mercúrio, pois excede em ligeireza
Finaliza o seu discurso, dizendo que
Ao vento leve e à seta bem talhada, Mercúrio deverá, rapidamente,
indicar um porto seguro, onde os
Lhe vá mostrar a terra onde se informe portugueses sejam reabastecidos e
orientados.
Da Índia, e onde a gente se reforme.»
Fim do discurso de Marte
Como isto disse, o Padre poderoso, Júpiter concorda e termina este
consílio.
A cabeça inclinando, consentiu
No que disse Mavorte valeroso
E néctar sobre todos esparziu.
Pelo caminho Lácteo glorioso
Logo cada um dos Deuses se partiu,
Todos os deuses regressaram aos
Fazendo seus reais acatamentos,
respectivos aposentos, aceitando a
Pera os determinados apousentos. decisão tomada.
40. Episódio de Inês de Castro - plano história de Portugal – episódio lírico Canto III – 119- 135
41. Episódio de Inês de Castro - plano história de Portugal – episódio lírico Canto III – 119- 135
Episódio inclui-se no plano da História de Portugal, pois:
• é narrado por Vasco da Gama, cujo narratário/destinatário é o Rei de Melinde.
• surge na continuidade da apresentação do reinado de D. Afonso IV.
Episódio é considerado um momento lírico, pois:
•Exploram-se os sentimentos pessoais do narrador;
• Dá-se expressão à emotividade e à exploração de sentimentos como o Amor, a
crueldade, o sofrimento…
• pode-se mesmo considerar que as principais características da tragédia clássica
estão patentes:
• Há o desenvolvimento de uma acção, que termina com a morte da
protagonista;
• Observa-se a lei das três unidades (acção, tempo e espaço);
• Há uma motivação para sentimentos de terror e piedade;
• A catástrofe é simbolizada pela morte da protagonista.
42. Estrutura deste episódio
A primeira parte, referente as causas da morte de Inês, vítima do amor.
A segunda, constitui o desenvolvimento em que se descreve o modo de vida feliz e
despreocupado que Inês tinha em Coimbra - é apresentada a razão de estado para que Inês
deixe a vida, pois o perigo que representa a ligação de D. Inês com D. Pedro, receia o domínio
espanhol.
O poeta põe em questão a grandeza moral do Rei por solucionar o problema de seu reino
mandando matar a sua própria filha:
“Tirar Inês ao mundo, determina”;
“Que furor consentiu que a espada fina,
Que pôde sustentar o grande peso
Do furor Mauro, fosse alevantada
Contra üa fraca dama delicada?”.
Também nesta segunda parte é redigido o discurso suplicante de Inês ao rei de Portugal, seu
pai. Ela utiliza súplicas e argumento para comover o Rei na sua determinação - apresenta a
sua situação de mãe e a orfandade de seus filhos, declara-se inocente perante toda a situação
de futuro conflito, comove o rei dizendo-lhe que sendo um cavaleiro que sabe dar morte,
também sabe ”dar vida, com clemência” e como alternativa à morte, dá preferência ao exílio.
A terceira e última parte, constitui a reprovação do narrador, sublinhada pelo pranto
comovente das “filhas do Mondego” e pela animização da Natureza, que chora a morte de
Inês, sua antiga confidente.
43. Episódio de Inês de Castro - plano história de Portugal – episódio lírico Canto III – 119- 135
Passada esta tão próspera vitória,
Início remete para o plano da história
Tornando Afonso à Lusitana terra, de Portugal – o episódio narrado
anteriormente foi o da Batalha do
A se lograr da paz com tanta glória
Salado
Quanta soube ganhar na dura guerra,
O caso triste, e dino da memória, O narrador introduz o caso de Inês de
Que do sepulcro os homens desenterra, Castro, como um episódio do reinado
A de D. AfonsoIV, remetendo já para os
imparcialidade Aconteceu da mísera e mesquinha contornos do mesmo.
do narrador
Introdução
Que depois de ser morta foi Rainha.
Perífrase - D. Inês
119 de Castro
Tu só, tu, puro Amor, com força crua, O narrador dirige-se ao Amor,
atribuindo-lhe várias características:
Apóstrofe e
Que os corações humanos tanto obriga,
- puro, mas cruel
personificação
do Amor
Deste causa à molesta morte sua, -dominador e tirano;
- causador da desgraça que conta;
Como se fora pérfida inimiga. - cruel, que não se satisfaz com
Se dizem, fero Amor, que a sede tua lágrimas, pois deseja sangue.
Nem com lágrimas tristes se mitiga,
comparação
É porque queres, áspero e tirano,
Tuas aras banhar em sangue humano.
44. Estavas, linda Inês, posta em sossego,
Apresentação de Inês,
De teus anos colhendo doce fruto, remetendo para o momento
anterior à sua morte:
Naquele engano da alma, ledo e cego,
Metáfora - beleza, juventude, em Coimbra
Que a fortuna não deixa durar muito, - tranquilidade,
- paz ilusória,
Nos saudosos campos do Mondego,
- já a presença do sofrimento
De teus fermosos olhos nunca enxuto, amoroso
Desenvolvimento
Aos montes ensinando e às ervinhas
Perífrase – O nome que no peito escrito tinhas.
Pedro
121
Hipérbato: Do teu Príncipe ali te respondiam Este amor vive de memórias
As lembranças do felizes e ilusórias.
teu príncipe que na As lembranças que na alma lhe moravam, Também D. Pedro vive este
alma lhe moravam,
respondiam-te ali. Que sempre ante seus olhos te traziam, amor, da mesma forma.
Quando dos teus fermosos se apartavam:
Antítese
De noite em doces sonhos, que mentiam,
Oração relativa
explicativa De dia em pensamentos, que voavam. É um amor marcado pela
E quanto enfim cuidava, e quanto via, separação e pela saudade.
Eram tudo memórias de alegria.
45. 122
De outras belas senhoras e Princesas O Príncipe D. Pedro rejeita
Os desejados tálamos enjeita, todas as outras damas, pois
está apaixonado.
Que tudo enfim, tu, puro amor, despreza,
Quando um gesto suave te sujeita.
Vendo estas namoradas estranhezas
Reacção do pai, D. Afonso IV:
O velho pai sesudo, que respeita -O pai determina a morte de
Desenvolvimento
O murmurar do povo, e a fantasia Inês.
- tem em conta dois
Do filho, que casar-se não queria, elementos: o povo e o filho.
Eufemismo -
matar
Tirar Inês ao mundo determina,
Hipérbato: O rei acredita que ao matar
Determina Por lhe tirar o filho que tem preso,
tirar Inês ao Inês de Castro acabará com
mundo Crendo co'o sangue só da morte indina o seu amor
Oração Matar do firme amor o fogo aceso.
subordinada O narrador mostra a sua
causal Que furor consentiu que a espada fina, indignação e questiona o
exercício deste poder e desta
Que pôde sustentar o grande peso
força, pois usa-se a mesma
A
imparcialidade Do furor Mauro, fosse alevantada força contra o Mouro feroz e
do narrador contra uma fraca dama
Contra uma fraca dama delicada?
delicada.
46. 124 Início da narração da sua
Traziam-na os horríficos algozes execução:
-Os executores trazem-na à
Ante o Rei, já movido a piedade: presença do rei;
Oração
Mas o povo, com falsas e ferozes - mais uma vez são apresentadas
coordenada as motivações desta morte, da
adversativa
Razões, à morte crua o persuade. responsabilidade do povo;
Ela com tristes o piedosas vozes, - há aqui alguma
desresponsabilização do rei…
Saídas só da mágoa, e saudade
Descrição da reacção de Inês à
Desenvolvimento
Do seu Príncipe, e filhos que deixava,
prisão e condenação:
Que mais que a própria morte a magoava, - O seu sofrimento não é pela sua
125 morte, mas por aqueles que
deixa: Pedro e os filhos.
Para o Céu cristalino alevantando
Anteposição -Inês com os olhos repletos de
Com lágrimas os olhos piedosos,
do adjectivo – lágrimas …
reforça a
Os olhos, porque as mãos lhe estava atando
crueldade dos
executores. Um dos duros ministros rigorosos;
v
E depois nos meninos atentando, -… e tendo em atenção os seus
filhos, dirigiu-se ao rei, avô dos
Que tão queridos tinha, e tão mimosos,
seus filhos.
Cuja orfandade como mãe temia,
Para o avô cruel assim dizia: Introdução ao discurso de Inês.
47. - "Se já nas brutas feras, cuja mente
Natura fez cruel de nascimento, Início do discurso de Inês:
E nas aves agrestes, que somente
-Começa por referir que a
Nas rapinas aéreas têm o intento, Natureza e as feras não
conseguem ser cruéis com as
Com pequenas crianças viu a gente
crianças, protegem-nas.
Terem tão piedoso sentimento,
Como coa mãe de Nino já mostraram,
- ilustra com exemplo latino.
Desenvolvimento
E colos irmãos que Roma edificaram;
Oração
relativa 127
explicativa
Ó tu, que tens de humano o gesto e o peito,
(Se de humano é matar uma donzela Continuação do
Apóstrofe
discurso de Inês:
ao rei
Fraca e sem força, só por ter sujeito . Dirige-se directamente
O coração a quem soube vencê-la) ao rei:
-apelando à sua
A estas criancinhas tem respeito, humanidade e piedade;
Pois o não tens à morte escura dela; -Invocando os seus
filhos.
Mova-te a piedade sua e minha, - afirma-se fraca, frágil
Pois te não move a culpa que não tinha. e inocente.
48. E se, vencendo a Maura resistência, Continuação do discurso de
Oração
Subordinativa A morte sabes dar com fogo e ferro, Inês:
condicional
Sabe também dar vida com clemência - refere que o rei sabe dar
A quem para perdê-la não fez erro. morte aos seus inimigos
também deve saber dar vida
Mas se to assim merece esta inocência, aos inocentes.
Põe-me em perpétuo e mísero desterro,
Oração - no entanto, Inês apresenta
Na Cítia f ria, ou lá na Líbia ardente,
Desenvolvimento
coordenada outra hipótese ao rei, caso a
adversativa
Onde em lágrimas viva eternamente. queira condenar, apesar de
inocente – o desterro.
129
Põe-me onde se use toda a feridade, - conclui o seu discurso
Entre leões e tigres, e verei reforçando a ideia do
desterro, dizendo que entre
Se neles achar posso a piedade os animais mais ferozes
Que entre peitos humanos não achei: poderia achar piedade que os
No
homens não têm.
Ali com o amor intrínseco e vontade
desterro
Naquele por quem morro, criarei - termina usando novamente
os filhos como argumento,
Estas relíquias suas que aqui viste,
dizendo que longe, no
Que refrigério sejam da mãe triste." desterro as poderia criar e
seriam o seu consolo.
49. 130
Queria perdoar-lhe o Rei benino, Desculpabilização do rei e as
pressões que sofre: O povo.
Desenvolvimento
Movido das palavras que o magoam;
Mas o pertinaz povo, e seu destino
(Que desta sorte o quis) lhe não perdoam.
Arrancam das espadas de aço fino
Momento da execução de D.
Os que por bom tal feito ali apregoam. Inês, que causa sofrimento e
Contra uma dama, ó peitos carniceiros, indignação ao narrador, visível
na interrogação retórica.
Feros vos amostrais, e cavaleiros?
131
"Qual contra a linda moça Policena, Início da terceira parte deste
episódio com a reprovação do
Consolação extrema da mãe velha, narrador e a exploração da
parte mais lírica.
Conclusão
Porque a sombra de Aquiles a condena,
Co'o ferro o duro Pirro se aparelha;
- Estado contemplativo desta
Mas ela os olhos com que o ar serena
morte e associação a outros
(Bem como paciente e mansa ovelha) episódios clássicos.
Na mísera mãe postos, que endoudece,
Ao duro sacrifício se oferece:
50. 132
Tais contra Inês os brutos matadores Continuação da reprovação do
No colo de alabastro, que sustinha narrador e a exploração da
parte mais lírica.
As obras com que Amor matou de amores
Aquele que depois a fez Rainha;
As espadas banhando, e as brancas flores,
Que ela dos olhos seus regadas tinha,
Se encarniçavam, férvidos e irosos,
Conclusão
No futuro castigo não cuidosos.
133
Bem puderas, ó Sol, da vista destes
Teus raios apartar aquele dia,
Como da seva mesa de Tiestes,
Animização da Natureza, que
Quando os filhos por mão de Atreu comia. chora a morte de Inês, sua
antiga confidente.
Vós, ó côncavos vales, que pudestes
A voz extrema ouvir da boca fria,
O nome do seu Pedro, que lhe ouvistes,
Por muito grande espaço repetisses!
51. 134
Assim como a bonina, que cortada - Estado contemplativo desta
Antes do tempo foi, cândida e bela, morte, destacando-se as
características da inocente e
Sendo das mãos lascivas maltratada comparando-a às flores.
Da menina que a trouxe na capela,
O cheiro traz perdido e a cor murchada:
Tal está morta a pálida donzela,
Secas do rosto as rosas, e perdida
Conclusão
A branca e viva cor, coa doce vida.
135
As filhas do Mondego a morte escura
-É sublinhado o pranto
Longo tempo chorando memoraram,
comovente das “filhas do
E, por memória eterna, em fonte pura Mondego” e é apresentada a
animização da Natureza, que
As lágrimas choradas transformaram;
chora a morte de Inês, sua
O nome lhe puseram, que inda dura, antiga confidente.
-Natureza que criou uma fonte
Dos amores de Inês que ali passaram.
deste choro.
Vede que fresca fonte rega as flores, – Quinta das lágrimas.
Que lágrimas são a água, e o nome amores.
52. 136
Não correu muito tempo que a vingança -O narrador apresenta a
reacção feroz de D. Pedro a
Não visse Pedro das mortais feridas,
esta execução:
Que, em tomando do Reino a governança, - - logo que se tornou rei,
perseguiu e puniu os
A tomou dos fugidos homicidas.
executores de Inês.
Do outro Pedro cruíssimo os alcança,
Que ambos, imigos das humanas vidas,
O concerto fizeram, duro e injusto, - comparação com exemplos de
Conclusão
Espanha e dos clássicos.
Que com Lépido e António fez Augusto.
-Pacto entre os reis que
137 obrigava um a entregar os
criminosos ao outro se os
Este, castigador foi rigoroso
capturasse
De latrocínios, mortes e adultérios:
Fazer nos maus cruezas, fero e iroso,
Eram os seus mais certos refrigérios. D. Pedro tornou-se um rei
rigoroso e justo em relação a
As cidades guardando justiçoso todos os crimes.
De todos os soberbos vitupérios,
D. Pedro, o justo.
Mais ladrões castigando à morte deu,
Que o vagabundo Aleides ou Teseu.
53. 138
Do justo e duro Pedro nasce o brando, - O plano da história de
(Vede da natureza o desconcerto!) Portugal prossegue,
apresentando já o seu filho
Remisso, e sem cuidado algum, Fernando, sucessor- D. Fernando, que
Que todo o Reino pôs em muito aperto: teve um reinado fraco,
chegando a ver o reino de
Que, vindo o Castelhano devastando Portugal em risco face ao
As terras sem defesa, esteve perto Castelhano.
- Oposição entre os dois reis.
De destruir-se o Reino totalmente;
-Termina com uma máxima que
transição
Que um fraco Rei faz fraca a forte gente.
Leitura
justifica os períodos menos
139 bons deste povo vitorioso:
Ou foi castigo claro do pecado
De tirar Lianor a seu marido, - o narrador termina
reflectindo ainda na
E casar-se com ela, de enlevado possibilidade de o fraco
Num falso parecer mal entendido; governo de D. Fernando ser um
castigo, pois D. Fernando
Ou foi que o coração sujeito e dado roubou Leonor Teles ao marido
Ao vício vil, de quem se viu rendido, para casar com ela.
-O narrador acusa-o de se
Mole se fez e fraco; e bem parece, entregar à luxúria, daí o castigo
Que um baixo amor os fortes enfraquece. e a fraqueza.
54. Questionário:
1 – De que forma podemos dizer que este é um episódio do plano da história de Portugal?
1.1 – Comprova com versos do texto.
2 – Por que razão podemos também considerar este episódio lírico?
2.1 – Comprova com versos do texto.
3 – De acordo com o texto, apresenta a posição de D. Afonso IV face a esta mulher e a este
relacionamento. Justifica.
4 – Apresenta a caracterização do Amor exposta pelo narrador.
5 – Estamos na presença de um narrador parcial ou imparcial? Justifica a afirmação e ilustra com
versos.
6 – Ao longo do seu discurso, Inês de Castro tenta defender-se. Apresenta os seus argumentos de
defesa.
7 – D. Pedro ficou conhecido pelo exercício da justiça. Justifica a afirmação e ilustra com versos.
8 – Apresenta um exemplo de apóstrofe e explora a sua intencionalidade.
9 – Apresenta um exemplo de interrogação retórica e demonstra a sua intencionalidade.
10 – Quais os elementos da natureza referidos na conclusão? Justifica estas alusões.
56. Episódio bélico apresentado em tom hiperbólico
- referências ao número e valor dos inimigos
- pormenores dos preparativos
- valentia demonstrada
Está Vasco da Gama a contar a História de Portugal ao Rei de Melinde;
- refere a morte de D. Fernando e respectivas consequências;
Depois da morte de D. Fernando, o Formoso, cuja filha D. Beatriz — com 11 anos apenas — casara com o rei
de Castela, Portugal insurge-se contra a ideia de ser governado por um estrangeiro.
A arraia-miúda das cidades e vilas e dos campos acompanhada por abastados mercadores e por alguns
fidalgos, aclama D. João, mestre de Avis, defensor e regedor ou regente do Reino.
-Refere toda a história da nomeação de D. João I, a Regedor e Defensor do Reino dá origem à
batalha contra Castela que se travou em 14 de Agosto de 1383.
-O Rei de Castela invade Portugal, e poucos eram os que queriam combater pela Pátria. Mas os
que estavam dispostos a defender o seu Reino, de entre os quais se destacava Nuno Álvares
Pereira, iriam defendê-lo com a convicção da vitória,
pois o país vizinho tinha enfraquecido bastante no reinado de D. Fernando e D. João I era
garantia de valor e sucesso e nunca Portugal tinha saído derrotado dos combates contra os
Castelhanos.
Na descrição da batalha, destacam-se as actuações de Nuno Álvares Pereira e de D. João,
Mestre de Avis; salienta-se também o facto dos irmãos de Nuno combaterem contra a própria
Pátria, acabando por morrer numa batalha em que foram traidores de Portugal.
No final, Camões refere o desânimo e a fuga dos Castelhanos, que novamente foram
derrotados pelos lusitanos.
57. A partir do casamento, D. Leonor Teles tornara-se cada
vez mais influente junto do rei, manobrando a sua
intervenção política nas relações exteriores, e ao mesmo
tempo cada vez mais impopular. Aparentemente, D.
Fernando mostra-se incapaz de manter uma
governação forte e o ambiente político interno ressente-
se disso, com intrigas constantes na corte. Em 1382, no
fim da guerra com Castela, estipula-se que a única filha
legítima de D. Fernando, D. Beatriz de Portugal, case
com o rei D. João I de Castela. Esta opção significava
uma anexação de Portugal e não foi bem recebida pela
classe média e parte da nobreza portuguesa.
Quando D. Fernando morre em 1383, a linha da dinastia
de Borgonha chega ao fim. D. Leonor Teles é nomeada
regente em nome da filha e de D. João de Castela, mas a
transição não será pacífica. Respondendo aos apelos de
grande parte dos Portugueses para manter o país
independente, D. João, mestre de Avis e irmão bastardo
de D. Fernando, declara-se rei de Portugal. O resultado
foi a crise de 1383-1385, um período de interregno,
onde o caos político e social dominou. D. João tornou-se
no primeiro rei da Dinastia de Avis em 1385.
58. Batalha de Aljubarrota - plano da História de Portugal
28
Deu sinal a trombeta Castelhana,
Início da batalha, dado pelo
Horrendo, fero, ingente e temeroso; toque de trombeta que se
gradação Ouviu-o o monte Artabro, e Guadiana ouviu desde a Galiza até ao sul
Atrás tornou as ondas de medroso;
de Portugal
Ouviu-o o Douro e a terra Transtagana;
Personificação
Batalha – 28 - 41
Correu ao mar o Tejo duvidoso;
E as mães, que o som terríbil escutaram, Ao som do início da batalha as
hipérbole Aos peitos os filhinhos apertaram. mães temeram pela segurança
de seus filhos.
29
Quantos rostos ali se vêem sem cor, Há rostos sem cor e o terror é
Sensações
visuais Que ao coração acode o sangue amigo! grande, muitas vezes maior do
Que, nos perigos grandes, o temor que o próprio perigo.
É maior muitas vezes que o perigo;
E se o não é, parece-o; que o furor
De ofender ou vencer o duro amigo Durante o combate as pessoas,
Faz não sentir que é perda grande e rara, com o furor de vencer,
Dos membros corporais, da vida cara. esquecem-se do perigo e da
possibilidade de ficarem feridas
ou mesmo de perderem a
própria vida.
59. 30
Começa-se a travar a incerta guerra;
De ambas partes se move a primeira ala; A guerra começa. Uns são movidos pela
Presente Uns leva a defensão da própria terra, defesa da sua própria terra e outros pelo
do Outros as esperanças de ganhá-la; desejo de vitória
Indicativo Logo o grande Pereira, em quem se encerra
Todo o valor, primeiro se assinala: D. Nuno Álvares Pereira destaca-se na
Derriba, e encontra, e a terra enfim semeia
Dos que a tanto desejam, sendo alheia.
luta.
31
Batalha – 28 - 41
Já pelo espesso ar os estridentes
Sensações Farpões, setas e vários tiros voam; Descrição da cena de guerra.
visuais Debaixo dos pés duros dos ardentes Características da descrição.
auditivas Cavalos treme a terra, os vales soam;
Portugueses lutam, mas os castelhanos
Espedaçam-se as lanças; e as frequentes
Quedas coas duras armas, tudo atroam; são mais numerosos
Recrescem os amigos sobre a pouca
Gente do fero Nuno, que os apouca.
32
D. Diogo e D. Pedro Pereira, irmãos de
Eis ali seus irmãos contra ele vão, Nuno Álvares Pereira, estão a combater
(Caso feio e cruel!) mas não se espanta, contra ele, “(caso feio e cruel)” – no
Que menos é querer matar o irmão, entanto, não tão grave como combater
Quem contra o Rei e a Pátria se alevanta:
contra o rei e a pátria.
Destes arrenegados muitos são
No primeiro esquadrão, que se adianta
Contra irmãos e parentes (caso estranho!) No primeiro esquadrão há portugueses
Quais nas guerras civis de Júlio e Magno. que renegaram a pátria e combatem
contra seus irmãos, o que já acontecia no
tempo dos clássicos.
60. 33
Ó tu, Sertório, ó nobre Coriolano,
Apóstrofe a figuras que traíram a sua
Catilina, e vós outros dos antigos, pátria
Que contra vossas pátrias, com profano
Coração, vos fizestes inimigos,
Se lá no reino escuro de Sumano Se estes traidores receberem castigos,
Receberdes gravíssimos castigos, também os portugueses têm casos
Dizei-lhe que também dos Portugueses destes.
Alguns tredores houve algumas vezes.
34
Batalha – 28 - 41
Rompem-se aqui dos nossos os primeiros, Começa a haver perda de vidas.
Tantos dos inimigos a eles vão!
Está ali Nuno, qual pelos outeiros
Entre todos está Nuno Álvares Pereira,
De Ceita está o fortíssimo leão, general com experiência nas guerras de
Que cercado se vê dos cavaleiros Ceuta. Ele encontra-se a ser atacado,
Que os campos vão correr de Tetuão: perturbado, mas não com medo.
Perseguem-no com as lanças, e ele iroso, Valorização do perfil de Álvares Pereira.
Torvado um pouco está, mas não medroso.
35
Com torva vista os vê, mas a natura
Ferina e a ira não lhe compadecem
Que as costas dê, mas antes na espessura A sua natureza guerreira faz com que
Das lanças se arremessa, que recrescem. não desista e continue a lutar.
Tal está o cavaleiro, que a verdura
Tinge co'o sangue alheio; ali perecem
Morrem alguns portugueses, pois apesar
Alguns dos seus, que o ânimo valente
Perde a virtude contra tanta gente. de corajosos enfrentavam um poder
maior.
61. 36
Sentiu Joane a afronta que passava
Nuno, que, como sábio capitão, D. João I, sabendo que D. Nuno Álvares
Tudo corria e via, e a todos dava, corria perigo, acudiu à linha da frente
Com presença e palavras, coração. para apoiar os guerreiros com a sua
Qual parida leoa, fera e brava, presença e palavras de encorajamento.
Que os filhos que no ninho sós estão,
Sentiu que, enquanto pasto lhe buscara,
O pastor de Massília lhos furtara; Comparação com uma leoa que protege
37 as suas crias (norte de África)
Batalha – 28 - 41
Corre raivosa, e freme, e com bramidos
Os montes Sete Irmãos atroa e abala:
Tal Joane, com outros escolhidos
Dos seus, correndo acode à primeira ala:
-"Ó fortes companheiros, ó subidos Discurso de encorajamento de D. João I.
Cavaleiros, a quem nenhum se iguala, -Apelo ao patriotismo, à coragem, à
Defendei vossas terras, que a esperança superioridade, responsabilidade,
Da liberdade está na vossa lança. liberdade…
38
Vedes-me aqui, Rei vosso, e companheiro,
Que entre as lanças, e setas, e os arneses - reforça a ideia de que ele próprio está
Dos inimigos corro e vou primeiro: no campo de batalha e deve ser o
Pelejai, verdadeiros Portugueses!"- exemplo a seguir!
Isto disse o magnânimo guerreiro,
E, sopesando a lança quatro vezes, Com um único tiro, matou muitos
Com força tira; e, deste único tiro, adversários.
Muitos lançaram o último suspiro.
62. 39
Reacção ao discurso de Porque eis os seus acesos novamente O ânimo volta e continuam a lutar
rei Duma nobre vergonha e honroso fogo, com coragem e progredindo na
Sobre qual mais com ânimo valente batalha.
Perigos vencerá do Márcio jogo,
Porfiam: tinge o ferro o sangue ardente;
Rompem malhas primeiro, e peitos logo:
Assim recebem junto e dão feridas,
Como a quem já não dói perder as vidas. Já nem temem perder a vida.
40
Batalha – 28 - 41
Entre os muitos mortos A muitos mandam ver o Estígio lago,
são apontados: o mestre Em cujo corpo a morte e o ferro entrava:
de Santiago, D. Pedro
O Mestre morre ali de Santiago, São mortas várias figuras ilustres,
Moniz, ou Munoz, e os entre elas, os irmãos de Nuno
irmãos de D. Nuno, os Que fortíssimamente pelejava;
Morre também, fazendo grande estrago, Álvares Pereira.
renegados, um deles
mestre de Calatra-va. Outro Mestre cruel de Calatrava;
Alguns comentadores Os Pereiras também arrenegados
dão, porém, o mestre de Morrem, arrenegando o Céu e os fados.
Santiago como morto em
Valverde.
41
Muitos também do vulgo vil sem nome São mortos outros menos ilustres e
Vão, e também dos nobres, ao profundo, outros nobres.
Onde o trifauce Cão perpétua fome
Tem das almas que passam deste mundo. Muitos são feridos, muitos
Perífrase - E porque mais aqui se amanse e dome
morrem, mas a bandeira
inferno A soberba do amigo furibundo,
A sublime bandeira Castelhana
castelhana é derrubada aos pés
Foi derribada aos pés da Lusitana. da lusitana.
Resultado da
Batalha
63. 42
Aqui a fera batalha se encruece Com a queda da bandeira castelhana, a
Com mortes, gritos, sangue e cutiladas; batalha tornou-se ainda mais cruel.
A multidão da gente que perece
Enumeração Tem as flores da própria cor mudadas;
Já as costas dão e as vidas; já falece Sem forças para combaterem, os
O furor e sobejam as lançadas; castelhanos começam a fugir e o rei de
Metáfora
Já de Castela o Rei desbaratado Castela vê-se derrotado e impedido de
Se vê, e de seu propósito mudado. atingir o seu propósito/objectivo.
43
O campo vai deixando ao vencedor, O rei vai abandonando o campo de
Contente de lhe não deixar a vida. batalha e atrás dele fogem todos os
Seguem-no os que ficaram, e o temor castelhanos com grade dor, devido:
Lhe dá, não pés, mas asas à fugida. -à morte;
Encobrem no profundo peito a dor -Aos meios gastos e perdidos;
Da morte, da fazenda despendida, - à mágoa e desonra;
Enumeração Da mágoa, da desonra, e triste nojo - ao luto de ser vencido.
De ver outrem triunfar de seu despojo.
44
Reacções à derrota:
Alguns vão maldizendo e blasfemando
-Uns maldizem a guerra;
Do primeiro que guerra fez no mundo;
-Outros maldizem a ambição de desejar
Outros a sede dura vão culpando
o que não é seu.
Do peito cobiçoso e sitibundo,
Que, por tomar o alheio, o miserando
Povo aventura às penas do profundo,
Deixando tantas mães, tantas esposas
- A derrota causa dor em muitas mães,
Sem filhos, sem maridos, desditosas.
esposas, filhos…
64. 45
O vencedor Joane esteve os dias Fazia parte do ritual destas
Costumados no campo, em grande glória; guerras permanecer o vencedor
Com ofertas depois, e romarias, alguns dias no campo da
As graças deu a quem lhe deu vitória. batalha, dando assim ao
Mas Nuno, que não quer por outras vias vencido oportunidade de
Entre as gentes deixar de si memória desforra.
Senão por armas sempre soberanas,
Para as terras se passa Transtaganas.
São Nuno foi canonizado pelo Papa Bento XVI em 26 de Abril de 2009.
65. Partida das naus , o velho do restelo - plano da História de Portugal e início da viagem
Canto – IV 83-89 / 94-104
66. O projecto para o caminho marítimo para a Índia foi delineado
por D. João II como medida de redução dos custos nas trocas
comerciais com a Ásia e tentativa de monopolizar o comércio
das especiarias. A juntar à cada vez mais sólida presença
marítima portuguesa, D. João almejava o domínio das rotas
comerciais e expansão do reino de Portugal que já se
transformava em Império. Porém, o empreendimento não seria
Portugal (, 3 de Maio de
1455 – Alvor, 25 de realizado durante o seu reinado. Seria o seu sucessor, D.
Outubro de 1495) Manuel I que iria designar Vasco da Gama para esta expedição,
embora mantendo o plano original.
Na preparação da partida das naus de Vasco da Gama
para a Índia, sobressai no meio da confusão um
alvoroço e ao mesmo tempo um desejo de alcançar o
trajecto pretendido.
Após a citação do chamado Velho do Restelo, deu-se a
Portugal (, 31 de Maio partida; ficaram para trás as terras portuguesas e
de 1469 — Lisboa, 13
de Dezembro de 1521)
apenas o mar e o céu infinitos cabiam na visão dos
lusitanos.
67. Partida das naus , o velho do restelo -
plano da História de Portugal e início da viagem Canto – IV 83-89 / 94-104
Preparação do rei Foram de Emanuel remunerados,
Porque com mais amor se apercebessem, D. Manuel é o responsável pela
E com palavras altas animados organização deste grupo. Tê-lo-
Para quantos trabalhos sucedessem. á incentivado e motivado.
Assim foram os Mínias ajuntados,
Para que o Véu dourado combatessem, Tal como já acontecera no mar
Na fatídica Nau, que ousou primeira Negro
Tentar o mar Euxínio, aventureira.
Apresentação dos
84
marinheiros e
E já no porto da ínclita Ulisseia Já no Porto de Lisboa, em
soldados
C'um alvoroço nobre, e é um desejo, Belém, onde o rio Tejo encontra
Perífrase -
(Onde o licor mistura e branca areia o mar.
Lisboa Co'o salgado Neptuno o doce Tejo)
As naus prestes estão; e não refreia As naus já estão prontas e o
Narrador
Temor nenhum o juvenil despejo, ânimo dos marinheiros e
participante: Porque a gente marítima e a de Marte soldados é elevado.
Vasco da Estão para seguir-me a toda parte.
Gama a 85
contar a Pelas praias vestidos os soldados
própria De várias cores vêm e várias artes, Descrição dos soldados, prontos
viagem
E não menos de esforço aparelhados para descobrir novos mundos.
Para buscar do mundo novas partes.
Nas fortes naus os ventos sossegados
Ondeam os aéreos estandartes; As naus são personificadas e
Elas prometem, vendo os mares largos, prometem levar aqueles
De ser no Olimpo estrelas como a de Argos. homens à imortalidade.
68. 86
Depois de aparelhados desta sorte As condições físicas estão
De quanto tal viagem pede e manda, asseguradas, há que preparar o
Aparelhamos a alma para a morte, espírito para o perigo da morte,
que sempre existe.
Que sempre aos nautas ante os olhos anda.
Para o sumo Poder que a etérea corte Vasco da Gama recorda a
Perífrase: Sustenta só coa vista veneranda, oração e pedido de protecção e
Deus
Imploramos favor que nos guiasse, ajuda a Deus para esta viagem.
E que nossos começos aspirasse.
Deus
Cristão
87
Partimo-nos assim do santo templo Partiram da ermida de Nossa S.
Perífrase:
Belém Que nas praias do mar está assentado, de Belém.
Que o nome tem da terra, para exemplo,
Donde Deus foi em carne ao mundo dado.
Apóstrofe:
Rei de Certifico-te, ó Rei, que se contemplo Apóstrofe ao rei de Melinde,
Melinde Como fui destas praias apartado, recordando a dúvida e o receio
Cheio dentro de dúvida e receio, que sentira, mas que tentara
Apresentação do Que apenas nos meus olhos ponho o freio. disfarçar.
estado de espírito
de Vasco da Gama
69. 88
Apresentação do
estado de espírito
A gente da cidade aquele dia, No dia da partida, havia muitos
das gentes
(Uns por amigos, outros por parentes, presentes descontentes/
Outros por ver somente) concorria, infelizes.
Saudosos na vista e descontentes.
E nós coa virtuosa companhia A comitiva fez-se acompanhar
de religiosos em procissão.
De mil Religiosos diligentes,
Em procissão solene a Deus orando,
Para os batéis viemos caminhando.
89
Em tão longo caminho e duvidoso O povo não acreditava no
Por perdidos as gentes nos julgavam; sucesso desta expedição.
As mulheres c'um choro piedoso,
Enumeração Os homens com suspiros que arrancavam;
de pessoas
que não
Mães, esposas, irmãs, que o temeroso
acreditavam Amor mais desconfia, acrescentavam
voltar a ver A desesperarão, e frio medo
os que
embarcavam
De já nos não tornar a ver tão cedo.
70. 90
Qual vai dizendo: -" Ó filho, a quem eu tinha Apresentam-se dois casos de
Só para refrigério, e doce amparo lamúrias/queixas:
Desta cansada já velhice minha, . Os filhos que deveriam
Que em choro acabará, penoso e amaro, acompanhar os pais e ajudá-los
Por que me deixas, mísera e mesquinha? são afastados.
Por que de mim te vás, ó filho caro,
A fazer o funéreo enterramento,
Onde sejas de peixes mantimento!" –
91
"Qual em cabelo: -"Ó doce e amado esposo, . Os homens que abandonavam
Sem quem não quis Amor que viver possa, os lares para se aventurarem no
Por que is aventurar ao mar iroso mar.
Essa vida que é minha, e não é vossa?
Como por um caminho duvidoso * Crítica aos descobrimentos ao
Vos esquece a afeição tão doce nossa? facto de se abandonar o país e o
Nosso amor, nosso vão contentamento seu desenvolvimento.
Quereis que com as velas leve o vento?" -
92
Nestas e outras palavras que diziam O narrador diz que todos
De amor e de piedosa humanidade, tinham esta perspectiva.
Os velhos e os meninos os seguiam,
Em quem menos esforço põe a idade.
Os montes de mais perto respondiam,
Quase movidos de alta piedade; E até a natureza responde a
A branca areia as lágrimas banhavam, esta dor.
Que em multidão com elas se igualavam. Personificação
71. 93
Nós outros sem a vista alevantarmos O narrador diz que a tripulação não parou os seus
Nem a mãe, nem a esposa, neste estado, olhos naqueles que deixava para não sofrerem,
Por nos não magoarmos, ou mudarmos nem se deixarem mover dos seus propósitos.
Do propósito firme começado,
Determinei de assim nos embarcarmos Vasco da Gama não quis demorar as despedidas
Sem o despedimento costumado, que sempre magoam.
Que, posto que é de amor usança boa,
A quem se aparta, ou fica, mais magoa.
94
Mas um velho d'aspeito venerando,
Que ficava nas praias, entre a gente,
Postos em nós os olhos, meneando
Três vezes a cabeça, descontente,
A voz pesada um pouco alevantando,
Que nós no mar ouvimos claramente,
C'um saber só de experiências feito,
Leitura
Tais palavras tirou do experto peito:
95
- Ó glória de mandar! Ó vã cobiça
Desta vaidade, a quem chamamos Fama!
Ó fraudulento gosto, que se atiça
C'uma aura popular, que honra se chama!
Que castigo tamanho e que justiça
Fazes no peito vão que muito te ama!
Que mortes, que perigos, que tormentas,
Que crueldades neles experimentas!
72. Adamastor - plano da História de Portugal /viagem – episódio lendário Canto – V
39-60
74. Adamastor - estrutura
• Inspirado em Homero e Ovídio, o episódio do Gigante Adamastor é o mais rico e complexo do
poema. de natureza simbólica, mitológica e lírica.
• Compõe-se de vinte e quatro estrofes (canto V, 37 - 60), assim distribuídas:
Estrofes 37-38: introdução (2)
Estrofes 39-48: Adamastor (10)
Estrofe 49: transição (1)
Estrofes 50-59: Adamastor (10)
Estrofe 60: epílogo (1)
Como se vê, há uma distribuição muito equilibrada das partes: das vinte e quatro estrofes, quatro se
destinam à introdução, transição e epílogo; as vinte restantes, divididas ao meio, apresentam o herói
da sequência. Tanto Vasco da Gama como o Adamastor aparecem como narradores e como
personagens.
75. No plano histórico, simboliza:
- a superação pelos portugueses do medo do “Mar Tenebroso”, das superstições medievais que povoavam o
Atlântico e o Índico de monstros e abismos.
- Adamastor é uma visão, um espectro, uma alucinação que existe só nas crendices dos portugueses. É
contra seus próprios medos que os navegadores triunfam.
No plano lírico é um dos pontos altos do poema, retomando dois temas constantes da lírica camoniana:
- o do amor impossível e o do amante rejeitado.
Adamastor, um dos gigantes filhos da Terra, apaixonou-se pela nereida Tétis. Não
correspondido, tenta tomá-la à força, provocando a cólera de Júpiter, que o transforma no
Cabo das Tormentas, personificado numa figura monstruosa, lançada nos confins do Atlântico.
Este episódio é importante, pois nele se concentram as grandes linhas da epopeia:
1. O real maravilhoso (dificuldade na passagem do cabo).
2. A existência de profecias (história de Portugal).
3. Lirismo (história de amor);
4. É também um episódio trágico, de amor e morte;
5. É um episódio épico, em que se consolida a vitória do homem sobre os elementos (água, fogo, terra, ar);
76. Resumo do Enredo
Introdução (est. 37, 38, Canto V):
· Preparação do ambiente para o aparecimento do gigante: depois de cinco dias claros, com
ventos calmos, com os marinheiros “descuidados”, surge uma nuvem negra “tão temerosa e
carregada” que põe “nos corações um grande medo” e leva Vasco da Gama a interpelar o
próprio Deus todo-poderoso.
Aparecimento do monstro e sua descrição (est. 39, 40, Canto V).
· Caracterização directa e indirecta do monstro, sobretudo através de uma adjectivação
sugestiva e abundante, para realçar a imponência da figura e o terror e a estupefacção do Gama
e dos seus companheiros (“Arrepiam-se as carnes e o cabelo/A mi e a todos, só de ouvi-lo e vê-
lo.” (est. 40. Vv- 7-8, Canto V).
Discurso do gigante (1ª parte) (est. 41-48, Canto V). Glorificação épica.
· Discurso de carácter profético e ameaçador, através do qual Adamastor, num tom de voz
“horrendo e grosso” anuncia os castigos e danos por si reservados para aquela “gente ousada”
que invadira o seu reino (dos mares):
. A “suma vingança” (a morte) de quem o descobriu (Bartolomeu Dias);
. A morte de D. Francisco de Almeida, primeiro Vice-rei da Índia;
. O naufrágio e a morte da família Sepúlveda;
. E, para além destes casos particulares, as naus portuguesas terão sempre “inimiga esta
paragem” através de “naufrágios, perdições de toda sorte/Que o menor mal de todos seja a
morte”.
77. Interpelação do Gama (est. 49, Canto V).
· Gama já incomodado com todas aquelas profecias de desgraça, interroga o monstro sobre a sua
identidade. É essa pergunta tão simples que promove a profunda viragem do seu discurso,
fazendo-o recordar a frustração amorosa passada e meditar na sua actual condição de degredado
solitário e petrificado.
Discurso do gigante (2ª parte) (est. 50-59, Canto V). Lirismo amoroso e elegíaco.
· A resposta à pergunta de Gama tem carácter autobiográfico e tom elegíaco (lamentação, triste)
(“com voz pesada e amara”) e disfórico, pois assistimos à evocação do seu passado amoroso
infeliz.
Epílogo (est. 60, Canto V).
· Súbito desaparecimento do Gigante, agora choroso pela recordação do seu passado triste e
levando consigo a nuvem negra e o “sonoro bramido” do mar com que aparecera.
Pedido de Gama a Deus para que remova “os duros casos, que Adamastor contou futuros”.
78. 37 -
Porém já cinco sóis eram passados A viagem da esquadra é rápida e
Que dali nos partíramos, cortando
Introdução – preparação do cenário
próspera até uma nuvem que escurece
Os mares nunca doutrem navegados, os ares surge sobre as cabeças dos
Prosperamente os ventos assoprando, navegantes.
Quando uma noite, estando descuidados
Na cortadora proa vigiando,
hipérbato
Uma nuvem, que os ares escurece,
Sobre nossas cabeças aparece.
Discurso de 1º
pessoa
38 -
A nuvem escura que surgiu vinha tão
Tão temerosa vinha e carregada,
carregada que encheu de medo os
Que pôs nos corações um grande medo; navegantes. O mar, ao longe, fazia grande
Bramindo, o negro mar de longe brada, ruído ao bater contra os rochedos.
Como se desse em vão nalgum rochedo.
"Ó Potestade (disse) sublimada: Vasco da Gama, atemorizado, lança voz à
Que ameaço divino ou que segredo tempestade perguntando o que era ela, que
Este clima e este mar nos apresenta, parecia mais que uma simples tormenta
marinha.
Que mor cousa parece que tormenta?"
O cenário aterrador fará a imagem do
Gigante ainda mais terrível e assustadora.
comparação
79. Desenvolvimento: Aparecimento do monstro e sua descrição
39 - Vasco da Gama não havia
terminado de falar quando surgiu uma
figura enorme. Segue-se a descrição do
Não acabava, quando uma figura mostrengo/Adamastor:
Se nos mostra no ar, robusta e válida, - de rosto fechado, de olhos encovados,
De disforme e grandíssima estatura; de postura má, de cabelos crespos e
cheios de terra, de boca negra e de
O rosto carregado, a barba esquálida,
dentes amarelos. Esta passagem é
Os olhos encovados, e a postura meramente descritiva.
Medonha e má e a cor terrena e pálida;
Cheios de terra e crespos os cabelos, Discurso de 1º
A boca negra, os dentes amarelos. pessoa
Exemplos
Tão grande era de membros, que bem posso clássicos
Certificar-te que este era o segundo
De Rodes estranhíssimo Colosso, 40 - A figura era tão enorme que
Que um dos sete milagres foi do mundo. poder-se-ia jurar ser ela o segundo
Cum tom de voz nos fala, horrendo e grosso, Colosso de Rodes. Surge no quarto
verso a introdução da fala do
Que pareceu sair do mar profundo.
Gigante, cuja voz fazia arrepiar os
Arrepiam-se as carnes e o cabelo, cabelos e a carne dos navegantes.
A mi e a todos, só de ouvi-lo e vê-lo!
O Colosso de Rodes foi uma estátua de Hélios, deus grego do sol, construída
entre 292 a.C. e 280 a.C. pelo escultor Carés de Lindos. A estátua tinha trinta
metros de altura, 70 toneladas e era feita de bronze. Tornou-se uma das sete
maravilhas do mundo antigo.