O documento descreve o declínio do Império Carolíngio após a morte de Carlos Magno, incluindo os fracos sucessores, o princípio teutônico de herança que dividiu o império, o surgimento do feudalismo, e novas invasões bárbaras. Também discute como esses fatores enfraqueceram o poder político do Império e como a Igreja se fortaleceu nesse período através de fatores como as Doações de Constantino, a conversão da Escandinávia, e a reforma moná
Declínio do Império Carolíngio e a Igreja entre 800-1054
1. Império e Cristianismo latino-teutônico
Declínio imperial e renascença eclesiástica
História Eclesiástica I
Pr. André dos Santos Falcão Nascimento
Blog: http://prfalcao.blogspot.com
Email: goldhawk@globo.com
Seminário Teológico Shalom
2. Declínio do Império Carolíngio
Imediatamente após a formação do Império por Carlos Magno,
iniciou-se seu declínio. Por conta de diversos fatores, o Império
não conseguiu se sustentar como a força política universal que
os papas desejavam:
Fracos sucessores de Carlos Magno
Princípio teutônico de herança
Surgimento do feudalismo
Novas invasões bárbaras (vikings, eslavos e magiares)
3. Declínio do Império Carolíngio
Princípio teutônico de herança: Havia um princípio
entre os povos teutões de que as terras de um pai
deveriam ser divididas entre seus filhos. Posto em
prática por Luís, o Pio (778-840), filho de Carlos
Magno, para aplacar a turbulenta família, o princípio
gerou uma divisão do reino entre seus filhos.
Quando Luís faleceu, a briga pelo império se iniciou. Luís, o Germano, havia
herdado a porção oriental do império, enquanto que Carlos II havia herdado a
parte ocidental. Uma longa porção central de terra, entre o Mar do Norte e o Mar
Adriático, ficara com Lotário, juntamente com o título de Imperador.
Lotário buscou conquistar todas as terras imperiais sob seu poder, porém Carlos
e Luís se uniram contra Lotário em Estrasburgo, em 842, gerando uma aliança
contra a qual Lotário não conseguiu lutar. Em 843, os três irmãos assinaram o
tratado de Verdun. A atual França foi dada a Carlos, a atual Alemanha, a Luís, e
uma estreita faixa de terra, de 160 quilômetros de largura, foi concedida a
Lotário, juntamente com o título imperial.
4. A faixa de terra entre os
dois reinos se tornaria
motivo de rivalidade entre
as duas nações até o séc.
XX. Em 870, em
Mersden, um novo tratado
foi assinado, onde a
região central foi
redividida entre os
governantes dos reinos
francos oriental e
ocidental, confinando os
descendentes de Lotário
à região da atual Itália.
5. Feudalismo
O feudalismo foi um sistema social agrário
que surgiu na Europa com a crise da vida
urbana após as invasões bárbaras. Com o
enfraquecimento do poder imperial, as
pessoas foram forçadas a voltar para o campo
em busca de sobrevivência.
O feudalismo era um sistema de organização política baseado na posse da
terra. O senhor local protegia a região de sua propriedade, em troca do
trabalho das pessoas que eram protegidas por eles. As pessoas comuns,
chamadas de servos, deviam lealdade a seu senhor. Cada gleba de terra
era autossuficiente, exceto por bens como sal, moinhos e barras de ferro
para uso do ferreiro para forjar ferramentas. A gleba era a unidade territorial
feudal e compreendia um pedaço de terra suficiente para sustentar um
cavaleiro. Alguns senhores feudais podiam ter várias glebas.
7. Camponeses Servos
Mercadores Fazendeiros Artesãos
Cavaleiros Vassalos
Nobreza
Rei
Papa - Igreja
Alimentos
Mercadorias e serviços
Proteção e serviço militar
Dinheiro e cavaleiros
10. Influências do feudalismo na Igreja
Possuía grandes porções de terra na Europa Oriental
Terras doadas por santos ou penitentes em busca de
justificação para uma vida de pecado ficaram nas mãos da
Igreja Romana.
Como proprietária de terras, não foi influenciada pelo sistema
feudal.
Cessão de terras aos cavaleiros feudais em troca de proteção.
Dupla obediência: Papa ou senhor?
11. Influências do feudalismo na Igreja
Alta nobreza envolvendo-se em eleições para conseguir abadias ou
episcopados a parentes, que poderiam assim se tornar proprietários
de terras da igreja. Estes parentes não se interessavam pelos
assuntos da igreja e eram mundanos.
Controvérsia das investiduras: Quem investiria o clero, Igreja ou
Estado?
Diminuição da brutalidade das guerras feudais com a Paz de Deus e
a Trégua de Deus.
Paz de Deus: Pacto de abolir rixas pessoais, não atacar pessoas
desarmadas, impedir roubo e violência e não saquear locais sagrados.
Trégua de Deus: Não lutar entre a tarde de quarta e manhã de segunda, e
não guerrear nos dias de festa eclesiástica (100 dias de lutas), igrejas,
cemitérios, mosteiros e conventos são santuários de refúgio, mulheres,
camponeses e clérigos não podiam ser molestados.
12. Novas invasões bárbaras
Ataques de povos do norte, das regiões escandinavas (Suécia, Dinamarca e
Noruega nos sécs. VIII e IX: Vikings, Eslavos e Magiares.
Mosteiros e cidades situados ao longo da costa ou às margens de rios eram
alvos de tais grupos, especialistas em navegação.
Muitos dos invasores fixaram-se na Inglaterra, fundindo-se com os anglo-
saxões e destruindo a refinada cultura na Inglaterra e na Irlanda.
Outros fixaram-se na Normandia, de onde sairiam para conquistar a
Inglaterra sob Guilherme, o Conquistador, em 1066.
Outros foram para a Europa oriental e colocaram o fundamento do Estado
russo.
Um grupo foi para a Sicília e sul da Itália, representando ameaça ao poder
temporal do papado.
Eslavos e magiares fixaram-se no centro-sul da Europa, na região da
Morávia, Hungria e Bulgária.
13. Geografia pós séc. IX
Estado Germânico torna-se sucessor do Estado franco imperial (séc. X), mas
não se torna uma nação-estado centralizada. Enfrentaria o papado em busca de
supremacia até sua derrota para Inocêncio III.
Geografia trabalhando contra unificação alemã e gerando interesses diferentes
em cada região.
União dos duques tribais da Germânia sob a coroa de Henrique, o
Passarinheiro, em 919, para enfrentar as investidas do norte e dos húngaros
eslavos ao sudeste.
Sucessor Otto (912-973) torna os duques seus vassalos e passa a supervisionar
os negócios da igreja, nomeando bispos e abades de sua confiança. Construiu
uma monarquia centralizada, sendo coroado imperador do Sacro Império
Romano em 962 ao ajudar o papa João XII a enfrentar um poderoso rei que
havia surgido como um desafio ao seu poder.
Isso gerou problemas de ingerência dos imperadores nos negócios da igreja,
chegando a eleger papas de seu interesse, como Otto III, que entrou em Roma
em 996 e forçou a eleição de seu primo Bruno como papa Gregório V.
O Sacro Império duraria até Napoleão declarar sua dissolução em 1806.
14. A Igreja entre 800 e 1054
A partir do séc. IX, a Igreja Ocidental experimentou um reavivamento interior
que lhe deu forças para competir com a interferência imperial. Vários foram
os fatores que contribuíram para o fortalecimento do poder eclesiástico do
papa:
Doação de Constantino e Falsas Decretais
Conversão da Escandinávia
Fortalecimento da doutrina da missa
Reforma monástica
Liderança de pessoas capazes
15. A Igreja entre 800 e 1054
Doação de Constantino e Falsas Decretais
Base legal para propriedade de terras em nome do papa. Nicolau I (858-867) foi o
primeiro a usar uma coleção dos decretos de vários pontífices de Roma. Ficou
conhecido como Falsas Decretais e continha a Doação, além de decretos autênticos e
forjados desde o tempo de Clemente de Roma.
Estabeleciam a supremacia papal sobre todos os líderes eclesiásticos.
Concediam o direito a qualquer bispo de apelar diretamente ao papa, ultrapassando o
chefe de seu arcebispado.
Reivindicava o direito do papa ser livre do controle secular.
Não há certeza que algum papa tenha forjado a coleção, mas muitos a usaram para
apoiar suas alegações.
Conversão da Escandinávia
Fortalecimento da doutrina da missa
Reforma monástica
Liderança de pessoas capazes
16. A Igreja entre 800 e 1054
Doação de Constantino e Falsas Decretais
Conversão da Escandinávia
Aceitação do evangelho pelos povos escandinavos se deve a Ansgar
(801-865), natural de Flandres.
Respondeu ao chamado do rei dinamarquês Haroldo por um missionário,
em 826, dedicando os 36 anos restantes de sua vida à obra missionária
no norte da Europa.
Dinamarca conquistada completamente no séc. XI, nos dias de Canuto.
Noruega aceita o cristianismo no ano 1000 e é feito a religião oficial da
Suécia e da Islândia por essa época.
Fortalecimento da doutrina da missa
Reforma monástica
Liderança de pessoas capazes
17. A Igreja entre 800 e 1054
Doação de Constantino e Falsas Decretais
Conversão da Escandinávia
Fortalecimento da doutrina da missa
A natureza da presença de Cristo na ceia serviu para fortalecer o papado porque o
papa dirigia a hierarquia dos clérigos, únicos que tinham o direito de ministrar o
milagre da Missa.
Em 831, Pascásio Radberto (c. 785-860), monge do mosteiro de Corbie, próximo a
Amiens, começa a ensinar que, por milagre divino, a substância do pão e do vinho
são imediatamente transformados em corpo e sangue de Cristo. Não chamava de
transubstanciação, mas essa era sua ideia.
Defendeu sua ideia no livro De Corpore et Sanguine Domini, sendo adotada
oficialmente em 1215 e defenida plenamente em 1545.
Reforma monástica
Liderança de pessoas capazes
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Doação de Constantino e Falsas Decretais
Conversão da Escandinávia
Fortalecimento da doutrina da missa
Reforma monástica
No séc. X, os mosteiros haviam se tornado ricos e corruptos, precisando de
urgentes reformas. O ideal original de serviço foi substituído pelo ideal de salvação
pessoal combinado com vida confortável em um mosteiro rico. O papado em si
sofreu declínio entre Nicolau I e Leão IX.
O mosteiro de Cluny foi fundado por Berno a mando do duque William de
Aquitaine, para o “bem de sua alma”. Berno, que já havia sido abade em outro
mosteiro, recebeu autorização para fundar um mosteiro isento de controle secular
ou episcopal e exerceria a autogestão sob a proteção do papa. Sua liderança e de
seu sucessor, Odo, levou a vários mosteiros beneditinos, incluindo o de Monte
Cassino, se reorganizarem à semelhança do de Cluny.
Liderança de pessoas capazes
19. A Igreja entre 800 e 1054
Doação de Constantino e Falsas Decretais
Conversão da Escandinávia
Fortalecimento da doutrina da missa
Reforma monástica
No velho sistema, cada mosteiro tinha seu próprio abade monárquico,
independente de outros da mesma ordem. O de Cluny indicava que os abades de
novos mosteiros deviam submissão ao de Cluny, gerando uma ordem centralizada
sob um chefe, o abade de Cluny, trabalhando em harmonia com o papa. No final
do séc. XII já havia mais de 1100 mosteiros sob a liderança do abade de Cluny.
Os líderes cluniacenses condenavam a simonia (compra de cargos eclesiásticos),
e o nepotismo. Outra plataforma foi o celibato. Os monges também criam que a
Igreja não deveria ser controlada pelo rei, Imperador ou duque, e nova ênfase foi
dada à vida ascética. Boas escolas foram fundadas pelos cluniacenses e o
movimento das Cruzadas deve muito a eles. A ordem foi extinta em 1790.
Liderança de pessoas capazes
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Doação de Constantino e Falsas Decretais
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Fortalecimento da doutrina da missa
Reforma monástica
Liderança de pessoas capazes
Nicolau I (858-867): Obrigou Lotário II de Larraine a desistir da ideia de divorciar-
se de sua esposa legal, Teutberga, com quem havia se casado por razões
políticas, para se casar com Waldrada, mulher por quem se apaixonara. Manteve
o direito de bispos apelarem diretamente ao papa, tentou colocar o imperador
oriental e o patriarca sob sua autoridade, sem sucesso.
21. A Igreja entre 800 e 1054
Doação de Constantino e Falsas Decretais
Conversão da Escandinávia
Fortalecimento da doutrina da missa
Reforma monástica
Liderança de pessoas capazes
Entre Nicolau I e Leão IX, mais de 40 papas ocuparam a cadeira episcopal, sem
grande apelo. Um caso emblemático foi o de Bento IX, papa indigno, deposto em
favor de Silvestre III e que vendeu seu trono para o homem que se tornou
Gregório IV, sem abdicar do trono. Três papas alegavam ser legítimos. Um sínodo
convocado pelo imperador em Sutri, em 1046, com Bento e Silvestre depostos e
Gregório forçado a renunciar em favor de Clemente II, que morreu logo, assim
como seu sucessor. Eventualmente Henrique indicou seu primo Bruno pra se
tornar o futuro papa Leão IX.
22. A Igreja entre 800 e 1054
Doação de Constantino e Falsas Decretais
Conversão da Escandinávia
Fortalecimento da doutrina da missa
Reforma monástica
Liderança de pessoas capazes
Leão IX mostrou-se digno da indicação, interessado em reformar a igreja nos
termos do programa de Cluny.
Com a eleição de Nicolau II ajudado por Humberto e pelo competente
Hildebrando, futuramente Gregório VII, a eleição do papa saiu das mãos da turba
romana e passou para o controle dos líderes eclesiásticos no Colégio dos
Cardeais, em 1059.
23. O Cisma da Igreja
Em 1054, as Igrejas do Oriente e do Ocidente finalmente chegaram a um
impasse, gerando a primeira grande divisão da Igreja Cristã. Várias foram as
razões para esta separação:
Divisão do Império em Ocidente e Oriente, com duas lideranças estabelecidas por
Teodósio, em 395.
Diferença de jurisdição: Oriente sob o Imperador, Ocidente sob o papa.
Ocidente trabalhava assuntos práticos, Oriente trabalhava assuntos de natureza
filosófica. A maioria das controvérsias entre 325 e 451 surgiu no Oriente.
Celibato: Casamento de clérigos abaixo de bispo permitido no Oriente, enquanto
que no Ocidente era proibido.
Uso de barba: Manutenção obrigatória no Oriente, ao contrário do Ocidente.
Ocidente trabalhava o idioma latino, Oriente usava o grego.
Cláusula filioque: Inclusão de cláusula no credo Niceno que indicava que o
Espírito Santo provinha do Pai e do Filho, algo não aceito no Oriente, gerou
acusação do patriarca Fócio de heresia por parte de Nicolau I e do Ocidente.
24. O Cisma da Igreja
Em 1054, as Igrejas do Oriente e do Ocidente finalmente chegaram a um
impasse, gerando a primeira grande divisão da Igreja Cristã. Várias foram as
razões para esta separação:
Divergência de data em que se deve celebrar a Páscoa.
Controvérsia iconoclasta causada por decisão do imperador Leão III em 726 de
proibir genuflexão a esculturas e imagens e, em 739, que tudo exceto a Bíblia
fosse removido das igrejas e destruído, limitando o poder dos monges e refutando
as acusações de idolatria dos muçulmanos. A oposição do papa e do imperador
Carlos Magno nos assuntos do Oriente gerou rusgas entre as duas facções. O
Ocidente continuou a usar as esculturas, enquanto que o Oriente conservou
apenas os ícones, geralmente gravuras de Cristo que deveriam ser reverenciadas,
mas não cultuadas.
Ressentimento com tentativa do papa Nicolau I de interferir na nomeação do
patriarca da Igreja no Oriente.
25. O Cisma da Igreja
Em 1054, todas as diferenças vieram à tona quando um problema menor surgiu.
Miguel Cerulário, patriarca de Constantinopla de 1043 a 1059, condenou a Igreja
do Ocidente pelo uso de pão não-levedado na Eucaristia. Esta era uma prática
que se disseminara no Ocidente a partir do séc. IX.
Leão IX enviou dois legados e o cardeal Humberto ao Oriente para por fim à
polêmica.
Ao final das discussões, as diferenças de opinião eram ainda maiores.
Em 16/07/1054, os legados romanos colocaram no altar superior da catedral de
Santa Sofia um decreto de excomunhão do patriarca e seus seguidores. Tal ato
foi respondido por uma anatematização do papa de Roma e seus seguidores. As
duas igrejas passaram a não se reconhecerem mutuamente, entendendo-se ser
a verdadeira Igreja de Cristo.
A excomunhão mútua só foi suspensa em 07/12/1965, durante o Concílio
Vaticano II, pelo papa Paulo VI e pelo patriarca Atenágoras.
26. Consequências do cisma
Movimentos ecumênicos tornaram-se muito difíceis após tal divisão. O
movimento ecumênico atual, que visa a reunião das igrejas da Cristandade,
não tem o apoio da Igreja Católica Romana e apenas um pequeno apoio da
Igreja Ortodoxa Grega, sendo fundamentalmente protestante. Ambas
querem uma Igreja Ecumênica sob seus termos, apesar do Oriente ter se
aberto a diálogos com igrejas protestantes.
Exclusão do Oriente das influências revitalizantes de fortalecimento do
Ocidente, como o surgimento das cidades, nações e da classe média, sem
contar os movimentos culturais da Renascença e a Reforma.
Esforço missionário Oriental leva a fé ortodoxa à Bulgária, com a conversão
de Bóris em 864, à Rússia em 955 com a conversão da princesa Olga e em
988 com a conversão de seu neto Vladimir, e ao povo magiar.
Estagnação da Igreja, com pouca mudança ritual, de administração ou
teológica, devido ao choque do islã e a perda de gente e terras aos
muçulmanos.
27. Fontes
Texto base: CAIRNS, Earle E. O Cristianismo através dos séculos: uma
história da igreja cristã. 3 ed. Trad. Israel Belo de Azevedo e Valdemar
Kroker. São Paulo: Vida Nova, 2008.
Textos auxiliares:
DREHER, Martin N. Coleção História da Igreja, 4 vols. 4 ed. São Leopoldo:
Sinodal, 1996.
GONZALEZ, Justo L. História ilustrada do cristianismo. 10 vols. São Paulo:
Vida Nova, 1983