O documento discute os impactos da globalização no mundo do trabalho, incluindo o aumento da precarização através da disseminação de formas de trabalho precário e condições análogas à escravidão. A globalização econômica enfraqueceu as proteções sociais e levou países menos desenvolvidos a oferecer mão de obra barata para atrair investimentos, comprometendo os direitos trabalhistas.
O impacto do trabalho precário na era da globalização
1.
2.
3. O trabalho da Sociedade Globalizada
A globalização trouxe para a humanidade
um complexo de conseqüências, dentre as
quais as injustiças sociais, na justa medida
em que passou a acompanhar a evolução
do capitalismo e seu retorno à sua forma
primitiva de acumulação, com a decadência
do socialismo e a crise do sistema
concessivo de humanização do capital
(social-democracia).
4. Medidas dos Países Desenvolvidos
Alguns países mais desenvolvidos começaram
a se armar de medidas de segurança contra a
velocidade desse avanço, com vistas a
preservar o equilíbrio social com sua explosão.
No entanto, mesmo estes países, não foram
capazes de prever e se preparar para a
mutação desse fenômeno que gerou uma
globalização econômica impregnada da
ideologia da mais dura forma de capitalismo:
aquele que prega como bem maior para a
sociedade, a economia de mercado sobre
qualquer outro aspecto.
5. Na sua nova etapa, a globalização
definitivamente consolidada com o avanço
tecnológico, diminuiu a importância da matéria-
prima e da mão-de-obra direta, ampliando as
desigualdades sociais, trazendo como
resultados o desemprego, o "dumping social", a
pobreza e a escravidão. Isto porque o Estado
passou a ser pressionado para agir como
garantidor dos interesses econômicos a fim de
superar a desigualdade produtiva, mesmo que
isso significasse recuar nas conquistas sociais
alcançadas pelas sociedades ao longo de
muitas décadas.
6. Historicamente, a ameaça do socialismo
representou o verdadeiro motivo da criação de
leis de natureza social que, no entanto, em
certa medida "representaram uma conquista
dos trabalhadores, mas, por outro lado, elas
significaram o resultado de uma reação natural
da classe dominante como tática de
sobrevivência para o modelo capitalista de
produção, em virtude do risco da tomada do
poder que as revoltas dos trabalhadores
passam a representar, ainda mais diante do
sucesso da revolução proletária na Rússia, em
1917" .
7. A implementação dos ideais capitalistas, a
partir da Revolução Industrial até a primeira
metade do século XX, aprofundou as injustiças
sociais e os conflitos entre o capital e o
trabalho, e acirrou a concorrência dos
monopólios nacionais dos diversos países por
fatias mais amplas do mercado mundial,
contribuindo, inclusive, para provocar duas
guerras mundiais.
Como conseqüência dos conflitos, formaram-
se duas classes antagônicas: aqueles que
davam força ao capitalismo e àqueles que
reagiam a ele - a capitalista e a proletária.
8. Ante a numerosidade da primeira classe e seus
questionamentos, o que se tornava um perigo para
o sistema, pelo surgimento de um sistema sócio-
econômico-político alternativo – o
socialismo/comunismo -,o Estado capitalista
modificou sua concepção liberal (autonomia
contratual) para uma mais coletiva
(intervencionista) visando manter um equilíbrio
entre as classes, em nome da igualdade.
Na justa relação em que o Estado aumentava sua
força e conseqüentemente os limites de suas
atividades, as liberdades individuais foram
restringidas através das primeiras leis de proteção
ao trabalho que, mais tarde, deram origem ao
Direito do Trabalho.
9. A intervenção do Estado intensificou-se depois do
fim da Segunda Guerra Mundial, caracterizando
uma nova fase do capitalismo, também chamado de
"Estado do Bem-Estar Social", através da instituição
de um sistema sócio-econômico-político de social-
democracia, que procurou atenuar a ação do
capitalismo.
Durante os trinta anos que se seguiram ao término
da 2ª.Guerra Mundial, o capitalismo moderno,
estruturado no imperialismo monopolista dos
grandes grupos econômicos, sob a liderança das
corporações norte-americanas, e orientado pela
tendência de multinacionalização do capital,
conheceu um período de contínua prosperidade,
favorecendo a concentração do poder econômico
das nações mais ricas sobre as mais pobres.
10. A partir da década de 70, com a desvalorização do dólar
pelos persistentes déficits na balança de pagamento
norte-americana, agravada pelos gastos da fracassada
investida no Vietnã, a crise mundial do petróleo, o
acirramento da concorrência internacional, as estruturas
do capitalismo monopolista começaram a ruir.
O abalo geral na economia mundial com a crise do
capitalismo monopolista deu um forte impulso à
globalização econômica, pois promoveu a
reconcentração do capital nos centros mais dinâmicos
do capitalismo e o avanço tecnológico, abrindo uma
nova etapa para a economia mundial.
Com o fim da guerra fria, o desenvolvimento da
tecnologia e das comunicações e a redefinição das
estratégias do capital, a contenção social criada contra o
capitalismo selvagem na revolução industrial mergulhou,
gradativamente, em um período problemático.
11. Finalmente, nas décadas de 1980/1990, a social-democracia
entrou em verdadeira derrocada, pois a elevada carga tributária
exigida dos atores sociais (agentes econômicos e
trabalhadores) para manter os custos sociais, principalmente
dos países menos desenvolvidos, provocou uma redução dos
investimentos destinados à expansão e modernização das
empresas impelidas a concorrer internacionalmente, alargando
ainda mais o fosso entre os países ricos e pobres.
No início dos anos 90, com o sepultamento definitivo do
comunismo pela extinção da antiga URSS e a crise da social
democracia, a globalização econômica entrou em um ritmo
jamais visto na história humana. Neste período, os capitais,
criadores e controladores das novas conquistas tecnológicas
necessárias ao desenvolvimento dos países, passaram a
circular instantaneamente de um País para o outro, onde se lhes
eram oferecido potencial máximo de produção e consumo,
redução de tempo entre uma e outro, aumento da escala,
qualidade e produtividade a baixos custos unitários.
12. Pode-se definir trabalho precário como aquele que
tem pouca ou nenhuma estabilidade, não cumprindo
a contento o propósito do trabalho, que é fornecer
ao homem condições dignas de sustento próprio e
da sua família e garantir a sua cidadania.
A precarização do trabalho pode se apresentar sob
várias formas, dentre elas o trabalho em condições
análogas à escravidão, que se difere das demais
formas de trabalho precário por possuir como uma
de suas características basilares a presença de
cerceamento do direito de livre locomoção do
trabalhador, seja através da violência física, seja por
meio da coação econômica, como no caso da
servidão por dívida.
13. O trabalho em condições análogas à de
escravo não se confunde com a escravidão
em si, que é um regime social de sujeição e
exploração do homem e de sua força de
trabalho, como propriedade privada.
No trabalho em condições análogas à de
escravo, a par de não ser o trabalhador
legalmente considerado como propriedade
particular do empregador, tal qual no regime
de escravidão, o trabalhador é reduzido a
mera ferramenta do processo produtivo,
atingindo a sua própria dignidade como
homem pelo cerceamento de em um de seus
direitos mais básicos: a liberdade.
14. Em tempos de globalização, onde as economias dos
países subdesenvolvidos, incapazes de implementar as
políticas sociais e econômicas internas por seu atraso
estrutural por decisões políticas pretéritas, utilizam
como fórmula de ganhar terreno na competição
internacional: baixa proteção social + isenções fiscais +
expressivo mercado consumidor -, a precarização do
trabalho, na forma de trabalho em condições análogas
à escravidão, tende a crescer e se alastrar para fora de
suas fronteiras.
Somente no Brasil, de acordo com um levantamento da
Comissão da Pastoral da Terra - CPT, em 2002 foram
contabilizados cerca de 5,6 mil trabalhadores escravos
libertos no país - quase o dobro dos 2,4 mil registrados
no ano anterior.
15. Que o trabalho precário nesta nova era global
é uma dos maiores problemas da sociedade
mundial, quanto a isto não se têm dúvidas. O
cerne da questão, no entanto, é se seria o
trabalho precário fruto da globalização
econômica.
Aqueles que negam a responsabilidade da
globalização no processo de degradação do
trabalho, defendem que o aumento das taxas
de desemprego decorre, na verdade, da
ineficiência dos Estados Nacionais em superar
suas crises internas e que vêem na
globalização uma forma de solucioná-las.
16. Buscando os elementos de convicção do sistema da social-
democracia criada a partir da 2ª. Guerra Mundial, verificamos
que o seu ponto de partida consistia na conciliação de quatro
fontes principais de inspiração: o socialismo, o capitalismo,
as idéias econômicas de John Maynard Keynes e a doutrina
social da Igreja Católica, como meio de se alcançar à
igualdade, através da promoção da proteção social, sem
prejuízo da manutenção da essência do capitalismo.
No final do século XX, com a decadência do socialismo, a
reconcentração do capital e a crescente dependência dos
países menos desenvolvidos, pela incapacidade de realizar a
acumulação primitiva do capital e de garantir o avanço das
conquistas sociais com desenvolvimento educacional,
científico e tecnológico, estes Estados tiveram que se
modificar para atrair investimentos externos, devido ao
advento da globalização dos mercados.
17. A transnacionalização dos mercados, em
pouco mais de uma década, transformou
radicalmente as estruturas de dominação
política e de apropriação de recursos,
subverteu as noções de tempo e espaço,
derrubou fronteiras políticas e jurídicas,
multiplicou, de modo excepcional e em escala
planetária, o fluxo de idéias, conhecimento,
bens, serviços, valores culturais voltados para
a ideologia do sistema capitalista e tornaram
comunitárias as decisões, ignorando as
identidades nacionais dos países e suas
peculiaridades sociais e econômicas.
18. Talvez o maior efeito ocorrido nas relações de
trabalho nas últimas décadas tenha sido o
crescimento do mercado de trabalho precário
atingindo mais de 700 milhões de trabalhadores por
todo o mundo, como conseqüência da
transnacionalização dos mercados.
As mudanças trazidas pelo processo globalizante dos
mercados, com sua força atual dada pelo avanço
tecnológico, enunciam como uma de suas
características a obrigação de aceitá-lo, quer se goste
ou não, ante a sua irreversibilidade, e, os países que
decidiram não abrir seus mercados sofrem hoje pela
decadência e incapacidade de superar as misérias.
19. A impossibilidade de rejeitar o processo, com
vistas ao crescimento econômico estagnado
sem ele, fez com que os países menos
desenvolvidos social e economicamente
passassem a utilizar a sua força de trabalho
como barganha para atração de investimentos
externos, a partir do recuo das garantias
sociais.
A ausência de políticas de inclusão social
desses Estados propiciou o aumento da
precarização do trabalho em uma de suas
piores formas, o trabalho em condições
análogas à escravidão, e, conseqüentemente,
sensibilizou a força de trabalho mundial.
20. Encurralados entre a necessidade de prestigiar a
globalização capitalista e o fortalecimento dos atores
sociais enfraquecidos pelo processo, mas sem
condições para tanto, enquanto não alcançados os
investimentos externos preciso para fornecer o
crescimento econômico, os países menos
desenvolvidos social e economicamente passam a
globalizar as suas mazelas.
A não revisão das prioridades da mundialização do
capital em prol do fator humano com o fim da sutil
forma de "coisificação" o homem ao invés de
propiciar o tão almejado sonho de desenvolvimento
econômico, acabará por abrir ensejo para que a
sociedade mundial caminhe a passos largos para a
escravidão.