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2| S É R I E C R I S T I A N I S M O P R Á T I C O
EM ESPÍRITO
E EM VERDADE
Curso prático de liturgia
2| S É R I E C R I S T I A N I S M O P R Á T I C O
EM ESPÍRITO
E EM VERDADE
Curso prático de liturgia
Luiz Carlos Ramos
EDITEO
São Bernardo do Campo, 2008
Série Cristianismo Prático
© 2008 Luiz Carlos Ramos
EDITORA DA FACULDADE DE TEOLOGIA (EDITEO)
Catalogação preparada pela bibliotecária
Aparecida Comelli Tavares (CRB 8-3781) – Biblioteca Jalmar Bowden
264 RAMOS, Luiz Carlos
R147e Em espírito e em verdade: curso prático de
liturgia / Luiz Carlos Ramos. São Bernardo
do Campo: Editeo, 2008.
144 p.
ISBN: 978-85-88410-85-5
1. Liturgia 2. Culto público I. Curso prático
de liturgia II. Título
CDD 18ª. ed.
Faculdade de Teologia da Igreja Metodista – Umesp
Reitor da Faculdade de Teologia Rui de Souza Josgrilberg
Reitor da Umesp Márcio de Moraes
Editeo
Conselho Editorial Blanches de Paula
Helmut Renders
José Carlos de Souza
Luiz Carlos Ramos
Magali do Nascimento Cunha
Nelson Luiz Campos Leite
Otoniel Luciano Ribeiro
Rui de Souza Josgrilberg (presidente)
Ronaldo Sathler-Rosa
Stanley da Silva Moraes
Tércio Machado Siqueira
Marcos José Martins
Coordenador editorial Ronaldo Sathler-Rosa
Editor responsável por este livro Tércio Machado Siqueira
Coordenador de produção Luiz Carlos Ramos
Revisão Gedilson Oliveira dos Santos,
Glória Pratas e Adilson Miguel da Silva
Assistente Editorial Glória Pratas
Editoração e capa Marcos Antonio Brescovici
Foto da capa Vitor Chaves (patena e cálice
utilizados nas celebrações
eucarísticas da FaTeo)
EDITORA DA FACULDADE DE TEOLOGIA DA IGREJA METODISTA
Rua do Sacramento, 230 – Rudge Ramos
09840-000 – São Bernardo do Campo, SP
Telefone: (11) 4366-5983 — e-mail: editeo@metodista.br
Sumário
Prefácio ................................................................... 7
Prólogo .................................................................. 11
Introdução ............................................................ 13
Liturgia e Culto ............................................................ 13
Liturgia e Teologia........................................................ 13
Modelos bíblicos e históricos de ordem para o culto ....... 16
As bases da liturgia cristã: o Pão e a Palavra ................. 24
I O que é culto? (A liturgia do serviço) ...............29
II Por que fazer culto? (A liturgia da graça) .......37
III Onde se faz culto? (A liturgia do espaço
sagrado)................................................................41
Lugares Sagrados........................................................ 42
Tabernáculo................................................................. 43
O Templo .................................................................... 45
Sinagogas ................................................................... 47
Casas (cenáculo) ......................................................... 48
Praça pública ............................................................... 50
Prisões ........................................................................ 52
Catacumbas ................................................................ 53
Basílicas e catedrais ..................................................... 54
A linguagem espacial e a teologia dos edifícios, mobílias
e utensílios religiosos................................................... 57
A Igreja: em espírito e em verdade............................... 62
IV Quem participa do culto? (A liturgia
do povo de Deus)..................................................65
6|
O lugar da criança no culto cristão................................ 69
Culto para crianças ou culto com as crianças? ............... 72
O que as crianças podem e não podem fazer no culto?.. 74
Preparação da liturgia de um culto inclusivo.................. 78
Portanto...................................................................... 79
V Quando fazer culto? (A liturgia do tempo)....... 81
A celebração da História da Salvação............................ 82
O Calendário Litúrgico.................................................. 85
Ciclo do Natal ........................................................87
O Tempo Comum (após Epifania
e após Pentecostes) ...............................................91
Ciclo Pascal ...........................................................94
Esquema do Ano Litúrgico............................................ 99
VI Como fazer culto? (A liturgia da liberdade
e da criatividade)................................................ 103
Objetividade e subjetividade litúrgicas .........................104
A emoção na comunicação litúrgica........................105
A razão na comunicação litúrgica ...........................106
Emoção, sensação e razão e a saúde litúrgica .........109
Outras formas de comunicação-não-verbal na liturgia ......110
A natureza e o culto .............................................111
O corpo e o culto..................................................119
A cultura e o culto................................................131
A Equipe ou Ministério de Liturgia................................135
Epílogo ................................................................ 139
Referências......................................................... 141
Textos sobre culto e liturgia.........................................141
Textos sobre a comunicação por vias não-verbais ........143
Prefácio
A Série Cristianismo Prático (SCRIPT)
foi planejada para oferecer às lide-
ranças das igrejas locais, pastores e
pastoras, leigos e leigas, um instru-
mento de trabalho e aperfeiçoamento
da pastoral cristã. Como uma de-
monstração de nossa disposição, te-
mos a alegria de apresentar o traba-
lho do Rev. Luiz Carlos Ramos, Em
Espírito e em Verdade, um curso prá-
tico de liturgia.
A publicação deste livro torna-se
urgente, exatamente, porque cresce,
nas igrejas evangélicas, uma atitude
de desdém para com a palavra “litur-
gia”. Há poucos dias, ouvi a seguinte
frase, numa oração de um leigo: “Re-
8|
preenda, Senhor, o espírito de litur-
gia”. Indagado pelo pastor sobre o
seu conceito de liturgia, ele respon-
deu: “é aquele papelzinho que orga-
niza o culto”.
O livro Em Espírito e em Verdade
tem a intenção de esclarecer o signi-
ficado de liturgia para a Igreja Cristã.
Mais do que enfatizar a liturgia como
uma ordem para a celebração cúlti-
ca, o autor deixa claro que ela vai
além. Para ele, liturgia deve ser com-
preendida como uma vida de serviço
à Causa Divina. Isso faz da liturgia
um conjunto harmonioso de pala-
vras, gestos e expressões que orien-
tam e desafiam a comunidade cele-
brante a aperfeiçoar o seu testemu-
nho cristão.
Assim, pedagogicamente, a liturgia
deixa de ser mera questão formal,
para exercer um verdadeiro papel pro-
fético, desafiando a cada celebrante a
transformar os passos litúrgicos, con-
| 9
tidos numa folha de papel, em práti-
cas do seu dia-a-dia.
O autor desenvolve este tema com
profundidade e leveza. Partindo das
bases bíblicas, mostra a liturgia como
um instrumento necessário ao teste-
munho cristão. Além disso, ele deseja
mostrar que a liturgia é um dos ele-
mentos que sinalizam a dimensão
ecumênica da Igreja Cristã, em todas
as épocas. Na diversidade das igrejas,
a liturgia se faz presente na especifi-
cidade de cada tradição cristã.
Portanto, a Faculdade de Teologia
da Igreja Metodista pretende, com
esta publicação, incentivar as igrejas
locais a redescobrirem a importância
da liturgia, para o culto, e a dialoga-
rem com as tradições cristãs. A preo-
cupação do Rev. Luiz Carlos é com a
prática do culto nas igrejas.
Como editor da Série Cristianismo
Prático, espero que este curso prático
de liturgia ajude o povo cristão na bus-
ca de uma autêntica celebração de sua
10|
fé. Que os cultos sejam mais comunitá-
rios e participativos, e que o povo cren-
te seja mais consciente e comprometido
com a Palavra de Deus.
Tércio Machado Siqueira
Prólogo
O material desta obra é o resulta-
do da experiência do autor como pas-
tor e como liturgista. É fruto dos
cursos ministrados nas comunidades
pelo Brasil afora e das aulas de Li-
turgia da Faculdade de Teologia da
Igreja Metodista; e também da expe-
rimentação de uma espiritualidade
encarnada, vivenciada nas celebra-
ções da Igreja local, regional e nacio-
nalmente, bem como em tantos en-
contros ecumênicos, e, particular-
mente, nos cultos da FaTeo.
Luiz Carlos Ramos
12|
Introdução
Liturgia e Culto
NTES DE APRESENTARMOS
uma definição de liturgia, é
importante fazer uma pe-
quena distinção entre Liturgia e Cul-
to: segundo Nelson Kirst (ver referên-
cias bibliográficas no final da publi-
cação) Culto é o encontro celebrativo
entre Deus e o seu povo, e a Liturgia
é o que acontece nesse encontro.
Liturgia e Teologia
Convencionalmente, a Teologia se
estrutura em três grandes áreas, a
saber: (1) Bíblia, que se ocupa da in-
A
L U I Z C A R L O S R A M O S
14|
vestigação das fontes da fé cristã; (2)
Teologia Sistemática e História, que
estuda a maneira como a fé foi inter-
pretada e reinterpretada em diferen-
tes épocas e lugares; (3) e Pastoral,
que se ocupa da práxis da fé, isto é,
da reflexão e da prática aplicada à
realidade das pessoas e das comuni-
dades de fé no contexto da missão da
Igreja a toda a humanidade.
Didaticamente, a Liturgia inscre-
ve-se no escopo da Teologia Pastoral,
que, por sua vez, se subdivide em di-
ferentes áreas, sendo as principais
estabelecidas a partir da narrativa
bíblica do livro dos Atos dos Apóstolos
(especialmente, 2.42-47): doutrina
(didaskalia) – comunhão (koinonia) –
partilha do pão (diakonia) – ora-
ção/louvor (liturgia). A Liturgia é, por-
tanto, um capítulo da Teologia Pasto-
ral, ao lado da Educação Cristã, do
Aconselhamento ou Poimênica, da
Diaconia ou Ministérios. Entretanto,
essas divisões têm caráter meramente
S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E
| 15
didático, pois, na prática, todas as
áreas da Teologia estão imbricadas,
interligadas e se interdependem.
Na academia, o uso científico do
termo liturgia aplica-se à disciplina
teológica que trata da ritualidade ce-
rimonial e rubrical que regulam o e-
xercício externo do culto.
Considera-se a liturgia como teolo-
gia primeira (theologia prima) e a re-
flexão dogmática como Teologia se-
gunda (theologia secunda). É igual-
mente considerada ápice e fonte (cul-
men et fons) da ação da igreja (actio
ecclesiae). Neste sentido, como ensina
Casiano Floristán, a liturgia é “lugar
primário no qual se realiza a autênti-
ca fé, ao mesmo tempo em que é fonte
e norma primeira da doutrina”. A li-
turgia é uma das três grandes ações
da Igreja, sendo precedida pela evan-
gelização e seguida pela atividade ca-
ritativa, testemunhal ou apostólica.
Assim sendo, não se pode fazer Li-
turgia sem se recorrer à fonte da nos-
L U I Z C A R L O S R A M O S
16|
sa fé, a Bíblia; nem à interpretação e
atualização dessa fé, a Teologia Sis-
temática e a História; e, muito menos,
sem recorrer-se à aplicação dessa fé à
vida com vistas à transformação da
realidade à luz dos princípios do Rei-
no de Deus, que é a tarefa específica
da Teologia Pastoral.
Por essa razão, trataremos dos
temas da Liturgia, sempre relacio-
nando-os à Bíblia, à sistematização
histórica e à práxis pastoral.
Comecemos, portanto, pela busca
de alguns modelos bíblicos de ordem
para o culto.
Modelos bíblicos e históricos
de ordem para o culto
Na Bíblia Hebraica há muitas in-
dicações, umas mais, outras menos
explícitas, de diferentes práticas li-
túrgicas. Um bom exemplo é a narra-
tiva de Neemias 8.1-12. Note-se a
estrutura sugerida pela narrativa:
S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E
| 17
Reunião – leitura bíblica – adoração –
edificação (explicação da leitura) –
refeição comunitária/serviço aos ne-
cessitados.
No mesmo livro podemos encon-
trar variações dessa estrutura, veja-
se, por exemplo, Neemias 9: Confis-
são individual – leitura bíblica – ado-
ração e louvor – confissão comunitá-
ria – dedicação (renovação da alian-
ça).
Um dos modelos mais significati-
vos é o encontrado em Isaías 6.1-8. A
estrutura oferecida por esta passagem
forneceu a base para a liturgia de vá-
rias igrejas reformadas e, particular-
mente, a Igreja Metodista, aqui no
Brasil: adoração – confissão (indivi-
dual e comunitária) – edificação – de-
dicação.
No Novo Testamento, várias são as
referências. Detenhamo-nos em al-
gumas das que mais inspiraram a
prática litúrgica histórica.
L U I Z C A R L O S R A M O S
18|
Lucas 24. O capítulo 24 do Evan-
gelho de Lucas repete sistematica-
mente uma mesma estrutura: encon-
tro – Serviço da Palavra – Serviço da
Mesa – Envio. Veja Lucas 24.13-35;
36-43; 44-49.
O mesmo texto de Atos 2.42-47,
mencionado acima, também nos ofe-
rece uma referência sobre a prática
celebrativa dos primeiros cristãos:
instrução – comunhão – partilha –
oração e louvor.
Apocalipse 8. Uma outra proposta
litúrgica, bem diferente, encontramos
no relato de um culto escatológico,
narrado no capítulo 8 e seguintes do
livro do Apocalipse: silêncio contem-
plativo – súplicas (incensário) – pro-
clamação (trombetas) – edificação
(10.8-10) – Envio (10.11; 11.1ss).
Um dos registros mais antigos, a
que temos acesso, sobre o culto nos
primeiros séculos, encontra-se na
Didachè, que era uma espécie de ma-
nual dos primeiros cristãos, datado,
S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E
| 19
provavelmente, do final do primeiro
século. Veja-se, a título de ilustração,
a seguinte oração eucarística extraída
da Didachè:
No que se refere à eucaristia,
dai graças assim:
Primeiramente, sobre o cálice:
Nós te damos graças, ó Pai nosso,
pela santa vinha de Davi, teu servo;
tu no-la fizeste conhecer
por Jesus, teu filho.
Glória a ti pelos séculos!
Depois, sobre o pão partido:
Nós te damos graças, ó Pai nosso,
pela vida e pelo conhecimento
que nos concedeste
por Jesus, teu filho.
Glória a ti pelos séculos!
Como esse pão partido,
antes disseminado
sobre as montanhas,
foi reunido para ser apenas um,
reúne do mesmo modo tua igreja das
extremidades terra em teu Reino.
Sim, a ti são a glória e o poder
por Jesus Cristo, pelos séculos!
L U I Z C A R L O S R A M O S
20|
Depois de terdes comido o pão,
agradecei assim:
Nós te damos graças, ó Pai santo,
por teu santo nome,
que abrigaste em nosso coração,
pelo conhecimento, pela fé
e pela imortalidade
que nos concedeste
por Jesus, teu filho.
Glória a ti pelos séculos!
Tu, Senhor todo-poderoso, criaste o
universo para louvor de teu nome e
deste aos homens a comida e a bebida
para [seu] regozijo,
a fim de que eles te dêem graças;
mas a nós, tu nos deste um alimento
e uma bebida espirituais
e a vida eterna por teu filho.
Antes de tudo nós te damos graças
porque és poderoso;
Glória a ti pelos séculos!
Lembra-te, Senhor,
de livrar tua igreja de todo mal
e de completá-la em teu amor.
Reúne, dos quatro ventos a Igreja,
que santificaste,
no Reino que preparaste para ela.
Porque a ti pertencem o poder
e a glória pelos séculos!
S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E
| 21
Venha a tua graça
e passe este mundo!
Hosana ao Deus de Davi!
Quem é santo venha;
quem não é faça penitência.
Marana tha! Amém.
Síntese: Adoração (orações a Deus,
o Pai) – Eucaristia (proclamação do
evangelho e memorial de Jesus, o Fi-
lho) – Diakonia (Espírito Santo motiva
o serviço/coleta em favor dos necessi-
tados).
Outro importante documento é o
relato de Justino Mártir (Primeira
Apologia), de meados do segundo sé-
culo da era cristã. Assim Justino des-
creve a celebração do domingo:
Depois disso, continuamos a recor-
dação dessas coisas. Aqueles que têm
posses prestam ajuda a todos os que
têm necessidade, e nós nos damos
assistência mutua. Em todas as nos-
sas oferendas bendizemos o Criador
do universo por seu filho Jesus Cristo
e pelo Espírito Santo. No dia chamado
do sol, todos, habitem nas cidades ou
nos campos, se reúnem num mesmo
L U I Z C A R L O S R A M O S
22|
lugar. São lidas as memórias dos a-
póstolos e os escritos dos profetas en-
quanto o tempo o permite. Terminada
a leitura, aquele que preside toma a
palavra para advertir e exortar à imi-
tação desses belos ensinamentos. Em
seguida, todos nós nos levantamos e
oramos em voz alta. Depois, como já
dissemos, terminada a oração, são
trazidos pão, vinho e água. Aquele
que preside, à medida que suas forças
o permitem, faz subir ao céu orações e
ações de graça, e todo o povo respon-
de com a aclamação amém.
Segue-se a distribuição dos alimentos
consagrados a cada um, e a parte dos
ausentes lhes é enviada pelo ministé-
rio dos diáconos. Aqueles que têm
bens em abundância e querem fazer
doações doam livremente o que que-
rem. O que é recolhido é entregue ao
presidente, que dá assistência aos ór-
fãos, ás viúvas, aos doentes, aos indi-
gentes, aos presos, aos hóspedes es-
trangeiros, numa palavra, a todos os
que estão passando necessidade.
Nós nos reunimos no dia de Sol por-
que é o primeiro dia, aquele em que
Deus, tirando a matéria das trevas,
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| 23
criou o mundo, porque nesse mesmo
dia o nosso salvador Jesus Cristo res-
suscitou dos mortos. Na vigília do dia
de Saturno ele foi crucificado e, no dia
seguinte a este, isto é, no dia do Sol,
ele apareceu aos seus apóstolos e aos
seus discípulos e lhes ensinou essa
doutrina que nós acabamos de sub-
meter ao vosso exame.
A liturgia começava com leituras
das Escrituras e relatos dos testemu-
nhos dos apóstolos (seguidores de
Jesus) – exortações para a imitação
dos atos de Jesus, conforme teste-
munhados – orações pelo mundo e
pela igreja, particularmente pelos en-
fermos, ou que estavam à morte, e
pelos que haviam sido presos por pro-
fessarem a Cristo, denunciados por
não cristãos – beijo da Paz – ofertório
dos elementos eucarísticos – oração
eucarística – distribuição dos elemen-
tos eucarísticos aos presentes e envio
aos ausentes – coleta em favor dos
necessitados (alimentos, roupas ou
dinheiro) – despedida com oração pa-
L U I Z C A R L O S R A M O S
24|
ra que todos permaneçam fiéis e a
salvo até reunirem-se novamente no
próximo domingo.
As bases da liturgia cristã:
o Pão e a Palavra
Sabe-se que os primeiros cristãos
mantinham seu costume, como ju-
deus, de freqüentar a sinagoga, aos
sábados, para ouvir a leitura da Lei,
dos Escritos e dos Profetas; e que, no
domingo, se reuniam nas casas para
o “partir do pão” e celebrar a memória
de Jesus. Celebravam, assim, a Pala-
vra, no sábado, e a Ceia, no domingo.
Porém, à medida que os cristãos fo-
ram sendo expulsos das sinagogas,
passaram a concentrar no domingo a
celebração da Palavra e da Mesa.
Num primeiro momento, como sa-
lienta Nelson Kirst em Nossa Liturgia:
das origens até hoje, o sacramento
eucarístico era feito no contexto de
uma refeição normal e tinha a seguin-
te estrutura: O celebrante partia o
pão e fazia uma oração de ação de
S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E
| 25
graças, depois todos comiam a refei-
ção comunal e, ao final, o celebrante
voltava a chamar a atenção de todos
para a partilha do vinho que era pre-
cedida de outra oração de ação de
graças. A estrutura era, portanto: pão
– refeição – vinho. Mais tarde, por
razões várias, passou-se a realizar a
refeição em primeiro lugar, juntando
a celebração do pão e do vinho no
final da cerimônia: refeição – pão e
vinho. Mais adiante, ainda, separou-
se completamente a refeição do me-
morial do pão e do vinho.
O culto cristão integra em uma
única celebração a leitura e a explica-
ção das Escrituras, próprias da litur-
gia da Sinagoga judaica, e o memorial
eucarístico, do Cenáculo.
As primeiras pessoas a professar a
fé cristã eram, principalmente, judias,
e assim continuaram até que foram
expulsas da Sinagoga. Até então, re-
uniam-se no sábado (Shabah), na Si-
nagoga para a liturgia da Palavra, e
tornavam a reunir-se no domingo (Dia
L U I Z C A R L O S R A M O S
26|
do Senhor) para a Liturgia do Cenácu-
lo.
Quando as Sinagogas fecharam
suas portas aos cristãos, estes passa-
ram a concentrar a liturgia da Pala-
vra, e a do Cenáculo, numa única
celebração, desta vez no Dia do Se-
nhor (Kyriake hemera).
Dos relatos bíblicos e históricos,
mencionados até aqui, podemos esta-
belecer um padrão que dá o funda-
mento da liturgia cristã: a Celebração
da Palavra e a Celebração da Mesa.
Quase todos os relatos têm em co-
mum o fato de terem dois focos dis-
tintos e complementares: a leitura e
explicação da Palavra, de um lado, e a
prática sacramental do memorial ins-
tituído por Jesus, a eucaristia, ou
Santa Ceia, ou ainda a Ceia do Se-
nhor, de outro. Pão e Palavra são,
portanto, os pilares da liturgia.
Na organização do espaço celebra-
tivo, esses “pilares” ficam evidentes
pela disposição, no altar: da mesa da
comunhão e do púlpito, lugares res-
pectivos da comunhão e da proclama-
S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E
| 27
ção; do sacramento e do Evangelho;
da partilha e do anúncio; da fé e da
prática; dos atos de piedade e das
obras de misericórdia; enfim, do Pão e
da Palavra.
28|
29|
I
O que é culto?
(A liturgia do serviço)
TERMO LITURGIA TEM origem no
grego clássico leitourgia (leitos
[adjetivo de laós] = povo + ergon
= trabalho, esforço), que originalmente
designava toda obra, ação ou iniciativa
assumida livremente por um indivíduo
em favor do povo ou do bairro ou da
cidade ou do Estado. Aos poucos o ter-
mo passou a designar qualquer traba-
lho que importasse em “serviço”, mais
ou menos obrigatório, prestado ao Es-
tado, ou a um indivíduo, ou mesmo à
divindade (“serviço religioso”).
O
L U I Z C A R L O S R A M O S
30|
Na Bíblia Hebraica, ou Antigo Tes-
tamento, um dos termos mais signifi-
cativos, relativos ao culto, é hawa,
que pode ser traduzido por “prostrar-
se” e “adorar”. A palavra é empregada
170 vezes em todo o AT e traz a idéia
de submissão e auto-humilhação,
cujo sentido sugere um curvar-se até
a testa encostar o chão.
Derivam de hawa outros termos
que nos ajudam a entender melhor a
força e a idéia da raiz desse termo:
abad, traduzido por “escravo”, servo
(equivalente ao grego doulos); abida,
traduzido por “serviço”, “ritual”, “ado-
ração”; ‘abodah, traduzido por “traba-
lho” e ‘abad, “servir”, “cultivar o cam-
po” (vd. Êx 12.21-28; Dt 10.8; 2Cr
8.14).
Em Esdras 6, por exemplo, esses
termos são empregados na narrativa
que descreve o serviço realizado por
ocasião da construção ou reconstru-
ção de Jerusalém.
S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E
| 31
A tradução grega do Antigo Testa-
mento, a Septuaginta (LXX), emprega
o termo liturgia sempre, sem exceção,
para designar o “serviço religioso”
prestado pelos levitas a Yaweh (ocorre
mais de 150 vezes).
No Novo Testamento, o verbo lei-
tourgeo, o adjetivo leitourgikos e os
substantivos leitourgia e leitourgos
ocorrem 15 vezes e, em geral, são tra-
duzidos como “serviço”, “ministério”,
“socorro/auxílio” e seus correspon-
dentes. Em Atos 13.2 o termo tem,
especificamente, o sentido de “culto”
(ver também: Hb 1.7,14, 8.2,6, 10.11;
Fp 2.17).
Nos escritos extrabíblicos, como
na Didachè e textos de Clemente, o
termo aparece claramente relacionado
com a celebração eucarística.
Ao longo da história da Igreja, o
termo grego foi preservado na igreja
oriental, mas substituído por seus
equivalentes latinos (officium, ministe-
rium, múnus...) na igreja latina.
L U I Z C A R L O S R A M O S
32|
Atualmente, a palavra liturgia se
aplica a todo o conjunto dos atos ri-
tuais e da Igreja pelos quais prosse-
gue no mundo no exercício do sacer-
dócio de Jesus Cristo, destinado a
santificar os seres humanos e glorifi-
car a Deus.
No Novo Testamento, outros ter-
mos são utilizados com o mesmo sen-
tido de leitourgia (At 13.2; Hb 1.7,14,
8.2,6, 10.11; Fp 2.17), entre eles:
Proskyneo (equivalente ao he-
braico hawa), geralmente tra-
duzido por “adorar/adoração/
adorador”, (Mt 2.2,8, 11; 4.9,
10; Jo 4.20-23; Ap 3.9). Signi-
fica, literalmente, “curvar-se”,
“prostrar-se”;
Sebomai, traduzido por “te-
mor”, “piedade” (Mt 15.9; At
13.43,50, 16.14, 17.4,17, 18.
7,13, 19.27). É a característica
dos homens e mulheres cuja
piedade se tornava notória pela
S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E
| 33
prática da oração, do jejum e
das esmolas dadas aos pobres;
E Latreia, traduzido como “cul-
to”, “serviço sagrado” (Rm 9.4,
12.1; Hb 9.1,6,9,14; Mt 4.10;
At. 7.7; Ap 7.15, 22.3). A la-
treia é a tarefa do latris, o mais
humilde dos serviçais do perío-
do bíblico. Há vários tipos de
escravos que são mencionados
na Bíblia: o doulos, que cuida-
va dos serviços externos (trata-
va dos animais, lavrava a ter-
ra...); o diakonos, que cuidava
dos serviços domésticos (servia
as mesas, limpava a casa...); e
o latris, que era quem fazia o
trabalho mais degradante (lim-
pava a latrina). O latris não é
mencionado nas páginas do
NT, mas o seu serviço sim, nos
textos indicados acima. Da
mesma raiz, temos as expres-
sões em português “latrina” e
“idolatria”.
L U I Z C A R L O S R A M O S
34|
Todos esses termos têm a conota-
ção de humildade e serviço.
Portanto, liturgia é o serviço comuni-
tário celebrado pelo povo de Deus por
meio da adoração à Trindade e da soli-
dariedade aos da família da fé, bem co-
mo a toda a comunidade humana.
Talvez por essa origem etimológica
dos termos, para muitos, participar
do culto assumiu um caráter de de-
ver, de obrigação, de trabalho (até
hoje, um termo muito comum na lín-
gua inglesa para designar o culto é
service, “serviço”).
Por essa razão, é preciso, aqui,
evocar a grande ação da graça de
Deus, que toma a iniciativa de vir até
nós, no culto, como veio ao encontro
da humanidade na pessoa de Jesus
Cristo, e estabelece conosco uma no-
va aliança, pela qual já não somos
chamados servos, mas amigos:
Já não vos chamo servos, porque o ser-
vo não sabe o que faz o seu senhor;
mas tenho-vos chamado amigos, por-
S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E
| 35
que tudo quanto ouvi de meu Pai vos
tenho dado a conhecer. (Jo 15.15)
Assim sendo, o culto é o encontro
maravilhoso do Eterno com o efêmero,
do Infinito com o finito, do Santíssimo
com o pecador redimido.
A dimensão do serviço prestado
com muita humildade permanece,
mas não por dever, mas por amor.
Dizendo de outra forma, a liturgia
é um diálogo interativo e afetivo en-
tre Deus e os seres humanos e des-
tes entre si, no contexto celebrativo
da fé, na forma de um serviço co-
munal — comunitário e comunica-
cional — porque é prestado por to-
dos e para todos.
36|
II
Por que fazer culto?
(A liturgia da graça)
OR QUE ALGUÉM VAI AO CULTO? A
resposta a esta pergunta pode
ser reveladora da teologia do
culto.
Há, historicamente, três posturas
clássicas a esse respeito: a primeira,
típica da Igreja Medieval, que diz que
devemos ir ao culto para sermos a-
graciados por Deus: ênfase na mística
sacramental.
Uma segunda, muito difundida
entre os anabatistas, diz que devemos
ir ao culto para sermos alimentados
P
L U I Z C A R L O S R A M O S
38|
pela Palavra de Deus: ênfase na ra-
cionalidade dogmática.
Finalmente, a posição de reforma-
dores, como Calvino e Lutero, que
entenderam que a liturgia não deve
ser considerada mero meio para se
obter graça ou favor divinos, nem co-
mo ocasião para que o povo de Deus
seja alimentado por sua Palavra, uma
vez essas seriam práticas antropocên-
tricas — porque têm como último be-
neficiário o ser humano.
Em contrapartida, os reformadores
entenderam que a liturgia deve ser
teocêntrica, de modo que Deus seja o
sujeito, o centro, o foco do culto. As-
sim, o fiel deve buscar em primeiro
lugar o Reino de Deus e sua justiça —
isso também no culto. Assim, a graça,
a instrução bem como as demais coi-
sas, serão acrescentados aos fiéis
como decorrência natural. Aqui estão
sendo levadas em consideração as
duas grandes doutrinas da Reforma
Protestante: a Teologia da Graça (es-
S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E
| 39
pecialmente, Lutero) e a da Soberania
de Deus (especialmente, Calvino).
Na prática, constata-se que há um
caminho de mão dupla: de um lado,
Deus vem ao encontro da comunidade
(e é sempre ele quem toma a iniciati-
va), e, por outro lado, a comunidade
vai ao encontro de Deus, como res-
posta em ação de graças à grande
ação da graça de Deus. O culto se
constitui, assim, em ponto de encon-
tro celebrativo entre Deus e a comu-
nidade e desta consigo mesma (cf. Tg
4.8).
No entanto, não se deve perder o
referencial de que Deus é o centro do
culto, é ele que “está sentado no alto
e sublime trono” (cf. Is 61).
A pergunta “por que fazer cultos?”
será melhor respondida e mais deta-
lhadamente explicada ao longo dos
próximos capítulos, à medida que a-
bordarmos outros aspectos essenciais
da liturgia.
40|
III
Onde se faz culto?
(A liturgia do espaço sagrado)
UANTO AO ESPAÇO LITÚRGICO,
desde muito cedo na experiên-
cia do povo de Deus, conforme
registrada nas Escrituras, houve a
preocupação de delimitações e esta-
belecimento de áreas nas quais a ma-
nifestação do Sagrado é experimenta-
da de maneira especialmente enfática.
A relação do povo de Deus com
tais lugares acompanhou o amadure-
cimento da sua fé e espiritualidade,
bem como as contingências sócio-
político-geográficas próprias de cada
período de sua história.
Q
L U I Z C A R L O S R A M O S
42|
Lugares Sagrados
Primeiramente, na fase em que o
povo de Deus dava seus primeiros
passos na construção de sua identi-
dade religiosa (fé e teologia), sua ex-
periência com as manifestações de
Yaweh (as teofanias) eram eventuais
e esporádicas. Assim, as primeiras
referências são os chamados Lugares
Sagrados, tais como aconteceu com:
Noé, após o Dilúvio (Gn 8.20); Abraão,
nos Carvalhais de Manre (Gn 13.18);
Moisés, no Monte Horebe (Êx 3.5);
Josué, no Monte Ebal (Js 8.30); Davi,
na Eira de Ornã (1Cr 21.26); Esdras e
Neemias, na reconstrução do Templo
(Ed 3.2); mesmo Jesus, no Monte da
Transfiguração (Mc 9.2ss); e Paulo, no
lugar de oração às margens de um rio
(At 16.13 ).
Nas primeiras experiências, o lu-
gar em si passa a ser considerado
sagrado, porque ali algo especial da
parte de Deus aconteceu.
S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E
| 43
Na medida em que a identidade re-
ligiosa do povo de Deus vai se estabe-
lecendo com mais clareza, começou-
se a construir ou utilizar-se de locais
conforme as circunstâncias do seu
cotidiano.
Tabernáculo
Quando nômades, habitantes de
tendas, e peregrinos do deserto, cons-
truíram o Tabernáculo (Êx 30-40, ver
também cap. 25 [especialmente v. 8 a
27]).
O Tabernáculo deveria ficar no
centro do acampamento israelita, com
a entrada do Santo Lugar voltada pa-
ra o Oriente e a do compartimento
interno, o Santo dos Santos, voltado
para o Ocidente.
Tratava-se de uma estrutura sim-
ples: uma cerca de lona com um pá-
tio, e um espaço reservado menor (o
Santo) para os sacrifícios diários, ofe-
recidos pelos sacerdotes, e um ainda
L U I Z C A R L O S R A M O S
44|
mais reservado (o Santo dos Santos)
onde o Sumo-Sacerdote oferecia o
sacrifício anual.
O Tabernáculo abrigava a Arca da
Aliança (cf. Êx 25.1-22), o Menorah
ou castiçal de sete braços (cf. Êx
25.31-39), o Altar de Bronze para os
holocaustos (cf. Êx 27.1-8) e o Altar
de Ouro para o incenso (Êx 30.1-10).
Quando o povo levantava acam-
pamento e partia para outras para-
gens, o Tabernáculo era desmontado
e carregado pelos levitas que torna-
vam a montá-lo no novo lugar de des-
tino.
Diferentemente do que se passava
nos Lugares Sagrados, com o Taber-
náculo, Yaweh passa a habitar em
uma tenda muito parecida com a casa
do povo que o adorava, acompanhan-
do-o em sua peregrinação, sempre
que este se mudava.
Durante a conquista de Canaã, o
Tabernáculo permaneceu em Gilgal,
depois em Silo, e depois em Quiriate-
S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E
| 45
Jearim, até Davi. No tempo de Saul,
ficou em Nobe (1Sm 21.1). Salomão o
trouxe para Jerusalém.
Segundo o Evangelho de João, Je-
sus “tabernaculou” com os seres hu-
manos (cf. 1.14).
O Templo
Quando sedentários, já estabeleci-
dos na Terra Prometida, e passam a
habitar em casas de madeira e alve-
naria, devidamente decoradas e “a-
paineladas” (cf. Ag 1.4), os adoradores
de Yaweh decidem construir o Templo
(cf. 1Rs 5.5; 6).
O modelo para o Templo é o que
há de melhor em termos de edifica-
ções humanas da época.
O Templo passa a ser o lugar de
referência ao redor do qual gira a vida
do povo de Deus. Em Jerusalém, on-
de é edificado, está o centro do poder
político, econômico e religioso.
L U I Z C A R L O S R A M O S
46|
E é o Templo que dá legitimidade a
todo o resto. Para isso, peregrinações
anuais eram promovidas, de modo
que todos tinham o compromisso de
comparecer ao Templo periodicamen-
te para oferecer sacrifício, pagar taxas
e impostos e apresentar seus filhos e
iniciá-los na fé de Yaweh.
O Templo de Jerusalém, edificado
por Salomão, foi destruído pelos Babi-
lônios, cerca de 600 anos antes de
Cristo. Em duas ocasiões, foi reedifica-
do (por Neemias, em 520-516 a.C., e
por Herodes, entre 19 a.C. e 64 d.C.).
Depois de quatro anos de rebelião ar-
mada, pela qual os hebreus pretendi-
am inutilmente expulsar os funcioná-
rios de César da terra prometida, no
ano 70, o general romano Tito, obede-
cendo às ordens do seu pai, Vespasia-
no, foi enviado à Palestina para resta-
belecer a ordem imperial. Lá chegando,
assaltou Jerusalém e incendiou e arra-
sou o Templo, não sem antes promo-
ver-lhe o saque completo.
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| 47
Atualmente, no lugar do Templo,
em Jerusalém, está construída uma
Mesquita Islâmica (a Mesquita da
Cúpula Dourada). Ainda hoje há fac-
ções judaicas que sonham com a re-
construção o Templo de Salomão.
Sinagogas
Quando, na diáspora, o povo de
Deus se viu disperso por “todo o can-
to”, e longe do Templo. Como fazer
para preservar as tradições religio-
sas? Como transmiti-las às novas ge-
rações? Como celebrar a fé? Onde ler
as Escrituras? Onde reunir-se para
as orações?
Tais necessidades motivaram a
constituição das sinagogas (do gr.
syn+ago = “reunir-se”, “ir para junto”).
Estas eram edificações inspiradas no
Templo, em proporções reduzidas, nas
quais o povo passou a se reunir para
exercitar a espiritualidade e alimentar
L U I Z C A R L O S R A M O S
48|
a fé. A Sinagoga fazia as vezes do
Templo, a exceção dos sacrifícios.
Jesus, como judeu que era, fre-
qüentava assiduamente as sinagogas
(ver Lc 4.16-37). Também os apósto-
los e os primeiros cristãos reuniam-se
nas sinagogas para a leitura e expli-
cação das Escrituras e para a oração
(ver At 17.1-2 e 10).
Casas (cenáculo)
Além das sinagogas, os primeiros
cristãos se reuniam nas casas das pes-
soas do povo que abriam suas portas
para acolher a comunidade cristã.
Esse costume foi certamente inspi-
rado e incentivado pelo próprio Jesus,
que tinha essa prática de freqüentar as
casas de seus amigos e ali constituir
um lugar de oração, comunhão, e ins-
trução (cf. Lc 4.38; 6.29; 10.38ss).
A instituição do sacramento da Ceia
Eucarística se deu na casa de uma
pessoa anônima que, hospitaleiramen-
S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E
| 49
te, cedeu o Cenáculo (um aposento des-
tinado às refeições familiares), para que
Jesus, seus seguidores e seguidoras,
bem como, naturalmente, os integran-
tes da família hospedeira, partilhassem
aquela refeição comunal.
Num primeiro momento, na histó-
ria da Igreja Cristã, a prática normal
era, nos sábados, a comunidade reu-
nir-se na Sinagoga, para a Liturgia da
Palavra e, nos domingos, no Cenácu-
lo, para a Liturgia da Mesa.
Aos poucos, à medida que a identi-
dade entre a religiosidade judaica ofici-
al e o cristianismo nascente foi se dis-
tinguindo e distanciando, houve uma
ruptura entre a Sinagoga e o Cenáculo.
Muitos seguidores de Jesus foram,
literalmente, expulsos, excomunga-
dos, da Sinagoga (ver Jo 9.34-35).
Excluída, a comunidade cristã passou
a concentrar nas Casas/Cenáculo
tanto a Liturgia da Palavra quanto a
da Mesa.
L U I Z C A R L O S R A M O S
50|
Enquanto gozavam de certa liber-
dade, a comunidade cristã se reunia
nas Casas sem maiores problemas.
Muitas casas abrigavam Igrejas (ver,
por exemplo, Rm 16.5; Fm 1-3). Estas
passaram a ser conhecidas como Ca-
sas-igrejas (em gr. oikos-ekklesia; em
latim, domus ecclesie): a comunidade
de fé que se reúne em salas de casas
particulares.
Estima-se que, no final do terceiro
século, havia mais de 40 Casas-
igrejas somente em Roma.
Para os cristãos, não mais o templo
é o lugar da habitação da divindade,
mas a própria comunidade dos fiéis é
entendida como o lugar espiritual on-
de Deus, em Cristo, se faz presente,
onde quer que esta esteja reunida.
Praça pública
Grande parte do ministério de Je-
sus — a partir do seu batismo por João
Batista e depois do seu primeiro mila-
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| 51
gre, em Caná da Galiléia (cf. Jo 1 e 2)
— se deu em espaços públicos: nas
praias, à beira dos lagos (cf. Mt 5 e pa-
ralelos); nas planícies e nas colinas (cf.
Lc 6.17ss e Mt 5); pelas estradas, nos
caminhos e à margem dos caminhos
(cf. Mc 10.17,46; Lc 24.13ss); em jar-
dins e hortos (cf. Lc 22.39 e par.); nas
ruas das cidades (cf. Lc 19); no pátio e
nos espaços comuns do Templo (cf. Lc
19.41-17); etc.
Também os apóstolos, impulsiona-
dos pelo Espírito Santo, ganharam as
ruas para falar das maravilhas de Deus
(cf. At 2); ocuparam os espaços públi-
cos de debate, tais como as praças e o
Areópago (cf. At 17.16ss, especialmente
os vs. 17b e 19); evangelizaram nas
estradas (cf. At 8.26ss); em tombadi-
lhos de navios (cf. At 27); nas margens
de rios (cf. At 16.13-15); etc.
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52|
Prisões
Não tardou para que fossem lan-
çados em prisões aqueles e aquelas
que anunciavam o Evangelho de Je-
sus Cristo com tanta ousadia (ver At
5.18; 12.7). Particularmente em Atos
16.25, encontramos Paulo e Silas
cantando louvores a Deus na prisão.
Em Romanos 16.17, entre outras
passagens bíblicas, Paulo menciona
nominalmente os seus “companheiros
de prisão”. Mesmo preso, Paulo conti-
nuou a sua missão apostólica como
pregador do Evangelho, gerando mui-
tos “filhos na fé”, mesmo “na prisão”,
como podemos constatar por sua Epís-
tola a Filemon (esp. o v. 10).
Também João, prisioneiro na Ilha
de Pátmos, exerceu seu ministério
pastoral, redigindo suas cartas às Igre-
jas da Ásia Menor e registrando suas
visões e textos litúrgicos de louvor e
glorificação ao Senhor Deus Eterno (cf.
Ap 1.4 e 2.1ss).
S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E
| 53
Catacumbas
Quando a perseguição às pessoas
que professavam sua fé em Cristo ga-
nhou proporções mais violentas, atin-
gindo níveis de crueldade inimaginá-
veis, as comunidades cristãs precisa-
ram de lugares mais seguros e discre-
tos onde pudessem reunir-se “secre-
tamente’’ e em relativa segurança.
Assim as Catacumbas passam a ser
a nova “sede” dos cultos. Os cemitérios
eram lugares temidos, porque, segundo
as superstições pagãs, eram lugares
habitados por espíritos imundos (ver Mc
5), lugar de demônios e assombrações.
Mas, por causa da experiência,
primeiro, da ressurreição de Lázaro e,
depois, da ressurreição de Jesus, pa-
ra os cristãos, nem a morte nem os
cemitérios eram temidos.
Desde o martírio de Estevão (cf. At
7.54-60), e de Tiago, irmão de João
(cf. At 12.1-2), a comunidade cristã
adotou o costume de honrar a memó-
L U I Z C A R L O S R A M O S
54|
ria dos seus mártires. Daí nasceu o
costume de reunir-se nos lugares on-
de descansam os restos mortais da-
queles e daquelas que deram sua vida
por sua fé em Cristo. Ali, junto às lá-
pides dos mártires, a salvo dos su-
persticiosos perseguidores, a Igreja se
reuniu inúmeras vezes para a Liturgia
da Palavra e a Liturgia da Mesa (ver
Ap 7.9-17 [esp. v. 14]).
Basílicas e catedrais
Em meados do século IV, devido a
controvertidos episódios políticos e
místicos do Imperador Constantino, o
cristianismo passou, não só a ser to-
lerado, mas a ser, enfaticamente, in-
centivado com o respaldo do Estado.
Esse período recebeu a designação de
Paz Constantiniana.
Os pequenos grupos marginais de
cristãos vão, rapidamente, se tornan-
do grandes assembléias. Isso exigiu
uma reestruturação do espaço cele-
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| 55
brativo. As casas já não davam conta
de abrigar às grandes massas que
afluíam para as cerimônias religiosas.
O próprio Constantino designou,
então, seus arquitetos para a edificação
de novos espaços destinados aos cultos
cristãos. Ora, a experiência desses pro-
fissionais quando, à construção de
amplos edifícios, estava consolidada
pelas chamadas Basílicas. Estas eram,
a princípio, espaços forenses onde se
reunia o Tribunal do Júri da época,
para julgar processos judiciais.
Tais edifícios têm o santuário, ge-
ralmente com abside (nicho ou recin-
to semicircular ou poligonal, de teto
abobadado, geralmente situado nos
fundos ou na extremidade da cons-
trução ou de parte dela) para a cáte-
dra (antes destinada para uso do ma-
gistrado, agora reservado para quem
preside a liturgia), um ambão ou púl-
pito (antiga tribuna), o altar (mesa da
comunhão), e um nártex (vestíbulo
que ficava à entrada da basílica pale-
L U I Z C A R L O S R A M O S
56|
ocristã, destinado aos catecúmenos,
para que pudessem assistir aos ritu-
ais, sem deles participar diretamente,
por ainda não serem batizados [conti-
nuou em uso nas igrejas da Idade
Média e, mesmo após perder seu sen-
tido, nos períodos posteriores, per-
maneceu demarcado pelo espaço en-
tre a portada e o pára-vento]).
Nos séculos subseqüentes, as ba-
sílicas apresentaram formas variadas
(quadrada, redonda, em forma de
cruz latina, de cruz grega ou sim-
plesmente de aula [pátio ou grande
vestíbulo], retangular).
Os estilos variaram, com as cultu-
ras dos respectivos séculos: estilo
românico, gótico, clássico renascen-
tista, barroco, neo-clássico, e con-
temporâneo.
O termo “Catedral” é relativo a “cá-
tedra”, e designa a igreja principal de
uma diocese, onde se encontra o tro-
no episcopal; sé, matriz.
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| 57
A linguagem espacial e a teologia
dos edifícios, mobílias e utensílios
religiosos
No culto, antes mesmo que os ce-
lebrantes pronunciem qualquer pala-
vra, o Evangelho já começa a ser pre-
gado e conceitos teológicos e ideológi-
cos já estão sendo transmitidos pela
linguagem espacial da arquitetura do
edifício, pela disposição e tipos da
mobília, pela estética e função dos
utensílios.
Pode-se identificar, para fins didá-
ticos, três concepções espaciais típi-
cas: O conceito medieval, que valoriza
o altar, pois sua teologia reforça o
aspecto místico e espiritual da parti-
cipação no mistério eucarístico. O
conceito cartesiano, próprio do perío-
do da pós-Reforma do séc. XVI, que
coloca em evidência o púlpito, que
reforça o aspecto intelectual, concei-
tual e didático da fé. E o conceito mi-
diático, comum nos dias atuais, que
L U I Z C A R L O S R A M O S
58|
valoriza o palco, isto é, o aspecto es-
petacular do evento celebrativo, cujo
centro passa a ser a performance dos
celebrantes como comunicadores-
atores e dos instrumentistas e canto-
res.
Deve-se, portanto, ter um espírito
crítico em relação ao trato que se dá
ao espaço celebrativo, pois aquilo que
este comunica pode, eloqüentemente,
estar em flagrante contradição com
aquilo que os/as pregadores/as a-
nunciam dos púlpitos.
As edificações religiosas devem ser
adequadas à celebração das ações
litúrgicas e devem facilitar a partici-
pação ativa dos fiéis.
Cada elemento arquitetônico, ou
da mobília ou utensílio empregado no
culto, tem implicações teológico-
litúrgicas que expressam seu (1) as-
pecto celebrativo, pois o culto é fé e
festa motivada pela Graça (cf. Lc
15.7,10,23 e 32); (2) aspecto educati-
vo, pois há uma teologia inerente às
S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E
| 59
formas dos espaços retangulares,
quadrados, circulares e em leque —
uns mais inclusivos outros menos; (3)
aspecto encarnacional, pois o espaço
explicita o nível de inculturação ou
encarnação do Evangelho pregado em
determinada cultura, como expressão
material da Palavra, à luz da encar-
nação de Deus em Cristo (Jo 1.14); (4)
aspecto espiritual, pois aponta para a
transcendência por meio da transpa-
rência perceptível na concepção desse
espaço: simplicidade nobre, familiari-
dade, beleza, propriedade, qualidade,
autenticidade ou integridade dos ele-
mentos que compõem o ambiente ce-
lebrativo; (5) aspecto estético-poético
do espaço que, intencionalmente, in-
tegra a comunidade de fiéis (corpo-
alma-e-espírito), por meio de cuida-
dosa ambientação e decoração que
possibilitem a inclusão dos sentidos,
sentimentos, emoções e razões.
Isso implica em um cuidado teoló-
gico-litúrgico-estético do lugar ou es-
L U I Z C A R L O S R A M O S
60|
paço onde esse povo se reúne. Por
isso, são considerados imprescindí-
veis, nos templos cristãos, como es-
trutura mínima fundamental, o san-
tuário, a nave e o átrio.
O Santuário é o espaço central
(não fisicamente, mas no sentido de
mais importante) do edifício. Tudo de-
ve estar orientado para o espaço re-
servado para o Memorial Pascal, lugar
da renovação da aliança: o altar, que
representa a mesa do sacrifício (AT), a
mesa eucarística (NT) e as lápides dos
fiéis que deram sua vida por amor a
Cristo, os mártires; para a pia ou fon-
te bastismal, que, juntamente com a
mesa do altar, representam os dois
sacramentos (Ceia e Batismo); para o
ambão ou púlpito, que é o lugar de
onde o Evangelho é pregado e a Pala-
vra de Deus é proclamada; e para a
sédia ou cátedra, que é o lugar onde
se senta o presidente da celebração.
A Nave (do latim navis, que signi-
fica “navio”, pela lembrança do forma-
S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E
| 61
to das vigas que suportam o teto de
alguns templos se parecerem com o
costado de um navio) é o espaço da
assembléia, que são os membros do
corpo místico de Cristo. É o lugar da
atenção, do alerta, da vigilância. É o
lugar dos batizados e, por esta razão,
o batistério (ou pia batismal) pode es-
tar colocado à entrada da nave, indi-
cando que participam da celebração
cristã aquelas pessoas que receberam
o Sacramento do Batismo e se vestiram
das “vestes brancas” para apresentar-
se diante do Trono do Cordeiro.
E o Átrio (do latim atriu[m]) é o
espaço de transição. É o espaço para
a festa do encontro, onde as pessoas
se reúnem antes e depois da celebra-
ção. Ao chegar para o culto, a pessoa
se prepara para entrar no santuário,
fica em silêncio e passa pela porta
que é Cristo (não se pode chegar no
lugar santo a não ser por intermédio
de Cristo — Jo 10.7,9).
L U I Z C A R L O S R A M O S
62|
Os vários objetos que são empre-
gados no culto devem ser cuidadosa-
mente escolhidos e sabiamente em-
pregados, quer sejam objetos simbóli-
cos, tais como o pão e o vinho e os
recipientes que os contêm, a Bíblia, a
cruz; quer sejam objetos festivos, co-
mo são os candelabros, as flores e os
vasos, os estandartes, os ornamentos
e os vitrais; e mesmo os objetos fun-
cionais, entre eles, o suporte para a
Bíblia, as toalhas, os sistemas acústi-
cos, climatizadores, de iluminação, etc.
A Igreja: em espírito e em verdade
Teologicamente, ou espiritualmen-
te falando, à luz dos ensinamentos e
da prática de Jesus (cf. Jo 4.20-23),
deve-se compreender que o “espaço
sagrado”, por excelência, não depende
da forma arquitetônica, nem da topo-
grafia, mas da atitude dos fiéis que
devem adorar o Pai “em espírito e em
verdade”.
S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E
| 63
Essa compreensão — de adorado-
res que adoram em espírito e em ver-
dade —, juntamente com o dito de
Jesus de que “onde estiverem dois ou
três reunidos em meu nome, ali estou
no meio deles” (Mt 18.20), fundamen-
tou a eclesiologia cristã: a “igreja” não
é um edifício, mas o povo reunido em
nome de Jesus, o Cristo.
Os modelos para os edifícios cris-
tãos, portanto, não devem ser os sun-
tuosos “templos” do paganismo mo-
derno, tais como os bancos, shopping
centers, edifícios públicos e casas de
espetáculo. Antes, sua forma deve ser
determinada pela teologia do culto,
isto é, a liturgia. Suas linhas devem
ser sóbrias, austeras e singelas — o
que não implica em comprometer a
estética. Linhas que privilegiem o sen-
timento de comunhão da assembléia
com Deus e de solidariedade para
com o próximo; onde Deus possa ser
adorado em espírito e em verdade (Jo
4.24), com decência e com ordem
L U I Z C A R L O S R A M O S
64|
(1Co 14.40), com o espírito e com o
entendimento (1Co 14.15), onde pos-
samos apresentar os nossos próprios
corpos em sacrifício vivo, santo e agra-
dável a Deus em um culto racional,
alegre, sensível e sincero (cf. Rm 12.1).
O Ministério da Ambientação, ou
da decoração, ou da ornamentação, é,
em primeira instância, um ministério
kerygmático, de anúncio do Evange-
lho e da proclamação da Palavra.
Aquelas pessoas que abraçam esse
ministério devem estar dispostas a
ambientar e decorar com arte (estética
e qualidade), o que pressupõe dom e
talento; devem também ambientar e
decorar com inteligência (praticidade e
significado), o que requer esforço e
estudo; e devem ainda ambientar e
decorar com o coração (afetividade e
espiritualidade), para o que é preciso
sensibilidade e fé.
IV
Quem participa do culto?
(A liturgia do povo de Deus)
e acordo com a tradição bí-
blica, Deus é a personagem
central do culto, pois é ele
quem está assentado no alto e subli-
me trono (cf. Is 6.1); é glorificado por
seres celestiais (cf. Is 6.2); é servido
por ministros ou sacerdotes/liturgos/
celebrantes (cf. 103. 21), é cultuado
pela comunidade de fiéis, a congrega-
ção ou assembléia (cf. Sl 5.8; 22.22-
23, 25-26); até mesmo por todos os
que morreram por causa do seu tes-
temunho, os mártires ou testemu-
nhas, se acham constantemente dian-
D
L U I Z C A R L O S R A M O S
66|
te do trono, glorificando o Altíssimo
(cf. Ap 7.9-15); mesmo os pagãos ou
gentios, de todas as nações, estão
convidados para o culto (cf. Sl 117); e,
mais ainda, de acordo com os salmis-
tas, todo ser que respira deve louvar a
Deus (cf. Sl 150.6); e mesmo os seres
inanimados, tais como os corpos ce-
lestes, de alguma forma, proclamam a
glória de Deus, e anunciam as obras
das suas mãos (cf. Sl 19.1).
Deus é quem toma a iniciativa e
vem ao nosso encontro, no culto,
dando início ao diálogo litúrgico e ce-
lebrativo da fé. Pouco sabemos sobre
a participação dos seres celestiais no
culto, bem como a respeito das tes-
temunhas que se acham constante-
mente diante do trono louvando a
Deus. Por outro lado, podemos nos
aplicar a compreender a nossa parti-
cipação no culto, como comunidade
de fiéis.
A congregação de fiéis é formada
por pessoas de todas as camadas so-
S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E
| 67
ciais, de todas as culturas e de todas
as idades. Isso significa que, do culto,
tomam parte e têm lugar: pessoas das
classes empobrecidas e das classes
abastadas; pessoas cultas ou iletra-
das; e pessoas de todas as idades — a
Igreja talvez seja o único espaço insti-
tucional com tamanha abrangência
inclusiva.
Teoricamente, todos deveriam ter
sua participação no culto garantida,
representada ou contemplada: na es-
trutura da liturgia que se celebra, no
repertório dos cânticos que se ento-
am, no tipo de linguagem que se ado-
ta, etc.
Ou a Igreja é de todos ou não é I-
greja! Igreja só para jovens não é Igre-
ja, é point; igreja só para idosos não é
Igreja, é clube de saudosistas.
Quando se diz que têm lugar no
culto pessoas de todas as idades, es-
tamos dizendo que a liturgia deve ser
concebida e preparada para incluir e
L U I Z C A R L O S R A M O S
68|
contemplar bebês, crianças, adoles-
centes, jovens, adultos e idosos.
Embora isso pareça relativamente
óbvio, ao observarmos o que acontece
na prática de muitas igrejas, essa in-
clusão não acontece.
Conquanto se possa constatar um
evidente conflito de gerações, entre
jovens e idosos, na disputa pela he-
gemonia litúrgica, as maiores vítimas
dessas disputas são as crianças.
De uma maneira ou de outra, jo-
vens, adultos e idosos têm os seus
meios para contestar e protestar. As
crianças, entretanto, não têm voz
nem vez.
Não obstante, dar destaque para a
participação da criança no culto não é
apenas uma questão de fazer uma
concessão e dar-lhes, provisoriamen-
te, vez e voz. A criança trazida para o
centro do culto, como se pretende
demonstrar a seguir, é a própria ra-
zão de ser da liturgia.
S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E
| 69
O lugar da criança no culto cristão
A participação da criança, no cul-
to, merece destaque por uma razão
histórica e bíblica. Como sabemos, o
centro da liturgia cristã é a Páscoa
que é também o centro da liturgia
judaica. Ora, nas instruções dadas
por ocasião da instituição da Páscoa
judaica, a criança desempenha um
papel central, e é ela que dá início às
solenidades.
Vejamos alguns dos relatos bíblicos
da instituição da celebração da Páscoa:
Êxodo 12.24-27: “24 Guardai, pois, is-
to por estatuto para vós outros e para
vossos filhos [grifo nosso], para sempre.
25 E, uma vez dentro na terra que o
SENHOR vos dará, como tem dito, obser-
vai este rito. 26 Quando vossos filhos
[grifo nosso] vos perguntarem: Que rito
é este? 27 Respondereis: É o sacrifício
da Páscoa ao SENHOR, que passou por
cima das casas dos filhos de Israel no
Egito, quando feriu os egípcios e livrou
as nossas casas. Então, o povo se incli-
nou e adorou.”
L U I Z C A R L O S R A M O S
70|
Êxodo 13.14: “Quando teu filho [grifo
nosso] amanhã te perguntar: Que é is-
so? Responder-lhe-ás: O SENHOR com
mão forte nos tirou da casa da servi-
dão.”
Deuteronômio 6.20-21: Quando teu fi-
lho [grifo nosso], no futuro, te pergun-
tar, dizendo: Que significam os teste-
munhos, e estatutos, e juízos que o SE-
NHOR, nosso Deus, vos ordenou? 21 En-
tão, dirás a teu filho [grifo nosso]: Éra-
mos servos de Faraó, no Egito; porém o
SENHOR de lá nos tirou com poderosa
mão.
À luz dessas referências, podemos
nos perguntar pelo lugar que as cri-
anças devem ter nos nossos cultos.
As grandes experiências de fé do
povo de Deus eram celebradas ciclica-
mente, justamente, pensando na trans-
missão dessa espiritualidade para as
novas gerações (ver Lc 2.41-42).
As crianças eram, assim, o ele-
mento disparador de tais liturgias.
Tais cerimoniais eram concebidas
especialmente para responder aos
insistentes por quês? das crianças:
S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E
| 71
“quando vossos filhos vos pergunta-
rem: que rito é este? Responder-lhes-
ás...” (Êx 12.26 e par.).
As crianças eram, portanto, o ponto
de partida e, em grande parte, a razão
de ser da liturgia. É como se o culto
fosse um veículo em cujo motor preci-
sasse ser dada a partida por um siste-
ma eficiente de ignição, para então em-
preender efetivamente sua viagem.
Ao que parece, não faria muito
sentido fazer essas festas sem a pre-
sença das crianças. Sim, é verdade
que os adultos sempre se beneficiam
muito de tais festas, mas para o adul-
to os ritos são sempre repetição, e
tem função de reforço conceitual e
prático, mas para as crianças é des-
coberta e novidade deslumbrante de
um novo universo espiritual.
Assim sendo, se alguém, depois de
Deus, tiver que ser privilegiado no
culto cristão, esse alguém são as cri-
anças.
L U I Z C A R L O S R A M O S
72|
Culto para crianças
ou culto com as crianças?
Qual seria, então, a melhor alter-
nativa em relação à questão criança-
e-culto? As alternativas mais freqüen-
temente empregadas pelas igrejas
protestantes são: (1) Modelo do culto
infantil que consiste em tirar a crian-
ça do culto e fazer um outro (infantili-
zado) à parte para elas; (2) o modelo
híbrido que tolera as crianças no cul-
to parcialmente, mas somente até o
momento da prédica, quando, então,
elas são retiradas do templo para um
lugar onde terão atividades “diferen-
ciadas” (a palavra é mais bonita do
que o resultado, pois amiúde o que se
verifica é que tais atividades se resu-
mem a entretenimento sem projeto
didático-pedagógico, supervisionadas
por pessoas que não têm formação
para a educação infantil); (3) e o mo-
delo deixa como está pra ver como fi-
ca, que simplesmente ignora a pre-
S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E
| 73
sença da criança no culto, cuja litur-
gia prossegue indiferente à presença
das crianças.
O terceiro modelo, do deixa como
está, embora talvez seja o mais recor-
rente, deveria estar fora de cogitação.
Quanto aos outros dois modelos,
por mais bem intencionados que se-
jam tanto o projeto do culto infantil
quanto o projeto híbrido, ambos tam-
bém acabam se tornando antipedagó-
gicos, pois excluem a criança do cul-
to, total ou parcialmente.
Ora, se a criança é retirada do
templo quando pequena, não há como
esperarmos que, quando for adoles-
cente (ou pré-adolescente), ela queira
permanecer no culto. Pois tudo o que
lhe foi ensinado, ainda que não inten-
cionalmente, todas as vezes que foi
retirada do culto, é que ela não é
bem-vinda ali.
As experiências inclusivas são ra-
ras. Isso é em parte compreensível,
mas não justificável. Compreensível,
L U I Z C A R L O S R A M O S
74|
porque exige esforço, preocupação e
dá trabalho. É injustificável, porque
não há nada mais importante no Rei-
no de Deus do que as crianças: afinal,
foi isso que aprendemos (ou devería-
mos ter aprendido) de Jesus em Ma-
teus 18.1-2 e em Lucas 9.47.
Como, afinal, a criança pode ser
incluída plenamente no culto? Disso
trataremos a seguir.
O que as crianças podem
e não podem fazer no culto?
Eis uma boa questão para a Igreja
se perguntar: afinal o que as crianças
podem e o que não podem no culto?
Talvez o leitor ou leitora desta refle-
xão se surpreenda com a resposta
enfática que aqui se dará, afirmando
que não há nada, liturgicamente fa-
lando, que as crianças não possam
fazer no culto cristão – nada que um
adulto não faça.
S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E
| 75
O que acontece, amiúde, nos nos-
sos cultos? Em geral, oramos, canta-
mos, lemos as Escrituras Sagradas,
testemunhamos, proclamamos o E-
vangelho, comungamos, ofertamos,
nos comprometemos assumindo com-
promissos, etc.
Ora, quais desses atos litúrgicos
estão fora das possibilidades das cri-
anças?
As crianças podem aprender a orar
antes mesmo de aprender a andar –
então, por que nunca convidamos
uma criança para fazer uma oração
nos cultos de domingo?
E quanto a cantar, por que tam-
bém não cantamos com elas, uma vez
que elas sempre cantam conosco?
pois todos, mesmo os bebês, adoram
(inclusive no sentido literal do termo)
cantar (afinal, deles nasce o perfeito
louvor, dizem as Escrituras Sagradas
em Mt 21.16). Se elas cantam nosso
repertório, porque nós não cantamos
as suas canções?
L U I Z C A R L O S R A M O S
76|
Ler a Bíblia: desde que alfabetiza-
da, o que acontece cada vez mais ce-
do, uma criança com sete, ou seis,
talvez cinco anos, pode fazer leituras,
da Bíblia ou de outros textos litúrgi-
cos, tal como qualquer adulto – não
seria fantástico se todo culto tivesse a
participação de crianças na direção
de certas leituras?
Quanto aos testemunhos e à pro-
clamação, também aí as crianças po-
dem ser sujeitos.
Elas podem, inclusive, participar
da prédica, encenando passagens bí-
blicas, interpretando ilustrações (pra-
ticamente todo sermão recorre às i-
lustrações para aclarar pontos obscu-
ros ou conceitos abstratos). O mero
fato de o pregador, ou pregadora, ter
em mente que seu público também é
formado por crianças, já pode servir
como estímulo para a busca de uma
linguagem mais expressiva, o uso de
vocabulário mais substantivo, objetivo
e concreto; para o emprego de ima-
S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E
| 77
gens visuais e outros recursos sensí-
veis (ao tato, ao paladar, ao olfato,
por exemplo). Fazendo isso, todos se
beneficiariam, pois quando usamos
linguagem abstrata, somente os adul-
tos (e nem mesmo todos eles) conse-
guem acompanhar, mas a linguagem
objetiva e os substantivos concretos,
todos, crianças e adultos, podem e
gostam de acompanhar.
E, no momento da dedicação, in-
tercessão e envio, as crianças também
podem assumir compromissos como
sujeitos na comunidade de fé e na
construção do Reino de Deus.
Quanto aos bebês, quando presen-
tes ao culto, podem não entender
conceitualmente o que está se pas-
sando, mas afetivamente eles estão
“aprendendo”, desde cedo, que eles
são bem-vindos, que são amados e
que ali é seu lugar: no meio da comu-
nidade de fé.
L U I Z C A R L O S R A M O S
78|
Preparação da liturgia
de um culto inclusivo
Preparar a liturgia de um culto in-
clusivo, para todos, no qual todos são
considerados, representados, e cuja
participação está garantida, não é
assim algo tão difícil ou diferente do
convencional.
Basta que, na hora em que estiver-
mos escolhendo o repertório dos hinos,
das leituras, dos gestos e atos litúrgi-
cos, lembrar de incluir as crianças,
assim como fazemos naturalmente com
os jovens e os adultos. Por exemplo,
prever músicas próprias para as crian-
ças (ora, se elas podem cantar nossos
hinos, porque não podemos cantar os
delas?). E na hora de distribuir as tare-
fas na condução do culto, lembrarmo-
nos de atribuir funções às crianças,
que pode ser desde a direção de ora-
ções e leituras, até a cooperação em
atos como o recolhimento das ofertas, a
distribuição da Ceia, e encenações e
S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E
| 79
performances várias — a depender u-
nicamente da criatividade, da boa von-
tade e do bom senso dos responsáveis
pelo preparo e direção da liturgia dos
cultos ordinários das nossas igrejas.
Portanto...
Para finalizar estas considerações
sobre o culto cristão inclusivo, pode-
mos sintetizar algumas das principais
conclusões a que chegamos, a partir
do exposto acima:
1. Deus é sempre o principal sujeito
do culto Cristão que, mediante o
convite da sua graça, nos reúne
como seu povo num encontro ce-
lebrativo dialógico e interativo.
2. O povo é a congregação de fiéis
que, em resposta ao convite da
graça divina, presta-lhe seu
serviço no culto comunitário.
3. A congregação de fiéis é formada
por todas as pessoas da comu-
nidade: bebês, crianças, adoles-
centes, jovens, adultos e idosos.
L U I Z C A R L O S R A M O S
80|
4. As pessoas responsáveis pela
preparação e pela direção da li-
turgia devem levar em conta a
totalidade do povo de Deus, o
que implica em envolver, con-
templar, incluir a todos nos vá-
rios atos litúrgicos.
5. Dentre todos os fiéis, são as
crianças as que merecem maior
cuidado e atenção, pois, à luz
da tradição bíblica, são elas
que deflagram o culto com suas
perguntas fundamentais, às
quais a comunidade celebrante
oferece sua resposta de fé, no
exercício de uma espiritualida-
de que é, assim, transmitida de
geração em geração.
6. Não há nada que um adulto fa-
ça no culto que não possa ser
feito pelas crianças. Portanto,
elas não devem ser meras es-
pectadoras do culto, mas sujei-
tos ativos da dinâmica litúrgica.
Colocar isso em prática... Eis aí
um belo desafio!
V
Quando fazer culto?
(A liturgia do tempo)
LITURGIA SE DÁ NO TEMPO e
no espaço. O tempo da litur-
gia é a História da Salvação
contada ciclicamente durante o Ano
Cristão, que tem a Páscoa como centro
irradiador da mensagem salvífica.
Ao contar a história de Jesus (a
expectativa de sua vinda, sua vida e
ensinamentos, sua paixão, morte e
ressurreição) e sua presença espiritu-
al na Igreja, a comunidade de fé re-
lembra, atualiza e celebra a sua pró-
pria salvação.
A
L U I Z C A R L O S R A M O S
82|
A liturgia é, a um só tempo, memó-
ria, atualização e esperança salvífica.
A celebração da História da Salvação
Para celebrar a sua salvação em
Cristo, a Igreja, observa o Calendário
Cristão ou Calendário Litúrgico, que
se estrutura em dois ciclos festivos e
dois tempos ordinários: o Ciclo do Na-
tal, formado pelo Advento, Natal e E-
pifania, que é seguido por um primei-
ro Tempo Comum (após Epifania); e o
Ciclo da Páscoa, que compreende a
Quaresma (que dura 40 dias), a Se-
mana Santa, o Tempo Pascal (que
dura 50 dias), e Pentecostes, seguido
de um segundo Tempo Comum (após
Pentecostes).
Essa história é constantemente
atualizada em ocasiões que se revesti-
ram de especial sentido, à luz do E-
vangelho: o Domingo (dia da Ressur-
reição), a Quarta (acordo de Judas
para a traição), Quinta (lava-pés e
S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E
| 83
instituição da Ceia) e Sexta-feiras
(julgamento, crucificação, morte e
sepultamento de Jesus), e o Sábado
(Jesus no sepulcro); bem como as Ho-
ras de Oração — Matinas-Laudes
(nascer do sol/ressurreição), Tércias
(julgamento), Média (crucificação),
Noas (morte), Vésperas (sepultamen-
to), Completas e as Vigílias Noturnas
(Getsêmani).
No próprio culto, a igreja revive a
História da Salvação: num primeiro
momento adora o Pai (primeira pes-
soa da Trindade), recordando o Cria-
dor que é Santo e perfeito; diante da
santidade do Pai, a congregação reco-
nhece suas imperfeições e pecados,
por isso recorre ao Filho, segunda
pessoa da Trindade, que é o “Cordeiro
de Deus que tira o pecado do mundo”;
agraciada com o perdão, a congrega-
ção pode agora ser instruída na sua
fé, porque o Filho também, é o “Verbo
que se fez carne e habitou entre nós
cheio de graça e de verdade”; essa
L U I Z C A R L O S R A M O S
84|
instrução, entretanto, para que se
efetive na vida da comunidade, deve
ser inspirada e iluminada pela ação
do Espírito Santo, a terceira pessoa
da Trindade, que é também quem mo-
tiva e envia a Igreja em sua missão,
que é a de reconciliar a humanidade
com Deus, o Pai, retomando, assim, o
ciclo teológico-litúrgico.
A História da Salvação é, assim,
celebrada no tempo cósmico, no ano
litúrgico, nas horas do dia e naquela
“hora única” que é o culto.
Também a História da Humanida-
de é celebrada na liturgia da comuni-
dade de fé: datas cívicas, nacionais e
internacionais, são motivo de referên-
cia e intercessão no culto.
E, finalmente, a História das Pes-
soas (nascimento, puberdade, casa-
mento, procriação, envelhecimento e
morte) também são motivos que ins-
piram a prática celebrativa, porque
relacionam a nossa própria história
de vida, e nos incluem, na grande his-
S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E
| 85
tória da salvação, mediante a graça
de Deus.
O Calendário Litúrgico
Todo o Calendário Litúrgico se de-
senvolve a partir da Páscoa. Esta é
comemorada no primeiro domingo
depois da primeira lua cheia do outo-
no, no nosso hemisfério (na primave-
ra, no Norte). Tradicionalmente era a
ocasião em que os catecúmenos eram
batizados e recebidos como membros
da comunidade cristã — geralmente
depois de ter passado três anos se
preparando para isso.
Desde muito cedo, na História da
Igreja, adotou-se o costume de obser-
var um tempo de jejum e oração, pri-
meiramente no dia anterior ao Do-
mingo da Páscoa, depois, durante to-
da a Semana Santa. Finalmente, esse
período se ampliou para quarenta,
inspirados na narrativa da tentação
de Jesus durante quarenta dias e
L U I Z C A R L O S R A M O S
86|
quarenta noites no deserto, bem como
nas demais associações com o núme-
ro quatro, quarenta e quatrocentos,
na Bíblia: quarenta dias do dilúvio,
quatrocentos anos de escravidão no
Egito, quarenta anos de peregrinação
pelo deserto, anúncio de que em qua-
renta dias Nínive seria subvertida, e
sua súbita conversão, etc.
A Festa do Natal é mais tardia, e
se estabelece depois do século IV (e o
Advento, depois do VI). Trata-se da
cristianização da festa pagã que cele-
brava o “começo do fim” do inverno,
isto é, o solstício de inverno, no he-
misfério Norte. Para os cristãos, Je-
sus é o Sol da Justiça que nasceu em
Belém; ele é o Sol que é maior que o
astro adorado pelos pagãos, este sol
não existiria, não fosse aquEle.
Da mesma forma que a Páscoa, a
comemoração do nascimento de Je-
sus, no Natal, carecia de preparação.
Novamente o número quatro é evoca-
do. Desta vez, reserva-se quatro se-
S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E
| 87
manas (domingos), para que as comu-
nidades cristãs se preparem para o
grande evento da encarnação do Ver-
bo. Nesse período, a igreja recorda as
promessas feitas aos pais na fé a res-
peito da vinda do Messias, o Salvador.
Ciclo do Natal
O Ciclo do Natal corresponde a qua-
tro tempos litúrgicos do calendário cris-
tão, a saber, Advento, Natal, Epifania e
Batismo do Senhor. Este ciclo tem início
quatro domingos antes do Natal e se
estende até o Batismo do Senhor.
O Advento é o tempo que marca o
início do calendário litúrgico cristão.
Sua origem é documentada a partir
do século IV a.C. Semelhante à pre-
paração da Páscoa, expiação de Cris-
to, o Advento surge como preparação
para o nascimento de Jesus, o Natal.
Advento, do latim adventus, significa
“vinda”, “espera”.
Trata-se de uma celebração onde o
foco é a expectativa da vinda do Messias,
L U I Z C A R L O S R A M O S
88|
o Cristo prometido. Nesse período cele-
bra-se a espera do Messias, e pode ser
dividido em duas partes: os dois primei-
ros domingos enfatizam o Advento Esca-
tológico, o terceiro e o quarto domingos a
Preparação do Natal de Cristo.
Destarte, o Advento tem a dimen-
são da expectativa da segunda vinda
de Cristo, bem como, a expectativa da
chegada do Messias que concretiza o
Reino, o “já” e o “ainda não” – que
significa viver a espera do cumpri-
mento das promessas e renovar a es-
perança no Reino que virá.
A espiritualidade do Advento é mar-
cada pela esperança e o aguardo do
Messias prometido; a fé na concretiza-
ção da promessa; o amor que se de-
monstra com a chegada do Messias e a
paz por ele anunciada e plenificada.
O segundo tempo litúrgico desse
ciclo é o Natal. Esta celebração teve
sua origem nos meados do século IV
d.C., entretanto sua aceitação como
festa cristã ocorreu no século VI d.C.
O Natal surgiu com a finalidade de
afastar os fiéis da festa pagã do natale
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| 89
solis invictus (“deus sol invencível”), e
passou a significar a chegada do Mes-
sias, o “sol da justiça” (cf. Ml 4.2) já
anunciado e aguardado no Advento.
Natal, na acepção da palavra, sig-
nifica “nascimento”, entretanto para
as/os cristãs/aos a partir do século
IV d.C., este significado é ainda mais
profundo, pois com o nascimento de
Cristo celebra-se “o Verbo que se fez
carne e habitou entre nós”, o Deus
infinitamente rico se faz servo e habi-
ta entre os despossuídos da terra. É
este Verbo que atrai para si toda a
criação a fim de reintegrá-la ao proje-
to salvífico de Deus.
A espiritualidade desse período
enfatiza a humanidade de Cristo e a
salvação que nele é absoluta.
O terceiro tempo desse ciclo é a
Epifania, que surgiu no Oriente como
festa da manifestação do Cristo en-
carnado. Somente, a partir do século
IV d.C., passou para o Ocidente a fim
de rememorar a visita dos reis magos
ao Messias que havia chegado.
L U I Z C A R L O S R A M O S
90|
Epifania, do grego ephifaneia, sig-
nifica “manifestação”, “aparição”. An-
tes de tornar-se um termo apropriado
pelo cristianismo, significava a che-
gada de um rei ou imperador. A partir
de Cristo, tem a conotação de “mani-
festação do divino ao mundo”, que no
Primeiro Testamento era expressa
pelo termo “teofania”.
Esse tempo celebra a manifestação
de Cristo aos seres humanos, no mo-
mento em que os reis do Oriente segui-
ram a estrela em busca daquele que
viria a ser o Salvador por excelência.
A Epifania é para o Natal o que o
Pentecostes é para a Páscoa, isto é,
desenvolvimento e permanência do ato
de Cristo em favor da humanidade.
A espiritualidade deste período é
caracterizada pela manifestação e apa-
rição de Cristo ao mundo. É o Cristo
prometido que se torna uma realidade
na vida de mulheres e homens que
procuram a paz, a justiça e o amor.
O Batismo do Senhor é celebrado
no primeiro domingo após a Epifania, e
representa o início da missão de Jesus
S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E
| 91
no mundo. Este tempo é parte da ma-
nifestação de Jesus aos seres huma-
nos, por isso trata-se de uma continui-
dade da Epifania. Diferenciando-se
pelo fato de que na Epifania é a huma-
nidade (representada pelos magos) que
vai a Cristo, ao passo que com o Ba-
tismo do Senhor é Deus (por meio de
Jesus Cristo) que vem até o ser huma-
no, a fim de cumprir sua missão.
Por isso, a espiritualidade desse
dia é marcada pela missão iniciada
por Jesus em prol dos menos favore-
cidos e injustiçados.
Com o Batismo do Senhor termina
o Ciclo do Natal, dando início ao Tem-
po Comum, ou Tempo após Epifania.
O Tempo Comum
(após Epifania e após Pentecostes)
Além dos dois ciclos festivos, o
“Ano do Senhor”, também contempla
33 ou 34 semanas, situadas entre o
Natal e a Páscoa. Esse período rece-
beu a designação Tempo Comum
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92|
por contrapor-se à época festiva do
Ano Cristão.
O fato de haver um Tempo Comum
ressalta o significado de que Deus
não é Senhor somente das coisas ex-
traordinárias, mas também o é do
cotidiano. Enfatiza a presença cons-
tante e amorosa do Pai na caminhada
do povo rumo à plenitude do Reino. A
cada celebração, antecipamos a eter-
na liturgia do céu, para o qual nos
preparamos, dia-a-dia, tanto no tem-
po festivo como no tempo comum.
Ao longo da história, várias inicia-
tivas foram tomadas no sentido de
oferecer alternativas à liturgia do
tempo não festivo. Para exemplificar
com algumas mais recentes e próxi-
mas, citamos a formalização, na dé-
cada de 30 nos EUA, de uma propos-
ta que sugeria a criação de um novo
período, o Kingdomtide (Ciclo ou
Tempo do Reino). Essa proposta tem
de positivo o fato de enfatizar menos o
aspecto eclesiástico-institucional e
mais o teológico-missionário do perí-
odo. Entretanto, a postura mais am-
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| 93
plamente adotada pelos protestantes
do mundo todo, foi a de designar as
duas partes do Tempo Comum como
sendo “Tempo após Epifania” e “Tem-
po após Pentecostes”, respectivamen-
te. Na Igreja Metodista no Brasil, o
rev. Messias Valverde propôs uma
organização do Ano Cristão dividido
em Estações Litúrgicas, das quais
destacamos a Estação da Criação,
com uma preocupação ecológica e
escatológica.
A primeira parte do Tempo Co-
mum tem início na segunda-feira a-
pós a comemoração do Batismo do
Senhor e vai até a véspera da Quarta-
Feira de Cinzas, quando começa a
Quaresma (Ciclo da Páscoa).
Sua espiritualidade enfatiza o a-
núncio do Reino de Deus e visa à es-
perança e à pregação da Palavra.
A segunda parte do Tempo Co-
mum começa na segunda-feira após
Pentecostes e dura até a véspera do
Primeiro Domingo do Advento, quan-
do tem início o Ciclo do Natal.
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94|
Sua espiritualidade comemora o
próprio ministério de Cristo em sua
plenitude, principalmente aos domin-
gos e enfatiza a vivência do Reino de
Deus e a compreensão de que os/as
cristãos/ãs, são o sinal desse Reino.
Se na primeira parte do Tempo Co-
mum a ênfase é no anúncio, na se-
gunda é a concretização do Reino de
Deus.
Ciclo Pascal
O Ciclo Pascal — que compreen-
de a Quaresma, a Semana Santa, o
Tempo Pascal, e encerra-se com o
Pentecostes — formou-se a partir de
um processo de reflexão e sistemati-
zação do cristianismo que vai do pri-
meiro ao quarto século da era Cristã.
A partir deste ciclo se constituiu todo
o calendário litúrgico.
Nas comunidades primitivas, era
comum a reunião no primeiro dia de
cada semana na qual celebrava-se a
memória de Jesus. A origem do culto
cristão está em torno dessa “Páscoa
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| 95
Semanal”, que ocorria no chamado
“Dia do Senhor”.
Em boa parte por influência do
judaísmo cristão, desenvolveu-se
uma celebração anual da Páscoa co-
mo um “grande dia do Senhor”, cuja
festa se prolongava por cinqüenta
dias, sendo o último, o dia de chega-
da do Espírito, o Pentecostes Cristão,
isso já no século II.
No século IV, desenvolveu-se a
tradição de reviver e refletir de um
modo mais sistematizado, os momen-
tos da paixão, isso deu origem às
celebrações da Semana Santa. Desde
o século III as vésperas da Páscoa já
eram dias de reflexão. Os catecúme-
nos que por dois anos vinham sendo
preparados, agora eram acompanha-
dos por toda a comunidade. Inspi-
rando-se nos quarenta dias de pre-
paro de Jesus para seu ministério,
nasceu o período da quaresma. As-
sim, em torno da celebração da mor-
te e ressurreição de Jesus, desenvol-
veu-se todo o Ciclo Pascal do Calen-
dário Litúrgico Cristão, marcado pela
L U I Z C A R L O S R A M O S
96|
penitência e confissão, mas também
pela alegria e exultação do crucifica-
do e ressuscitado.
A Quaresma é o período no qual
se enfatiza a importância da contri-
ção, do preparo e da conversão. Ini-
cia-se no quadragésimo dia antes da
Páscoa (não se contam os domingos).
O início na Quarta-feira de Cinzas
retoma à tradição bíblica do arrepen-
dimento com cinzas e vestes de saco
(Jn 3.5-6). É um momento oportuno
para refletir sobre a confissão e o
valor do perdão de Deus.
Sua espiritualidade enfatiza mo-
mentos de preparo na história bíblica
geral e da vida de Jesus:
Quarenta dias de Jesus no de-
serto (Mt 4.2; Lc 4.1ss);
Quarenta dias de Moisés no
Sinai (Êx 34.28);
Quarenta anos do povo no de-
serto (Êx 16.35);
Elias em direção ao Horeb (1Rs
19.8).
A Semana Santa tem início no
Domingo de Ramos, celebração de
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| 97
Cristo como o Messias, salvador dos
pobres, o rei dos humildes. Reflete-se,
nessa semana, passo a passo, os úl-
timos momentos da vida de Jesus.
Este é o momento da vigília de
preparo para a ressurreição.
Sua espiritualidade chama-nos a
atenção para os momentos finais de
Jesus até o ápice de sua paixão:
A Santa Ceia (Mt 26.17-30);
O Lava-pés (Jo 13.1-17);
Jesus no Getsêmani (Mt 26.36-
46; Mc 14.26-31);
O julgamento, sepultamento e
a crucificação (Mt 27; Mc 15;
Lc 23; Jo 19).
A Páscoa¸ propriamente, é a festa
da ressurreição e da libertação. Um
novo Êxodo ocorre, e a humanidade
passa do cativeiro da morte para a
vida.
Sua solenidade pode iniciar-se já
na Quinta-Feira Santa (instituição da
ceia), que dá início ao chamado Trí-
duo Pascal. Contudo a celebração da
ressurreição começa com uma vigília
na noite de sábado encontrando sua
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98|
plenitude no romper da aurora do
Domingo da Páscoa, quando Cristo é
lembrado como o sol da justiça que
traz a luz da nova vida, na ressurrei-
ção.
A espiritualidade norteadora da
Páscoa aponta para a ressurreição
nos mais variados relatos das comu-
nidades do século I d.C.:
A ressurreição (Mt 28.1-20; Mc
16.1-8; Lc 24.1-12; Jo 20.1-18;
At 1.14);
Cânticos Pascais (Sl 113 ao 118
e Êx 12).
Entre os hebreus, era comum a
celebração da chamada “festa das
semanas” ou Pentecostes, isso por-
que ela se dava sete semanas, ou cin-
qüenta dias, após a Páscoa. Nela, o
povo dava graças ao Senhor pela co-
lheita. Mais tarde, adquiriu mais uma
dimensão celebrativa, a da proclama-
ção da lei (instrução) no Sinai, cin-
qüenta dias após a libertação do Egi-
to.
Na era cristã, o Pentecostes tor-
nou-se o último dia do ciclo pascal,
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| 99
quando celebra-se a chegada do Espí-
rito Santo como aquele que atualiza a
presença do ressuscitado entre nós,
dando força para que as comunidades
sejam testemunhas de Jesus na his-
tória.
A espiritualidade que nos orienta
nesse período fala da presença conso-
ladora do Espírito que semeia nos
corações a esperança do Reino de
Deus e nos impulsiona para a missão:
Festa das semanas (Êx 34.22;
Lv 23.15);
Jesus promete o Consolador
(Jo 16.7);
Jesus ressuscitado sopra seu
Espírito (Jo 20.22);
A chegada do Espírito Santo no
dia de Pentecostes (At 2).
Esquema do Ano Litúrgico
Ciclo do Natal
Advento (quatro domingos que
antecedem o Natal)
Natal (véspera, dia de Natal e
semana que se segue)
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100|
Epifania (6 de janeiro ou o do-
mingo mais próximo)
Tempo Comum após Epifania
Domingos seguintes até o que
antecede a Quarta-Feira de Cinzas
Ciclo da Páscoa
Quaresma (tem início com a
Quarta-Feira de Cinzas)
Semana Santa: o Domingo de
Ramos ou Domingo da Paixão
(dá início à Semana Santa) que
se completa com o Tríduo Pas-
cal (as solenidades da Institui-
ção da Ceia, a Crucificação e a
Ressurreição de Cristo)
Domingo da Páscoa, que encerra
a Semana Santa (é a festa mais
importante do Ano Litúrgico)
Domingos de Páscoa (até o do-
mingo de Pentecostes)
Pentecostes (encerra o período
da Páscoa)
Tempo Comum após Pentecostes
Domingo da Santíssima Trindade
Domingos seguintes até o...
... Domingo do Cristo Rei (últi-
mo domingo do Ano Litúrgico:
S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E
| 101
no domingo seguinte recomeça-
se o ciclo do Natal com o Pri-
meiro Domingo de Avento).
103|
VI
Como fazer culto?
(A liturgia da liberdade
e da criatividade)
PARTIR DO NOSSO ESTUDO,
constatamos que um culto
cristão tem uma tríplice
estrutura, caracterizada pela ação
efetiva das três pessoas da Trindade,
o Pai, o Filho, e o Espírito Santo. As-
sim, pode-se dizer que o culto cristão
possui partes essenciais que se au-
sentes o descaracterizariam.
Assim, a estrutura básica da litur-
gia cristã é trinitária e pressupõe um
primeiro momento teológico, no qual
Deus é adorado, um segundo momen-
A
L U I Z C A R L O S R A M O S
104|
to Cristológico, no qual a memória de
Cristo é celebrada e proclamada; e
um terceiro momento, Pneumatológi-
co, no qual, pela ação do Espírito, a
comunidade se compromete com o
serviço a Deus e ao próximo.
Essa liturgia é construída a partir
da ação criativa da comunidade de fé
e compõe-se de atos, ritos.
Objetividade e subjetividade
litúrgicas
Nesse sentido, a liturgia se constitui
de ritos, atos, ofícios e sacramentos
comunitários que se expressam pelas
vias racionais próprias das palavras
(escritas, lidas, proclamadas, cantadas)
e pelas vias sensoriais próprias dos
gestos (levantar os olhos, fechar os o-
lhos, ouvir a palavra, aspirar o incenso,
curvar a cabeça, beijar, comer o pão,
beber o vinho, impor as mãos, estender
as mãos, aplaudir, bater no peito, a-
S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E
| 105
braçar, ficar em pé, sentar-se, ajoelhar-
se, processionais e recessionais...).
A emoção na comunicação litúrgica
Além das dimensões racionais e
sensoriais da comunicação verbal e
não-verbal, a liturgia também comu-
nica pelas vias subjetivas das emo-
ções. A maneira como os ritos, atos,
ofícios e sacramentos afetam nossos
sentimentos dependem de um sem
número de questões que subjazem à
nossa consciência. As emoções podem
ser evocadas a partir de fora, mas
somente podem ser experimentadas a
partir de dentro. O riso ou choro, a
ira ou a ternura, a indignação ou a
compaixão, são estados que, literal-
mente, jorram do subconsciente. São
manifestações que, antes de desper-
tar, jazem adormecidas ou, para usar
a linguagem psicanalítica, estão re-
primidas e contidas no obscuro mun-
do da alma humana.
L U I Z C A R L O S R A M O S
106|
Quando somos tocados desde fora
por uma palavra ou um gesto, por um
som ou uma imagem, pode acontecer
de vacilarem as forças repressoras
que mantinham trancadas as com-
portas do subconsciente. Abrem-se
essas comportas e emergem, então,
as emoções, juntamente com memó-
rias significativas (de experiências da
infância, de lembranças dos pais, dos
filhos...), que compõem o repertório
existencial e que, por uma razão ou
outra, foi associado ao instante cele-
brativo. Não raro, essas liberações
emocionais resultam em êxtases que
se revelam tão intensos que chegam a
embotar a razão, dando vazão a ações
não conscientes e não racionais.
A razão na comunicação litúrgica
Ora, o princípio da primazia da
emoção sobre a razão é o grande
trunfo dos meios de comunicação de
massa. Os estudiosos da comunica-
S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E
| 107
ção rapidamente concluíram que as
pessoas não são persuadidas por ar-
gumentos racionais, mas seduzidas
por experiências emocionais. A mídia
descobriu a eficiência do entreteni-
mento e do espetáculo como mediado-
ras da “conversão” que transforma o
auditório em massa.
Entretenimento, como sugere a eti-
mologia da palavra, se refere a um
processo que procura ter o indivíduo
“entre” alguma coisa. O entretenimen-
to funciona como um parêntesis, no
qual o indivíduo se isola, ainda que
por alguns instantes, do mundo real.
É aqui, no processo de separação do
real, que entra o espetáculo, cuja
etimologia remonta ao latim specu-
lum, espelho. O espetáculo é, portan-
to, uma imagem do real. As imagens,
por mais parecidas que sejam, não
podem ser confundidas com a reali-
dade, pois toda imagem refletida no
espelho se apresenta como o “inverso”
do real ou como sua reprodução in-
L U I Z C A R L O S R A M O S
108|
vertida. A vida real, quando espetacu-
larizada, se nos dá como não-vida.
Quando, como espectadores, nos di-
vertimos com o espetáculo, abrimos
um parênteses em nossa vida e sus-
pendemos por um tempo a nossa e-
xistência, para nos dedicarmos à con-
templação da simulação do real.
Como ação terapêutica, essa práti-
ca pode até ser de grande benefício
para a nossa saúde emocional, entre-
tanto, quando isso se dá como meca-
nismo de fuga sistemática da realida-
de, o que se verifica é um desperdício
considerável da vida real. Como o
medo e a amnésia, a fuga também se
constitui em importante dispositivo
de sobrevivência. Não obstante, o me-
do, a amnésia e a fuga não devem
substituir a própria vida, por mais
dura que esta seja, sob pena de ter-
minar por aniquilar a própria existên-
cia. O entretenimento pode causar
dependência, mas não responsabili-
S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E
| 109
dade; alivia as tensões, mas não re-
sulta em compromissos.
Emoção, sensação e razão e a saú-
de litúrgica
A liturgia é essencialmente comu-
nicação por abranger todo o espectro
comunicacional humano. E a comu-
nicação litúrgica será tanto mais in-
tensa quanto maior for a abrangência
da sua ação, subjetiva/objetiva, ver-
bal/não-verbal, consciente/incons-
ciente... Um grande desafio para a
liturgia é, portanto, dosar adequada-
mente emoção, sensação e razão.
Concluímos que a saúde litúrgica de
uma comunidade de fé depende da
sensibilização equilibrada e inteligen-
te das dimensões sensorial, emocional
e racional da comunicação humana
no contexto celebrativo. Mas isso não
se poderá obter pelo espetáculo nem
pelo entretenimento, mas somente no
serviço comunitário celebrado pelo
L U I Z C A R L O S R A M O S
110|
povo para Deus e para toda a comu-
nidade humana.
Outras formas de
comunicação-não-verbal na liturgia
Temos “lugares” comuns com to-
das as pessoas, de todas as idades,
de qualquer nacionalidade e de qual-
quer substrato social.
O primeiro desses “lugares” é a
natura (natureza), em cujo ventre
todos fomos gerados, em cujos seios
saciamos a fome.
O segundo é o corpo — a corporei-
dade é um tema que nos diz respeito
a todos, religiosos ou não, homens e
mulheres, adultos e crianças.
Finalmente, a cultura, o “univer-
so”, a oikoumene, na qual habitamos.
Conquanto diversa e extremamente
complexa — seja nas imensas distân-
cias geográficas dos cinco continen-
tes, quer seja no microcosmo da nos-
S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E
| 111
sa casa — a cultura nos forja, ora nos
formando, ora nos deformando.
A natureza e o culto
Os antigos filósofos diziam que a
tudo o que existe no mundo é deriva-
do de quatro substâncias elementa-
res: a terra, a água, o fogo e, o ar.
Na Bíblia, encontramos inúmeras
referências a esses elementos relacio-
nados à espiritualidade do povo de
Deus.
No princípio, criou Deus os céus e
a terra. Deus fez o ser humano a par-
tir do pó da terra e o designou para
cultivar e cuidar da terra (“tu és pó e
ao pó tornarás”) ouviu o grito do san-
gue de Abel clamando da terra; não
suportando a maldade do coração
humano, enviou o dilúvio para des-
truir e purificar a terra; chamou A-
braão e lhe disse: “sai da tua terra e
vai pra terra que te mostrarei”; desa-
fiou Moisés a libertar o povo e Israel
L U I Z C A R L O S R A M O S
112|
da opressão no Egito e conduzi-lo à
terra prometida; com Josué conquis-
taram e habitaram a terra que mana
leite e mel; em Jesus Cristo, Deus
desceu do céu à terra e habitou entre
nós, cheio de graça e de verdade; pela
boca dos apóstolos, o Evangelho foi
anunciado por toda a terra; João, no
Apocalipse, nos fala assim da nova
Jerusalém: “vi novo céu e nova ter-
ra...”.
A terra é a nossa casa, é o nosso
berço e o nosso destino. A nova terra
é a promessa da vida abundante, da
redenção plena. Na Bíblia, a palavra
terra aparece quase três mil vezes
(2729).
No culto, podemos fazer alusão, ou
mesmo utilizarmos de maneira con-
creta o elemento terra nos momentos
de batismo, de lançamento de pedra
fundamental de edifício religioso, de
renovação do pacto, de ofício fúnebre,
etc., etc.
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| 113
Não menos importante é a água:
no Gênesis, o Espírito de Deus paira-
va sobre a face das águas; no dilúvio,
as águas cobriram e purificaram a
terra de sua maldade; na libertação
do Egito, Moisés tocou a água com
seu bordão e o mar se abriu para que
o povo passasse; na chegada à terra
prometida, tiveram que transpor o rio
Jordão; o mesmo rio em cujas águas
João batizou multidões e o próprio
Jesus; Jesus andou sobre as águas e
acalmou a tempestade e os vagalhões;
com água, o eunuco, foi batizado por
Filipe e Pedro batizou mais de três mil
almas de uma só vez; Paulo sobrevi-
veu a naufrágios e, como Jonas, foi
devolvido à praia para pregar o Evan-
gelho; na Cidade Santa, descrita no
Apocalipse, há o rio da vida, brilhante
como cristal, que corre do trono de
Deus e do Cordeiro, em cujas mar-
gens está a árvore da vida, que pro-
duz frutos para a cura dos povos e o
último verso do Apocalipse diz: “O
L U I Z C A R L O S R A M O S
114|
Espírito e a noiva dizem: Vem! Aquele
que ouve, diga: Vem! Aquele que tem
sede venha, e quem quiser receba de
graça a água da vida”.
Na Bíblia, a palavra água ocorre
659 vezes, sem contar rio, torrente,
chuva, manancial, fonte, etc.
Na liturgia, a água é simbolica-
mente significativa no batismo, na
celebração do ágape, na cerimônia do
lava-pés, nos cultos de renovação do
pacto e de purificação, etc., etc.
O fogo é também a luz. O primeiro
ato criador de Deus foi “haja luz!”;
Deus fez chover enxofre e fogo sobre
Sodoma e Gomorra; Abraão caminha-
va rumo ao lugar onde deveria sacrifi-
car o próprio filho com o cutelo numa
mão e o fogo na outra; Moisés, viu o
fogo em uma sarça que ardia, mas
não se consumia; uma das pragas
lançadas sobre o Egito, no processo
de libertação, foi a chuva de pedras e
fogo; quando o povo peregrinou du-
rante quarenta anos pelo deserto, o
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| 115
Senhor ia adiante deles de dia com
uma coluna de nuvem e de noite com
uma coluna de fogo para os iluminar
e indicar o caminho; no templo, um
castiçal com sete braços ficara junto
à Torah, para iluminar-lhe a leitura
(“lâmpada para os meus pés é a tua
Palavra, e luz para os meus cami-
nhos”, cantam os salmistas); Isaías
foi purificado do seu pecado, no culto
do Templo, por uma brasa que um
serafim tirara do altar com uma te-
naz; Daniel foi preservado do fogo,
quando atirado numa fornalha para
ser castigado por sua fidelidade a Ya-
weh; João Batista não era a luz, mas
veio para que testificasse da luz; Je-
sus disse: “eu sou a luz do mundo” e,
ainda, “vós sois a luz do mundo”; no
Pentecostes cristão, o Espírito Santo
desceu sobre os discípulos e discípu-
las na forma de línguas de fogo; o au-
tor de Hebreus diz que “o nosso Deus
é fogo consumidor”; inúmeras são as
alusões ao fogo, no Apocalipse, dentre
L U I Z C A R L O S R A M O S
116|
elas, a de que “a morte e o inferno
foram lançados para dentro do lago
de fogo” e “a cidade não precisa nem
do sol, nem da lua, para lhe darem
claridade, pois a glória de Deus a ilu-
minou, e o Cordeiro é a sua lâmpada.”
A palavra fogo aparece mais de
360 vezes na Bíblia; luz, mais de 320;
isso para não detalhar sobre a pala-
vra lâmpada, sol, glória, e os verbos
iluminar, resplandecer, glorificar, to-
dos esses, termos relacionados com
fogo/luz.
No culto, as luzes que se acendem
(castiçais) é um importante símbolo
da glória de Deus, da presença do
Espírito, da orientação da Palavra de
Deus, etc., etc.
O ar: no princípio, a terra era sem
forma e vazia e o Espírito (ar, sopro,
vento) de Deus pairava sobre a face
das águas; tendo criado o homem do
pó do terra, Deus soprou em suas
narinas o fôlego da vida; no Dilúvio,
quando Deus lembrou-se de Noé, na
S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E
| 117
arca, “fez soprar um vento sobre a
terra, e baixaram as águas”; na fuga
do Egito, um vento vindo do Oriente
soprou e abriu o Mar de Juncos para
que o povo alcançasse a liberdade;
Elias teve um encontro especial com
Deus após presenciar vendavais, ter-
remotos e saraiva, quando Deus se
apresentou a ele numa brisa tranqüi-
lo e suave; na visão dos ossos secos,
Ezequiel profetizou: “vem dos quatro
ventos, ó espírito, e assopra sobre es-
tes mortos, para que vivam”; no Culto
do templo, não deveria nunca faltar o
incenso, que simboliza as orações dos
fiéis, feito com finíssimas especiarias
aromáticas; certa vez, Jesus, no bar-
co, “repreendeu o vento e disse ao
mar: Acalma-te, emudece! O vento se
aquietou, e fez-se grande bonança”;
ressuscitado, Jesus veio ao encontro
dos seus seguidores, soprou sobre
eles e disse: “recebei o espírito”; no
dia do primeiro Pentecostes Cristão,
“veio do céu um som, como de um
L U I Z C A R L O S R A M O S
118|
vento impetuoso, e encheu toda a ca-
sa onde [os discípulos e discípulas]
estavam assentados”; o apóstolo Pau-
lo diz que nós, cristãos e cristãs, so-
mos o bom perfume de Cristo; o últi-
mo verso do Apocalipse diz: “O Espíri-
to e a noiva dizem: Vem! Aquele que
ouve, diga: Vem!”
Em toda a Bíblia, encontramos a
palavra vento, mais de 150 vezes; es-
pírito, 550 vezes, alma, que significa
literalmente “garganta”, por onde
passa o fôlego, mais de 400 vezes;
aroma e perfume, mais de 100 vezes.
Tudo isso é muito sugestivo no
que diz respeito à criatividade litúrgi-
ca. Explorar os aromas e perfumes, e
a simbologia do vento (por meio dos
instrumentos de sopro, por exemplo),
pode ser tremendamente sensibiliza-
dor no exercício de uma espirituali-
dade vívida e no processo de trans-
missão da fé às novas gerações e aos
que se achegam à cultura cristã.
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Em espírito e em verdade - curso prático de liturgia

  • 1.
  • 2.
  • 3. 2| S É R I E C R I S T I A N I S M O P R Á T I C O EM ESPÍRITO E EM VERDADE Curso prático de liturgia
  • 4.
  • 5. 2| S É R I E C R I S T I A N I S M O P R Á T I C O EM ESPÍRITO E EM VERDADE Curso prático de liturgia Luiz Carlos Ramos EDITEO São Bernardo do Campo, 2008
  • 6. Série Cristianismo Prático © 2008 Luiz Carlos Ramos EDITORA DA FACULDADE DE TEOLOGIA (EDITEO) Catalogação preparada pela bibliotecária Aparecida Comelli Tavares (CRB 8-3781) – Biblioteca Jalmar Bowden 264 RAMOS, Luiz Carlos R147e Em espírito e em verdade: curso prático de liturgia / Luiz Carlos Ramos. São Bernardo do Campo: Editeo, 2008. 144 p. ISBN: 978-85-88410-85-5 1. Liturgia 2. Culto público I. Curso prático de liturgia II. Título CDD 18ª. ed. Faculdade de Teologia da Igreja Metodista – Umesp Reitor da Faculdade de Teologia Rui de Souza Josgrilberg Reitor da Umesp Márcio de Moraes Editeo Conselho Editorial Blanches de Paula Helmut Renders José Carlos de Souza Luiz Carlos Ramos Magali do Nascimento Cunha Nelson Luiz Campos Leite Otoniel Luciano Ribeiro Rui de Souza Josgrilberg (presidente) Ronaldo Sathler-Rosa Stanley da Silva Moraes Tércio Machado Siqueira Marcos José Martins Coordenador editorial Ronaldo Sathler-Rosa Editor responsável por este livro Tércio Machado Siqueira Coordenador de produção Luiz Carlos Ramos Revisão Gedilson Oliveira dos Santos, Glória Pratas e Adilson Miguel da Silva Assistente Editorial Glória Pratas Editoração e capa Marcos Antonio Brescovici Foto da capa Vitor Chaves (patena e cálice utilizados nas celebrações eucarísticas da FaTeo) EDITORA DA FACULDADE DE TEOLOGIA DA IGREJA METODISTA Rua do Sacramento, 230 – Rudge Ramos 09840-000 – São Bernardo do Campo, SP Telefone: (11) 4366-5983 — e-mail: editeo@metodista.br
  • 7. Sumário Prefácio ................................................................... 7 Prólogo .................................................................. 11 Introdução ............................................................ 13 Liturgia e Culto ............................................................ 13 Liturgia e Teologia........................................................ 13 Modelos bíblicos e históricos de ordem para o culto ....... 16 As bases da liturgia cristã: o Pão e a Palavra ................. 24 I O que é culto? (A liturgia do serviço) ...............29 II Por que fazer culto? (A liturgia da graça) .......37 III Onde se faz culto? (A liturgia do espaço sagrado)................................................................41 Lugares Sagrados........................................................ 42 Tabernáculo................................................................. 43 O Templo .................................................................... 45 Sinagogas ................................................................... 47 Casas (cenáculo) ......................................................... 48 Praça pública ............................................................... 50 Prisões ........................................................................ 52 Catacumbas ................................................................ 53 Basílicas e catedrais ..................................................... 54 A linguagem espacial e a teologia dos edifícios, mobílias e utensílios religiosos................................................... 57 A Igreja: em espírito e em verdade............................... 62 IV Quem participa do culto? (A liturgia do povo de Deus)..................................................65
  • 8. 6| O lugar da criança no culto cristão................................ 69 Culto para crianças ou culto com as crianças? ............... 72 O que as crianças podem e não podem fazer no culto?.. 74 Preparação da liturgia de um culto inclusivo.................. 78 Portanto...................................................................... 79 V Quando fazer culto? (A liturgia do tempo)....... 81 A celebração da História da Salvação............................ 82 O Calendário Litúrgico.................................................. 85 Ciclo do Natal ........................................................87 O Tempo Comum (após Epifania e após Pentecostes) ...............................................91 Ciclo Pascal ...........................................................94 Esquema do Ano Litúrgico............................................ 99 VI Como fazer culto? (A liturgia da liberdade e da criatividade)................................................ 103 Objetividade e subjetividade litúrgicas .........................104 A emoção na comunicação litúrgica........................105 A razão na comunicação litúrgica ...........................106 Emoção, sensação e razão e a saúde litúrgica .........109 Outras formas de comunicação-não-verbal na liturgia ......110 A natureza e o culto .............................................111 O corpo e o culto..................................................119 A cultura e o culto................................................131 A Equipe ou Ministério de Liturgia................................135 Epílogo ................................................................ 139 Referências......................................................... 141 Textos sobre culto e liturgia.........................................141 Textos sobre a comunicação por vias não-verbais ........143
  • 9. Prefácio A Série Cristianismo Prático (SCRIPT) foi planejada para oferecer às lide- ranças das igrejas locais, pastores e pastoras, leigos e leigas, um instru- mento de trabalho e aperfeiçoamento da pastoral cristã. Como uma de- monstração de nossa disposição, te- mos a alegria de apresentar o traba- lho do Rev. Luiz Carlos Ramos, Em Espírito e em Verdade, um curso prá- tico de liturgia. A publicação deste livro torna-se urgente, exatamente, porque cresce, nas igrejas evangélicas, uma atitude de desdém para com a palavra “litur- gia”. Há poucos dias, ouvi a seguinte frase, numa oração de um leigo: “Re-
  • 10. 8| preenda, Senhor, o espírito de litur- gia”. Indagado pelo pastor sobre o seu conceito de liturgia, ele respon- deu: “é aquele papelzinho que orga- niza o culto”. O livro Em Espírito e em Verdade tem a intenção de esclarecer o signi- ficado de liturgia para a Igreja Cristã. Mais do que enfatizar a liturgia como uma ordem para a celebração cúlti- ca, o autor deixa claro que ela vai além. Para ele, liturgia deve ser com- preendida como uma vida de serviço à Causa Divina. Isso faz da liturgia um conjunto harmonioso de pala- vras, gestos e expressões que orien- tam e desafiam a comunidade cele- brante a aperfeiçoar o seu testemu- nho cristão. Assim, pedagogicamente, a liturgia deixa de ser mera questão formal, para exercer um verdadeiro papel pro- fético, desafiando a cada celebrante a transformar os passos litúrgicos, con-
  • 11. | 9 tidos numa folha de papel, em práti- cas do seu dia-a-dia. O autor desenvolve este tema com profundidade e leveza. Partindo das bases bíblicas, mostra a liturgia como um instrumento necessário ao teste- munho cristão. Além disso, ele deseja mostrar que a liturgia é um dos ele- mentos que sinalizam a dimensão ecumênica da Igreja Cristã, em todas as épocas. Na diversidade das igrejas, a liturgia se faz presente na especifi- cidade de cada tradição cristã. Portanto, a Faculdade de Teologia da Igreja Metodista pretende, com esta publicação, incentivar as igrejas locais a redescobrirem a importância da liturgia, para o culto, e a dialoga- rem com as tradições cristãs. A preo- cupação do Rev. Luiz Carlos é com a prática do culto nas igrejas. Como editor da Série Cristianismo Prático, espero que este curso prático de liturgia ajude o povo cristão na bus- ca de uma autêntica celebração de sua
  • 12. 10| fé. Que os cultos sejam mais comunitá- rios e participativos, e que o povo cren- te seja mais consciente e comprometido com a Palavra de Deus. Tércio Machado Siqueira
  • 13. Prólogo O material desta obra é o resulta- do da experiência do autor como pas- tor e como liturgista. É fruto dos cursos ministrados nas comunidades pelo Brasil afora e das aulas de Li- turgia da Faculdade de Teologia da Igreja Metodista; e também da expe- rimentação de uma espiritualidade encarnada, vivenciada nas celebra- ções da Igreja local, regional e nacio- nalmente, bem como em tantos en- contros ecumênicos, e, particular- mente, nos cultos da FaTeo. Luiz Carlos Ramos
  • 14. 12|
  • 15. Introdução Liturgia e Culto NTES DE APRESENTARMOS uma definição de liturgia, é importante fazer uma pe- quena distinção entre Liturgia e Cul- to: segundo Nelson Kirst (ver referên- cias bibliográficas no final da publi- cação) Culto é o encontro celebrativo entre Deus e o seu povo, e a Liturgia é o que acontece nesse encontro. Liturgia e Teologia Convencionalmente, a Teologia se estrutura em três grandes áreas, a saber: (1) Bíblia, que se ocupa da in- A
  • 16. L U I Z C A R L O S R A M O S 14| vestigação das fontes da fé cristã; (2) Teologia Sistemática e História, que estuda a maneira como a fé foi inter- pretada e reinterpretada em diferen- tes épocas e lugares; (3) e Pastoral, que se ocupa da práxis da fé, isto é, da reflexão e da prática aplicada à realidade das pessoas e das comuni- dades de fé no contexto da missão da Igreja a toda a humanidade. Didaticamente, a Liturgia inscre- ve-se no escopo da Teologia Pastoral, que, por sua vez, se subdivide em di- ferentes áreas, sendo as principais estabelecidas a partir da narrativa bíblica do livro dos Atos dos Apóstolos (especialmente, 2.42-47): doutrina (didaskalia) – comunhão (koinonia) – partilha do pão (diakonia) – ora- ção/louvor (liturgia). A Liturgia é, por- tanto, um capítulo da Teologia Pasto- ral, ao lado da Educação Cristã, do Aconselhamento ou Poimênica, da Diaconia ou Ministérios. Entretanto, essas divisões têm caráter meramente
  • 17. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 15 didático, pois, na prática, todas as áreas da Teologia estão imbricadas, interligadas e se interdependem. Na academia, o uso científico do termo liturgia aplica-se à disciplina teológica que trata da ritualidade ce- rimonial e rubrical que regulam o e- xercício externo do culto. Considera-se a liturgia como teolo- gia primeira (theologia prima) e a re- flexão dogmática como Teologia se- gunda (theologia secunda). É igual- mente considerada ápice e fonte (cul- men et fons) da ação da igreja (actio ecclesiae). Neste sentido, como ensina Casiano Floristán, a liturgia é “lugar primário no qual se realiza a autênti- ca fé, ao mesmo tempo em que é fonte e norma primeira da doutrina”. A li- turgia é uma das três grandes ações da Igreja, sendo precedida pela evan- gelização e seguida pela atividade ca- ritativa, testemunhal ou apostólica. Assim sendo, não se pode fazer Li- turgia sem se recorrer à fonte da nos-
  • 18. L U I Z C A R L O S R A M O S 16| sa fé, a Bíblia; nem à interpretação e atualização dessa fé, a Teologia Sis- temática e a História; e, muito menos, sem recorrer-se à aplicação dessa fé à vida com vistas à transformação da realidade à luz dos princípios do Rei- no de Deus, que é a tarefa específica da Teologia Pastoral. Por essa razão, trataremos dos temas da Liturgia, sempre relacio- nando-os à Bíblia, à sistematização histórica e à práxis pastoral. Comecemos, portanto, pela busca de alguns modelos bíblicos de ordem para o culto. Modelos bíblicos e históricos de ordem para o culto Na Bíblia Hebraica há muitas in- dicações, umas mais, outras menos explícitas, de diferentes práticas li- túrgicas. Um bom exemplo é a narra- tiva de Neemias 8.1-12. Note-se a estrutura sugerida pela narrativa:
  • 19. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 17 Reunião – leitura bíblica – adoração – edificação (explicação da leitura) – refeição comunitária/serviço aos ne- cessitados. No mesmo livro podemos encon- trar variações dessa estrutura, veja- se, por exemplo, Neemias 9: Confis- são individual – leitura bíblica – ado- ração e louvor – confissão comunitá- ria – dedicação (renovação da alian- ça). Um dos modelos mais significati- vos é o encontrado em Isaías 6.1-8. A estrutura oferecida por esta passagem forneceu a base para a liturgia de vá- rias igrejas reformadas e, particular- mente, a Igreja Metodista, aqui no Brasil: adoração – confissão (indivi- dual e comunitária) – edificação – de- dicação. No Novo Testamento, várias são as referências. Detenhamo-nos em al- gumas das que mais inspiraram a prática litúrgica histórica.
  • 20. L U I Z C A R L O S R A M O S 18| Lucas 24. O capítulo 24 do Evan- gelho de Lucas repete sistematica- mente uma mesma estrutura: encon- tro – Serviço da Palavra – Serviço da Mesa – Envio. Veja Lucas 24.13-35; 36-43; 44-49. O mesmo texto de Atos 2.42-47, mencionado acima, também nos ofe- rece uma referência sobre a prática celebrativa dos primeiros cristãos: instrução – comunhão – partilha – oração e louvor. Apocalipse 8. Uma outra proposta litúrgica, bem diferente, encontramos no relato de um culto escatológico, narrado no capítulo 8 e seguintes do livro do Apocalipse: silêncio contem- plativo – súplicas (incensário) – pro- clamação (trombetas) – edificação (10.8-10) – Envio (10.11; 11.1ss). Um dos registros mais antigos, a que temos acesso, sobre o culto nos primeiros séculos, encontra-se na Didachè, que era uma espécie de ma- nual dos primeiros cristãos, datado,
  • 21. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 19 provavelmente, do final do primeiro século. Veja-se, a título de ilustração, a seguinte oração eucarística extraída da Didachè: No que se refere à eucaristia, dai graças assim: Primeiramente, sobre o cálice: Nós te damos graças, ó Pai nosso, pela santa vinha de Davi, teu servo; tu no-la fizeste conhecer por Jesus, teu filho. Glória a ti pelos séculos! Depois, sobre o pão partido: Nós te damos graças, ó Pai nosso, pela vida e pelo conhecimento que nos concedeste por Jesus, teu filho. Glória a ti pelos séculos! Como esse pão partido, antes disseminado sobre as montanhas, foi reunido para ser apenas um, reúne do mesmo modo tua igreja das extremidades terra em teu Reino. Sim, a ti são a glória e o poder por Jesus Cristo, pelos séculos!
  • 22. L U I Z C A R L O S R A M O S 20| Depois de terdes comido o pão, agradecei assim: Nós te damos graças, ó Pai santo, por teu santo nome, que abrigaste em nosso coração, pelo conhecimento, pela fé e pela imortalidade que nos concedeste por Jesus, teu filho. Glória a ti pelos séculos! Tu, Senhor todo-poderoso, criaste o universo para louvor de teu nome e deste aos homens a comida e a bebida para [seu] regozijo, a fim de que eles te dêem graças; mas a nós, tu nos deste um alimento e uma bebida espirituais e a vida eterna por teu filho. Antes de tudo nós te damos graças porque és poderoso; Glória a ti pelos séculos! Lembra-te, Senhor, de livrar tua igreja de todo mal e de completá-la em teu amor. Reúne, dos quatro ventos a Igreja, que santificaste, no Reino que preparaste para ela. Porque a ti pertencem o poder e a glória pelos séculos!
  • 23. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 21 Venha a tua graça e passe este mundo! Hosana ao Deus de Davi! Quem é santo venha; quem não é faça penitência. Marana tha! Amém. Síntese: Adoração (orações a Deus, o Pai) – Eucaristia (proclamação do evangelho e memorial de Jesus, o Fi- lho) – Diakonia (Espírito Santo motiva o serviço/coleta em favor dos necessi- tados). Outro importante documento é o relato de Justino Mártir (Primeira Apologia), de meados do segundo sé- culo da era cristã. Assim Justino des- creve a celebração do domingo: Depois disso, continuamos a recor- dação dessas coisas. Aqueles que têm posses prestam ajuda a todos os que têm necessidade, e nós nos damos assistência mutua. Em todas as nos- sas oferendas bendizemos o Criador do universo por seu filho Jesus Cristo e pelo Espírito Santo. No dia chamado do sol, todos, habitem nas cidades ou nos campos, se reúnem num mesmo
  • 24. L U I Z C A R L O S R A M O S 22| lugar. São lidas as memórias dos a- póstolos e os escritos dos profetas en- quanto o tempo o permite. Terminada a leitura, aquele que preside toma a palavra para advertir e exortar à imi- tação desses belos ensinamentos. Em seguida, todos nós nos levantamos e oramos em voz alta. Depois, como já dissemos, terminada a oração, são trazidos pão, vinho e água. Aquele que preside, à medida que suas forças o permitem, faz subir ao céu orações e ações de graça, e todo o povo respon- de com a aclamação amém. Segue-se a distribuição dos alimentos consagrados a cada um, e a parte dos ausentes lhes é enviada pelo ministé- rio dos diáconos. Aqueles que têm bens em abundância e querem fazer doações doam livremente o que que- rem. O que é recolhido é entregue ao presidente, que dá assistência aos ór- fãos, ás viúvas, aos doentes, aos indi- gentes, aos presos, aos hóspedes es- trangeiros, numa palavra, a todos os que estão passando necessidade. Nós nos reunimos no dia de Sol por- que é o primeiro dia, aquele em que Deus, tirando a matéria das trevas,
  • 25. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 23 criou o mundo, porque nesse mesmo dia o nosso salvador Jesus Cristo res- suscitou dos mortos. Na vigília do dia de Saturno ele foi crucificado e, no dia seguinte a este, isto é, no dia do Sol, ele apareceu aos seus apóstolos e aos seus discípulos e lhes ensinou essa doutrina que nós acabamos de sub- meter ao vosso exame. A liturgia começava com leituras das Escrituras e relatos dos testemu- nhos dos apóstolos (seguidores de Jesus) – exortações para a imitação dos atos de Jesus, conforme teste- munhados – orações pelo mundo e pela igreja, particularmente pelos en- fermos, ou que estavam à morte, e pelos que haviam sido presos por pro- fessarem a Cristo, denunciados por não cristãos – beijo da Paz – ofertório dos elementos eucarísticos – oração eucarística – distribuição dos elemen- tos eucarísticos aos presentes e envio aos ausentes – coleta em favor dos necessitados (alimentos, roupas ou dinheiro) – despedida com oração pa-
  • 26. L U I Z C A R L O S R A M O S 24| ra que todos permaneçam fiéis e a salvo até reunirem-se novamente no próximo domingo. As bases da liturgia cristã: o Pão e a Palavra Sabe-se que os primeiros cristãos mantinham seu costume, como ju- deus, de freqüentar a sinagoga, aos sábados, para ouvir a leitura da Lei, dos Escritos e dos Profetas; e que, no domingo, se reuniam nas casas para o “partir do pão” e celebrar a memória de Jesus. Celebravam, assim, a Pala- vra, no sábado, e a Ceia, no domingo. Porém, à medida que os cristãos fo- ram sendo expulsos das sinagogas, passaram a concentrar no domingo a celebração da Palavra e da Mesa. Num primeiro momento, como sa- lienta Nelson Kirst em Nossa Liturgia: das origens até hoje, o sacramento eucarístico era feito no contexto de uma refeição normal e tinha a seguin- te estrutura: O celebrante partia o pão e fazia uma oração de ação de
  • 27. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 25 graças, depois todos comiam a refei- ção comunal e, ao final, o celebrante voltava a chamar a atenção de todos para a partilha do vinho que era pre- cedida de outra oração de ação de graças. A estrutura era, portanto: pão – refeição – vinho. Mais tarde, por razões várias, passou-se a realizar a refeição em primeiro lugar, juntando a celebração do pão e do vinho no final da cerimônia: refeição – pão e vinho. Mais adiante, ainda, separou- se completamente a refeição do me- morial do pão e do vinho. O culto cristão integra em uma única celebração a leitura e a explica- ção das Escrituras, próprias da litur- gia da Sinagoga judaica, e o memorial eucarístico, do Cenáculo. As primeiras pessoas a professar a fé cristã eram, principalmente, judias, e assim continuaram até que foram expulsas da Sinagoga. Até então, re- uniam-se no sábado (Shabah), na Si- nagoga para a liturgia da Palavra, e tornavam a reunir-se no domingo (Dia
  • 28. L U I Z C A R L O S R A M O S 26| do Senhor) para a Liturgia do Cenácu- lo. Quando as Sinagogas fecharam suas portas aos cristãos, estes passa- ram a concentrar a liturgia da Pala- vra, e a do Cenáculo, numa única celebração, desta vez no Dia do Se- nhor (Kyriake hemera). Dos relatos bíblicos e históricos, mencionados até aqui, podemos esta- belecer um padrão que dá o funda- mento da liturgia cristã: a Celebração da Palavra e a Celebração da Mesa. Quase todos os relatos têm em co- mum o fato de terem dois focos dis- tintos e complementares: a leitura e explicação da Palavra, de um lado, e a prática sacramental do memorial ins- tituído por Jesus, a eucaristia, ou Santa Ceia, ou ainda a Ceia do Se- nhor, de outro. Pão e Palavra são, portanto, os pilares da liturgia. Na organização do espaço celebra- tivo, esses “pilares” ficam evidentes pela disposição, no altar: da mesa da comunhão e do púlpito, lugares res- pectivos da comunhão e da proclama-
  • 29. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 27 ção; do sacramento e do Evangelho; da partilha e do anúncio; da fé e da prática; dos atos de piedade e das obras de misericórdia; enfim, do Pão e da Palavra.
  • 30. 28|
  • 31. 29| I O que é culto? (A liturgia do serviço) TERMO LITURGIA TEM origem no grego clássico leitourgia (leitos [adjetivo de laós] = povo + ergon = trabalho, esforço), que originalmente designava toda obra, ação ou iniciativa assumida livremente por um indivíduo em favor do povo ou do bairro ou da cidade ou do Estado. Aos poucos o ter- mo passou a designar qualquer traba- lho que importasse em “serviço”, mais ou menos obrigatório, prestado ao Es- tado, ou a um indivíduo, ou mesmo à divindade (“serviço religioso”). O
  • 32. L U I Z C A R L O S R A M O S 30| Na Bíblia Hebraica, ou Antigo Tes- tamento, um dos termos mais signifi- cativos, relativos ao culto, é hawa, que pode ser traduzido por “prostrar- se” e “adorar”. A palavra é empregada 170 vezes em todo o AT e traz a idéia de submissão e auto-humilhação, cujo sentido sugere um curvar-se até a testa encostar o chão. Derivam de hawa outros termos que nos ajudam a entender melhor a força e a idéia da raiz desse termo: abad, traduzido por “escravo”, servo (equivalente ao grego doulos); abida, traduzido por “serviço”, “ritual”, “ado- ração”; ‘abodah, traduzido por “traba- lho” e ‘abad, “servir”, “cultivar o cam- po” (vd. Êx 12.21-28; Dt 10.8; 2Cr 8.14). Em Esdras 6, por exemplo, esses termos são empregados na narrativa que descreve o serviço realizado por ocasião da construção ou reconstru- ção de Jerusalém.
  • 33. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 31 A tradução grega do Antigo Testa- mento, a Septuaginta (LXX), emprega o termo liturgia sempre, sem exceção, para designar o “serviço religioso” prestado pelos levitas a Yaweh (ocorre mais de 150 vezes). No Novo Testamento, o verbo lei- tourgeo, o adjetivo leitourgikos e os substantivos leitourgia e leitourgos ocorrem 15 vezes e, em geral, são tra- duzidos como “serviço”, “ministério”, “socorro/auxílio” e seus correspon- dentes. Em Atos 13.2 o termo tem, especificamente, o sentido de “culto” (ver também: Hb 1.7,14, 8.2,6, 10.11; Fp 2.17). Nos escritos extrabíblicos, como na Didachè e textos de Clemente, o termo aparece claramente relacionado com a celebração eucarística. Ao longo da história da Igreja, o termo grego foi preservado na igreja oriental, mas substituído por seus equivalentes latinos (officium, ministe- rium, múnus...) na igreja latina.
  • 34. L U I Z C A R L O S R A M O S 32| Atualmente, a palavra liturgia se aplica a todo o conjunto dos atos ri- tuais e da Igreja pelos quais prosse- gue no mundo no exercício do sacer- dócio de Jesus Cristo, destinado a santificar os seres humanos e glorifi- car a Deus. No Novo Testamento, outros ter- mos são utilizados com o mesmo sen- tido de leitourgia (At 13.2; Hb 1.7,14, 8.2,6, 10.11; Fp 2.17), entre eles: Proskyneo (equivalente ao he- braico hawa), geralmente tra- duzido por “adorar/adoração/ adorador”, (Mt 2.2,8, 11; 4.9, 10; Jo 4.20-23; Ap 3.9). Signi- fica, literalmente, “curvar-se”, “prostrar-se”; Sebomai, traduzido por “te- mor”, “piedade” (Mt 15.9; At 13.43,50, 16.14, 17.4,17, 18. 7,13, 19.27). É a característica dos homens e mulheres cuja piedade se tornava notória pela
  • 35. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 33 prática da oração, do jejum e das esmolas dadas aos pobres; E Latreia, traduzido como “cul- to”, “serviço sagrado” (Rm 9.4, 12.1; Hb 9.1,6,9,14; Mt 4.10; At. 7.7; Ap 7.15, 22.3). A la- treia é a tarefa do latris, o mais humilde dos serviçais do perío- do bíblico. Há vários tipos de escravos que são mencionados na Bíblia: o doulos, que cuida- va dos serviços externos (trata- va dos animais, lavrava a ter- ra...); o diakonos, que cuidava dos serviços domésticos (servia as mesas, limpava a casa...); e o latris, que era quem fazia o trabalho mais degradante (lim- pava a latrina). O latris não é mencionado nas páginas do NT, mas o seu serviço sim, nos textos indicados acima. Da mesma raiz, temos as expres- sões em português “latrina” e “idolatria”.
  • 36. L U I Z C A R L O S R A M O S 34| Todos esses termos têm a conota- ção de humildade e serviço. Portanto, liturgia é o serviço comuni- tário celebrado pelo povo de Deus por meio da adoração à Trindade e da soli- dariedade aos da família da fé, bem co- mo a toda a comunidade humana. Talvez por essa origem etimológica dos termos, para muitos, participar do culto assumiu um caráter de de- ver, de obrigação, de trabalho (até hoje, um termo muito comum na lín- gua inglesa para designar o culto é service, “serviço”). Por essa razão, é preciso, aqui, evocar a grande ação da graça de Deus, que toma a iniciativa de vir até nós, no culto, como veio ao encontro da humanidade na pessoa de Jesus Cristo, e estabelece conosco uma no- va aliança, pela qual já não somos chamados servos, mas amigos: Já não vos chamo servos, porque o ser- vo não sabe o que faz o seu senhor; mas tenho-vos chamado amigos, por-
  • 37. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 35 que tudo quanto ouvi de meu Pai vos tenho dado a conhecer. (Jo 15.15) Assim sendo, o culto é o encontro maravilhoso do Eterno com o efêmero, do Infinito com o finito, do Santíssimo com o pecador redimido. A dimensão do serviço prestado com muita humildade permanece, mas não por dever, mas por amor. Dizendo de outra forma, a liturgia é um diálogo interativo e afetivo en- tre Deus e os seres humanos e des- tes entre si, no contexto celebrativo da fé, na forma de um serviço co- munal — comunitário e comunica- cional — porque é prestado por to- dos e para todos.
  • 38. 36|
  • 39. II Por que fazer culto? (A liturgia da graça) OR QUE ALGUÉM VAI AO CULTO? A resposta a esta pergunta pode ser reveladora da teologia do culto. Há, historicamente, três posturas clássicas a esse respeito: a primeira, típica da Igreja Medieval, que diz que devemos ir ao culto para sermos a- graciados por Deus: ênfase na mística sacramental. Uma segunda, muito difundida entre os anabatistas, diz que devemos ir ao culto para sermos alimentados P
  • 40. L U I Z C A R L O S R A M O S 38| pela Palavra de Deus: ênfase na ra- cionalidade dogmática. Finalmente, a posição de reforma- dores, como Calvino e Lutero, que entenderam que a liturgia não deve ser considerada mero meio para se obter graça ou favor divinos, nem co- mo ocasião para que o povo de Deus seja alimentado por sua Palavra, uma vez essas seriam práticas antropocên- tricas — porque têm como último be- neficiário o ser humano. Em contrapartida, os reformadores entenderam que a liturgia deve ser teocêntrica, de modo que Deus seja o sujeito, o centro, o foco do culto. As- sim, o fiel deve buscar em primeiro lugar o Reino de Deus e sua justiça — isso também no culto. Assim, a graça, a instrução bem como as demais coi- sas, serão acrescentados aos fiéis como decorrência natural. Aqui estão sendo levadas em consideração as duas grandes doutrinas da Reforma Protestante: a Teologia da Graça (es-
  • 41. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 39 pecialmente, Lutero) e a da Soberania de Deus (especialmente, Calvino). Na prática, constata-se que há um caminho de mão dupla: de um lado, Deus vem ao encontro da comunidade (e é sempre ele quem toma a iniciati- va), e, por outro lado, a comunidade vai ao encontro de Deus, como res- posta em ação de graças à grande ação da graça de Deus. O culto se constitui, assim, em ponto de encon- tro celebrativo entre Deus e a comu- nidade e desta consigo mesma (cf. Tg 4.8). No entanto, não se deve perder o referencial de que Deus é o centro do culto, é ele que “está sentado no alto e sublime trono” (cf. Is 61). A pergunta “por que fazer cultos?” será melhor respondida e mais deta- lhadamente explicada ao longo dos próximos capítulos, à medida que a- bordarmos outros aspectos essenciais da liturgia.
  • 42. 40|
  • 43. III Onde se faz culto? (A liturgia do espaço sagrado) UANTO AO ESPAÇO LITÚRGICO, desde muito cedo na experiên- cia do povo de Deus, conforme registrada nas Escrituras, houve a preocupação de delimitações e esta- belecimento de áreas nas quais a ma- nifestação do Sagrado é experimenta- da de maneira especialmente enfática. A relação do povo de Deus com tais lugares acompanhou o amadure- cimento da sua fé e espiritualidade, bem como as contingências sócio- político-geográficas próprias de cada período de sua história. Q
  • 44. L U I Z C A R L O S R A M O S 42| Lugares Sagrados Primeiramente, na fase em que o povo de Deus dava seus primeiros passos na construção de sua identi- dade religiosa (fé e teologia), sua ex- periência com as manifestações de Yaweh (as teofanias) eram eventuais e esporádicas. Assim, as primeiras referências são os chamados Lugares Sagrados, tais como aconteceu com: Noé, após o Dilúvio (Gn 8.20); Abraão, nos Carvalhais de Manre (Gn 13.18); Moisés, no Monte Horebe (Êx 3.5); Josué, no Monte Ebal (Js 8.30); Davi, na Eira de Ornã (1Cr 21.26); Esdras e Neemias, na reconstrução do Templo (Ed 3.2); mesmo Jesus, no Monte da Transfiguração (Mc 9.2ss); e Paulo, no lugar de oração às margens de um rio (At 16.13 ). Nas primeiras experiências, o lu- gar em si passa a ser considerado sagrado, porque ali algo especial da parte de Deus aconteceu.
  • 45. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 43 Na medida em que a identidade re- ligiosa do povo de Deus vai se estabe- lecendo com mais clareza, começou- se a construir ou utilizar-se de locais conforme as circunstâncias do seu cotidiano. Tabernáculo Quando nômades, habitantes de tendas, e peregrinos do deserto, cons- truíram o Tabernáculo (Êx 30-40, ver também cap. 25 [especialmente v. 8 a 27]). O Tabernáculo deveria ficar no centro do acampamento israelita, com a entrada do Santo Lugar voltada pa- ra o Oriente e a do compartimento interno, o Santo dos Santos, voltado para o Ocidente. Tratava-se de uma estrutura sim- ples: uma cerca de lona com um pá- tio, e um espaço reservado menor (o Santo) para os sacrifícios diários, ofe- recidos pelos sacerdotes, e um ainda
  • 46. L U I Z C A R L O S R A M O S 44| mais reservado (o Santo dos Santos) onde o Sumo-Sacerdote oferecia o sacrifício anual. O Tabernáculo abrigava a Arca da Aliança (cf. Êx 25.1-22), o Menorah ou castiçal de sete braços (cf. Êx 25.31-39), o Altar de Bronze para os holocaustos (cf. Êx 27.1-8) e o Altar de Ouro para o incenso (Êx 30.1-10). Quando o povo levantava acam- pamento e partia para outras para- gens, o Tabernáculo era desmontado e carregado pelos levitas que torna- vam a montá-lo no novo lugar de des- tino. Diferentemente do que se passava nos Lugares Sagrados, com o Taber- náculo, Yaweh passa a habitar em uma tenda muito parecida com a casa do povo que o adorava, acompanhan- do-o em sua peregrinação, sempre que este se mudava. Durante a conquista de Canaã, o Tabernáculo permaneceu em Gilgal, depois em Silo, e depois em Quiriate-
  • 47. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 45 Jearim, até Davi. No tempo de Saul, ficou em Nobe (1Sm 21.1). Salomão o trouxe para Jerusalém. Segundo o Evangelho de João, Je- sus “tabernaculou” com os seres hu- manos (cf. 1.14). O Templo Quando sedentários, já estabeleci- dos na Terra Prometida, e passam a habitar em casas de madeira e alve- naria, devidamente decoradas e “a- paineladas” (cf. Ag 1.4), os adoradores de Yaweh decidem construir o Templo (cf. 1Rs 5.5; 6). O modelo para o Templo é o que há de melhor em termos de edifica- ções humanas da época. O Templo passa a ser o lugar de referência ao redor do qual gira a vida do povo de Deus. Em Jerusalém, on- de é edificado, está o centro do poder político, econômico e religioso.
  • 48. L U I Z C A R L O S R A M O S 46| E é o Templo que dá legitimidade a todo o resto. Para isso, peregrinações anuais eram promovidas, de modo que todos tinham o compromisso de comparecer ao Templo periodicamen- te para oferecer sacrifício, pagar taxas e impostos e apresentar seus filhos e iniciá-los na fé de Yaweh. O Templo de Jerusalém, edificado por Salomão, foi destruído pelos Babi- lônios, cerca de 600 anos antes de Cristo. Em duas ocasiões, foi reedifica- do (por Neemias, em 520-516 a.C., e por Herodes, entre 19 a.C. e 64 d.C.). Depois de quatro anos de rebelião ar- mada, pela qual os hebreus pretendi- am inutilmente expulsar os funcioná- rios de César da terra prometida, no ano 70, o general romano Tito, obede- cendo às ordens do seu pai, Vespasia- no, foi enviado à Palestina para resta- belecer a ordem imperial. Lá chegando, assaltou Jerusalém e incendiou e arra- sou o Templo, não sem antes promo- ver-lhe o saque completo.
  • 49. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 47 Atualmente, no lugar do Templo, em Jerusalém, está construída uma Mesquita Islâmica (a Mesquita da Cúpula Dourada). Ainda hoje há fac- ções judaicas que sonham com a re- construção o Templo de Salomão. Sinagogas Quando, na diáspora, o povo de Deus se viu disperso por “todo o can- to”, e longe do Templo. Como fazer para preservar as tradições religio- sas? Como transmiti-las às novas ge- rações? Como celebrar a fé? Onde ler as Escrituras? Onde reunir-se para as orações? Tais necessidades motivaram a constituição das sinagogas (do gr. syn+ago = “reunir-se”, “ir para junto”). Estas eram edificações inspiradas no Templo, em proporções reduzidas, nas quais o povo passou a se reunir para exercitar a espiritualidade e alimentar
  • 50. L U I Z C A R L O S R A M O S 48| a fé. A Sinagoga fazia as vezes do Templo, a exceção dos sacrifícios. Jesus, como judeu que era, fre- qüentava assiduamente as sinagogas (ver Lc 4.16-37). Também os apósto- los e os primeiros cristãos reuniam-se nas sinagogas para a leitura e expli- cação das Escrituras e para a oração (ver At 17.1-2 e 10). Casas (cenáculo) Além das sinagogas, os primeiros cristãos se reuniam nas casas das pes- soas do povo que abriam suas portas para acolher a comunidade cristã. Esse costume foi certamente inspi- rado e incentivado pelo próprio Jesus, que tinha essa prática de freqüentar as casas de seus amigos e ali constituir um lugar de oração, comunhão, e ins- trução (cf. Lc 4.38; 6.29; 10.38ss). A instituição do sacramento da Ceia Eucarística se deu na casa de uma pessoa anônima que, hospitaleiramen-
  • 51. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 49 te, cedeu o Cenáculo (um aposento des- tinado às refeições familiares), para que Jesus, seus seguidores e seguidoras, bem como, naturalmente, os integran- tes da família hospedeira, partilhassem aquela refeição comunal. Num primeiro momento, na histó- ria da Igreja Cristã, a prática normal era, nos sábados, a comunidade reu- nir-se na Sinagoga, para a Liturgia da Palavra e, nos domingos, no Cenácu- lo, para a Liturgia da Mesa. Aos poucos, à medida que a identi- dade entre a religiosidade judaica ofici- al e o cristianismo nascente foi se dis- tinguindo e distanciando, houve uma ruptura entre a Sinagoga e o Cenáculo. Muitos seguidores de Jesus foram, literalmente, expulsos, excomunga- dos, da Sinagoga (ver Jo 9.34-35). Excluída, a comunidade cristã passou a concentrar nas Casas/Cenáculo tanto a Liturgia da Palavra quanto a da Mesa.
  • 52. L U I Z C A R L O S R A M O S 50| Enquanto gozavam de certa liber- dade, a comunidade cristã se reunia nas Casas sem maiores problemas. Muitas casas abrigavam Igrejas (ver, por exemplo, Rm 16.5; Fm 1-3). Estas passaram a ser conhecidas como Ca- sas-igrejas (em gr. oikos-ekklesia; em latim, domus ecclesie): a comunidade de fé que se reúne em salas de casas particulares. Estima-se que, no final do terceiro século, havia mais de 40 Casas- igrejas somente em Roma. Para os cristãos, não mais o templo é o lugar da habitação da divindade, mas a própria comunidade dos fiéis é entendida como o lugar espiritual on- de Deus, em Cristo, se faz presente, onde quer que esta esteja reunida. Praça pública Grande parte do ministério de Je- sus — a partir do seu batismo por João Batista e depois do seu primeiro mila-
  • 53. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 51 gre, em Caná da Galiléia (cf. Jo 1 e 2) — se deu em espaços públicos: nas praias, à beira dos lagos (cf. Mt 5 e pa- ralelos); nas planícies e nas colinas (cf. Lc 6.17ss e Mt 5); pelas estradas, nos caminhos e à margem dos caminhos (cf. Mc 10.17,46; Lc 24.13ss); em jar- dins e hortos (cf. Lc 22.39 e par.); nas ruas das cidades (cf. Lc 19); no pátio e nos espaços comuns do Templo (cf. Lc 19.41-17); etc. Também os apóstolos, impulsiona- dos pelo Espírito Santo, ganharam as ruas para falar das maravilhas de Deus (cf. At 2); ocuparam os espaços públi- cos de debate, tais como as praças e o Areópago (cf. At 17.16ss, especialmente os vs. 17b e 19); evangelizaram nas estradas (cf. At 8.26ss); em tombadi- lhos de navios (cf. At 27); nas margens de rios (cf. At 16.13-15); etc.
  • 54. L U I Z C A R L O S R A M O S 52| Prisões Não tardou para que fossem lan- çados em prisões aqueles e aquelas que anunciavam o Evangelho de Je- sus Cristo com tanta ousadia (ver At 5.18; 12.7). Particularmente em Atos 16.25, encontramos Paulo e Silas cantando louvores a Deus na prisão. Em Romanos 16.17, entre outras passagens bíblicas, Paulo menciona nominalmente os seus “companheiros de prisão”. Mesmo preso, Paulo conti- nuou a sua missão apostólica como pregador do Evangelho, gerando mui- tos “filhos na fé”, mesmo “na prisão”, como podemos constatar por sua Epís- tola a Filemon (esp. o v. 10). Também João, prisioneiro na Ilha de Pátmos, exerceu seu ministério pastoral, redigindo suas cartas às Igre- jas da Ásia Menor e registrando suas visões e textos litúrgicos de louvor e glorificação ao Senhor Deus Eterno (cf. Ap 1.4 e 2.1ss).
  • 55. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 53 Catacumbas Quando a perseguição às pessoas que professavam sua fé em Cristo ga- nhou proporções mais violentas, atin- gindo níveis de crueldade inimaginá- veis, as comunidades cristãs precisa- ram de lugares mais seguros e discre- tos onde pudessem reunir-se “secre- tamente’’ e em relativa segurança. Assim as Catacumbas passam a ser a nova “sede” dos cultos. Os cemitérios eram lugares temidos, porque, segundo as superstições pagãs, eram lugares habitados por espíritos imundos (ver Mc 5), lugar de demônios e assombrações. Mas, por causa da experiência, primeiro, da ressurreição de Lázaro e, depois, da ressurreição de Jesus, pa- ra os cristãos, nem a morte nem os cemitérios eram temidos. Desde o martírio de Estevão (cf. At 7.54-60), e de Tiago, irmão de João (cf. At 12.1-2), a comunidade cristã adotou o costume de honrar a memó-
  • 56. L U I Z C A R L O S R A M O S 54| ria dos seus mártires. Daí nasceu o costume de reunir-se nos lugares on- de descansam os restos mortais da- queles e daquelas que deram sua vida por sua fé em Cristo. Ali, junto às lá- pides dos mártires, a salvo dos su- persticiosos perseguidores, a Igreja se reuniu inúmeras vezes para a Liturgia da Palavra e a Liturgia da Mesa (ver Ap 7.9-17 [esp. v. 14]). Basílicas e catedrais Em meados do século IV, devido a controvertidos episódios políticos e místicos do Imperador Constantino, o cristianismo passou, não só a ser to- lerado, mas a ser, enfaticamente, in- centivado com o respaldo do Estado. Esse período recebeu a designação de Paz Constantiniana. Os pequenos grupos marginais de cristãos vão, rapidamente, se tornan- do grandes assembléias. Isso exigiu uma reestruturação do espaço cele-
  • 57. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 55 brativo. As casas já não davam conta de abrigar às grandes massas que afluíam para as cerimônias religiosas. O próprio Constantino designou, então, seus arquitetos para a edificação de novos espaços destinados aos cultos cristãos. Ora, a experiência desses pro- fissionais quando, à construção de amplos edifícios, estava consolidada pelas chamadas Basílicas. Estas eram, a princípio, espaços forenses onde se reunia o Tribunal do Júri da época, para julgar processos judiciais. Tais edifícios têm o santuário, ge- ralmente com abside (nicho ou recin- to semicircular ou poligonal, de teto abobadado, geralmente situado nos fundos ou na extremidade da cons- trução ou de parte dela) para a cáte- dra (antes destinada para uso do ma- gistrado, agora reservado para quem preside a liturgia), um ambão ou púl- pito (antiga tribuna), o altar (mesa da comunhão), e um nártex (vestíbulo que ficava à entrada da basílica pale-
  • 58. L U I Z C A R L O S R A M O S 56| ocristã, destinado aos catecúmenos, para que pudessem assistir aos ritu- ais, sem deles participar diretamente, por ainda não serem batizados [conti- nuou em uso nas igrejas da Idade Média e, mesmo após perder seu sen- tido, nos períodos posteriores, per- maneceu demarcado pelo espaço en- tre a portada e o pára-vento]). Nos séculos subseqüentes, as ba- sílicas apresentaram formas variadas (quadrada, redonda, em forma de cruz latina, de cruz grega ou sim- plesmente de aula [pátio ou grande vestíbulo], retangular). Os estilos variaram, com as cultu- ras dos respectivos séculos: estilo românico, gótico, clássico renascen- tista, barroco, neo-clássico, e con- temporâneo. O termo “Catedral” é relativo a “cá- tedra”, e designa a igreja principal de uma diocese, onde se encontra o tro- no episcopal; sé, matriz.
  • 59. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 57 A linguagem espacial e a teologia dos edifícios, mobílias e utensílios religiosos No culto, antes mesmo que os ce- lebrantes pronunciem qualquer pala- vra, o Evangelho já começa a ser pre- gado e conceitos teológicos e ideológi- cos já estão sendo transmitidos pela linguagem espacial da arquitetura do edifício, pela disposição e tipos da mobília, pela estética e função dos utensílios. Pode-se identificar, para fins didá- ticos, três concepções espaciais típi- cas: O conceito medieval, que valoriza o altar, pois sua teologia reforça o aspecto místico e espiritual da parti- cipação no mistério eucarístico. O conceito cartesiano, próprio do perío- do da pós-Reforma do séc. XVI, que coloca em evidência o púlpito, que reforça o aspecto intelectual, concei- tual e didático da fé. E o conceito mi- diático, comum nos dias atuais, que
  • 60. L U I Z C A R L O S R A M O S 58| valoriza o palco, isto é, o aspecto es- petacular do evento celebrativo, cujo centro passa a ser a performance dos celebrantes como comunicadores- atores e dos instrumentistas e canto- res. Deve-se, portanto, ter um espírito crítico em relação ao trato que se dá ao espaço celebrativo, pois aquilo que este comunica pode, eloqüentemente, estar em flagrante contradição com aquilo que os/as pregadores/as a- nunciam dos púlpitos. As edificações religiosas devem ser adequadas à celebração das ações litúrgicas e devem facilitar a partici- pação ativa dos fiéis. Cada elemento arquitetônico, ou da mobília ou utensílio empregado no culto, tem implicações teológico- litúrgicas que expressam seu (1) as- pecto celebrativo, pois o culto é fé e festa motivada pela Graça (cf. Lc 15.7,10,23 e 32); (2) aspecto educati- vo, pois há uma teologia inerente às
  • 61. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 59 formas dos espaços retangulares, quadrados, circulares e em leque — uns mais inclusivos outros menos; (3) aspecto encarnacional, pois o espaço explicita o nível de inculturação ou encarnação do Evangelho pregado em determinada cultura, como expressão material da Palavra, à luz da encar- nação de Deus em Cristo (Jo 1.14); (4) aspecto espiritual, pois aponta para a transcendência por meio da transpa- rência perceptível na concepção desse espaço: simplicidade nobre, familiari- dade, beleza, propriedade, qualidade, autenticidade ou integridade dos ele- mentos que compõem o ambiente ce- lebrativo; (5) aspecto estético-poético do espaço que, intencionalmente, in- tegra a comunidade de fiéis (corpo- alma-e-espírito), por meio de cuida- dosa ambientação e decoração que possibilitem a inclusão dos sentidos, sentimentos, emoções e razões. Isso implica em um cuidado teoló- gico-litúrgico-estético do lugar ou es-
  • 62. L U I Z C A R L O S R A M O S 60| paço onde esse povo se reúne. Por isso, são considerados imprescindí- veis, nos templos cristãos, como es- trutura mínima fundamental, o san- tuário, a nave e o átrio. O Santuário é o espaço central (não fisicamente, mas no sentido de mais importante) do edifício. Tudo de- ve estar orientado para o espaço re- servado para o Memorial Pascal, lugar da renovação da aliança: o altar, que representa a mesa do sacrifício (AT), a mesa eucarística (NT) e as lápides dos fiéis que deram sua vida por amor a Cristo, os mártires; para a pia ou fon- te bastismal, que, juntamente com a mesa do altar, representam os dois sacramentos (Ceia e Batismo); para o ambão ou púlpito, que é o lugar de onde o Evangelho é pregado e a Pala- vra de Deus é proclamada; e para a sédia ou cátedra, que é o lugar onde se senta o presidente da celebração. A Nave (do latim navis, que signi- fica “navio”, pela lembrança do forma-
  • 63. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 61 to das vigas que suportam o teto de alguns templos se parecerem com o costado de um navio) é o espaço da assembléia, que são os membros do corpo místico de Cristo. É o lugar da atenção, do alerta, da vigilância. É o lugar dos batizados e, por esta razão, o batistério (ou pia batismal) pode es- tar colocado à entrada da nave, indi- cando que participam da celebração cristã aquelas pessoas que receberam o Sacramento do Batismo e se vestiram das “vestes brancas” para apresentar- se diante do Trono do Cordeiro. E o Átrio (do latim atriu[m]) é o espaço de transição. É o espaço para a festa do encontro, onde as pessoas se reúnem antes e depois da celebra- ção. Ao chegar para o culto, a pessoa se prepara para entrar no santuário, fica em silêncio e passa pela porta que é Cristo (não se pode chegar no lugar santo a não ser por intermédio de Cristo — Jo 10.7,9).
  • 64. L U I Z C A R L O S R A M O S 62| Os vários objetos que são empre- gados no culto devem ser cuidadosa- mente escolhidos e sabiamente em- pregados, quer sejam objetos simbóli- cos, tais como o pão e o vinho e os recipientes que os contêm, a Bíblia, a cruz; quer sejam objetos festivos, co- mo são os candelabros, as flores e os vasos, os estandartes, os ornamentos e os vitrais; e mesmo os objetos fun- cionais, entre eles, o suporte para a Bíblia, as toalhas, os sistemas acústi- cos, climatizadores, de iluminação, etc. A Igreja: em espírito e em verdade Teologicamente, ou espiritualmen- te falando, à luz dos ensinamentos e da prática de Jesus (cf. Jo 4.20-23), deve-se compreender que o “espaço sagrado”, por excelência, não depende da forma arquitetônica, nem da topo- grafia, mas da atitude dos fiéis que devem adorar o Pai “em espírito e em verdade”.
  • 65. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 63 Essa compreensão — de adorado- res que adoram em espírito e em ver- dade —, juntamente com o dito de Jesus de que “onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome, ali estou no meio deles” (Mt 18.20), fundamen- tou a eclesiologia cristã: a “igreja” não é um edifício, mas o povo reunido em nome de Jesus, o Cristo. Os modelos para os edifícios cris- tãos, portanto, não devem ser os sun- tuosos “templos” do paganismo mo- derno, tais como os bancos, shopping centers, edifícios públicos e casas de espetáculo. Antes, sua forma deve ser determinada pela teologia do culto, isto é, a liturgia. Suas linhas devem ser sóbrias, austeras e singelas — o que não implica em comprometer a estética. Linhas que privilegiem o sen- timento de comunhão da assembléia com Deus e de solidariedade para com o próximo; onde Deus possa ser adorado em espírito e em verdade (Jo 4.24), com decência e com ordem
  • 66. L U I Z C A R L O S R A M O S 64| (1Co 14.40), com o espírito e com o entendimento (1Co 14.15), onde pos- samos apresentar os nossos próprios corpos em sacrifício vivo, santo e agra- dável a Deus em um culto racional, alegre, sensível e sincero (cf. Rm 12.1). O Ministério da Ambientação, ou da decoração, ou da ornamentação, é, em primeira instância, um ministério kerygmático, de anúncio do Evange- lho e da proclamação da Palavra. Aquelas pessoas que abraçam esse ministério devem estar dispostas a ambientar e decorar com arte (estética e qualidade), o que pressupõe dom e talento; devem também ambientar e decorar com inteligência (praticidade e significado), o que requer esforço e estudo; e devem ainda ambientar e decorar com o coração (afetividade e espiritualidade), para o que é preciso sensibilidade e fé.
  • 67. IV Quem participa do culto? (A liturgia do povo de Deus) e acordo com a tradição bí- blica, Deus é a personagem central do culto, pois é ele quem está assentado no alto e subli- me trono (cf. Is 6.1); é glorificado por seres celestiais (cf. Is 6.2); é servido por ministros ou sacerdotes/liturgos/ celebrantes (cf. 103. 21), é cultuado pela comunidade de fiéis, a congrega- ção ou assembléia (cf. Sl 5.8; 22.22- 23, 25-26); até mesmo por todos os que morreram por causa do seu tes- temunho, os mártires ou testemu- nhas, se acham constantemente dian- D
  • 68. L U I Z C A R L O S R A M O S 66| te do trono, glorificando o Altíssimo (cf. Ap 7.9-15); mesmo os pagãos ou gentios, de todas as nações, estão convidados para o culto (cf. Sl 117); e, mais ainda, de acordo com os salmis- tas, todo ser que respira deve louvar a Deus (cf. Sl 150.6); e mesmo os seres inanimados, tais como os corpos ce- lestes, de alguma forma, proclamam a glória de Deus, e anunciam as obras das suas mãos (cf. Sl 19.1). Deus é quem toma a iniciativa e vem ao nosso encontro, no culto, dando início ao diálogo litúrgico e ce- lebrativo da fé. Pouco sabemos sobre a participação dos seres celestiais no culto, bem como a respeito das tes- temunhas que se acham constante- mente diante do trono louvando a Deus. Por outro lado, podemos nos aplicar a compreender a nossa parti- cipação no culto, como comunidade de fiéis. A congregação de fiéis é formada por pessoas de todas as camadas so-
  • 69. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 67 ciais, de todas as culturas e de todas as idades. Isso significa que, do culto, tomam parte e têm lugar: pessoas das classes empobrecidas e das classes abastadas; pessoas cultas ou iletra- das; e pessoas de todas as idades — a Igreja talvez seja o único espaço insti- tucional com tamanha abrangência inclusiva. Teoricamente, todos deveriam ter sua participação no culto garantida, representada ou contemplada: na es- trutura da liturgia que se celebra, no repertório dos cânticos que se ento- am, no tipo de linguagem que se ado- ta, etc. Ou a Igreja é de todos ou não é I- greja! Igreja só para jovens não é Igre- ja, é point; igreja só para idosos não é Igreja, é clube de saudosistas. Quando se diz que têm lugar no culto pessoas de todas as idades, es- tamos dizendo que a liturgia deve ser concebida e preparada para incluir e
  • 70. L U I Z C A R L O S R A M O S 68| contemplar bebês, crianças, adoles- centes, jovens, adultos e idosos. Embora isso pareça relativamente óbvio, ao observarmos o que acontece na prática de muitas igrejas, essa in- clusão não acontece. Conquanto se possa constatar um evidente conflito de gerações, entre jovens e idosos, na disputa pela he- gemonia litúrgica, as maiores vítimas dessas disputas são as crianças. De uma maneira ou de outra, jo- vens, adultos e idosos têm os seus meios para contestar e protestar. As crianças, entretanto, não têm voz nem vez. Não obstante, dar destaque para a participação da criança no culto não é apenas uma questão de fazer uma concessão e dar-lhes, provisoriamen- te, vez e voz. A criança trazida para o centro do culto, como se pretende demonstrar a seguir, é a própria ra- zão de ser da liturgia.
  • 71. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 69 O lugar da criança no culto cristão A participação da criança, no cul- to, merece destaque por uma razão histórica e bíblica. Como sabemos, o centro da liturgia cristã é a Páscoa que é também o centro da liturgia judaica. Ora, nas instruções dadas por ocasião da instituição da Páscoa judaica, a criança desempenha um papel central, e é ela que dá início às solenidades. Vejamos alguns dos relatos bíblicos da instituição da celebração da Páscoa: Êxodo 12.24-27: “24 Guardai, pois, is- to por estatuto para vós outros e para vossos filhos [grifo nosso], para sempre. 25 E, uma vez dentro na terra que o SENHOR vos dará, como tem dito, obser- vai este rito. 26 Quando vossos filhos [grifo nosso] vos perguntarem: Que rito é este? 27 Respondereis: É o sacrifício da Páscoa ao SENHOR, que passou por cima das casas dos filhos de Israel no Egito, quando feriu os egípcios e livrou as nossas casas. Então, o povo se incli- nou e adorou.”
  • 72. L U I Z C A R L O S R A M O S 70| Êxodo 13.14: “Quando teu filho [grifo nosso] amanhã te perguntar: Que é is- so? Responder-lhe-ás: O SENHOR com mão forte nos tirou da casa da servi- dão.” Deuteronômio 6.20-21: Quando teu fi- lho [grifo nosso], no futuro, te pergun- tar, dizendo: Que significam os teste- munhos, e estatutos, e juízos que o SE- NHOR, nosso Deus, vos ordenou? 21 En- tão, dirás a teu filho [grifo nosso]: Éra- mos servos de Faraó, no Egito; porém o SENHOR de lá nos tirou com poderosa mão. À luz dessas referências, podemos nos perguntar pelo lugar que as cri- anças devem ter nos nossos cultos. As grandes experiências de fé do povo de Deus eram celebradas ciclica- mente, justamente, pensando na trans- missão dessa espiritualidade para as novas gerações (ver Lc 2.41-42). As crianças eram, assim, o ele- mento disparador de tais liturgias. Tais cerimoniais eram concebidas especialmente para responder aos insistentes por quês? das crianças:
  • 73. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 71 “quando vossos filhos vos pergunta- rem: que rito é este? Responder-lhes- ás...” (Êx 12.26 e par.). As crianças eram, portanto, o ponto de partida e, em grande parte, a razão de ser da liturgia. É como se o culto fosse um veículo em cujo motor preci- sasse ser dada a partida por um siste- ma eficiente de ignição, para então em- preender efetivamente sua viagem. Ao que parece, não faria muito sentido fazer essas festas sem a pre- sença das crianças. Sim, é verdade que os adultos sempre se beneficiam muito de tais festas, mas para o adul- to os ritos são sempre repetição, e tem função de reforço conceitual e prático, mas para as crianças é des- coberta e novidade deslumbrante de um novo universo espiritual. Assim sendo, se alguém, depois de Deus, tiver que ser privilegiado no culto cristão, esse alguém são as cri- anças.
  • 74. L U I Z C A R L O S R A M O S 72| Culto para crianças ou culto com as crianças? Qual seria, então, a melhor alter- nativa em relação à questão criança- e-culto? As alternativas mais freqüen- temente empregadas pelas igrejas protestantes são: (1) Modelo do culto infantil que consiste em tirar a crian- ça do culto e fazer um outro (infantili- zado) à parte para elas; (2) o modelo híbrido que tolera as crianças no cul- to parcialmente, mas somente até o momento da prédica, quando, então, elas são retiradas do templo para um lugar onde terão atividades “diferen- ciadas” (a palavra é mais bonita do que o resultado, pois amiúde o que se verifica é que tais atividades se resu- mem a entretenimento sem projeto didático-pedagógico, supervisionadas por pessoas que não têm formação para a educação infantil); (3) e o mo- delo deixa como está pra ver como fi- ca, que simplesmente ignora a pre-
  • 75. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 73 sença da criança no culto, cuja litur- gia prossegue indiferente à presença das crianças. O terceiro modelo, do deixa como está, embora talvez seja o mais recor- rente, deveria estar fora de cogitação. Quanto aos outros dois modelos, por mais bem intencionados que se- jam tanto o projeto do culto infantil quanto o projeto híbrido, ambos tam- bém acabam se tornando antipedagó- gicos, pois excluem a criança do cul- to, total ou parcialmente. Ora, se a criança é retirada do templo quando pequena, não há como esperarmos que, quando for adoles- cente (ou pré-adolescente), ela queira permanecer no culto. Pois tudo o que lhe foi ensinado, ainda que não inten- cionalmente, todas as vezes que foi retirada do culto, é que ela não é bem-vinda ali. As experiências inclusivas são ra- ras. Isso é em parte compreensível, mas não justificável. Compreensível,
  • 76. L U I Z C A R L O S R A M O S 74| porque exige esforço, preocupação e dá trabalho. É injustificável, porque não há nada mais importante no Rei- no de Deus do que as crianças: afinal, foi isso que aprendemos (ou devería- mos ter aprendido) de Jesus em Ma- teus 18.1-2 e em Lucas 9.47. Como, afinal, a criança pode ser incluída plenamente no culto? Disso trataremos a seguir. O que as crianças podem e não podem fazer no culto? Eis uma boa questão para a Igreja se perguntar: afinal o que as crianças podem e o que não podem no culto? Talvez o leitor ou leitora desta refle- xão se surpreenda com a resposta enfática que aqui se dará, afirmando que não há nada, liturgicamente fa- lando, que as crianças não possam fazer no culto cristão – nada que um adulto não faça.
  • 77. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 75 O que acontece, amiúde, nos nos- sos cultos? Em geral, oramos, canta- mos, lemos as Escrituras Sagradas, testemunhamos, proclamamos o E- vangelho, comungamos, ofertamos, nos comprometemos assumindo com- promissos, etc. Ora, quais desses atos litúrgicos estão fora das possibilidades das cri- anças? As crianças podem aprender a orar antes mesmo de aprender a andar – então, por que nunca convidamos uma criança para fazer uma oração nos cultos de domingo? E quanto a cantar, por que tam- bém não cantamos com elas, uma vez que elas sempre cantam conosco? pois todos, mesmo os bebês, adoram (inclusive no sentido literal do termo) cantar (afinal, deles nasce o perfeito louvor, dizem as Escrituras Sagradas em Mt 21.16). Se elas cantam nosso repertório, porque nós não cantamos as suas canções?
  • 78. L U I Z C A R L O S R A M O S 76| Ler a Bíblia: desde que alfabetiza- da, o que acontece cada vez mais ce- do, uma criança com sete, ou seis, talvez cinco anos, pode fazer leituras, da Bíblia ou de outros textos litúrgi- cos, tal como qualquer adulto – não seria fantástico se todo culto tivesse a participação de crianças na direção de certas leituras? Quanto aos testemunhos e à pro- clamação, também aí as crianças po- dem ser sujeitos. Elas podem, inclusive, participar da prédica, encenando passagens bí- blicas, interpretando ilustrações (pra- ticamente todo sermão recorre às i- lustrações para aclarar pontos obscu- ros ou conceitos abstratos). O mero fato de o pregador, ou pregadora, ter em mente que seu público também é formado por crianças, já pode servir como estímulo para a busca de uma linguagem mais expressiva, o uso de vocabulário mais substantivo, objetivo e concreto; para o emprego de ima-
  • 79. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 77 gens visuais e outros recursos sensí- veis (ao tato, ao paladar, ao olfato, por exemplo). Fazendo isso, todos se beneficiariam, pois quando usamos linguagem abstrata, somente os adul- tos (e nem mesmo todos eles) conse- guem acompanhar, mas a linguagem objetiva e os substantivos concretos, todos, crianças e adultos, podem e gostam de acompanhar. E, no momento da dedicação, in- tercessão e envio, as crianças também podem assumir compromissos como sujeitos na comunidade de fé e na construção do Reino de Deus. Quanto aos bebês, quando presen- tes ao culto, podem não entender conceitualmente o que está se pas- sando, mas afetivamente eles estão “aprendendo”, desde cedo, que eles são bem-vindos, que são amados e que ali é seu lugar: no meio da comu- nidade de fé.
  • 80. L U I Z C A R L O S R A M O S 78| Preparação da liturgia de um culto inclusivo Preparar a liturgia de um culto in- clusivo, para todos, no qual todos são considerados, representados, e cuja participação está garantida, não é assim algo tão difícil ou diferente do convencional. Basta que, na hora em que estiver- mos escolhendo o repertório dos hinos, das leituras, dos gestos e atos litúrgi- cos, lembrar de incluir as crianças, assim como fazemos naturalmente com os jovens e os adultos. Por exemplo, prever músicas próprias para as crian- ças (ora, se elas podem cantar nossos hinos, porque não podemos cantar os delas?). E na hora de distribuir as tare- fas na condução do culto, lembrarmo- nos de atribuir funções às crianças, que pode ser desde a direção de ora- ções e leituras, até a cooperação em atos como o recolhimento das ofertas, a distribuição da Ceia, e encenações e
  • 81. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 79 performances várias — a depender u- nicamente da criatividade, da boa von- tade e do bom senso dos responsáveis pelo preparo e direção da liturgia dos cultos ordinários das nossas igrejas. Portanto... Para finalizar estas considerações sobre o culto cristão inclusivo, pode- mos sintetizar algumas das principais conclusões a que chegamos, a partir do exposto acima: 1. Deus é sempre o principal sujeito do culto Cristão que, mediante o convite da sua graça, nos reúne como seu povo num encontro ce- lebrativo dialógico e interativo. 2. O povo é a congregação de fiéis que, em resposta ao convite da graça divina, presta-lhe seu serviço no culto comunitário. 3. A congregação de fiéis é formada por todas as pessoas da comu- nidade: bebês, crianças, adoles- centes, jovens, adultos e idosos.
  • 82. L U I Z C A R L O S R A M O S 80| 4. As pessoas responsáveis pela preparação e pela direção da li- turgia devem levar em conta a totalidade do povo de Deus, o que implica em envolver, con- templar, incluir a todos nos vá- rios atos litúrgicos. 5. Dentre todos os fiéis, são as crianças as que merecem maior cuidado e atenção, pois, à luz da tradição bíblica, são elas que deflagram o culto com suas perguntas fundamentais, às quais a comunidade celebrante oferece sua resposta de fé, no exercício de uma espiritualida- de que é, assim, transmitida de geração em geração. 6. Não há nada que um adulto fa- ça no culto que não possa ser feito pelas crianças. Portanto, elas não devem ser meras es- pectadoras do culto, mas sujei- tos ativos da dinâmica litúrgica. Colocar isso em prática... Eis aí um belo desafio!
  • 83. V Quando fazer culto? (A liturgia do tempo) LITURGIA SE DÁ NO TEMPO e no espaço. O tempo da litur- gia é a História da Salvação contada ciclicamente durante o Ano Cristão, que tem a Páscoa como centro irradiador da mensagem salvífica. Ao contar a história de Jesus (a expectativa de sua vinda, sua vida e ensinamentos, sua paixão, morte e ressurreição) e sua presença espiritu- al na Igreja, a comunidade de fé re- lembra, atualiza e celebra a sua pró- pria salvação. A
  • 84. L U I Z C A R L O S R A M O S 82| A liturgia é, a um só tempo, memó- ria, atualização e esperança salvífica. A celebração da História da Salvação Para celebrar a sua salvação em Cristo, a Igreja, observa o Calendário Cristão ou Calendário Litúrgico, que se estrutura em dois ciclos festivos e dois tempos ordinários: o Ciclo do Na- tal, formado pelo Advento, Natal e E- pifania, que é seguido por um primei- ro Tempo Comum (após Epifania); e o Ciclo da Páscoa, que compreende a Quaresma (que dura 40 dias), a Se- mana Santa, o Tempo Pascal (que dura 50 dias), e Pentecostes, seguido de um segundo Tempo Comum (após Pentecostes). Essa história é constantemente atualizada em ocasiões que se revesti- ram de especial sentido, à luz do E- vangelho: o Domingo (dia da Ressur- reição), a Quarta (acordo de Judas para a traição), Quinta (lava-pés e
  • 85. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 83 instituição da Ceia) e Sexta-feiras (julgamento, crucificação, morte e sepultamento de Jesus), e o Sábado (Jesus no sepulcro); bem como as Ho- ras de Oração — Matinas-Laudes (nascer do sol/ressurreição), Tércias (julgamento), Média (crucificação), Noas (morte), Vésperas (sepultamen- to), Completas e as Vigílias Noturnas (Getsêmani). No próprio culto, a igreja revive a História da Salvação: num primeiro momento adora o Pai (primeira pes- soa da Trindade), recordando o Cria- dor que é Santo e perfeito; diante da santidade do Pai, a congregação reco- nhece suas imperfeições e pecados, por isso recorre ao Filho, segunda pessoa da Trindade, que é o “Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo”; agraciada com o perdão, a congrega- ção pode agora ser instruída na sua fé, porque o Filho também, é o “Verbo que se fez carne e habitou entre nós cheio de graça e de verdade”; essa
  • 86. L U I Z C A R L O S R A M O S 84| instrução, entretanto, para que se efetive na vida da comunidade, deve ser inspirada e iluminada pela ação do Espírito Santo, a terceira pessoa da Trindade, que é também quem mo- tiva e envia a Igreja em sua missão, que é a de reconciliar a humanidade com Deus, o Pai, retomando, assim, o ciclo teológico-litúrgico. A História da Salvação é, assim, celebrada no tempo cósmico, no ano litúrgico, nas horas do dia e naquela “hora única” que é o culto. Também a História da Humanida- de é celebrada na liturgia da comuni- dade de fé: datas cívicas, nacionais e internacionais, são motivo de referên- cia e intercessão no culto. E, finalmente, a História das Pes- soas (nascimento, puberdade, casa- mento, procriação, envelhecimento e morte) também são motivos que ins- piram a prática celebrativa, porque relacionam a nossa própria história de vida, e nos incluem, na grande his-
  • 87. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 85 tória da salvação, mediante a graça de Deus. O Calendário Litúrgico Todo o Calendário Litúrgico se de- senvolve a partir da Páscoa. Esta é comemorada no primeiro domingo depois da primeira lua cheia do outo- no, no nosso hemisfério (na primave- ra, no Norte). Tradicionalmente era a ocasião em que os catecúmenos eram batizados e recebidos como membros da comunidade cristã — geralmente depois de ter passado três anos se preparando para isso. Desde muito cedo, na História da Igreja, adotou-se o costume de obser- var um tempo de jejum e oração, pri- meiramente no dia anterior ao Do- mingo da Páscoa, depois, durante to- da a Semana Santa. Finalmente, esse período se ampliou para quarenta, inspirados na narrativa da tentação de Jesus durante quarenta dias e
  • 88. L U I Z C A R L O S R A M O S 86| quarenta noites no deserto, bem como nas demais associações com o núme- ro quatro, quarenta e quatrocentos, na Bíblia: quarenta dias do dilúvio, quatrocentos anos de escravidão no Egito, quarenta anos de peregrinação pelo deserto, anúncio de que em qua- renta dias Nínive seria subvertida, e sua súbita conversão, etc. A Festa do Natal é mais tardia, e se estabelece depois do século IV (e o Advento, depois do VI). Trata-se da cristianização da festa pagã que cele- brava o “começo do fim” do inverno, isto é, o solstício de inverno, no he- misfério Norte. Para os cristãos, Je- sus é o Sol da Justiça que nasceu em Belém; ele é o Sol que é maior que o astro adorado pelos pagãos, este sol não existiria, não fosse aquEle. Da mesma forma que a Páscoa, a comemoração do nascimento de Je- sus, no Natal, carecia de preparação. Novamente o número quatro é evoca- do. Desta vez, reserva-se quatro se-
  • 89. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 87 manas (domingos), para que as comu- nidades cristãs se preparem para o grande evento da encarnação do Ver- bo. Nesse período, a igreja recorda as promessas feitas aos pais na fé a res- peito da vinda do Messias, o Salvador. Ciclo do Natal O Ciclo do Natal corresponde a qua- tro tempos litúrgicos do calendário cris- tão, a saber, Advento, Natal, Epifania e Batismo do Senhor. Este ciclo tem início quatro domingos antes do Natal e se estende até o Batismo do Senhor. O Advento é o tempo que marca o início do calendário litúrgico cristão. Sua origem é documentada a partir do século IV a.C. Semelhante à pre- paração da Páscoa, expiação de Cris- to, o Advento surge como preparação para o nascimento de Jesus, o Natal. Advento, do latim adventus, significa “vinda”, “espera”. Trata-se de uma celebração onde o foco é a expectativa da vinda do Messias,
  • 90. L U I Z C A R L O S R A M O S 88| o Cristo prometido. Nesse período cele- bra-se a espera do Messias, e pode ser dividido em duas partes: os dois primei- ros domingos enfatizam o Advento Esca- tológico, o terceiro e o quarto domingos a Preparação do Natal de Cristo. Destarte, o Advento tem a dimen- são da expectativa da segunda vinda de Cristo, bem como, a expectativa da chegada do Messias que concretiza o Reino, o “já” e o “ainda não” – que significa viver a espera do cumpri- mento das promessas e renovar a es- perança no Reino que virá. A espiritualidade do Advento é mar- cada pela esperança e o aguardo do Messias prometido; a fé na concretiza- ção da promessa; o amor que se de- monstra com a chegada do Messias e a paz por ele anunciada e plenificada. O segundo tempo litúrgico desse ciclo é o Natal. Esta celebração teve sua origem nos meados do século IV d.C., entretanto sua aceitação como festa cristã ocorreu no século VI d.C. O Natal surgiu com a finalidade de afastar os fiéis da festa pagã do natale
  • 91. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 89 solis invictus (“deus sol invencível”), e passou a significar a chegada do Mes- sias, o “sol da justiça” (cf. Ml 4.2) já anunciado e aguardado no Advento. Natal, na acepção da palavra, sig- nifica “nascimento”, entretanto para as/os cristãs/aos a partir do século IV d.C., este significado é ainda mais profundo, pois com o nascimento de Cristo celebra-se “o Verbo que se fez carne e habitou entre nós”, o Deus infinitamente rico se faz servo e habi- ta entre os despossuídos da terra. É este Verbo que atrai para si toda a criação a fim de reintegrá-la ao proje- to salvífico de Deus. A espiritualidade desse período enfatiza a humanidade de Cristo e a salvação que nele é absoluta. O terceiro tempo desse ciclo é a Epifania, que surgiu no Oriente como festa da manifestação do Cristo en- carnado. Somente, a partir do século IV d.C., passou para o Ocidente a fim de rememorar a visita dos reis magos ao Messias que havia chegado.
  • 92. L U I Z C A R L O S R A M O S 90| Epifania, do grego ephifaneia, sig- nifica “manifestação”, “aparição”. An- tes de tornar-se um termo apropriado pelo cristianismo, significava a che- gada de um rei ou imperador. A partir de Cristo, tem a conotação de “mani- festação do divino ao mundo”, que no Primeiro Testamento era expressa pelo termo “teofania”. Esse tempo celebra a manifestação de Cristo aos seres humanos, no mo- mento em que os reis do Oriente segui- ram a estrela em busca daquele que viria a ser o Salvador por excelência. A Epifania é para o Natal o que o Pentecostes é para a Páscoa, isto é, desenvolvimento e permanência do ato de Cristo em favor da humanidade. A espiritualidade deste período é caracterizada pela manifestação e apa- rição de Cristo ao mundo. É o Cristo prometido que se torna uma realidade na vida de mulheres e homens que procuram a paz, a justiça e o amor. O Batismo do Senhor é celebrado no primeiro domingo após a Epifania, e representa o início da missão de Jesus
  • 93. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 91 no mundo. Este tempo é parte da ma- nifestação de Jesus aos seres huma- nos, por isso trata-se de uma continui- dade da Epifania. Diferenciando-se pelo fato de que na Epifania é a huma- nidade (representada pelos magos) que vai a Cristo, ao passo que com o Ba- tismo do Senhor é Deus (por meio de Jesus Cristo) que vem até o ser huma- no, a fim de cumprir sua missão. Por isso, a espiritualidade desse dia é marcada pela missão iniciada por Jesus em prol dos menos favore- cidos e injustiçados. Com o Batismo do Senhor termina o Ciclo do Natal, dando início ao Tem- po Comum, ou Tempo após Epifania. O Tempo Comum (após Epifania e após Pentecostes) Além dos dois ciclos festivos, o “Ano do Senhor”, também contempla 33 ou 34 semanas, situadas entre o Natal e a Páscoa. Esse período rece- beu a designação Tempo Comum
  • 94. L U I Z C A R L O S R A M O S 92| por contrapor-se à época festiva do Ano Cristão. O fato de haver um Tempo Comum ressalta o significado de que Deus não é Senhor somente das coisas ex- traordinárias, mas também o é do cotidiano. Enfatiza a presença cons- tante e amorosa do Pai na caminhada do povo rumo à plenitude do Reino. A cada celebração, antecipamos a eter- na liturgia do céu, para o qual nos preparamos, dia-a-dia, tanto no tem- po festivo como no tempo comum. Ao longo da história, várias inicia- tivas foram tomadas no sentido de oferecer alternativas à liturgia do tempo não festivo. Para exemplificar com algumas mais recentes e próxi- mas, citamos a formalização, na dé- cada de 30 nos EUA, de uma propos- ta que sugeria a criação de um novo período, o Kingdomtide (Ciclo ou Tempo do Reino). Essa proposta tem de positivo o fato de enfatizar menos o aspecto eclesiástico-institucional e mais o teológico-missionário do perí- odo. Entretanto, a postura mais am-
  • 95. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 93 plamente adotada pelos protestantes do mundo todo, foi a de designar as duas partes do Tempo Comum como sendo “Tempo após Epifania” e “Tem- po após Pentecostes”, respectivamen- te. Na Igreja Metodista no Brasil, o rev. Messias Valverde propôs uma organização do Ano Cristão dividido em Estações Litúrgicas, das quais destacamos a Estação da Criação, com uma preocupação ecológica e escatológica. A primeira parte do Tempo Co- mum tem início na segunda-feira a- pós a comemoração do Batismo do Senhor e vai até a véspera da Quarta- Feira de Cinzas, quando começa a Quaresma (Ciclo da Páscoa). Sua espiritualidade enfatiza o a- núncio do Reino de Deus e visa à es- perança e à pregação da Palavra. A segunda parte do Tempo Co- mum começa na segunda-feira após Pentecostes e dura até a véspera do Primeiro Domingo do Advento, quan- do tem início o Ciclo do Natal.
  • 96. L U I Z C A R L O S R A M O S 94| Sua espiritualidade comemora o próprio ministério de Cristo em sua plenitude, principalmente aos domin- gos e enfatiza a vivência do Reino de Deus e a compreensão de que os/as cristãos/ãs, são o sinal desse Reino. Se na primeira parte do Tempo Co- mum a ênfase é no anúncio, na se- gunda é a concretização do Reino de Deus. Ciclo Pascal O Ciclo Pascal — que compreen- de a Quaresma, a Semana Santa, o Tempo Pascal, e encerra-se com o Pentecostes — formou-se a partir de um processo de reflexão e sistemati- zação do cristianismo que vai do pri- meiro ao quarto século da era Cristã. A partir deste ciclo se constituiu todo o calendário litúrgico. Nas comunidades primitivas, era comum a reunião no primeiro dia de cada semana na qual celebrava-se a memória de Jesus. A origem do culto cristão está em torno dessa “Páscoa
  • 97. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 95 Semanal”, que ocorria no chamado “Dia do Senhor”. Em boa parte por influência do judaísmo cristão, desenvolveu-se uma celebração anual da Páscoa co- mo um “grande dia do Senhor”, cuja festa se prolongava por cinqüenta dias, sendo o último, o dia de chega- da do Espírito, o Pentecostes Cristão, isso já no século II. No século IV, desenvolveu-se a tradição de reviver e refletir de um modo mais sistematizado, os momen- tos da paixão, isso deu origem às celebrações da Semana Santa. Desde o século III as vésperas da Páscoa já eram dias de reflexão. Os catecúme- nos que por dois anos vinham sendo preparados, agora eram acompanha- dos por toda a comunidade. Inspi- rando-se nos quarenta dias de pre- paro de Jesus para seu ministério, nasceu o período da quaresma. As- sim, em torno da celebração da mor- te e ressurreição de Jesus, desenvol- veu-se todo o Ciclo Pascal do Calen- dário Litúrgico Cristão, marcado pela
  • 98. L U I Z C A R L O S R A M O S 96| penitência e confissão, mas também pela alegria e exultação do crucifica- do e ressuscitado. A Quaresma é o período no qual se enfatiza a importância da contri- ção, do preparo e da conversão. Ini- cia-se no quadragésimo dia antes da Páscoa (não se contam os domingos). O início na Quarta-feira de Cinzas retoma à tradição bíblica do arrepen- dimento com cinzas e vestes de saco (Jn 3.5-6). É um momento oportuno para refletir sobre a confissão e o valor do perdão de Deus. Sua espiritualidade enfatiza mo- mentos de preparo na história bíblica geral e da vida de Jesus: Quarenta dias de Jesus no de- serto (Mt 4.2; Lc 4.1ss); Quarenta dias de Moisés no Sinai (Êx 34.28); Quarenta anos do povo no de- serto (Êx 16.35); Elias em direção ao Horeb (1Rs 19.8). A Semana Santa tem início no Domingo de Ramos, celebração de
  • 99. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 97 Cristo como o Messias, salvador dos pobres, o rei dos humildes. Reflete-se, nessa semana, passo a passo, os úl- timos momentos da vida de Jesus. Este é o momento da vigília de preparo para a ressurreição. Sua espiritualidade chama-nos a atenção para os momentos finais de Jesus até o ápice de sua paixão: A Santa Ceia (Mt 26.17-30); O Lava-pés (Jo 13.1-17); Jesus no Getsêmani (Mt 26.36- 46; Mc 14.26-31); O julgamento, sepultamento e a crucificação (Mt 27; Mc 15; Lc 23; Jo 19). A Páscoa¸ propriamente, é a festa da ressurreição e da libertação. Um novo Êxodo ocorre, e a humanidade passa do cativeiro da morte para a vida. Sua solenidade pode iniciar-se já na Quinta-Feira Santa (instituição da ceia), que dá início ao chamado Trí- duo Pascal. Contudo a celebração da ressurreição começa com uma vigília na noite de sábado encontrando sua
  • 100. L U I Z C A R L O S R A M O S 98| plenitude no romper da aurora do Domingo da Páscoa, quando Cristo é lembrado como o sol da justiça que traz a luz da nova vida, na ressurrei- ção. A espiritualidade norteadora da Páscoa aponta para a ressurreição nos mais variados relatos das comu- nidades do século I d.C.: A ressurreição (Mt 28.1-20; Mc 16.1-8; Lc 24.1-12; Jo 20.1-18; At 1.14); Cânticos Pascais (Sl 113 ao 118 e Êx 12). Entre os hebreus, era comum a celebração da chamada “festa das semanas” ou Pentecostes, isso por- que ela se dava sete semanas, ou cin- qüenta dias, após a Páscoa. Nela, o povo dava graças ao Senhor pela co- lheita. Mais tarde, adquiriu mais uma dimensão celebrativa, a da proclama- ção da lei (instrução) no Sinai, cin- qüenta dias após a libertação do Egi- to. Na era cristã, o Pentecostes tor- nou-se o último dia do ciclo pascal,
  • 101. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 99 quando celebra-se a chegada do Espí- rito Santo como aquele que atualiza a presença do ressuscitado entre nós, dando força para que as comunidades sejam testemunhas de Jesus na his- tória. A espiritualidade que nos orienta nesse período fala da presença conso- ladora do Espírito que semeia nos corações a esperança do Reino de Deus e nos impulsiona para a missão: Festa das semanas (Êx 34.22; Lv 23.15); Jesus promete o Consolador (Jo 16.7); Jesus ressuscitado sopra seu Espírito (Jo 20.22); A chegada do Espírito Santo no dia de Pentecostes (At 2). Esquema do Ano Litúrgico Ciclo do Natal Advento (quatro domingos que antecedem o Natal) Natal (véspera, dia de Natal e semana que se segue)
  • 102. L U I Z C A R L O S R A M O S 100| Epifania (6 de janeiro ou o do- mingo mais próximo) Tempo Comum após Epifania Domingos seguintes até o que antecede a Quarta-Feira de Cinzas Ciclo da Páscoa Quaresma (tem início com a Quarta-Feira de Cinzas) Semana Santa: o Domingo de Ramos ou Domingo da Paixão (dá início à Semana Santa) que se completa com o Tríduo Pas- cal (as solenidades da Institui- ção da Ceia, a Crucificação e a Ressurreição de Cristo) Domingo da Páscoa, que encerra a Semana Santa (é a festa mais importante do Ano Litúrgico) Domingos de Páscoa (até o do- mingo de Pentecostes) Pentecostes (encerra o período da Páscoa) Tempo Comum após Pentecostes Domingo da Santíssima Trindade Domingos seguintes até o... ... Domingo do Cristo Rei (últi- mo domingo do Ano Litúrgico:
  • 103. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 101 no domingo seguinte recomeça- se o ciclo do Natal com o Pri- meiro Domingo de Avento).
  • 104.
  • 105. 103| VI Como fazer culto? (A liturgia da liberdade e da criatividade) PARTIR DO NOSSO ESTUDO, constatamos que um culto cristão tem uma tríplice estrutura, caracterizada pela ação efetiva das três pessoas da Trindade, o Pai, o Filho, e o Espírito Santo. As- sim, pode-se dizer que o culto cristão possui partes essenciais que se au- sentes o descaracterizariam. Assim, a estrutura básica da litur- gia cristã é trinitária e pressupõe um primeiro momento teológico, no qual Deus é adorado, um segundo momen- A
  • 106. L U I Z C A R L O S R A M O S 104| to Cristológico, no qual a memória de Cristo é celebrada e proclamada; e um terceiro momento, Pneumatológi- co, no qual, pela ação do Espírito, a comunidade se compromete com o serviço a Deus e ao próximo. Essa liturgia é construída a partir da ação criativa da comunidade de fé e compõe-se de atos, ritos. Objetividade e subjetividade litúrgicas Nesse sentido, a liturgia se constitui de ritos, atos, ofícios e sacramentos comunitários que se expressam pelas vias racionais próprias das palavras (escritas, lidas, proclamadas, cantadas) e pelas vias sensoriais próprias dos gestos (levantar os olhos, fechar os o- lhos, ouvir a palavra, aspirar o incenso, curvar a cabeça, beijar, comer o pão, beber o vinho, impor as mãos, estender as mãos, aplaudir, bater no peito, a-
  • 107. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 105 braçar, ficar em pé, sentar-se, ajoelhar- se, processionais e recessionais...). A emoção na comunicação litúrgica Além das dimensões racionais e sensoriais da comunicação verbal e não-verbal, a liturgia também comu- nica pelas vias subjetivas das emo- ções. A maneira como os ritos, atos, ofícios e sacramentos afetam nossos sentimentos dependem de um sem número de questões que subjazem à nossa consciência. As emoções podem ser evocadas a partir de fora, mas somente podem ser experimentadas a partir de dentro. O riso ou choro, a ira ou a ternura, a indignação ou a compaixão, são estados que, literal- mente, jorram do subconsciente. São manifestações que, antes de desper- tar, jazem adormecidas ou, para usar a linguagem psicanalítica, estão re- primidas e contidas no obscuro mun- do da alma humana.
  • 108. L U I Z C A R L O S R A M O S 106| Quando somos tocados desde fora por uma palavra ou um gesto, por um som ou uma imagem, pode acontecer de vacilarem as forças repressoras que mantinham trancadas as com- portas do subconsciente. Abrem-se essas comportas e emergem, então, as emoções, juntamente com memó- rias significativas (de experiências da infância, de lembranças dos pais, dos filhos...), que compõem o repertório existencial e que, por uma razão ou outra, foi associado ao instante cele- brativo. Não raro, essas liberações emocionais resultam em êxtases que se revelam tão intensos que chegam a embotar a razão, dando vazão a ações não conscientes e não racionais. A razão na comunicação litúrgica Ora, o princípio da primazia da emoção sobre a razão é o grande trunfo dos meios de comunicação de massa. Os estudiosos da comunica-
  • 109. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 107 ção rapidamente concluíram que as pessoas não são persuadidas por ar- gumentos racionais, mas seduzidas por experiências emocionais. A mídia descobriu a eficiência do entreteni- mento e do espetáculo como mediado- ras da “conversão” que transforma o auditório em massa. Entretenimento, como sugere a eti- mologia da palavra, se refere a um processo que procura ter o indivíduo “entre” alguma coisa. O entretenimen- to funciona como um parêntesis, no qual o indivíduo se isola, ainda que por alguns instantes, do mundo real. É aqui, no processo de separação do real, que entra o espetáculo, cuja etimologia remonta ao latim specu- lum, espelho. O espetáculo é, portan- to, uma imagem do real. As imagens, por mais parecidas que sejam, não podem ser confundidas com a reali- dade, pois toda imagem refletida no espelho se apresenta como o “inverso” do real ou como sua reprodução in-
  • 110. L U I Z C A R L O S R A M O S 108| vertida. A vida real, quando espetacu- larizada, se nos dá como não-vida. Quando, como espectadores, nos di- vertimos com o espetáculo, abrimos um parênteses em nossa vida e sus- pendemos por um tempo a nossa e- xistência, para nos dedicarmos à con- templação da simulação do real. Como ação terapêutica, essa práti- ca pode até ser de grande benefício para a nossa saúde emocional, entre- tanto, quando isso se dá como meca- nismo de fuga sistemática da realida- de, o que se verifica é um desperdício considerável da vida real. Como o medo e a amnésia, a fuga também se constitui em importante dispositivo de sobrevivência. Não obstante, o me- do, a amnésia e a fuga não devem substituir a própria vida, por mais dura que esta seja, sob pena de ter- minar por aniquilar a própria existên- cia. O entretenimento pode causar dependência, mas não responsabili-
  • 111. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 109 dade; alivia as tensões, mas não re- sulta em compromissos. Emoção, sensação e razão e a saú- de litúrgica A liturgia é essencialmente comu- nicação por abranger todo o espectro comunicacional humano. E a comu- nicação litúrgica será tanto mais in- tensa quanto maior for a abrangência da sua ação, subjetiva/objetiva, ver- bal/não-verbal, consciente/incons- ciente... Um grande desafio para a liturgia é, portanto, dosar adequada- mente emoção, sensação e razão. Concluímos que a saúde litúrgica de uma comunidade de fé depende da sensibilização equilibrada e inteligen- te das dimensões sensorial, emocional e racional da comunicação humana no contexto celebrativo. Mas isso não se poderá obter pelo espetáculo nem pelo entretenimento, mas somente no serviço comunitário celebrado pelo
  • 112. L U I Z C A R L O S R A M O S 110| povo para Deus e para toda a comu- nidade humana. Outras formas de comunicação-não-verbal na liturgia Temos “lugares” comuns com to- das as pessoas, de todas as idades, de qualquer nacionalidade e de qual- quer substrato social. O primeiro desses “lugares” é a natura (natureza), em cujo ventre todos fomos gerados, em cujos seios saciamos a fome. O segundo é o corpo — a corporei- dade é um tema que nos diz respeito a todos, religiosos ou não, homens e mulheres, adultos e crianças. Finalmente, a cultura, o “univer- so”, a oikoumene, na qual habitamos. Conquanto diversa e extremamente complexa — seja nas imensas distân- cias geográficas dos cinco continen- tes, quer seja no microcosmo da nos-
  • 113. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 111 sa casa — a cultura nos forja, ora nos formando, ora nos deformando. A natureza e o culto Os antigos filósofos diziam que a tudo o que existe no mundo é deriva- do de quatro substâncias elementa- res: a terra, a água, o fogo e, o ar. Na Bíblia, encontramos inúmeras referências a esses elementos relacio- nados à espiritualidade do povo de Deus. No princípio, criou Deus os céus e a terra. Deus fez o ser humano a par- tir do pó da terra e o designou para cultivar e cuidar da terra (“tu és pó e ao pó tornarás”) ouviu o grito do san- gue de Abel clamando da terra; não suportando a maldade do coração humano, enviou o dilúvio para des- truir e purificar a terra; chamou A- braão e lhe disse: “sai da tua terra e vai pra terra que te mostrarei”; desa- fiou Moisés a libertar o povo e Israel
  • 114. L U I Z C A R L O S R A M O S 112| da opressão no Egito e conduzi-lo à terra prometida; com Josué conquis- taram e habitaram a terra que mana leite e mel; em Jesus Cristo, Deus desceu do céu à terra e habitou entre nós, cheio de graça e de verdade; pela boca dos apóstolos, o Evangelho foi anunciado por toda a terra; João, no Apocalipse, nos fala assim da nova Jerusalém: “vi novo céu e nova ter- ra...”. A terra é a nossa casa, é o nosso berço e o nosso destino. A nova terra é a promessa da vida abundante, da redenção plena. Na Bíblia, a palavra terra aparece quase três mil vezes (2729). No culto, podemos fazer alusão, ou mesmo utilizarmos de maneira con- creta o elemento terra nos momentos de batismo, de lançamento de pedra fundamental de edifício religioso, de renovação do pacto, de ofício fúnebre, etc., etc.
  • 115. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 113 Não menos importante é a água: no Gênesis, o Espírito de Deus paira- va sobre a face das águas; no dilúvio, as águas cobriram e purificaram a terra de sua maldade; na libertação do Egito, Moisés tocou a água com seu bordão e o mar se abriu para que o povo passasse; na chegada à terra prometida, tiveram que transpor o rio Jordão; o mesmo rio em cujas águas João batizou multidões e o próprio Jesus; Jesus andou sobre as águas e acalmou a tempestade e os vagalhões; com água, o eunuco, foi batizado por Filipe e Pedro batizou mais de três mil almas de uma só vez; Paulo sobrevi- veu a naufrágios e, como Jonas, foi devolvido à praia para pregar o Evan- gelho; na Cidade Santa, descrita no Apocalipse, há o rio da vida, brilhante como cristal, que corre do trono de Deus e do Cordeiro, em cujas mar- gens está a árvore da vida, que pro- duz frutos para a cura dos povos e o último verso do Apocalipse diz: “O
  • 116. L U I Z C A R L O S R A M O S 114| Espírito e a noiva dizem: Vem! Aquele que ouve, diga: Vem! Aquele que tem sede venha, e quem quiser receba de graça a água da vida”. Na Bíblia, a palavra água ocorre 659 vezes, sem contar rio, torrente, chuva, manancial, fonte, etc. Na liturgia, a água é simbolica- mente significativa no batismo, na celebração do ágape, na cerimônia do lava-pés, nos cultos de renovação do pacto e de purificação, etc., etc. O fogo é também a luz. O primeiro ato criador de Deus foi “haja luz!”; Deus fez chover enxofre e fogo sobre Sodoma e Gomorra; Abraão caminha- va rumo ao lugar onde deveria sacrifi- car o próprio filho com o cutelo numa mão e o fogo na outra; Moisés, viu o fogo em uma sarça que ardia, mas não se consumia; uma das pragas lançadas sobre o Egito, no processo de libertação, foi a chuva de pedras e fogo; quando o povo peregrinou du- rante quarenta anos pelo deserto, o
  • 117. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 115 Senhor ia adiante deles de dia com uma coluna de nuvem e de noite com uma coluna de fogo para os iluminar e indicar o caminho; no templo, um castiçal com sete braços ficara junto à Torah, para iluminar-lhe a leitura (“lâmpada para os meus pés é a tua Palavra, e luz para os meus cami- nhos”, cantam os salmistas); Isaías foi purificado do seu pecado, no culto do Templo, por uma brasa que um serafim tirara do altar com uma te- naz; Daniel foi preservado do fogo, quando atirado numa fornalha para ser castigado por sua fidelidade a Ya- weh; João Batista não era a luz, mas veio para que testificasse da luz; Je- sus disse: “eu sou a luz do mundo” e, ainda, “vós sois a luz do mundo”; no Pentecostes cristão, o Espírito Santo desceu sobre os discípulos e discípu- las na forma de línguas de fogo; o au- tor de Hebreus diz que “o nosso Deus é fogo consumidor”; inúmeras são as alusões ao fogo, no Apocalipse, dentre
  • 118. L U I Z C A R L O S R A M O S 116| elas, a de que “a morte e o inferno foram lançados para dentro do lago de fogo” e “a cidade não precisa nem do sol, nem da lua, para lhe darem claridade, pois a glória de Deus a ilu- minou, e o Cordeiro é a sua lâmpada.” A palavra fogo aparece mais de 360 vezes na Bíblia; luz, mais de 320; isso para não detalhar sobre a pala- vra lâmpada, sol, glória, e os verbos iluminar, resplandecer, glorificar, to- dos esses, termos relacionados com fogo/luz. No culto, as luzes que se acendem (castiçais) é um importante símbolo da glória de Deus, da presença do Espírito, da orientação da Palavra de Deus, etc., etc. O ar: no princípio, a terra era sem forma e vazia e o Espírito (ar, sopro, vento) de Deus pairava sobre a face das águas; tendo criado o homem do pó do terra, Deus soprou em suas narinas o fôlego da vida; no Dilúvio, quando Deus lembrou-se de Noé, na
  • 119. S C R I P T 2 : E M E S P Í R I T O E E M V E R D A D E | 117 arca, “fez soprar um vento sobre a terra, e baixaram as águas”; na fuga do Egito, um vento vindo do Oriente soprou e abriu o Mar de Juncos para que o povo alcançasse a liberdade; Elias teve um encontro especial com Deus após presenciar vendavais, ter- remotos e saraiva, quando Deus se apresentou a ele numa brisa tranqüi- lo e suave; na visão dos ossos secos, Ezequiel profetizou: “vem dos quatro ventos, ó espírito, e assopra sobre es- tes mortos, para que vivam”; no Culto do templo, não deveria nunca faltar o incenso, que simboliza as orações dos fiéis, feito com finíssimas especiarias aromáticas; certa vez, Jesus, no bar- co, “repreendeu o vento e disse ao mar: Acalma-te, emudece! O vento se aquietou, e fez-se grande bonança”; ressuscitado, Jesus veio ao encontro dos seus seguidores, soprou sobre eles e disse: “recebei o espírito”; no dia do primeiro Pentecostes Cristão, “veio do céu um som, como de um
  • 120. L U I Z C A R L O S R A M O S 118| vento impetuoso, e encheu toda a ca- sa onde [os discípulos e discípulas] estavam assentados”; o apóstolo Pau- lo diz que nós, cristãos e cristãs, so- mos o bom perfume de Cristo; o últi- mo verso do Apocalipse diz: “O Espíri- to e a noiva dizem: Vem! Aquele que ouve, diga: Vem!” Em toda a Bíblia, encontramos a palavra vento, mais de 150 vezes; es- pírito, 550 vezes, alma, que significa literalmente “garganta”, por onde passa o fôlego, mais de 400 vezes; aroma e perfume, mais de 100 vezes. Tudo isso é muito sugestivo no que diz respeito à criatividade litúrgi- ca. Explorar os aromas e perfumes, e a simbologia do vento (por meio dos instrumentos de sopro, por exemplo), pode ser tremendamente sensibiliza- dor no exercício de uma espirituali- dade vívida e no processo de trans- missão da fé às novas gerações e aos que se achegam à cultura cristã.