O documento discute a hidrocefalia de pressão normal idiopática (HPNI), comparando-a com outras síndromes demenciais. A HPNI é caracterizada por alteração da marcha, demência e incontinência urinária, devido a um distúrbio dinâmico do fluxo liquórico. Exames de imagem e análise do líquido cefalorraquidiano são importantes para o diagnóstico diferencial com doenças como a doença de Alzheimer. O tratamento cirúrgico com derivação ventriculoperitoneal pode melhorar os
Diagnóstico Diferencial da Hidrocefalia de Pressão Normal Idiopática
1. Ricardo Krause Martinez de Souza
Instituto de Neurologia de Curitiba
Coordenador do ADEMEC
Atibaia – São Paulo - 03/06/2015
HIDROCEFALIA DE PRESSÃO NORMAL
Diagnóstico Diferencial com as
Síndromes Demenciais
2. • A hidrocefalia de pressão normal idiopática é uma síndrome
clínica caracterizada por alteração da marcha, demência e
incontinência urinária.
• Trata-se de um distúrbio dinâmico do fluxo liquórico responsável
pela dilatação ventricular.
• A dilatação ventricular (na RM de encéfalo ou TC de crânio)
deve ser desproporcional ao grau de atrofia cerebral. Além
disso, não deve existir obstrução do sistema ventricular.
• Não deve existir suspeita de causas secundárias (hemorragia
subaracnoidea, meningites, traumatismo craniano).
• A pressão de abetura do líquido cefalorraquidiano deve estar
entre 7 a 25 cmH20.
3. • 1960: Introduzido por Salomón Hakim.
• 1964: Salomón Hakim defendeu sua tese como uma nova síndrome
intitulada “Síndrome Hidrocefálica do Adulto com Pressão Normal”.
• 1965: Publicado no New England Journal of Medicine por Adams e
colaboradores.
• A HPN foi descrita como a primeira forma de demência tratável.
Salomón Hakim
1922-2011
4. • A real incidência e prevalência da HPNI não são
conhecidas.
• Incidência: 5 casos por 100.000 habitantes ao ano(1).
• Acomete idosos da sétima década de vida.
• Estima-se que, no Brasil, existam 50 mil casos de HPNI.
• Infelizmente, a HPNI corresponde somente a 6% de todas
as causas de demência.(2)
• Já a doença de Alzheimer acomete aproximadamente 10%
da população acima de 65 anos de idade.
1- Dtsch Arztebl Int 2012; 109 (1-2): 15-26 2- Casmiro et al. (1989); Arch Neurol.
6. Guidelines
Por que devemos utilizar os critérios diagnósticos?
• Facilitar estudos epidemiológicos em HPNI.
• Melhorar a acurácia diagnóstica.
• Diminuir o número de pacientes que não respondem ao shunt.
Neurol Med Chir (Tokyo) 52, 775-809, 2012 Neurosurgery 57, september 2005 supplement
7. • Até mesmo pacientes com HPNI “provável” podem não
responder ao tratamento cirúrgico (1)
• Por que pacientes após o “shunt” podem apresentar melhora inicial
da função cognitiva e do controle dos esfíncteres e,
posteriormente, voltam a declinar?
– Presença de doença neurodegenerativa concomitante.
– Desenvolver uma nova doença degenerativa.
• Por que pacientes podem não responder ao tratamento cirúrgico
desde a colocação da DVP ou responder de forma parcial?
– Doença com muito tempo de evolução. (perda do “timing”)
– Não era HPNI!!! (doenças neurodegenerativas mimetizando HPN).
– Presença de várias comorbidades.
.
1 - Neurosurgery 57:S2-4-S2-16, 2005
8. OUTRAS CONDIÇÕES
Alterações da marcha: neuropatia
periférica, estenose de canal,
alcoolismo crônico, neurossífilis,
deficiência de vitamina B6 e B12.
Primary progressive freezing gait
Doenças infecciosas: doença de Lyme,
AIDS, neurossífilis.
Distúrbios urológicos: CA de próstata,
HPB
AVIM (Asymptomatic
ventriculomegaly with features of
HPNI on MRI)
DOENÇAS NEURODEGENERATIVAS
Doença de Alzheimer
Demência vascular: Doença de
Binswanger, CADASIL
Síndrome microvascular frontal-
subcortical do envelhecimento
Parkinsonismo vascular
Doença de Parkinson
Paralisia supranuclear progressiva
Demência com corpos de Lewy
Outros distúrbios do fluxo liquórico:
Estenose aquedutal, hidrocefalia
comunicante, síndrome de
ventriculomegalia evidenciada há
longa data no adulto (LOVA)
Cistos da bolsa de Blake
9. • Cerca de 40% a 75% dos pacientes com HPNI apresentam achados
histológicos típicos da doença de Alzheimer.
• 60% dos pacientes que apresentam sinais de doença cerebrovascular
podem resultar em alterações clínicas semelhantes à HPNI.
• Em tais pacientes, o tratamento cirúrgico pode melhorar principalmente a
marcha, enquanto a melhora cognitiva é menos marcada.
1 - Neurosurgery 57:S2-4-S2-16, 2005
10. • Níveis elevados de proteína leve do neurofilamento (NFL) no pré-
operatório foram correlacionados com uma melhora clínica e funcional
significativa após a derivação cirúrgica. Este estudo deu suporte para o
diagnóstico de HPN quando a proteína NFL estava elevada no LCR com
uma proteína TAU e sulfatídeo normal (1).
• Um estudo piloto demonstrou que a combinação de níveis de ß-amilóde
e TAU total foi capaz de predizer resultados favoráveis à resposta
cirúrgica, com uma sensibilidade de 80% e especificidade de 82,4% (2).
• Limitações e Conclusões
– Amostra estudada foi pequena.
– Tempo do seguimento pós-operatório foi curto.
– Até o momento, nenhum marcador no LCR pode identificar, com
certeza, pacientes “shunt” responsivos.
1 - Cerebrospinal Fluid Research 2008 2- Tarnaris A, J neurosurg. March 25, 2011
11. • Elevados níveis liquóricos de TAU total e TAU fosforilado e
baixos níveis de ß-A42 são encontrados na fase inicial da
doença de Alzheimer.
• Esses três marcadores puderam predizer a DA em indivíduos
com CCL, com uma alta sensibilidade (70% a 80%), e razão de
verossimilhança positiva de 7.5 a 8.5.
• Na suspeita de doença degenerativa (doença de Alzheimer)
associada à HPNI, o papel dos biomarcadores pode ser útil
para confirmar se há sobreposição de doenças.
Andreasen et al. Acta de Neurology Scand 2003.
13. • Não é possível diferenciar HPNI de DA somente com base na avaliação
cognitiva.
• HPNI: alteração significativa das funções corticais posteriores, e ainda,
foram mais acentuadas que nos pacientes com doença de Alzheimer.
• A alteração de linguagem não foi observada nos pacientes com HPNI.
• Após 1 ano do tratamento cirúrgico houve melhora no Teste de Trilhas A,
função executiva e na bateria de avaliação frontal (FAB).
Saito et al., 2011. Dementia and geriatric cognitive disorders extraSaito et al., 2011. Dementia and geriatric cognitive disorders extra
DA: > prejuízo na memória
episódica (> 50%)
HPN: > prejuízo atenção e
função executiva (>50%)
14. – DA- Alterações “corticais”
• Prejuízo na memória de evocação
• Afasia, Apraxia, Agnosia
• Opção - MEEM (mini-exame do estado mental)
– HPN- Alterações “subcorticais e frontais”
• Prejuízo na memória verbal
• Diminuição do processamento psicomotor
• Destreza motora fina prejudicada
• Comprometimento das funções executivas
• Opção - MOCA (Montreal Cognitive Assessment)
Tanto a doença de Alzheimer como a HPNI
causam prejuízo à memória
17. Sintomas Doença de Parkinson Hidrocefalia de Pressão Normal
Marcha • Características semelhantes
• Ausência de base alargada
• Pistas externas ajudam no
freezing
• Características semelhantes
• Pode apresentar: base alargada e desvio dos
pés para fora
• Pistas externas não são uteis
Parkinsonismo • Bradicinesia, rigidez, tremor,
instabilidade postural
• Pode existir, mas é incomum
Início • Assimétrico • Geralmente simétrico
Levodopa • Resposta excelente • Resposta pobre
Demência • Não deve existir nos estágios
iniciais
• Comum no início da doença
Incontinência
urinária
• Rara no início da doença • Comum no início da doença
Outros • Anosmia, hipomímia, disartria,
disfagia e distonia, DCS-REM
• Características raramente encontradas
Neuroimagem • A dilatação ventricular, quando
está presente, deve-se à atrofia
de estruturas subcorticais
• A dilatação ventricular é obrigatória, e não
pode ser atribuída totalmente à atrofia cerebral
18. 1. Aplicar a escala UPDRS – Item III (exame motor)
2. Administrar: Levodopa 200/50.
3. Reavaliar após 60 minutos: aplicar a escala UPDRS – Item III
(exame motor)
• O teste é positivo quando houver melhora no teste motor, entre
20 a 30%.
• Quando a melhora for inferior a 10%, o teste pode ser repetido
com uma dose adicional de 2 comprimidos de Levodopa 200/50.
• Como medida preventiva, para minimizar os efeitos de náusea e
hipotensão, pode ser administrado previamente domperidona.
• Alguns pacientes não respondem ao teste terapêutico
imediatamente. Nestes casos, podem utilizar doses tituladas:
Prolopa 100/25, 4 vezes ao dia, durante 4 a 6 semanas.
.
20. • Estudo epidemiológico realizado em duas cidades do Japão.
• Todos os participantes realizaram RM de encéfalo, com ou sem
sintomas neurológicos.
• 1 % dos idosos apresentaram achados consistentes na RM com
HPNI, sem nenhuma alteração neurológica.
• O seguimento de 4 a 8 anos, demonstrou que 25% dos indivíduos
com AVIM desenvolveram demência e/ou distúrbio da marcha.
• Este estudo sugeriu que AVIM pode ser uma fase pré-clínica da
HPNI.
• Entretanto, permanece incerto se todos os pacientes com AVIM
realmente desenvolveram HPNI e se responderam ao tratamento
cirúrgico.
Iseki C, J Neurol Sci 277: 54-57,2009
21. Souza, RKM et al. Lancet 2011;378:1676
Souza, RKM et al. Case Reports in Clinical Medicine
2 (2013) 377-379
22. • Fissura de Sylvius alargada, associada
ao estreitamento da convexidade
superior e do espaço subaracnóideo
dão suporte ao diagnóstico de HPN.
• VPP de 80% em resposta ao
tratamento cirúrgico.
Hashimoto et. al., 2010. Cerebrospinal Fluid Research
Disproportionately enlarged
subarachnoid space
hydrocephalus (DESH)
DESH permite diferenciar HPNI de
DA com elevada sensibilidade e
especificidade
23. • O índice de Evans, isoladamente,
não permite diferenciar a HPN da
doença de Alzheimer.
• O ângulo do corpo caloso menor
que 90 graus é um importante
método diagnóstico na HPNI.
Evans: 0,30
ACC 69
Evans: 0,29
ACC 102
Evans: 0,24
ACC 118
Ishii et al,. 2008. Eur Radiol
HPN Doença de Alzheimer Saudável
cortes perpendiculares no plano da
comissura antero-posterior ao nível
da comissura posterior
24. • HPN: aumento da amplitude do
corno temporal com fissuras peri-
hipocampais normais.
• Doença de Alzheimer: aumento da
amplitude do corno temporal e da
fissura peri-hipocampal.
• Corte coronal T1.
• Corte através do corpo
do hipocampo ao nível da
parte anterior da ponte.
Scheltens et al. (1992)
25. • Pressão intracraniana > 25 cm de H2O.
• Idade inferior a 40 anos.
• Sintomas assimétricos e transitórios.
• Presença precoce de afasia, apraxia ou paresias.
• Demência progressiva sem alteração da marcha
(mesmo com ventrículos dilatados).
• Ausência de progressão dos sintomas (ponto
controverso).
26. • Utilizar os critérios diagnósticos. (Guidelines)
• Estudo com neuroimagem é mandatório
(preferencialmente RM).
• Punção lombar e sempre aferir a pressão de abertura.
• Sempre realizar testes suplementares: teste de escolha -
Tap - Test (segundo consenso Japonês) e outros, quando
necessário, ou experiência de cada serviço.
• Avaliação neuropsicológica.
• Investigação laboratorial para demência, sempre (TSH,
dosagem de vitamina B12, sorologia para sífilis...)
• Em casos individuais, sorologia para HIV e doença de Lyme.
• Na suspeita de doença de Parkinson, realizar teste
terapêutico com Prolopa.
27. • Quando os biomarcadores (painel para DA e PET CT de
crânio) podem ser úteis para avaliar a existência de doença
degenerativa (DA) associada à HPNI:
– Características neuropsicológicas atípicas (afasia).
– Corno temporal dilatado, sugerindo atrofia.
– Ângulo do corpo caloso > 90 graus.
– Características clínicas atípicas e ausência de (DESH).
– Importante atrofia cortical global.
28. • Não devemos medir esforços na investigação de
pacientes com HPNI, já que se trata de uma demência
potencialmente reversível.
• O emprego da ressonância magnética deve ser
preferível à tomografia, por ser de grande utilidade na
diferenciação de outras desordens degenerativas e
doenças vasculares.
• Até o momento, nenhum marcador pode identificar,
com certeza, pacientes “shunt” responsivos.
• A possibilidade de doença degenerativa associada à
HPNI não significa que o tratamento cirúrgico esteja
contraindicado. Todavia, devemos estar cientes de que
a melhora pode ser parcial.