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LIBERTARISMO
E
DETERMINISMO
By Prof. Claudio Gomes
Pode-se entender liberdade de
muitas maneiras, dependendo
do tempo e do lugar em que o
sujeito está inserido. Mas desde
a antiguidade a liberdade tem
um significado muito especial:
“A palavra liberdade, conforme a
etimologia grega, eleutheria, significava
liberdade de movimento. Tratava-se
apenas de uma possibilidade do corpo
para se movimentar sem qualquer
restrição externa. Poder e liberdade
eram palavras praticamente sinônimas.
Compreendia-se a liberdade como
o poder de se movimentar sem
impedimentos, seja em razão da
debilidade do corpo, seja em razão
da necessidade ou mesmo em razão
do impedimento oposto por ordem de
um senhor”.
Mas será que somos realmente livres? Escolhemos livremente quem
somos? Decidimos sozinhos sobre nossas ações presentes e futuras? O
que você acha? (Pense um pouco).
Há aqueles que acreditam no DESTINO. E aqueles que acreditam em
um deus. Outros ainda, na sucessão de causas e efeitos. E você?
A partir dessas premissas, discutiremos os fundamentos do
LIBERTARISMO e DETERMINISMO. Qual posição é a mais factível?
LIBERTARIS
MO
A posição do libertarismo entende a
liberdade como a possibilidade do
indivíduo de decidir e agir conforme
sua própria vontade. Ser livre é,
pois, o mesmo que agir
voluntariamente, sendo esta
vontade determinada pelo próprio
agente exclusivamente. Ou seja,
diante de uma situação qualquer,
posso agir de uma maneira ou de
outra, dependendo apenas de
minha decisão. Isto também e
conhecido como autodeterminação,
pois o próprio sujeito que age é
causa de sua ação.
A Liberdade Guiando o Povo, de Delacroix, uma personificação da
liberdade que, antigamente, era vista como resultado de batalhas e de
imposição de vontades e justiças.
Um dos primeiros a formular essa noção de
liberdade foi Aristóteles, 384-322 a.C., no
Livro III da obra Ética a Nicômaco. Ele
distingue o voluntário do involuntário:
“Parecem ser involuntárias as ações
praticadas por força ou por ignorância. É
forçado o ato cujo princípio é exterior ao
agente, princípio para o qual o agente ou
paciente em nada contribui; por exemplo,
se o vento ou homens, que dominam a
situação, levarem-no a algum lugar”. Por
conseguinte, “o voluntário parece ser aquilo
cujo princípio reside no agente que conhece
as circunstâncias particulares nas quais
ocorre a ação”.
Le Génie de la Liberté, O Gênio da Liberdade, de Augustin
Dumont, estatua de bronze que descansa sobre a Colonne de Juillet na
Praça da Bastilha - França.
Para Aristóteles, há também certas situações
que parecem misturar o caráter voluntário e
involuntário, ou seja, quando uma escolha se
dá em função das circunstâncias do
momento. São ações voluntárias, mas
absolutamente são involuntárias, pois
ninguém escolheria tais atos por si mesmos.
Por outro lado o involuntário é também
aquilo que se faz por ignorância. E existe
uma diferença entre agir por ignorância e
agir na ignorância.
Aristóteles de Francesco Hayez,1811
No primeiro, age-se por causa
da ignorância, isto é, a
ignorância é a causa da ação. Se
soubesse o que fazia a pessoa
não agiria de tal maneira. No
segundo caso, a ignorância não
é propriamente a causa da
ação, mas, ao
contrário, consequência de
uma outra causa (a
embriaguez, a fúria, etc.), que
leva a pessoa a ignorar
momentaneamente o que faz.
Em uma das mais belas passagens do Antigo Testamento da Bíblia (Gênesis 9.21) Noé,
após o dilúvio, plantou vinha e fez o vinho. Fez uso da bebida a ponto de se embriagar.
Reza a bíblia que Noé gritou, tirou a roupa e desmaiou. Momentos depois seu filho Cam
o encontrou “tendo à mostra as suas vergonhas”.
A embriaguez de Noé
Segundo Aristóteles "a escolha deliberada
é acompanhada de pensamento e
reflexão". Por isso, ela é própria dos seres
humanos. Escolher envolve
deliberação, decisão.
Deliberar, por sua vez, requer investigação
e análise. Mas nem tudo é passível de
deliberação. Sobre certas coisas não temos
nenhum poder de decidir. Só podemos
escolher e deliberar "sobre as coisas que
estão em nosso poder, que podem ser
feitas". "São possíveis aquelas coisas que
ocorrem por nós mesmos". Assim, diz
Aristóteles, "cada um de nós homens
delibera sobre aquilo que pode ser feito por
si próprio".
A primeira representação escrita do conceito de "liberdade" acredita-se ser
a palavra escrita cuneiforme suméria Ama-gi. Estudos demonstram ser a
primeira instância dos seres humanos utilizando a escrita para representar a
ideia de "liberdade". Traduzido literalmente, significa "voltar para a mãe“.
A LIBERDADE SEGUNDO
SARTRE
O filósofo francês Jean Paul Sartre
(1905-1980) nasceu e viveu em Paris.
Sua produção intelectual é vasta e
variada: é dos raros filósofos que se
dedicaram não apenas à produção de
textos de filosofia, mas também de
literatura, teatro, crítica literária,
ensaios sobre política, cinema, pintura,
etc. Além disso, foi um ativista político,
não de forma partidária, mas como
intelectual engajado em causas
libertárias; sua atividade se deu por
meio de artigos, manifestos,
entrevistas.
No auge de sua carreira – artista, literato
e político de prestígio mundial – negou-
se a receber o Prêmio Nobel de
Literatura, que lhe foi atribuído em
1964. Receber essa honraria, para
Sartre, significaria reconhecer a
autoridade da Academia Real da
Suécia, comissão julgadora do prêmio. E
para onde iria a sua liberdade, sua
autonomia de criação? Sartre faleceu
em 1980 e pode-se dizer que foi
aclamado como um herói nacional
quando o cortejo de seu enterro parou a
cidade de Paris.
Geralmente o nome de Sartre é
associado à corrente filosófica
conhecida como existencialismo,
uma linha de pensamento que
acredita que não há ordem no
universo e não há objetivos certos
ou errados. Os indivíduos são livres
para criar sua própria vida de acordo
com as escolhas que fizerem, e
devem ser responsáveis por suas
ações. Na sequencia veremos como
Sartre pensa a liberdade.
"Viver é isto: ficar se equilibrando, o tempo todo,
entre escolhas e consequências" (Jean-Paul Sartre)
Aristóteles ensinou que a essência é o que faz com
que uma coisa seja o que é e não outra coisa
qualquer. Da essência não fazem parte qualidades
acidentais. Por exemplo: o fato de a caneta ser azul
ou verde, pequena ou grande, cara ou barata não
diz respeito à sua essência. O fato de ser um
instrumento usado para escrever, ser à tinta e de
formato adaptável à mão humana é que dita a
essência da caneta.
Vamos ver como isso acontece ao ser humano
segundo a corrente aristotélica e segundo o
existencialismo.
Para muitos pensadores
aristotélicos, o homem tem uma
essência – animal racional – que
pertence a toda a humanidade e
pode ou não ter existência individual.
Já os existencialistas afirmam que a
existência humana não existe nas
ideias nem é dada gratuitamente ao
homem. A essência humana é
construída por cada um de nós no
próprio existir.
← Homem Vitruviano (desenho de Leonardo da Vinci)
Quando penso em minha vida, vejo que há mil direções para se seguir. À
medida que vou existindo, decido-me por um caminho. Ando nele. Com
meu caminhar, abro a trilha. Sou como o trator, que faz seu caminho
enquanto avança, mais do que o automóvel, que só corre por estradas que
foram feitas por outros.
O homem é um ser apenas possível. Existo à medida que transformo esse
possível em real.
É no processo livre de escolha, a cada dia, de nossa existência que
construímos a essência humana. Escolhemos a nossa essência ao
procedermos à escolha do personagem que pretendemos ser. Daí, a
famosa frase de Sartre: “A existência precede a essência”.
Frequentemente esqueço que eu mesmo escolhi livremente construir
os amores, esquecer-me dos amigos ou curtir meus pais. Mas o mais
saboroso, e quase fantástico, desta aventura humana é que cada uma
vai fazendo sua libertação ao longo deste caminhar. E não só a sua vida,
mas de toda a humanidade, pois, com sua vida, está construindo sua
essência humana.
O homem é um ser que não pode
querer senão a sua liberdade e que
reconhece também que não pode
querer senão a liberdade dos outros.
Daí que ninguém vive livre sozinho...
Enfim, para Sartre, não existe o
destino, nós construímos o nosso
futuro.
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MO
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Libertarismo e determinismo

  • 2. Pode-se entender liberdade de muitas maneiras, dependendo do tempo e do lugar em que o sujeito está inserido. Mas desde a antiguidade a liberdade tem um significado muito especial: “A palavra liberdade, conforme a etimologia grega, eleutheria, significava liberdade de movimento. Tratava-se apenas de uma possibilidade do corpo para se movimentar sem qualquer restrição externa. Poder e liberdade eram palavras praticamente sinônimas. Compreendia-se a liberdade como o poder de se movimentar sem impedimentos, seja em razão da debilidade do corpo, seja em razão da necessidade ou mesmo em razão do impedimento oposto por ordem de um senhor”.
  • 3. Mas será que somos realmente livres? Escolhemos livremente quem somos? Decidimos sozinhos sobre nossas ações presentes e futuras? O que você acha? (Pense um pouco). Há aqueles que acreditam no DESTINO. E aqueles que acreditam em um deus. Outros ainda, na sucessão de causas e efeitos. E você? A partir dessas premissas, discutiremos os fundamentos do LIBERTARISMO e DETERMINISMO. Qual posição é a mais factível?
  • 5. A posição do libertarismo entende a liberdade como a possibilidade do indivíduo de decidir e agir conforme sua própria vontade. Ser livre é, pois, o mesmo que agir voluntariamente, sendo esta vontade determinada pelo próprio agente exclusivamente. Ou seja, diante de uma situação qualquer, posso agir de uma maneira ou de outra, dependendo apenas de minha decisão. Isto também e conhecido como autodeterminação, pois o próprio sujeito que age é causa de sua ação. A Liberdade Guiando o Povo, de Delacroix, uma personificação da liberdade que, antigamente, era vista como resultado de batalhas e de imposição de vontades e justiças.
  • 6. Um dos primeiros a formular essa noção de liberdade foi Aristóteles, 384-322 a.C., no Livro III da obra Ética a Nicômaco. Ele distingue o voluntário do involuntário: “Parecem ser involuntárias as ações praticadas por força ou por ignorância. É forçado o ato cujo princípio é exterior ao agente, princípio para o qual o agente ou paciente em nada contribui; por exemplo, se o vento ou homens, que dominam a situação, levarem-no a algum lugar”. Por conseguinte, “o voluntário parece ser aquilo cujo princípio reside no agente que conhece as circunstâncias particulares nas quais ocorre a ação”. Le Génie de la Liberté, O Gênio da Liberdade, de Augustin Dumont, estatua de bronze que descansa sobre a Colonne de Juillet na Praça da Bastilha - França.
  • 7. Para Aristóteles, há também certas situações que parecem misturar o caráter voluntário e involuntário, ou seja, quando uma escolha se dá em função das circunstâncias do momento. São ações voluntárias, mas absolutamente são involuntárias, pois ninguém escolheria tais atos por si mesmos. Por outro lado o involuntário é também aquilo que se faz por ignorância. E existe uma diferença entre agir por ignorância e agir na ignorância. Aristóteles de Francesco Hayez,1811
  • 8. No primeiro, age-se por causa da ignorância, isto é, a ignorância é a causa da ação. Se soubesse o que fazia a pessoa não agiria de tal maneira. No segundo caso, a ignorância não é propriamente a causa da ação, mas, ao contrário, consequência de uma outra causa (a embriaguez, a fúria, etc.), que leva a pessoa a ignorar momentaneamente o que faz. Em uma das mais belas passagens do Antigo Testamento da Bíblia (Gênesis 9.21) Noé, após o dilúvio, plantou vinha e fez o vinho. Fez uso da bebida a ponto de se embriagar. Reza a bíblia que Noé gritou, tirou a roupa e desmaiou. Momentos depois seu filho Cam o encontrou “tendo à mostra as suas vergonhas”. A embriaguez de Noé
  • 9. Segundo Aristóteles "a escolha deliberada é acompanhada de pensamento e reflexão". Por isso, ela é própria dos seres humanos. Escolher envolve deliberação, decisão. Deliberar, por sua vez, requer investigação e análise. Mas nem tudo é passível de deliberação. Sobre certas coisas não temos nenhum poder de decidir. Só podemos escolher e deliberar "sobre as coisas que estão em nosso poder, que podem ser feitas". "São possíveis aquelas coisas que ocorrem por nós mesmos". Assim, diz Aristóteles, "cada um de nós homens delibera sobre aquilo que pode ser feito por si próprio".
  • 10. A primeira representação escrita do conceito de "liberdade" acredita-se ser a palavra escrita cuneiforme suméria Ama-gi. Estudos demonstram ser a primeira instância dos seres humanos utilizando a escrita para representar a ideia de "liberdade". Traduzido literalmente, significa "voltar para a mãe“.
  • 12. O filósofo francês Jean Paul Sartre (1905-1980) nasceu e viveu em Paris. Sua produção intelectual é vasta e variada: é dos raros filósofos que se dedicaram não apenas à produção de textos de filosofia, mas também de literatura, teatro, crítica literária, ensaios sobre política, cinema, pintura, etc. Além disso, foi um ativista político, não de forma partidária, mas como intelectual engajado em causas libertárias; sua atividade se deu por meio de artigos, manifestos, entrevistas.
  • 13. No auge de sua carreira – artista, literato e político de prestígio mundial – negou- se a receber o Prêmio Nobel de Literatura, que lhe foi atribuído em 1964. Receber essa honraria, para Sartre, significaria reconhecer a autoridade da Academia Real da Suécia, comissão julgadora do prêmio. E para onde iria a sua liberdade, sua autonomia de criação? Sartre faleceu em 1980 e pode-se dizer que foi aclamado como um herói nacional quando o cortejo de seu enterro parou a cidade de Paris.
  • 14. Geralmente o nome de Sartre é associado à corrente filosófica conhecida como existencialismo, uma linha de pensamento que acredita que não há ordem no universo e não há objetivos certos ou errados. Os indivíduos são livres para criar sua própria vida de acordo com as escolhas que fizerem, e devem ser responsáveis por suas ações. Na sequencia veremos como Sartre pensa a liberdade. "Viver é isto: ficar se equilibrando, o tempo todo, entre escolhas e consequências" (Jean-Paul Sartre)
  • 15. Aristóteles ensinou que a essência é o que faz com que uma coisa seja o que é e não outra coisa qualquer. Da essência não fazem parte qualidades acidentais. Por exemplo: o fato de a caneta ser azul ou verde, pequena ou grande, cara ou barata não diz respeito à sua essência. O fato de ser um instrumento usado para escrever, ser à tinta e de formato adaptável à mão humana é que dita a essência da caneta. Vamos ver como isso acontece ao ser humano segundo a corrente aristotélica e segundo o existencialismo.
  • 16. Para muitos pensadores aristotélicos, o homem tem uma essência – animal racional – que pertence a toda a humanidade e pode ou não ter existência individual. Já os existencialistas afirmam que a existência humana não existe nas ideias nem é dada gratuitamente ao homem. A essência humana é construída por cada um de nós no próprio existir. ← Homem Vitruviano (desenho de Leonardo da Vinci)
  • 17. Quando penso em minha vida, vejo que há mil direções para se seguir. À medida que vou existindo, decido-me por um caminho. Ando nele. Com meu caminhar, abro a trilha. Sou como o trator, que faz seu caminho enquanto avança, mais do que o automóvel, que só corre por estradas que foram feitas por outros. O homem é um ser apenas possível. Existo à medida que transformo esse possível em real.
  • 18. É no processo livre de escolha, a cada dia, de nossa existência que construímos a essência humana. Escolhemos a nossa essência ao procedermos à escolha do personagem que pretendemos ser. Daí, a famosa frase de Sartre: “A existência precede a essência”. Frequentemente esqueço que eu mesmo escolhi livremente construir os amores, esquecer-me dos amigos ou curtir meus pais. Mas o mais saboroso, e quase fantástico, desta aventura humana é que cada uma vai fazendo sua libertação ao longo deste caminhar. E não só a sua vida, mas de toda a humanidade, pois, com sua vida, está construindo sua essência humana.
  • 19. O homem é um ser que não pode querer senão a sua liberdade e que reconhece também que não pode querer senão a liberdade dos outros. Daí que ninguém vive livre sozinho... Enfim, para Sartre, não existe o destino, nós construímos o nosso futuro.