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Prado Slides – Cidreira / RS
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A rua ainda era a mesma.
As mesmas casas. As
mesmas árvores. Até o
armazém do Espanhol
(assim chamado por razões
misteriosas, pois o dono
era português) continuava
lá. Ele desceu do carro e
começou a caminhar pela
calçada esburacada.
Prado Slides – Cidreira / RS
Parou em frente à casa que
tinha sido a dele. Era a
maior da rua. Puxa. Sentiu
um aperto na garganta.
Quantas lembranças! O
muro com as marcas da
bola. Lembrou-se então,
com uma intensidade que
quase o sufocou, do time.
O Valores da Zona!
Prado Slides – Cidreira / RS
Que tempo bom. Nunca
mais fora tão feliz. A
idéia de formar o time
tinha sido dele. Ele era o
dono da bola. Ele é que
contribuíra com a maior
parcela, tirada da mesada
que o pai lhe dava, para a
compra das camisetas.
Lembrava ainda da
formação do ataque:
Venancinho, Alemão, ele,
Mangola e Tobias da dona
Ester, para distinguir do
Tobias da dona Inácia, que
era zagueiro.
Prado Slides – Cidreira / RS
Tempo bom.
O Venancinho morava numa
casa de madeira em frente à
sua. Será que...
Atravessou a rua e bateu na
porta. Apareceu uma
menina dos seus oito anos.
- Quié.
- O Venancinho ainda mora
aqui?
- Quem?
Prado Slides – Cidreira / RS
- Venâncio. Venâncio,
ahn...
Tentou se lembrar do
sobrenome. Inútil. Só se
lembrava de Venancinho.
Vulgo Bicudo.
- Peraí - disse a menina, e
fechou a porta.
Prado Slides – Cidreira / RS
Nunca mais, desde aquele
tempo, tivera tantos
amigos. O grito de guerra
do time era "Valores da
Zona...Unidos! Unidos!
Unidos!". E eram unidos.
Com eles provara o
primeiro cigarro. Comprara
as primeiras revistas de
sacanagem. Lembrava das
reuniões no galpão atrás
da casa do Chico Babão, os
concursos de...
Apareceu uma senhora.
Prado Slides – Cidreira / RS
-Quer falar com quem?
- O Venâncio ainda mora
aqui?
- Mora.
- Ele está em casa?
- Está aposentado - disse a
mulher, como se dissesse
"onde mais poderia estar?".
E apontou para o próprio
peito: - Pulmão.
- Será que eu posso falar
com ele?
Prado Slides – Cidreira / RS
Ele disse. Explicou quem
era. A mulher tornou a
fechar a porta. Ele ouviu a
mulher gritando para
alguém. Seu nome e sua
descrição. E ouviu a voz
de um homem exclamando:
- Iiih. É o Bacana.
Prado Slides – Cidreira / RS
Não sabia que aquele era o
seu apelido. Compreendeu
tudo. Era como o
chamavam pelas costas.
Bacana. Só porque sua
casa era a maior e ele
tinha mesada.
Antes de se virar e voltar
para o carro, teve um
pensamento definitivo.
- Só me deixavam ser o
centroavante porque a bola
era minha.
Prado Slides – Cidreira / RS
CRÉDITOS
Formatação: Prado Slides
E-mail:
jpamador@terra.com.br
Texto: Luis Fernando
Veríssimo
Imagens: Net
Música: Balada número
sete
Moacir Franco

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Reencontro com o passado em Cidreira

  • 1. Prado Slides – Cidreira / RS
  • 2. Prado Slides – Cidreira / RS A rua ainda era a mesma. As mesmas casas. As mesmas árvores. Até o armazém do Espanhol (assim chamado por razões misteriosas, pois o dono era português) continuava lá. Ele desceu do carro e começou a caminhar pela calçada esburacada.
  • 3. Prado Slides – Cidreira / RS Parou em frente à casa que tinha sido a dele. Era a maior da rua. Puxa. Sentiu um aperto na garganta. Quantas lembranças! O muro com as marcas da bola. Lembrou-se então, com uma intensidade que quase o sufocou, do time. O Valores da Zona!
  • 4. Prado Slides – Cidreira / RS Que tempo bom. Nunca mais fora tão feliz. A idéia de formar o time tinha sido dele. Ele era o dono da bola. Ele é que contribuíra com a maior parcela, tirada da mesada que o pai lhe dava, para a compra das camisetas. Lembrava ainda da formação do ataque: Venancinho, Alemão, ele, Mangola e Tobias da dona Ester, para distinguir do Tobias da dona Inácia, que era zagueiro.
  • 5. Prado Slides – Cidreira / RS Tempo bom. O Venancinho morava numa casa de madeira em frente à sua. Será que... Atravessou a rua e bateu na porta. Apareceu uma menina dos seus oito anos. - Quié. - O Venancinho ainda mora aqui? - Quem?
  • 6. Prado Slides – Cidreira / RS - Venâncio. Venâncio, ahn... Tentou se lembrar do sobrenome. Inútil. Só se lembrava de Venancinho. Vulgo Bicudo. - Peraí - disse a menina, e fechou a porta.
  • 7. Prado Slides – Cidreira / RS Nunca mais, desde aquele tempo, tivera tantos amigos. O grito de guerra do time era "Valores da Zona...Unidos! Unidos! Unidos!". E eram unidos. Com eles provara o primeiro cigarro. Comprara as primeiras revistas de sacanagem. Lembrava das reuniões no galpão atrás da casa do Chico Babão, os concursos de... Apareceu uma senhora.
  • 8. Prado Slides – Cidreira / RS -Quer falar com quem? - O Venâncio ainda mora aqui? - Mora. - Ele está em casa? - Está aposentado - disse a mulher, como se dissesse "onde mais poderia estar?". E apontou para o próprio peito: - Pulmão. - Será que eu posso falar com ele?
  • 9. Prado Slides – Cidreira / RS Ele disse. Explicou quem era. A mulher tornou a fechar a porta. Ele ouviu a mulher gritando para alguém. Seu nome e sua descrição. E ouviu a voz de um homem exclamando: - Iiih. É o Bacana.
  • 10. Prado Slides – Cidreira / RS Não sabia que aquele era o seu apelido. Compreendeu tudo. Era como o chamavam pelas costas. Bacana. Só porque sua casa era a maior e ele tinha mesada. Antes de se virar e voltar para o carro, teve um pensamento definitivo. - Só me deixavam ser o centroavante porque a bola era minha.
  • 11. Prado Slides – Cidreira / RS CRÉDITOS Formatação: Prado Slides E-mail: jpamador@terra.com.br Texto: Luis Fernando Veríssimo Imagens: Net Música: Balada número sete Moacir Franco