O documento discute as mudanças culturais trazidas pelo novo capitalismo em três áreas: trabalho, talento e consumo. No trabalho, analisa como as estruturas organizacionais militarizadas vêm sendo substituídas por novas formas de gestão e contratação de pessoal devido à automação e fragmentação das tarefas. Isso cria desafios como a ameaça do "fantasma da inutilidade" diante das rápidas mudanças tecnológicas.
1. Comissária
da Varig
chora durante
manifestação em
defesa
da empresa no
Rio de Janeiro
Foto:
Folha de S. Paulo
Abril de 2006
A Cultura
do Novo
Capitalismo
de Richard Sennett
Apresentação de Armando Levy desenvolvida
a partir do livro de Richard Sennet 1
2. A cultura do novo capitalismo
Richard Sennett
Professor de Socilogia da London School
−
of Economics e do Massachusetts
Institute of Technology
Autor do livro A Cultura do Novo
−
Capitalismo (Rio de Janeiro, Editora
Record, 2006)
Ele analisa em seu livo três áreas
onde o novo capitalismo está
impondo mudanças culturais
significativas:
− TRABALHO
− TALENTO
− CONSUMO
2
4. Trabalho
Em meados do século XIX o
capitalismo era ainda tão
primitivo e descontrolado que
era visto por Marx como o
“berço da revolução”
Mas em um século – 1860 a
1960 - o capitalismo
aprendeu a se estruturar, Cartaz de pescadores
adotando modelos militares portugueses
chamando para a greve.
de organização Foto de Rui Tavares para
o site sobre a
Revolução Portuguesa
4
5. Militarização econômica, política e social
Período viu a adoção de
estruturas organizacionais
que refletiram a
hierarquização de comando
Weber: “a militarização do
universo econômico terá
reflexos no cotidiano social”
Sennett: “não é por acaso
Judeus poloneses são
que o Século XX teve toda dominados por nazistas em
sua primeira metade Varsóvia em 1943.
Foto do site de Oriza Martins.
dedicada a duas grandes
guerras mundiais”
5
6. Estruturas militares
Segundo autores como Chiavenatto, um modelo de
estrutura organizacional que traduziu a estruturação
militar dos negócios é a chamada Linha-Função
Presidência
Diretoria A Diretoria C
Diretoria B
DEPTO 3 DEPTO 4 DEPTO 5
DEPTO 1 DEPTO 2
ÁREA 1 ÁREA 2 ÁREA 3
SUB ÁREA 2 SUB ÁREA 3
SUB ÁREA 1
SUB SUB ÁREA 1 SUB SUB ÁREA 2 SUB SUB ÁREA 3
6
Decisão Execução
7. Burocracia x Mercado
A burocratização das organizações
apresentou resultados mais
eficientes do que o mercado
A sensação de estabilidade, de Linha de montagem
da DaimlerChrysler.
estruturação, de fazer parte de algo
Foto do site da empresa.
maior, deu às pessoas a
possibilidade de viverem suas vidas
como uma “narrativa”
Foi possível pensar em termos de
carreira e trabalhadores que
entravam nas empresas como
estagiários podiam almejar um dia
alcançar a presidência
7
8. Modelo lógico
Como economista político, Weber
sustentava que o exército constitui um
modelo organizacional mais lógico do que o
mercado, que é volátil e desagregador
Ele compreendia que formas de
racionalização da vida comandadas por
uma visão de mundo militar, levariam a
uma sociedade onde a fraternidade, a Max Weber,
em foto do site
autoridade e a agressão teriam também
Wikipédia
caráter militar
A “Administração Científica”, de Frederick
Taylor (Taylorismo), é a mais acabada
expressão dessa visão de mundo: as
organizações vistas pela ótica da estrutura
militar
8
9. O nascimento da Ford
Este filme mostra o
nascimento da empresa que
criou o modo de produção que
se tornou a marca registrada
das organizações com perfil
militar, onde o Taylorismo
impôs regras de trabalho que
aprisionaram o trabalhador às
engrenagens das fábricas Henry Ford em capa
da Time Magazine
de janeiro de 1935.
Foto publicada pelo
site Wikipédia
9
10. A jaula de ferro começa a ruir
É o aperfeiçoamento das
tecnologias de comunicação e
manufatura que confronta as
estruturas militarizadas das
organizações
As corporações globais
Primeiro PC da IBM,
começam a rever processos e lançado em 1981 em foto
estruturas a uma velocidade publicada pelo site
Wikipédia
alarmante
Nos anos 60, uma decisão
levava 5 meses para chegar à
linha de montagem, hoje leva
poucas semanas
10
11. Efeitos da automação
A automação diminuiu as
bases das grandes pirâmides
organizacionais
O fenômeno da globalização
limita-se a empresas de ponta
nos setores de tecnologia e
finanças
A maioria absoluta das
empresas dos EUA e UK não
são globais, não chegam a ter
mais de 3.000 empregados e
vivem como as pirâmides
burocráticas apontadas por
Weber de modo saudável e
rentável Imagens do filme “Tempos
Modernos”, de Charles Chaplin,
divulgadas pelo site com o
mesmo nome organizado por11
Diogo Ribeiro
12. Muitos imitando poucos
Embora as ditas empresas
globais sejam a minoria no
mundo, são exatamente suas
políticas de implementação de
tecnologia e de terceirização de
pessoal que são vistas como Protesto anti-globalização
na Escócia, em foto
“modelos” inclusive por governos do site Wikipédia
O trabalho temporário nos EUA e
UK já representa 8% da força de
trabalho e é o modelo de
contratação que mais cresce
12
13. Nova gestão de RH
A fragmentação do trabalho
levou ao surgimento de novos
modelos de contratação de
pessoas:
Casualização: contratação
−
Linha de montagem da
de terceiros ou profissionais Daimler Chrysler,
por tarefa (3 a 6 meses) com perfil automatizado, em
foto publicada pelo site
Dessedimentação: fim do
− Controle e Instrumentação
trabalho linear, com começo,
meio e fim; o trabalho agora é
fragmentado
Sequenciamento não
−
linear: programação da
produção de modo flexível
13
14. Uma nova estrutura
Para acomodar melhor a fragmentação do trabalho, a antiga
estrutura piramidal está sendo substituída por um estrutura
matricial, mais apta a lidar com tarefas fragmentadas e de
curto prazo:
Direção
Depto B Depto B
Depto A
de projeto 1
Gerência
de projeto 2
Gerência
14
15. Marx Tudo que é sólido
se desmancha
no ar!
Karl Marx, em foto
publicada pelo site Wikipédia 15
16. A reação humana
As mudanças estruturais
estão acarretando três
déficits sociais:
Baixo nível de lealdade
−
institucional
Diminuição da
− Operário de
linha-de-montagem
confiança informal da DaimlerChrysler,
empresa que registra
Perda do conhecimento
− greves freqüentes,
em foto publicada
institucional pelo site Controle e
Instrumentação
16
17. O capital social
Lealdade, confiança
e conhecimento
relacionam-se com o
modo como as
pessoas se envolvem Montadores da DaimlerChrysler,
em foto do site
com redes sociais Controle e Instrumentação
como: Envolvimento social alto
é igual a capital social alto;
A família
envolvimento social baixo é o
resultado de vínculos pobres com
A escola
as redes sociais
O trabalho
17
18. A falência do modelo
fordista de produção
vista em algumas
rápidas imagens
18
26. Ameaça do fantasma da inutilidade
São três as forças que se
caracterizam como a
moderna ameaça do
fantasma da inutilidade:
Oferta global de
mão-de-obra
Trabalhadores de Burma, que
Informatização ganham menos de US$ 2 por dia,
em foto do site BBC Brasil
Gestão do
envelhecimento
26
27. Oferta global de mão-de-obra
Migração de empregos de
países desenvolvidos para
países em desenvolvimento
não se explica apenas pelos
baixos salários
Trabalhadores de países como
Índia, China, Brasil, Rússia,
são mais qualificados para Trabalhador polonês exibe
bandeira da União Européia
algumas tarefas
à qual a Polônia acabou de
(telemarketing, montagem de se integrar, em foto publicada
motores e confecções) do que pelo site BBC Brasil
os trabalhadores de países
desenvolvidos
27
28. Informatização
A informatização dos processos
acelerou a “extinção de
capacitações”
Pesquisa do Forrester
Técnicos de computador, por
Research divulgada pelo
exemplo, têm que reaprender site BBC Brasil revela
suas técnicas completamente que número de Pcs no
pelo menos 3 vezes ao longo de mundo deve dobrar nos
próximos 3 anos; a
sua vida Lenovo, da foto, empresa
chinesa, deve crescer
O mesmo ocorre com o Direito,
mais do que qualquer
a Medicina e o Jornalismo outra fabricante de
Pcs do mundo
Quando adquirimos uma
capacitação não adquirimos um
bem durável
28
29. Gestão do envelhecimento
A extinção das capacitações
cria um problema para os
trabalhadores com mais idade
As empresas precisarão
escolher entre retreinar alguém
com 50 anos, ou contratar um
jovem com 25 anos, preparado
Trabalhadores franceses
para as modernas tecnologias,
protestam contra lei que
a um custo bem inferior determina que funcionários
públicos tenham que trabalhar
O resultado é que muitos
mais tempo antes de se
ótimos profissionais com mais aposentar, segundo
matéria do site
de 60 anos não têm o que fazer
BBC Brasil
29
30. Da perícia à superficialidade
No século XX, o profissional
especialista, perito, tinha
valor para a organização
porque ele fazia suas
atividades com qualidade
Mas a fragmentação do
trabalho e o avanço da
competitividade está Estudantes franceses protestam
exigindo que o trabalhador contra lei de flexibilização dos
faça as coisas o mais rápido constratos de trabalho proposta
pelo governo francês, em foto
possível para poder se publicada no site BBC Brasil
dedicar a outras coisas
30
31. Aptidão potencial
As organizações do novo
capitalismo criaram o
conceito de “aptidão
potencial”
É a habilidade de aprender
novas capacitações
Photo: Celso Avila / XPress
rapidamente, ao invés de se
aferrar a velhas Lula, um presidente
competências com boa “aptidão
potencial”; abandonou
Esta habilidade é típica do as velhas competências,
perfil de “consultor” faz de tudo um pouco
e quase tudo que faz
Principal capacitação é a de não tem muita
trabalhar bem com qualquer consistência
um
31
32. Conteúdos voláteis
Nas instituições onde os conteúdos
mudam constantemente, é preciso
mobilidade para resolver os problemas
Qualquer envolvimento profundo com
uma atividade seria contraproducente
pois os projetos terminam tão José Augusto Minarelli, que
rapidamente como começam conduziu pesquisa com
200 executivos de grandes
organizações demitidos
Cresce a pressão por resultados
de seus postos
“O quadro é de alerta e exige
Cresce o número daqueles que ficam
uma preocupação genuína por
pelo meio do caminho parte de dirigentes, acionistas e
dos próprios profissionais. Em
um ambiente hostil, onde
Cresce o número de empresas prevalecem ingredientes como
transformações constantes,
“voláteis” busca crescente por
produtividade, pressão contínua
para redução de custos e alta
competitividade, ficam
prejudicadas a realização dos
indivíduos e a perenidade das
organizações”.
32
33. Automóvel Corolla,
da Toyota, em foto
publicada no site
da empresa
CONSUMO
33
34. Plataformas
Produtos, políticas e
ideologias são produzidos
hoje em dia a partir de
plataformas
As bases tecnológicas e
materiais dos produtos são as Embora do ponto de
mesmas vista técnico e de material
utilizado na fabricação
Mudam apenas pequenos não exista diferença entre
o celular da esquerda
detalhes - “laminação a ouro” (Samsung) e o da direita
- que garantem a (Aiko), o primeiro custa
R$ 799,00 e o segundo
“diferenciação” custa R$ 99,00.
Fotos publicadas no site
da Vivo
34
35. Automóveis
A fabricação de automóveis é
um bom exemplo
As plataformas de produção
são idênticas
Busca-se a diferenciação em
pequenos detalhes Carro da Volvo que,
segundo a montadora, foi
Estes detalhes serão os pontos criado por mulheres para
ser vendido ao público
básicos da comunicação via feminino. Entre as
propaganda, que omitirá o fato “vantagens” do carro está
de que o carro anunciado é um dispositivo eletrônico
que avisa a oficina que
igual aos demais em quase o carro está com problemas,
todos os aspectos dispensando a usuária de
ter que perceber eventuais
falhas no automóvel
35
36. Diferencial é via propaganda
SKODA AUDI
Comunicação racional Comunicação emocional
− −
Carro visto por fora e por Carro sequer é visto
− −
dentro (visão é de quem dirige)
Muita informação sobre o Pouca informação sobre
− −
produto (preço, portas, o produto
motor, combustível)
Fotos do site
da Volkswagen
Diferencial é para que o consumidor não faça associação
alguma entre o Audi e o Skoda (ambos da Volkswagen), 36
que são 90% iguais.
37. Indústria da dominação
• Meios de comunicação criam escala de valores
• As diferenças são cunhadas e difundidas
artificialmente
Max Horkheimer
• Hierarquia de qualidades em série serve apenas
para quantificação
• Meios de comunicação impõem valores, hábitos e
comportamento
• Pessoas são reduzidas a material estatístico
• Liberdade resume-se a opção por produtos
diferentes
• A Indústria Cultural trabalha para submeter a
Theodor Adorno
humanidade
1935
37
38. As organizações e a propaganda
Este trecho do filme “A Corporação” mostra
como as organizações ditas de ponta utilizam a
propaganda com objetivos absolutamente
manipulativos
Cena do filme
“A Corporação”
- Basic Training.
38
39. Paixão comsuptiva
O consumidor de hoje não compra
um produto apenas para uso, mas
para tê-lo
Por essa razão, o foco da produção SUV – Carro produzido para
trafegar no deserto em
de qualquer bem, hoje, é a
operações militares é o
“potência”, seja um automóvel ou sonho de consumo do
um Ipod consumidor nos EUA por
ser grande, forte e “impor
Carros com potência para andar
respeito”. No Brasil, o
pelo deserto (SUV), circulam pelas fenômeno se repete com
cidades carros como o Eco Sport, da
Ford, Dobló, da Fiat e Tuareg,
Ipods com capacidade para 10.000 da Volkswagen. Foto de
músicas são usados por pessoas modelo SUV divulgada no
site da sueca Volvo.
que não se lembrariam de 30
músicas de sua preferência
39
40. Consumo de política
Esta forma de consumir
produtos se transferiu para a
política
Pessoas escolhem candidatos
como se fossem produtos
Os políticos são produzidos,
também, em plataformas
Não há diferença de fundo
entre eles Debate entre Kerry e Bush,
transmitido pela TV,
Os políticos, assim como o
que teve regras claras até
Skoda e o Audi, se sobre quanta maquiagem
cada candidato podia usar.
diferenciam apenas nos
Foto publicada pelo
detalhes site BBC Brasil.
40
41. Debate entre iguais
Os partidos Trabalhista e
Conservador da Inglaterra
gastaram 700 horas discutindo
se a caça à raposa devia ser
permitida apenas para
A caça à raposa foi proibida
caçadores que não usassem na Inglaterra para pessoas
cavalos montadas em cavalos.
À pé, pode. Este debate
Esses mesmos partidos
consumiu 700 horas no
discutiram por apenas 180 parlamento britânico,
enquanto questões mais
horas se o Reino Unido
relevantes são decididas
(Escócia, País de Gales, Irlanda em menos tempo porque
e Inglaterra) deveria ter um os partidos não têm
diferenças ideológicas
único parlamento
significativas. Foto publicada
pelo site BBC Brasil.
41
42. Qual a diferença entre estes dois?
Lula (Skoda) FHC (Audi)
“Qualquer homem com mais de “Esqueçam o que eu escrevi”.
60 anos que ainda é de esquerda
42
tem problemas mentais”.
44. O capitalismo social em nossa época
Para resgatar o capitalismo
social como ferramenta de
inclusão, é preciso criar
oportunidades para
restabelecer:
A narrativa na vida das
pessoas
Cepal e BID afirmam que o
A utilidade do indivíduo
número de idosos na América
para a sociedade Latina cresce e a grande maioria
está em situação vulnerável,
A perícia como base
por não contar com programas
para a valorização do assistenciais que garantam
trabalhador uma sobrevivência tranqüila.
Foto publicada no site
BBC Brasil.
44
45. Narrativa
Para resgatar a narrativa, nos EUA
e UK entidades como sindicatos e
clubes estão assumindo funções
alternativas que garantam uma
vida mais estável para seus
associados (como agências de
emprego e planos de saúde) Sindicatos vão assumir mais
do que a defesa do trabalhador
Objetivo é o de dar às pessoas o
do ponto de vista de salário e
senso de “comunidade” perdido emprego; vão, também, garantir
com a fragmentação do trabalho o sentimento de pertencimento
a uma comunidade. Foto
No Brasil, é possível que as igrejas publicada pelo site da
BBC Brasil.
evangélicas estejam assumindo
essa função
45
46. Utilidade
Para garantir que todos sejam
úteis, alguns países ensaiam
soluções inovadoras, como a
partilha de empregos na Holanda
Mãe da Indonésia leva filha à
Os empregos disponíveis são escola. Idéia é que os governos
fragmentados para que todos passem a remunerar estas
pessoas pelo trabalho social
tenham o que fazer o tempo
que praticam. Foto publicada
todo, ainda que trabalhem
pelo site da BBC Brasil.
apenas 3 dias por semana
Ainda neste aspecto, outra
solução é que os governos
passem a remunerar trabalhos
como os de donas-de-casa,
babás, acompanhantes de idosos
46
47. Perícia
Por fim, só a valorização da
perícia, ou seja, a capacidade de
fazer algo bem feito do começo ao
fim, vai ampliar o compromisso
dos trabalhadores com as
empresas onde trabalham
O novo capitalismo apresenta uma
cultura debilitada que será cada Torre da Enron, empresa
vez mais combatida e resultará norte-americana que
faliu fraudulentamente
em fracassos para as organizações
e prejudicou milhares
que a adotarem
de acionistas e
milhares de empregados,
revelando a inconsistência
do “novo capitalismo”, que
foca o lucro a qualquer
custo e a qualquer peço.
Foto do site BBC Brasil. 47
48. Obrigado!
Apresentação desenvolvida com
base no livro “ A cultura do novo
capitalismo”, de Richard Sennett
Armando Levy
Mestre em Teoria e Pesquisa em
Comunicação pela ECA-USP
Diretor da e-Press Comunicação
armando@epress.com.br
(11) 4082 4600
48