O documento discute o câncer como uma doença genética causada por mutações em genes que regulam o ciclo celular, como oncogenes e genes supressores de tumor. Apesar dos avanços no entendimento dos mecanismos da doença, a prevenção e o diagnóstico precoce ainda são as formas mais eficazes de controlar o câncer. O documento também explica as três categorias de displasias e como mutações podem ser herdadas ou ocorrer ao longo da vida.
Apresentação ISBET Jovem Aprendiz e Estágio 2023.pdf
Artigo câncer causas, prevenção e tratamento
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G E N É T I C AG E N É T I C A
Apesar dos bilhões de dólares investidos em pesquisas, especial-
O câncer ainda faz muitas
vítimas em todo o mundo,
apesar da intensa pesquisa
sobre esse mal.
Esse esforço, porém,
permitiu que os cientistas
conhecessem de maneira
detalhada os mecanismos
básicos da doença.
Os maiores avanços
obtidos no tratamento
do câncer nos últimos
tempos foram o aumento
da sobrevida dos pacientes
e até a cura, em certos
casos, mas a prevenção
e o diagnóstico precoce
ainda são as formas
mais eficazes de evitar
ou controlar a doença.
Enilze M. S. F. Ribeiro e
Newton Freire-Maia
Departamento de Genética,
Universidade Federal
do Paraná
mente nas últimas três décadas, a diminuição da
freqüência do câncer na população humana e da ta-
xa de mortalidade dessa doença ainda está bem abai-
xo do que se poderia esperar (figura 1). Isso não sig-
nifica, porém, uma derrota para a ciência: impor-
tantes progressos foram obtidos, em especial no co-
nhecimento dos mecanismos básicos de desenvolvi-
mento desse mal.
Muito do que se sabia sobre certos fatores que
geram ou favorecem o câncer, como o fumo, a dieta
inadequada (responsável por cerca de 10% dos cân-
ceres humanos), a radiação ultravioleta e os agen-
tes de algumas doenças sexualmente transmissíveis
(como o vírus da hepatite B, o vírus da Aids e o papi-
lomavírus humano), vem sendo reavaliado, sob a
ótica de um novo conhecimento. Sabe-se hoje que
todas as formas de câncer decorrem de alterações
no material genético de nossas células. São, portan-
to, doenças genéticas.
Figura 1. Número de casos novos dos tipos
de câncer mais freqüentes na população brasileira
(estimativa para 2002)
Pele não
melanoma
70.000
60.000
50.000
40.000
30.000
20.000
10.000
Mama
feminina
Próstata Traquéia
Brônquio
e pulmão
Feminino
Masculino
Estômago Cólon
e reto
Colo do útero Boca
CÂNCER
2. dezembro de 2002 • CIÊNCIA HOJE • 35
G E N É T I C AG E N É T I C A
Causas, prevenção e tratamento
O que é câncer?
A denominação comum de ‘câncer’ abrange mais de
uma centena de enfermidades, já que cada tecido do
organismo humano pode desenvolver uma ou mais
doenças malignas. O que todas essas doenças têm em
comum é principalmente a proliferação desordena-
da das células e a capacidade que algumas têm de
se desprender do bloco inicial e migrar até outro
local, onde se implantam e geram novos focos (ou
metástases).
As células normais só se reproduzem quando são
instruídas para isso, e seguem uma seqüência coor-
denada de eventos chamada de ‘ciclo celular’ (figu-
ra 2). As células cancerosas, ao contrário, passam a
seguir um programa próprio e desordenado de re-
produção. No início do processo, uma célula que já
tem alterações em seu material genético (mutações)
específicas nesse sentido, herdadas ou ocorridas ne-
la própria, sofre uma nova mutação, por acaso ou
Figura 2. O acúmulo de mutações ocorridas
durante o ciclo celular é responsável
pelo surgimento do câncer
(ARTE:
ELIMINAR
DA
FIGURA O
QUEESTÁ
NO MEIO
DO CICLO:
‘CDK’ E
‘CICLIN’.)
Síntese de DNA
Duplicação
dos cromossomos
Célula com
cromossomos duplicados
Separação dos
cromossomos
Divisão da célula
G1
M
G2
S
Mitose
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G E N É T I C A
por indução de um agente capaz de gerar câncer
(oncogênico), o que completa a ação desordenado-
ra do processo de reprodução.
Essa mutação complementar dá à célula cancero-
sa uma capacidade de reprodução superior à de suas
irmãs do mesmo tecido – uma vantagem ‘seletiva’! –
e ela começa a se dividir, desrespeitando as regras de
bom funcionamento do tecido. Forma-se, assim, um
aglomerado não programado, que cresce a um ritmo
superior ao das células normais à sua volta: um
tumor. Usualmente isso ocorre décadas antes que
esse aglomerado seja clinicamente detectável. Sua
transformação em um tumor maligno ocorrerá atra-
vés do acúmulo de mutações em classes específicas
de genes envolvidos na regulação da proliferação
celular (figura 3).
Os genes responsáveis
Doisgruposprincipaisdegenes,queconstituemuma
pequena fração do nosso genoma, estão entre os
principais responsáveis pelo desencadeamento do
processo canceroso. Em sua forma normal, eles con-
trolam o ciclo celular: os ‘protooncogenes’ estimu-
lam a divisão da célula, enquanto os ‘genes su-
pressores de tumor’ inibem o processo. Quando so-
frem mutação, os ‘protooncogenes’ tornam-se
oncogenes, levando a célula a se multiplicar em
excesso. Ao contrário, os ‘genes supressores de tu-
mor’, que contêm instruções para a produção de
proteínas que evitam o crescimento celular ina-
propriado, favorecem a instalação do câncer quando
são inativados por mutações.
Normalmente, quando uma substância denomi-
nada ‘fator de crescimento’ liga-se ao seu receptor
específico na membrana da célula, o receptor emite
um sinal para proteínas presentes no citoplasma.
Estas, por sua vez, emitem sinais de estímulo, em
cascata, a uma série de outras proteínas. Quando
esses sinais chegam ao núcleo, outras proteínas ali
presentes, denominadas ‘fatores de transcrição’, ati-
vam os genes que conduzirão a célula através do ci-
clo celular.
Alguns oncogenes levam as células a produzir
fatores de crescimento em excesso, levando a uma
hiperproliferação. Também já foram identificadas
versões oncogênicas de receptores, capazes de libe-
rar sinais de estímulo para o citoplasma mesmo na
ausência de fatores de crescimento. Outros oncoge-
nes afetam a cascata de sinais no citoplasma, en-
viando sinais ao núcleo mesmo não sendo estimula-
dos para isso. Um oncogene bastante estudado que
age assim é o RAS, que apresenta mutação em cer-
ca de 30% dos tumores humanos, incluindo os de có-
lon, pâncreas e pulmão. Finalmente, outros onco-
genes, como os do grupo MYC, alteram a atividade
dos fatores de transcrição dentro do núcleo.
Para se tornarem malignas, as células, além da
proliferação acelerada, precisam ignorar os sinais
inibitórios normalmente emitidos pelas proteínas
produzidas pelos genes supressores de tumor. Na
verdade, esses sinais estão inativos ou ausentes em
muitos tipos de células cancerosas, deixando-as sem
o controle de quando devem parar de se dividir ou,
no caso de lesões do DNA, sem o tempo necessá-
rio, durante o ciclo celular, para que ocorra o repa-
ro dessas lesões – isso acontece, por exemplo, nas
mutações do gene TP53, que impedem o prolonga-
mento do ciclo celular (o que garante tempo hábil
para o reparo).
Por ser necessário um acúmulo de mutações no
DNA, pode levar várias décadas até que um câncer
seja formado e depois detectado. Como explicar,
então, os cânceres nas crianças? Em muitos casos, o
início precoce pode ser explicado pela herança de
um gene mutante: a criança já nasce com um gene
supressor mutado e inativo, precisando apenas de
mais uma mutação em alguma célula para o
surgimento da doença. Com isso, o desenvolvimen-
to do tumor, que exigiria três ou quatro décadas, po-
de ser atingido em uma ou duas, ou menos.
Esses genes mutantes podem ser transmitidos
de uma geração para outra. Assim, várias pessoas da
mesma família terão um risco maior de desenvol-
ver a doença. Os cânceres de cólon e de mama são
exemplos: ambos podem surgir de forma esporádi-
ca, como resultado do acúmulo de mutações no-
vas, mas, em algumas famílias, vários indivíduos são
afetados devido à mutação em um gene herdado.
Figura 3. Uma seqüência de mutações em uma mesma célula faz
com que se torne maligna, segundo a teoria clonal do câncer
Célula
normal
Célula maligna
Primeira
mutação
Segunda
mutação
Terceira
mutação
Quarta
ou outras
mutações
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G E N É T I C A
Para muitos tumores, o gene responsável já é
conhecido. Com a recente conclusão do seqüen-
ciamento de quase todo o DNA humano, pelo Pro-
jeto Genoma, espera-se que a lista de genes de
suscetibilidade ao câncer aumente rapidamente.
Outras etapas – a identificação dos produtos desses
genes, da função de cada um e das interações entre
eles – ampliarão as possibilidades tanto da realiza-
ção de análises que identifiquem os indivíduos de
alto risco quanto do desenvolvimento de novas es-
tratégias de tratamento. Conhecendo as caracterís-
ticas moleculares de cada tumor, os médicos pode-
rão direcionar o tratamento, restaurando a norma-
lidade ou eliminando apenas as células alteradas,
sem prejuízo para as normais, como ainda ocorre
nas terapias convencionais.
Embora a vitória sobre o controle do câncer ain-
da não tenha sido atingida, ficamos com a esperan-
ça de que, graças ao progresso dos conhecimentos
sobre os aspectos básicos e de prevenção, possa-
mos obter uma redução altamente significativa na
prevalência da doença (sua freqüência na popula-
ção) e na sua taxa de mortalidade.
Uma doença genética
O Projeto Genoma Humano – primeiro passo para
decifraramensagemgenéticacontidaemnossoDNA
– concluiu que em cada célula, dos muitos trilhões
existentes em nosso organismo, existem, em dose
dupla, cerca de 35 mil a 45 mil genes (figura 4). Esse
número é muito inferior aos 100 mil estimados pela
genética clássica. Entre os genes humanos já descri-
tos, cerca de 100 seriam protooncogenes e cerca de
30 seriam supressores de tumores. Obviamente, a
quantidade de cada um desses dois tipos de genes
devesermaior,masmuitosaindanãosãoconhecidos.
Como visto, os protooncogenes podem, quando
sofrem uma mutação, se tornar oncogenes e coope-
rar para a formação de um câncer. Já os supressores
de tumor podem sofrer mutações e perder sua capa-
cidade de ‘inibidores’, permitindo o surgimento de
um câncer. Isso torna o câncer uma doença genéti-
ca, isto é, controlada por genes.
Mas não se deve confundir ‘genético’ com ‘here-
ditário’. Cerca de um décimo do total de cânceres
conhecidos são hereditários, isto é, tendem a ocor-
rer várias vezes na mesma família. Nesses casos, os
agentescarcinogênicos(fumo,radiação,algunsvírus
etc.) têm menor influência, pois as pessoas já nas-
cem com uma ou mais mutações geradoras (ou
possibilitadoras) de câncer. Assim, bastam algumas
poucas mutações a mais para que a doença se mani-
feste. A taxa de ocorrência de tais mutações é muito
baixa, e ainda não se conseguiu calculá-la para os
genes geradores ou possibilitadores de câncer. No
entanto, para outras situações, tanto no homem
quanto em outros seres vivos, a taxa é estimada em
torno de uma mutação para cada conjunto de
100 mil células (1/100 mil).
As células passam por uma oportunidade de
mutação a cada vez que se dividem. Como todos de-
rivamos de apenas uma célula (ovo ou zigoto), que
resulta da fecundação de um óvulo por um esper-
matozóide, e temos, quando adultos, muitos trilhões
decélulas,éfácildeduzirque,duranteavida,aquan-
tidade de oportunidades para que ocorra uma mu-
tação em nossas células é imensa. Por isso, o câncer
é mais freqüente nos velhos.
Uma vez que o câncer é uma doença genética,
decorrente de mutações herdadas pelo indiví-
duo ou ocorridas nele, e que a maioria delas é
inevitável e cumulativa, vê-se que é impossível
eliminá-lo. Podemos apenas identificá-lo mais
precocemente, combatê-lo com maior vigor,
extirpá-lo ou curá-lo, mas a possibilidade de sua
volta está inscrita no próprio mecanismo da vi-
da e de sua evolução.
Três tipos de displasias
Os distúrbios do desenvolvimento de tecidos são
chamados de displasias. Em relação à malignidade,
as displasias podem ser subdivididas – segundo os
autores deste artigo – em três tipos:
DNA
Cromossomos
Célula
Gene
Figura 4. Os genes são os trechos do DNA que contêm
informações essenciais à vida
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G E N É T I C A
1 Displasias não-malignas. São a maioria. As
displasias ectodérmicas, que afetam os pêlos, a den-
tição, as unhas, a sudação etc., são muito conhecidas
(o ectoderma é a camada mais externa de células no
embrião, e dá origem à epiderme, às mucosas e ao
sistema nervoso). Atualmente, são conhecidas 192
dessasdisplasias,comoconstatouobioquímicoToni
Lisboa-Costa, em pesquisa de pós-graduação na Uni-
versidadeFederaldoParaná.Essasdisplasiassão,em
geral, hereditárias. Outros exemplos são os calos,
manchas e verrugas, displasias comuns e por isso
bem conhecidas.
2 Displasias pré-malignas. Os pólipos (tumores
das mucosas) do intestino grosso, que ocorrem na po-
lipose hereditária, são exemplos. Tais pólipos são pre-
cursores de câncer, e sua extirpação evitará o apareci-
mento da doença. A lesão do colo do útero produzida
pelo papiloma-vírus humano (HPV) é outro exemplo.
3 Displasias malignas ou cânceres. Nesse caso, a
célula inicial sofre uma mutação específica que,
somada ao efeito de outras mutações, faz com que
percaoritmonormaldemultiplicação,passandoase
dividirmaisrápidodoqueonormal.Forma-se,então,
um tumor, e as células deste, além da multiplicação
acelerada, apresentam graves defeitos em uma etapa
essencial da divisão celular: a duplicação dos
cromossomos e sua separação em números e conteú-
dos iguais para as células-filhas. As células integran-
tes do tumor, portanto, são anômalas quanto à sua
constituição cromossômica – condição chamada de
‘instabilidade cromossômica’ (figura 5).
Como prevenir o câncer
O ideal, em termos de prevenção, é a descoberta da
displasia na fase pré-maligna ou de tumores em
estágios iniciais, seguida de sua total extirpação. Isso
é possível hoje em alguns casos (câncer do intestino
grosso, da pele, da mama e do colo do útero, por
exemplo), mas ainda é impensável para a imensa
maioria dos casos.
Infelizmente, todo o conhecimento atual sobre
as causas do câncer não trouxe os resultados prá-
ticos desejados no sentido de diminuir a freqüên-
cia da doença ou sua taxa de mortalidade. O pouco
que se sabe sobre essas causas permite, no entan-
to, elaborar uma pequena lista de conselhos e
sugestões que podem reduzir a ocorrência da
doença:
a Não fume. Acredita-se que o uso do tabaco seja
responsável por cerca de 50% das mortes por câncer.
Se você é fumante, deixe esse hábito imediatamente.
b Evitecarnesvermelhasesubstânciasgordurosas.
Suspeita-se que cerca de 10% das mortes por câncer
possam ocorrer em conseqüência da ingestão desses
alimentos. Prefira comer legumes, frutas, frutos do
mar etc.
c Nãoabusedoálcool,emespecialsevocêéfumante.
d Radiologistas (incluindo dentistas), radiotera-
peutas e seus assistentes e técnicos devem se expor
o mínimo possível aos raios X usados para diagnós-
tico e tratamento. Raios X têm grande utilidade, mas
são oncogênicos, o que justifica a proteção.
e Os especialistas vêm notando um significativo
aumento na freqüência do câncer de pele, cuja causa
principal parece ser o excesso de exposição ao Sol,
principalmente em certas horas do dia. Evite, sem
exceções, banhos de sol entre 10 h e 16 h, período do
diaemquearadiaçãoultravioletavindadoSolémais
intensa. Os filtros solares devem ser usados mesmo
em dias não ensolarados e, por pessoas de pele clara,
até dentro de casa. Um fator que vem aumentando o
potencial cancerígeno da radiação ultravioleta é a
redução, causada por gases industriais, da espessura
da chamada camada de ozônio. Essa camada fica na
estratosfera, a dezenas de quilômetros de altura, e
protege os seres vivos contra a radiação ultravioleta.
O ozônio (O3
) – que tem três átomos de oxigênio em
sua molécula, em vez de dois, como no oxigênio
comum (O2
) — é capaz de absorver essa radiação,
evitando que chegue à superfície da Terra, mas sua
destruição pelos gases industriais enfraquece essa
proteção.
Figura 5. Em uma célula cancerosa que
apresenta alterações cromossômicas,
estas são visualizadas por trocas de cores
nos cromossomos (marcados antes
com cores bem definidas)
6. dezembro de 2002 • CIÊNCIA HOJE • 39
G E N É T I C A
f Use sempre preservativos nas relações sexuais.
Eles evitarão a contaminação pelos vírus da Aids e da
hepatite B e pelo papiloma-vírus, responsáveis por
diferentes tipos de câncer.
g Faça exames preventivos anualmente. A detec-
ção precoce possibilita a cura ou a extirpação na
grandemaioriadostumores.OtestedePapanicolaou
é particularmente importante para eliminar as le-
sões pré-cancerosas do colo do útero, evitando que a
doença se desenvolva. Outros exames, como toque
retal, dosagem do PSA e biópsia, são essenciais na
prevenção e na extirpação do câncer de próstata.
h Se em sua família há casos de câncer dito here-
ditário (do intestino grosso, da mama), entre em
contatoimediatocomumespecialistanoassunto.Em
muitos casos, será possível evitar o aparecimento
da doença em você.
i Como o câncer é mais comum nos velhos, tome
todas as medidas de precaução com mais assiduida-
de e rigor à medida que for envelhecendo. A idade
avançada é, para alguns especialistas, o mais impor-
tante fator de risco para o câncer. Esse fator de risco
é inevitável. Por isso, trate de evitar todos os outros.
Avanços no tratamento
Com os notáveis progressos no conhecimento das
causas do câncer, era de se esperar que o desenvolvi-
mento terapêutico fosse beneficiado, levando a gran-
de aumento da sobrevida e da qualidade de vida dos
pacientes, após o diagnóstico. Infelizmente, ainda
não é possível inativar oncogenes ou reativar genes
supressores. Os progressos terapêuticos acontece-
ram, nas últimas décadas, nas áreas tradicionais da
radiação X, dos quimioterápicos e da hormonio-
terapia. Esses progressos possibilitaram certo au-
mento das taxas de sobrevida para todos os tipos de
câncer (figura 6).
Uma vez estabelecido o tumor, as células anôma-
las reproduzem-se rapidamente e de modo errado,
gerando células com instabilidade cromossômica.
As células defeituosas têm ainda as propriedades de
infiltração e metástase – isto é, podem migrar para
perto ou longe e gerar tumores secundários. Uma vez
instalados esses múltiplos focos, a solução seria a
descoberta de um método capaz de destruir as célu-
las anômalas sem afetar as normais, mesmo que
estejam lado a lado.
Várias tentativas têm sido feitas, algumas aparen-
temente bem sucedidas. Um exemplo é o de um
medicamento recentemente aprovado para o trata-
mento da leucemia mielóide crônica, um tipo de
câncer sangüíneo. A droga destrói especificamente
células cancerosas, através da identificação de uma
proteína anormal produzida por elas.
Outras boas notícias têm surgido na área da qui-
mioprevenção, especialmente no caso de cânceres
femininos, como os de mama, ovário e endométrio
(revestimento interno do útero). O tamoxifeno (dro-
ga que interfere na atividade do estrogênio), por
exemplo, tem sido um importante auxiliar não ape-
nas no tratamento do câncer mamário (prevenindo,
em muitos casos, o aparecimento do tumor na outra
mama), mas também na prevenção em mulheres
com risco elevado de desenvolvimento da doença.
Espera-se que essa droga interrompa o aumento da
incidência do câncer de mama. Outra abordagem
ainda em estudo é a terapia antiangiogênica (que
impede a formação dos vasos sangüíneos, através
dos quais os tumores recebem nutrientes), mas os
resultados ainda não são os esperados.
O aumento da sobrevida – e mesmo a cura, em
certos casos – devem ser mencionados como os
grandes progressos obtidos nas últimas décadas do
século 20. Apesar desses avanços, as medidas pre-
ventivas e o diagnóstico precoce ainda são as armas
mais potentes de que a medicina dispõe para dimi-
nuir a freqüência do câncer e das mortes causadas
por ele. I
Figura 6. A taxa de mortalidade (nos Estados Unidos)
dos principais tipos de câncer mudou pouco entre 1990 e 2000
Pulmão
1990
2000
Pulmão
MortesMortes
Mama
Mama
Próstata
Próstata
Cólon e reto
Cólon e reto
120.000
120.000
100.000
100.000
80.000
80.000
60.000
60.000
40.000
40.000
20.000
20.000
Feminino
Masculino
Sugestões
para leitura
BORGES-OSÓRIO,
M.R.&
ROBINSON,W.M.
Genética
humana, Porto
Alegre, Ed.
Artmed,2001.
Vários autores.
‘What you need
to know about
cancer’, in
Scientific
American
(‘Specialissue’),
p. 61, setembro
de 1996.
Vários autores.
‘Cancer’,in
Nature (‘Special
issue’),v.411,p.
335, maio de
2001.
Website do
Instituto
Nacional do
Câncer:
www.inca.gov.br