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A pesquisa fenomenológica e a enfermagem


Maria Dalva de Barros Carvalho1* e Elizabeth Ranier Martins do Valle2
1
 Departamento de Enfermagem, Universidade Estadual de Maringá, Av. Colombo, 5790, 87020-900, Maringá, Paraná, Brasil.
2
 Escola de Enfermagem, Universidade de São Paulo, Av. Bandeirantes, 3900, Campus Universitário, 14040-902, Ribeirão
Preto, São Paulo, Brasil. *Autor para correspondência.

              RESUMO. Este trabalho tece considerações sobre a fenomenologia como método de
              pesquisa na enfermagem. Aborda as questões básicas da fenomenologia e aponta fenômenos
              humanos passíveis de serem investigados por essa metodologia. Destaca o aspecto
              humanizador da ciência na pesquisa fenomenológica e sua importância para a enfermagem,
              uma vez que sua prática é com o homem, precisando compreendê-lo no seu mundo vivido.
              O cuidar, finalidade da enfermagem, implica a coexistência e a participação na compreensão
              da vivência de estar doente, de estar são, de estar em equilíbrio, de estar vivendo.
              Palavras-chave: enfermagem, fenomenologia, pesquisa.

              ABSTRACT. Phenomenological research and nursing. Phenomenology as a research
              approach in nursing is provided and analyzed. The study investigates the basic problems of
              phenomenology and pinpoints human phenomena that may be focussed upon by this
              methodology. The humanizing aspect of science and its importance for nursing is
              highlighted as one of the characteristics of phenomenological research. This is due to the
              fact that nursing deals with people who require comprehension in the context in which they
              live. Caring, the aim of nursing, implies in coexistence and participation, in the
              comprehension of being sick, healthy, balanced, in being alive.
              Key words: nursing, phenomenology, research.


    O homem, como mero organismo, máquina em                       A enfermagem no seu desenvolvimento histórico
funcionamento, onde a soma das partes, e apenas                em direção à cientificidade também trilhou e trilha
essa soma, completa o ser, é, como geralmente tem              os caminhos da ciência dita positiva. Nesse seu
sido visto pelas ciências das áreas de saúde.                  trajeto em busca da maioridade científica, a
    A pesquisa nessas áreas tem procurado                      enfermagem inspirou-se no modelo tradicional
estabelecer causas para explicar os fatos que ocorrem          biomédico das ciências naturais e experimentais. O
com o ser humano. No estabelecimento da relação                modelo biomédico obedece às exigências do
linear de causa-efeito, esse tipo de investigação              positivismo, que não aceita o conhecimento que não
recorre ao dedutivismo, à repetição dos eventos para           venha da experimentação.
o estabelecimento de uma generalização, quer dizer,                As pesquisas que favoreceram a sistematização de
ao objetivo, ao científico. Isso pressupõe uma                 um saber específico da enfermagem caracterizaram-
separação radical entre o estudioso e o seu objeto de          se por esse teor positivista, concreto, palpável,
investigação, de tal modo que ele, cientista apenas            comparável. Esse direcionamento no pensar e no
reflita de forma objetiva sobre o que deseja                   fazer pesquisa acabou influindo decisivamente na
conhecer. Vista dessa forma, a investigação funda-se           prática da enfermagem. Passou de um fazer
na experimentação, que acaba se transformando na               empírico, assistemático, a uma prática voltada para o
fonte de verdade para o conhecimento.                          objetivo, para os resultados, para o fim em si mesmo.
    Dessa forma, essa modalidade de pesquisa está                  Com o vigoroso avanço científico dos últimos
voltada para a observação dos fatos e para o                   tempos,     a    enfermagem        sofreu   profundas
significado destes, considerando-os em si mesmos               modificações, que se caracterizaram principalmente
(Forghieri, 1993).                                             pela fragmentação, pela compartimentalização do
    O conhecimento, ou seja, a ciência, nessa                  objeto de seu cuidado. Como conseqüência lógica e,
perspectiva, é conceituada como uma sistematização             poderíamos dizer inevitáveis, dessa fragmentação,
metodológica, limitando-se aos fatos que podem ser             surgiram e se impuseram de forma efetiva as regras,
verificados e às relações constantes entre eles.               rotinas, normas e regulamentos, que acabaram por

Acta Scientiarum                                                                   Maringá, v. 24, n. 3, p. 843-847, 2002
844                                                                                                    Carvalho & Valle

massificar o cuidado de enfermagem. Mais do que          conhecimento, há uma vida operante (Martins et al.,
isso, esse cuidado se tornou de tal modo impessoal       1990).
que se referia mais à doença que ao homem,                   Assim, voltada para a experiência, a reflexão
perdendo a visão do todo humano. A sofisticada           fenomenológica inclui a possibilidade de olhar as
tecnologia, os aparatos mecânicos que possibilitaram     coisas como elas se manifestam.
o prolongamento artificial da vida, os transplantes, a       Experienciando-se o mundo, este se abre para o
obstinada luta contra a morte e a doença, colocaram      homem, e esse abrir para o homem, esse se desvelar
o homem e sua humanidade em segundo plano,               para o homem, é o fenômeno1.
quando do assistir, do cuidar da enfermagem.                 A preocupação da fenomenologia é descrever o
     A Sistematização da Assistência de Enfermagem       fenômeno, não explicá-lo; é compreendê-lo, não
compreendida como ordenamento e direcionamento           achar relações causais. A descrição rigorosa do
ao trabalho do enfermeiro, como metodologia da           fenômeno é que permite chegar à sua essência2.
profissão de enfermeira (George, 1993), que permite          Ao se voltar para as coisas mesmas e para o
uma prática sistemática, objetiva, científica, não       mundo vivido, objetivando apreender a essência do
escapa também da armadilha da perda da                   fenômeno, acaba-se por negar sujeito e mundo
humanidade do indivíduo a quem essa assistência          como existentes independentes um do outro. O
está sendo prestada.                                     objeto do conhecimento não é nem o sujeito, nem o
     Ferraz et al (1991), em relação a essa faceta do    mundo, mas o mundo enquanto vivido pelo sujeito.
exercício profissional, comenta que a Sistematização     Essa concepção põe em evidência o conceito de
da Assistência de Enfermagem tem favorecido a            intencionalidade da consciência, isso é, a sua direção.
normatização        do      cuidado,     que     acaba       Segundo Chauí (1996), a consciência não é uma
homogeneizando e massificando a assistência,             substância, mas uma atividade constituída por atos,
através de planos rotinizados, privilegiando a           com os quais ela visa algo. Os atos da consciência são
patologia, a terapêutica e a tecnologia.                 noesis3 e o que é visado por ela são os noemas4.
     Estes caminhos de investigação e assistência            Todos os atos humanos são intencionais e essa
embora dicotomizem a relação sujeito/objeto, não se      intencionalidade sempre é um comportamento
mostram, suficientes para desvendar as complexas         dirigido a alguma coisa no mundo. A consciência
situações que envolvem as relações saúde-doença e o      portanto, é sempre consciência de alguma coisa. Ela
cuidar em enfermagem. É forçoso reconhecer a             só é consciência quando dirigida para um objeto, e o
necessidade de um novo modo, uma nova forma de           objeto só pode ser definido em relação com a
ver o homem, de investigá-lo e, nesse caso, o            consciência, ele é sempre objeto para um sujeito
homem na relação saúde-doença e o homem no               Dartigues, (1973). Daí se conclui que consciência e
cuidar na enfermagem, na sua totalidade,                 objeto não são entidades separadas, mas que se
analisando-o como ser concreto que vive o                definem a partir dessa correlação entre o interior que
fenômeno na totalidade de sua existência (Ferraz et      se volta e o objeto para o qual ele se volta. Sujeito e
al., 1991).                                              objeto estão intimamente ligados. Dessa forma, a
     Colocada como a terceira via entre o positivismo    fenomenologia não vê o homem separado do
e o discurso especulativo da metafísica, a               mundo, mas busca focalizar a forma pela qual o
fenomenologia aparece como método alternativo de         mundo se apresenta ao homem. Assim, o mundo
pesquisa. Como qualquer outro, não é o único nem         pode ser considerado como fenômeno, como ele se
o melhor, mas uma trajetória escolhida pelo              mostra ao homem (Merleau Ponty, 1994) .
investigador e que tem significado para ele. Essa
terceira via é aquela que, antes de todo raciocínio,
colocaria-nos no mesmo plano da realidade, ou            1
                                                             Fenômeno : Tudo que se mostra, se manifesta, se desvela para
como diz Husserl, das “coisas mesmas” (Dartigues,            a consciência. Do grego fainomenon significa discurso
                                                             esclarecedor a respeito daquilo que se mostra para o sujeito
1973).                                                       interrogador (Martins e Bicudo, 1989).
     A fenomenologia tem como princípio que o que        2
                                                             Essência: visão do sentido ideal que atribuímos ao fato
fundamenta todas as ciências é uma volta ao mundo            materialmente percebido e que nos permite identificá-lo
                                                             (Dartigues, 1973).
da experiência, ao mundo vivido. Essa postura            3
                                                             Noesis: aspecto subjetivo da vivência, constituído por todos os
rompe de modo definitivo com o modelo das                    atos de compreensão que tendem a apreender o objeto, como o
                                                             perceber, o recordar, o imaginar.
ciências naturais: antes da realidade objetiva há um     4
                                                             Noemas: aspecto objetivo da vivência, ou seja, o objeto
sujeito conhecedor, antes da objetividade há o               considerado pela reflexão em seus diferentes modos de ser
horizonte do mundo e antes do sujeito, da teoria do          dado (por ex: o percebido, o recordado, o imaginário). O objeto é
                                                             distinto do noema, por exemplo, o objeto de percepção da arvore
                                                             é a arvore, mas o noema desta percepção é “o percebido
                                                             enquanto tal” (Abbagnano, 1986).

Acta Scientiarum                                                                 Maringá, v. 24, n. 3, p. 843-847, 2002
A pesquisa fenomenológica e a enfermagem                                                                                   845

    Essa possibilidade de abertura, de ir em direção                   Na compreensão está sempre subentendida a
às coisas mesmas, àquilo que vai se apresentar como               interpretação. Ela possibilita ao investigador aceitar
fenomenal, no sentido do que se mostra à                          os resultados da redução como afirmativas que têm
experiência, exige um olhar cuidadoso, meditativo.                significados para ele, “mas que apontam para a
Esse olhar deve preceder qualquer teoria,                         experiência do sujeito, isto é, apontam para a consciência que
preconceitos, crenças ou explicações, quando o                    este tem do fenômeno” (Martins, 1992). A interpretação
fenômeno se mostra.                                               refere-se ao fenômeno que é percebido e vivido; na
    Esse olhar é o que Husserl chamou de epoché:                  realidade trata-se de interpretar a existência.
suspensão ou parada; uma saída da maneira comum                        Retomando a pesquisa em enfermagem nos
de olhar e abandonar os preconceitos e pressupostos               moldes das ciências naturais, certos fenômenos, tais
em relação a ela (Martins et al. 1990). Significa                 como: morte, vida, saúde, doença, dor e sofrimento,
suspender as crenças referentes ao mundo natural,                 que habitam o mundo cotidiano da profissão, não se
assumindo uma atitude neutra, não no sentido de                   permitem ser atingidos em sua compreensão. Assim,
negar o mundo ou as experiências, mas sim, de                     “o conceito de saúde, bem como o conceito de vida, não são
refletí-los e questioná-lo. Isso possibilita o emergir            definidos com precisão. A doença é uma facticidade não só do
do sentido de fatos que não tinham sido observados.               corpo de alguém, mas de todo o seu ser humano, de ser-no-
    Com essa atitude, a trajetória fenomenológica                 mundo” (Capalbo,1994).
procura estabelecer um contato direto com o                            A pessoa que fica doente não está só, está em
fenômeno que está sendo vivido. Para compreender                  relação com os outros, estes são co-presentes. Se
esse fenômeno é preciso então buscar a descrição da               uma das finalidades da enfermagem é o cuidar do
experiência pelos sujeitos que o vivenciam. A                     outro, isso implica a coexistência e a participação, na
essência objetivada pela fenomenologia não é um                   compreensão da vivência de estar doente:
conteúdo conceitual passível de definição, mas uma                compreender.
significação da essência existencial, que como tal                     No mundo da vida da enfermagem, no seu
deve ser descrita. Essa descrição deve ser a mais                 aspecto profissional, está inserida a consciência
natural e espontânea possível; não é opinião nem o                intencional desses profissionais. De acordo com
que se pensa, mas o que o sujeito está                            Capalbo (1994), essa consciência se volta para o
experienciando. Uma palavra, uma definição não                    mundo e retorna para si mesma. Ela se abre para o
poderá dizer o que há a dizer. É preciso recorrer ao              mundo e aos outros no entrecruzamento de suas
discurso, à descrição, para a aproximação maior                   experiências vividas e se volta para si mesma como
possível da densidade semântica do fenômeno                       consciência de si, centro irradiador de intenções,
humano (Rezende, 1990).                                           desejos, vontades, sentimentos e ações, como um
    A descrição de experiência por quem vivencia                  ego temporal e histórico.
um fenômeno é o caminho para a compreensão dele,                       A pesquisa fenomenológica na enfermagem
e a linguagem é uma das formas que se abrem para                  alerta no sentido de que fenômenos como saúde-
essa compreensão. A linguagem não tem função                      doença, vida-morte, relações enfermeiro-paciente,
apenas de comunicação, mas também de revelação                    não podem ser compreendidos isolados da pessoa
de um ser que existe em si e para os outros, como                 que os vive concretamente na totalidade de sua
singular e idêntico (Augras, 1981). A linguagem,                  existência. É preciso compreender o fenômeno no
poratanto, não é só um modo de expressão, mas nela                ser que o vivencia, numa maneira humana de existir,
se manifesta a essência daquilo que somos. Para                   na qual esse ser concreto está existencialmente
Heidegger toda compreensão se consuma na                          confrontado (Capalbo, 1994).
linguagem.      A     totalidade   significativa   da                  Tratar essas questões sob o prisma objetivado do
compreensibilidade vem à palavra (Heidegger,                      empirismo, longe da situacionalidade de quem o
1995)5.                                                           experiência, é não estar comprometido com a
    Compreender um comportamento humano é                         autenticidade do mundo-vida, mais do que isso, é
percebê-lo do interior, do ponto de vista da intenção             acreditar que o fenômeno se esgota em si mesmo, e
que o anima, logo, naquilo que o torna                            não que ele se dá em perspectiva, havendo sempre
propriamente humano e o distingue de um                           facetas a serem desveladas.
movimento físico (Dartigues, 1973).                                    O trabalho da enfermagem é com o humano, o
                                                                  que propicia o olhar fenomenológico para o outro
5
    “A compreensibilidade do ser-no-mundo, trabalhada por uma     situado no mundo em sua totalidade de vida. Ele está
    disposição, se pronuncia como discurso. Existencialmente, o   no mundo de maneira dinâmica; não é pronto e
    discurso é linguagem porque aquele ente, cuja abertura se
    articula em significações, possui o modo de ser-lançado-no-   acabado, mas um vasto horizonte de possibilidades,
    mundo, dependente de um mundo” (Heidegger, 1995, p.220).

Acta Scientiarum                                                                        Maringá, v. 24, n. 3, p. 843-847, 2002
846                                                                                                Carvalho & Valle

que vão se concretizando ou não, no transcorrer de          pelo ser, com possibilidades, vitórias ou derrotas
sua existência, através da liberdade.                       (Olivieri, 1985). Por isso o pesquisador deve ser
    Existe, então, uma inter-relação e uma                  engajado, compromissado com o ser humano. A
interdependência entre enfermeiro e o ser humano            participação do pesquisador então é inevitável, e sua
que é cuidado e investigado, sendo possível afirmar         presença não é apenas física, ele carrega também sua
que um e outro são sempre sujeitos e objetos que se         visão de homem e de mundo, que precisa ser
inteiram e interagem para uma consciência. Nesse            explicitada.
sentido, a fenomenologia se mostra como um                      A relação pesquisador / sujeito deve ter como
caminho importante para a pesquisa e,                       suportes a cooperação e a participação. O sujeito não
conseqüentemente, para a prática em enfermagem,             pode se sentir questionado, avaliado; ele, seu
já que é um chamado à reflexão, à compreensão, algo         discurso e suas ações podem ser a chave para a
inerente ao ser-humano, e um contraponto “às teorias        compreensão das situações investigadas, permitindo
do conhecimento, modelos de enfermagem e mais um            ao pesquisador penetrar no seu mundo vivido.
universo tecnológico presente” (Ferraz et al., 1991) que        Estimular o sujeito a participar da investigação é
acabam impedindo o pesquisador de enxergar o                colocá-lo por inteiro na situação, e desse modo,
simples, esquecendo o fundamental.                          facilitar a cooperação e a participação.
    O caminho fenomenológico não pode ser                       A coleta de dados manifesta-se como
imposto ao pesquisador, sequer sugerido. Precisa ser        intersubjetividade, já que é o encontro entre o
basicamente uma opção, uma visão de mundo.                  sujeito que conhece e vivencia uma situação e o
Sendo assim, a postura do investigador difere               pesquisador que a desconhece.
fundamentalmente da do pesquisador das ciências                 A atitude de empatia, o diálogo, a liberdade e a
naturais, pois procura compreender o homem como             cooperação do investigador que vai favorecer a
sujeito que tem seu mundo vivido para ser desvelado         compreensão, levam ao alargamento de seu
e, para tanto, vai buscar sentido nas suas falas e          horizonte, fundindo-o com o horizonte do
ações. Empatia, integração, participação, diálogo,          pesquisado.
liberdade       pessoal       e    social,      encontro,       À fenomenologia coube mostrar outro caminho
intersubjetividade, perpassam uma situação de               de opção além da ciência dita positiva, voltar ao
pesquisa nessa modalidade (Capalbo, s.d.).                  mundo da vida, humanizar a ciência, buscar um
    O adoecer e o morrer são algumas das inúmeras           sentido para as coisas. É preciso mais que conhecer a
possibilidades que tem a vida e que, por sua                coisa em si, é preciso conhecê-la em si mesmo. Está
indeterminação, podem ocorrer a qualquer                    interessada naquilo que é factível. Não pretende dar
momento. O homem tem consciência do seu existir             um caminho aos fatos, mas desvelar os caminhos dos
e da sua finitude. Ele é um horizonte de                    fatos, o seu acontecer.
possibilidades e o tempo é constitutivo do seu                  Esse caminho pode ser trilhado pela
existir. Sua vida é orientada para o futuro, mas o          enfermagem, porque sua prática é com o ser
passado também faz parte do existir presente. Essas         humano em situações de saúde-doença, ao longo de
possibilidades inerentes ao viver sofrem um                 sua etapa evolutiva e necessita compreendê-lo no seu
impacto, desestruturam-se frente a ameaças como             mundo vivido, o qual é o campo do conhecimento
dor, medo, sofrimento. Isso acaba por bloquear suas         humano.
perspectivas de futuro.                                         Nessa perspectiva “há interesse pela totalidade do
    As mais variadas reações ocorrem com o homem            homem, por sua unidade de vida, pelo seu ser de liberdade e
que enfrenta a situação de doença. Pode deixar de           participação responsável por suas vivências” (Capalbo,
ser-si-mesmo fugindo da situação, transferindo o            1994).
controle de si para outro; assumir sua autenticidade
e voltar-se para si mesmo, aceitando o sofrimento.          Referências
    A doença traz modificações, e exige adaptações
                                                            ABBAGNANO, N. Diccionario de filosofia. México: Fondo
por parte de quem adoece. Existem mudanças
                                                            Cultura Economica,1986.
concretas e objetivas como a quebra da rotina, o estar
                                                            AUGRAS, M. O ser da compreensão.Petrópolis: Vozes, 1981.
em ambiente estranho, e mudanças subjetivas, como
                                                            CAPALBO, C. Considerações sobre o método fenomenológico e a
os limites pessoais, dependências, impotências e
                                                            enfermagem. Rev. Enf. UERJ, Rio de Janeiro, v.2,n.1,p.26-
isolamento.                                                 32,1994.
    O ser doente é difícil de ser apreendido e
                                                            CAPALBO, C. Fenomenologia e ciências humanas. Rio de
interpretado. Não há um doente efetivo, mas um              Janeiro: Ozen Editor, sd.
projeto em andamento e um “tempo vivido doente”

Acta Scientiarum                                                                 Maringá, v. 24, n. 3, p. 843-847, 2002
A pesquisa fenomenológica e a enfermagem                                                                            847

CHAUÍ, M.S. Vida e Obra. In: Pensadores. Heidegger.       MARTINS, J.; BICUDO, M.A.V. A pesquisa qualitativa em
São Paulo: Nova Cultural, 1996.                           psicologia: fundamentos e recursos básicos. São Paulo:
DARTIGUES, A. O que é fenomenologia? Rio de Janeiro:      Moraes/Educ, 1989.
Eldorado, 1973.                                           MARTINS, J. et al. A fenomenologia como alternativa
FERRAZ, C.A. Sistematização da assistência de             metodológica para pesquisa-algumas considerações. São
enfermagem no referencial fenomenológico. Ribeirão        Paulo: Cadernos.da Sociedade de Estudos e Pesquisa.
Preto, Anais (Semana Wanda de Aguiar Horta), 1991.        Qualitativa, cad. 01, 1990.
FORGHIERI, Y.C. Psicologia fenomenológica: fundamentos,   MERLEAU PONTY, M. Fenomenologia da percepção. São
métodos e pesquisa. São Paulo: Pioneira, 1993.            Paulo: Martins Fontes, 1994.
GEORGE, J.B. Teorias de enfermagem. Porto Alegre: Artes   REZENDE, A. M. Concepção fenomenológica da educação. São
Médicas, 1993.                                            Paulo: Cortez, 1990.
HEIDEGGER, M. Ser e tempo. Rio de Janeiro: Vozes,         OLIVIERI, D.P. O ser doente. São Paulo: Moraes, 1985.
1995.                                                     Received on February 08, 2002.
MARTINS, J. Um enfoque fenomenológico do currículo:       Accepted on May 20, 2002.
educação como poésis. São Paulo: Cortez, 1992.




Acta Scientiarum                                                                   Maringá, v. 24, n. 3, p. 843-847, 2002

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  • 1. A pesquisa fenomenológica e a enfermagem Maria Dalva de Barros Carvalho1* e Elizabeth Ranier Martins do Valle2 1 Departamento de Enfermagem, Universidade Estadual de Maringá, Av. Colombo, 5790, 87020-900, Maringá, Paraná, Brasil. 2 Escola de Enfermagem, Universidade de São Paulo, Av. Bandeirantes, 3900, Campus Universitário, 14040-902, Ribeirão Preto, São Paulo, Brasil. *Autor para correspondência. RESUMO. Este trabalho tece considerações sobre a fenomenologia como método de pesquisa na enfermagem. Aborda as questões básicas da fenomenologia e aponta fenômenos humanos passíveis de serem investigados por essa metodologia. Destaca o aspecto humanizador da ciência na pesquisa fenomenológica e sua importância para a enfermagem, uma vez que sua prática é com o homem, precisando compreendê-lo no seu mundo vivido. O cuidar, finalidade da enfermagem, implica a coexistência e a participação na compreensão da vivência de estar doente, de estar são, de estar em equilíbrio, de estar vivendo. Palavras-chave: enfermagem, fenomenologia, pesquisa. ABSTRACT. Phenomenological research and nursing. Phenomenology as a research approach in nursing is provided and analyzed. The study investigates the basic problems of phenomenology and pinpoints human phenomena that may be focussed upon by this methodology. The humanizing aspect of science and its importance for nursing is highlighted as one of the characteristics of phenomenological research. This is due to the fact that nursing deals with people who require comprehension in the context in which they live. Caring, the aim of nursing, implies in coexistence and participation, in the comprehension of being sick, healthy, balanced, in being alive. Key words: nursing, phenomenology, research. O homem, como mero organismo, máquina em A enfermagem no seu desenvolvimento histórico funcionamento, onde a soma das partes, e apenas em direção à cientificidade também trilhou e trilha essa soma, completa o ser, é, como geralmente tem os caminhos da ciência dita positiva. Nesse seu sido visto pelas ciências das áreas de saúde. trajeto em busca da maioridade científica, a A pesquisa nessas áreas tem procurado enfermagem inspirou-se no modelo tradicional estabelecer causas para explicar os fatos que ocorrem biomédico das ciências naturais e experimentais. O com o ser humano. No estabelecimento da relação modelo biomédico obedece às exigências do linear de causa-efeito, esse tipo de investigação positivismo, que não aceita o conhecimento que não recorre ao dedutivismo, à repetição dos eventos para venha da experimentação. o estabelecimento de uma generalização, quer dizer, As pesquisas que favoreceram a sistematização de ao objetivo, ao científico. Isso pressupõe uma um saber específico da enfermagem caracterizaram- separação radical entre o estudioso e o seu objeto de se por esse teor positivista, concreto, palpável, investigação, de tal modo que ele, cientista apenas comparável. Esse direcionamento no pensar e no reflita de forma objetiva sobre o que deseja fazer pesquisa acabou influindo decisivamente na conhecer. Vista dessa forma, a investigação funda-se prática da enfermagem. Passou de um fazer na experimentação, que acaba se transformando na empírico, assistemático, a uma prática voltada para o fonte de verdade para o conhecimento. objetivo, para os resultados, para o fim em si mesmo. Dessa forma, essa modalidade de pesquisa está Com o vigoroso avanço científico dos últimos voltada para a observação dos fatos e para o tempos, a enfermagem sofreu profundas significado destes, considerando-os em si mesmos modificações, que se caracterizaram principalmente (Forghieri, 1993). pela fragmentação, pela compartimentalização do O conhecimento, ou seja, a ciência, nessa objeto de seu cuidado. Como conseqüência lógica e, perspectiva, é conceituada como uma sistematização poderíamos dizer inevitáveis, dessa fragmentação, metodológica, limitando-se aos fatos que podem ser surgiram e se impuseram de forma efetiva as regras, verificados e às relações constantes entre eles. rotinas, normas e regulamentos, que acabaram por Acta Scientiarum Maringá, v. 24, n. 3, p. 843-847, 2002
  • 2. 844 Carvalho & Valle massificar o cuidado de enfermagem. Mais do que conhecimento, há uma vida operante (Martins et al., isso, esse cuidado se tornou de tal modo impessoal 1990). que se referia mais à doença que ao homem, Assim, voltada para a experiência, a reflexão perdendo a visão do todo humano. A sofisticada fenomenológica inclui a possibilidade de olhar as tecnologia, os aparatos mecânicos que possibilitaram coisas como elas se manifestam. o prolongamento artificial da vida, os transplantes, a Experienciando-se o mundo, este se abre para o obstinada luta contra a morte e a doença, colocaram homem, e esse abrir para o homem, esse se desvelar o homem e sua humanidade em segundo plano, para o homem, é o fenômeno1. quando do assistir, do cuidar da enfermagem. A preocupação da fenomenologia é descrever o A Sistematização da Assistência de Enfermagem fenômeno, não explicá-lo; é compreendê-lo, não compreendida como ordenamento e direcionamento achar relações causais. A descrição rigorosa do ao trabalho do enfermeiro, como metodologia da fenômeno é que permite chegar à sua essência2. profissão de enfermeira (George, 1993), que permite Ao se voltar para as coisas mesmas e para o uma prática sistemática, objetiva, científica, não mundo vivido, objetivando apreender a essência do escapa também da armadilha da perda da fenômeno, acaba-se por negar sujeito e mundo humanidade do indivíduo a quem essa assistência como existentes independentes um do outro. O está sendo prestada. objeto do conhecimento não é nem o sujeito, nem o Ferraz et al (1991), em relação a essa faceta do mundo, mas o mundo enquanto vivido pelo sujeito. exercício profissional, comenta que a Sistematização Essa concepção põe em evidência o conceito de da Assistência de Enfermagem tem favorecido a intencionalidade da consciência, isso é, a sua direção. normatização do cuidado, que acaba Segundo Chauí (1996), a consciência não é uma homogeneizando e massificando a assistência, substância, mas uma atividade constituída por atos, através de planos rotinizados, privilegiando a com os quais ela visa algo. Os atos da consciência são patologia, a terapêutica e a tecnologia. noesis3 e o que é visado por ela são os noemas4. Estes caminhos de investigação e assistência Todos os atos humanos são intencionais e essa embora dicotomizem a relação sujeito/objeto, não se intencionalidade sempre é um comportamento mostram, suficientes para desvendar as complexas dirigido a alguma coisa no mundo. A consciência situações que envolvem as relações saúde-doença e o portanto, é sempre consciência de alguma coisa. Ela cuidar em enfermagem. É forçoso reconhecer a só é consciência quando dirigida para um objeto, e o necessidade de um novo modo, uma nova forma de objeto só pode ser definido em relação com a ver o homem, de investigá-lo e, nesse caso, o consciência, ele é sempre objeto para um sujeito homem na relação saúde-doença e o homem no Dartigues, (1973). Daí se conclui que consciência e cuidar na enfermagem, na sua totalidade, objeto não são entidades separadas, mas que se analisando-o como ser concreto que vive o definem a partir dessa correlação entre o interior que fenômeno na totalidade de sua existência (Ferraz et se volta e o objeto para o qual ele se volta. Sujeito e al., 1991). objeto estão intimamente ligados. Dessa forma, a Colocada como a terceira via entre o positivismo fenomenologia não vê o homem separado do e o discurso especulativo da metafísica, a mundo, mas busca focalizar a forma pela qual o fenomenologia aparece como método alternativo de mundo se apresenta ao homem. Assim, o mundo pesquisa. Como qualquer outro, não é o único nem pode ser considerado como fenômeno, como ele se o melhor, mas uma trajetória escolhida pelo mostra ao homem (Merleau Ponty, 1994) . investigador e que tem significado para ele. Essa terceira via é aquela que, antes de todo raciocínio, colocaria-nos no mesmo plano da realidade, ou 1 Fenômeno : Tudo que se mostra, se manifesta, se desvela para como diz Husserl, das “coisas mesmas” (Dartigues, a consciência. Do grego fainomenon significa discurso esclarecedor a respeito daquilo que se mostra para o sujeito 1973). interrogador (Martins e Bicudo, 1989). A fenomenologia tem como princípio que o que 2 Essência: visão do sentido ideal que atribuímos ao fato fundamenta todas as ciências é uma volta ao mundo materialmente percebido e que nos permite identificá-lo (Dartigues, 1973). da experiência, ao mundo vivido. Essa postura 3 Noesis: aspecto subjetivo da vivência, constituído por todos os rompe de modo definitivo com o modelo das atos de compreensão que tendem a apreender o objeto, como o perceber, o recordar, o imaginar. ciências naturais: antes da realidade objetiva há um 4 Noemas: aspecto objetivo da vivência, ou seja, o objeto sujeito conhecedor, antes da objetividade há o considerado pela reflexão em seus diferentes modos de ser horizonte do mundo e antes do sujeito, da teoria do dado (por ex: o percebido, o recordado, o imaginário). O objeto é distinto do noema, por exemplo, o objeto de percepção da arvore é a arvore, mas o noema desta percepção é “o percebido enquanto tal” (Abbagnano, 1986). Acta Scientiarum Maringá, v. 24, n. 3, p. 843-847, 2002
  • 3. A pesquisa fenomenológica e a enfermagem 845 Essa possibilidade de abertura, de ir em direção Na compreensão está sempre subentendida a às coisas mesmas, àquilo que vai se apresentar como interpretação. Ela possibilita ao investigador aceitar fenomenal, no sentido do que se mostra à os resultados da redução como afirmativas que têm experiência, exige um olhar cuidadoso, meditativo. significados para ele, “mas que apontam para a Esse olhar deve preceder qualquer teoria, experiência do sujeito, isto é, apontam para a consciência que preconceitos, crenças ou explicações, quando o este tem do fenômeno” (Martins, 1992). A interpretação fenômeno se mostra. refere-se ao fenômeno que é percebido e vivido; na Esse olhar é o que Husserl chamou de epoché: realidade trata-se de interpretar a existência. suspensão ou parada; uma saída da maneira comum Retomando a pesquisa em enfermagem nos de olhar e abandonar os preconceitos e pressupostos moldes das ciências naturais, certos fenômenos, tais em relação a ela (Martins et al. 1990). Significa como: morte, vida, saúde, doença, dor e sofrimento, suspender as crenças referentes ao mundo natural, que habitam o mundo cotidiano da profissão, não se assumindo uma atitude neutra, não no sentido de permitem ser atingidos em sua compreensão. Assim, negar o mundo ou as experiências, mas sim, de “o conceito de saúde, bem como o conceito de vida, não são refletí-los e questioná-lo. Isso possibilita o emergir definidos com precisão. A doença é uma facticidade não só do do sentido de fatos que não tinham sido observados. corpo de alguém, mas de todo o seu ser humano, de ser-no- Com essa atitude, a trajetória fenomenológica mundo” (Capalbo,1994). procura estabelecer um contato direto com o A pessoa que fica doente não está só, está em fenômeno que está sendo vivido. Para compreender relação com os outros, estes são co-presentes. Se esse fenômeno é preciso então buscar a descrição da uma das finalidades da enfermagem é o cuidar do experiência pelos sujeitos que o vivenciam. A outro, isso implica a coexistência e a participação, na essência objetivada pela fenomenologia não é um compreensão da vivência de estar doente: conteúdo conceitual passível de definição, mas uma compreender. significação da essência existencial, que como tal No mundo da vida da enfermagem, no seu deve ser descrita. Essa descrição deve ser a mais aspecto profissional, está inserida a consciência natural e espontânea possível; não é opinião nem o intencional desses profissionais. De acordo com que se pensa, mas o que o sujeito está Capalbo (1994), essa consciência se volta para o experienciando. Uma palavra, uma definição não mundo e retorna para si mesma. Ela se abre para o poderá dizer o que há a dizer. É preciso recorrer ao mundo e aos outros no entrecruzamento de suas discurso, à descrição, para a aproximação maior experiências vividas e se volta para si mesma como possível da densidade semântica do fenômeno consciência de si, centro irradiador de intenções, humano (Rezende, 1990). desejos, vontades, sentimentos e ações, como um A descrição de experiência por quem vivencia ego temporal e histórico. um fenômeno é o caminho para a compreensão dele, A pesquisa fenomenológica na enfermagem e a linguagem é uma das formas que se abrem para alerta no sentido de que fenômenos como saúde- essa compreensão. A linguagem não tem função doença, vida-morte, relações enfermeiro-paciente, apenas de comunicação, mas também de revelação não podem ser compreendidos isolados da pessoa de um ser que existe em si e para os outros, como que os vive concretamente na totalidade de sua singular e idêntico (Augras, 1981). A linguagem, existência. É preciso compreender o fenômeno no poratanto, não é só um modo de expressão, mas nela ser que o vivencia, numa maneira humana de existir, se manifesta a essência daquilo que somos. Para na qual esse ser concreto está existencialmente Heidegger toda compreensão se consuma na confrontado (Capalbo, 1994). linguagem. A totalidade significativa da Tratar essas questões sob o prisma objetivado do compreensibilidade vem à palavra (Heidegger, empirismo, longe da situacionalidade de quem o 1995)5. experiência, é não estar comprometido com a Compreender um comportamento humano é autenticidade do mundo-vida, mais do que isso, é percebê-lo do interior, do ponto de vista da intenção acreditar que o fenômeno se esgota em si mesmo, e que o anima, logo, naquilo que o torna não que ele se dá em perspectiva, havendo sempre propriamente humano e o distingue de um facetas a serem desveladas. movimento físico (Dartigues, 1973). O trabalho da enfermagem é com o humano, o que propicia o olhar fenomenológico para o outro 5 “A compreensibilidade do ser-no-mundo, trabalhada por uma situado no mundo em sua totalidade de vida. Ele está disposição, se pronuncia como discurso. Existencialmente, o no mundo de maneira dinâmica; não é pronto e discurso é linguagem porque aquele ente, cuja abertura se articula em significações, possui o modo de ser-lançado-no- acabado, mas um vasto horizonte de possibilidades, mundo, dependente de um mundo” (Heidegger, 1995, p.220). Acta Scientiarum Maringá, v. 24, n. 3, p. 843-847, 2002
  • 4. 846 Carvalho & Valle que vão se concretizando ou não, no transcorrer de pelo ser, com possibilidades, vitórias ou derrotas sua existência, através da liberdade. (Olivieri, 1985). Por isso o pesquisador deve ser Existe, então, uma inter-relação e uma engajado, compromissado com o ser humano. A interdependência entre enfermeiro e o ser humano participação do pesquisador então é inevitável, e sua que é cuidado e investigado, sendo possível afirmar presença não é apenas física, ele carrega também sua que um e outro são sempre sujeitos e objetos que se visão de homem e de mundo, que precisa ser inteiram e interagem para uma consciência. Nesse explicitada. sentido, a fenomenologia se mostra como um A relação pesquisador / sujeito deve ter como caminho importante para a pesquisa e, suportes a cooperação e a participação. O sujeito não conseqüentemente, para a prática em enfermagem, pode se sentir questionado, avaliado; ele, seu já que é um chamado à reflexão, à compreensão, algo discurso e suas ações podem ser a chave para a inerente ao ser-humano, e um contraponto “às teorias compreensão das situações investigadas, permitindo do conhecimento, modelos de enfermagem e mais um ao pesquisador penetrar no seu mundo vivido. universo tecnológico presente” (Ferraz et al., 1991) que Estimular o sujeito a participar da investigação é acabam impedindo o pesquisador de enxergar o colocá-lo por inteiro na situação, e desse modo, simples, esquecendo o fundamental. facilitar a cooperação e a participação. O caminho fenomenológico não pode ser A coleta de dados manifesta-se como imposto ao pesquisador, sequer sugerido. Precisa ser intersubjetividade, já que é o encontro entre o basicamente uma opção, uma visão de mundo. sujeito que conhece e vivencia uma situação e o Sendo assim, a postura do investigador difere pesquisador que a desconhece. fundamentalmente da do pesquisador das ciências A atitude de empatia, o diálogo, a liberdade e a naturais, pois procura compreender o homem como cooperação do investigador que vai favorecer a sujeito que tem seu mundo vivido para ser desvelado compreensão, levam ao alargamento de seu e, para tanto, vai buscar sentido nas suas falas e horizonte, fundindo-o com o horizonte do ações. Empatia, integração, participação, diálogo, pesquisado. liberdade pessoal e social, encontro, À fenomenologia coube mostrar outro caminho intersubjetividade, perpassam uma situação de de opção além da ciência dita positiva, voltar ao pesquisa nessa modalidade (Capalbo, s.d.). mundo da vida, humanizar a ciência, buscar um O adoecer e o morrer são algumas das inúmeras sentido para as coisas. É preciso mais que conhecer a possibilidades que tem a vida e que, por sua coisa em si, é preciso conhecê-la em si mesmo. Está indeterminação, podem ocorrer a qualquer interessada naquilo que é factível. Não pretende dar momento. O homem tem consciência do seu existir um caminho aos fatos, mas desvelar os caminhos dos e da sua finitude. Ele é um horizonte de fatos, o seu acontecer. possibilidades e o tempo é constitutivo do seu Esse caminho pode ser trilhado pela existir. Sua vida é orientada para o futuro, mas o enfermagem, porque sua prática é com o ser passado também faz parte do existir presente. Essas humano em situações de saúde-doença, ao longo de possibilidades inerentes ao viver sofrem um sua etapa evolutiva e necessita compreendê-lo no seu impacto, desestruturam-se frente a ameaças como mundo vivido, o qual é o campo do conhecimento dor, medo, sofrimento. Isso acaba por bloquear suas humano. perspectivas de futuro. Nessa perspectiva “há interesse pela totalidade do As mais variadas reações ocorrem com o homem homem, por sua unidade de vida, pelo seu ser de liberdade e que enfrenta a situação de doença. Pode deixar de participação responsável por suas vivências” (Capalbo, ser-si-mesmo fugindo da situação, transferindo o 1994). controle de si para outro; assumir sua autenticidade e voltar-se para si mesmo, aceitando o sofrimento. Referências A doença traz modificações, e exige adaptações ABBAGNANO, N. Diccionario de filosofia. México: Fondo por parte de quem adoece. Existem mudanças Cultura Economica,1986. concretas e objetivas como a quebra da rotina, o estar AUGRAS, M. O ser da compreensão.Petrópolis: Vozes, 1981. em ambiente estranho, e mudanças subjetivas, como CAPALBO, C. Considerações sobre o método fenomenológico e a os limites pessoais, dependências, impotências e enfermagem. Rev. Enf. UERJ, Rio de Janeiro, v.2,n.1,p.26- isolamento. 32,1994. O ser doente é difícil de ser apreendido e CAPALBO, C. Fenomenologia e ciências humanas. Rio de interpretado. Não há um doente efetivo, mas um Janeiro: Ozen Editor, sd. projeto em andamento e um “tempo vivido doente” Acta Scientiarum Maringá, v. 24, n. 3, p. 843-847, 2002
  • 5. A pesquisa fenomenológica e a enfermagem 847 CHAUÍ, M.S. Vida e Obra. In: Pensadores. Heidegger. MARTINS, J.; BICUDO, M.A.V. A pesquisa qualitativa em São Paulo: Nova Cultural, 1996. psicologia: fundamentos e recursos básicos. São Paulo: DARTIGUES, A. O que é fenomenologia? Rio de Janeiro: Moraes/Educ, 1989. Eldorado, 1973. MARTINS, J. et al. A fenomenologia como alternativa FERRAZ, C.A. Sistematização da assistência de metodológica para pesquisa-algumas considerações. São enfermagem no referencial fenomenológico. Ribeirão Paulo: Cadernos.da Sociedade de Estudos e Pesquisa. Preto, Anais (Semana Wanda de Aguiar Horta), 1991. Qualitativa, cad. 01, 1990. FORGHIERI, Y.C. Psicologia fenomenológica: fundamentos, MERLEAU PONTY, M. Fenomenologia da percepção. São métodos e pesquisa. São Paulo: Pioneira, 1993. Paulo: Martins Fontes, 1994. GEORGE, J.B. Teorias de enfermagem. Porto Alegre: Artes REZENDE, A. M. Concepção fenomenológica da educação. São Médicas, 1993. Paulo: Cortez, 1990. HEIDEGGER, M. Ser e tempo. Rio de Janeiro: Vozes, OLIVIERI, D.P. O ser doente. São Paulo: Moraes, 1985. 1995. Received on February 08, 2002. MARTINS, J. Um enfoque fenomenológico do currículo: Accepted on May 20, 2002. educação como poésis. São Paulo: Cortez, 1992. Acta Scientiarum Maringá, v. 24, n. 3, p. 843-847, 2002