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O NORDESTE           ALAGOAS         BAHIA     CEARÁ        MARANH ÃO         PARAÍBA          PIAUÍ       PERNAMBUCO         RIO GRANDE DO NORTE    SERGIPE 




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  Angelo Castelo
                                 13.09.2009                                                                                   Voltar
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                                                                                          O poeta, romancista, roteirista, 
                                                                                          dramaturgo e sociólogo, Ruy Câmara, 
                                                                                          nasceu em 15/04/1954, em Recife e 
                                                                                          viveu a infância em Messejana, 
                                                                                          subúrbio de Fortaleza ­ Ceará, onde 
                                                                                          leu pela primeira vez Augusto dos 
                                                                                          Anjos, Cruz e Sousa e José de Alencar, 
 
                                              O poeta, romancista, roteirista, 
                                              dramaturgo e sociólogo, Ruy Câmara, 
                                              nasceu em 15/04/1954, em Recife e 
                                              viveu a infância em Messejana, 
                                              subúrbio de Fortaleza ­ Ceará, onde 
                                              leu pela primeira vez Augusto dos 
                                              Anjos, Cruz e Sousa e José de Alencar, 
                                              o pai do romance brasileiro. 


                                              Formado em Tecnologia Mecânica 
                                              pela Escola Técnica Federal do Ceará, 
                                              cursou Engenharia Operacional e 
                                              Engenharia Mecânica na Universidade 
                                              de Fortaleza (1973 à 1979); estudou 
                                              Filosofia como autodidata; em 1996 
                                              retorna à Universidade e bacharelou­
                                              se em Sociologia e Ciências Políticas), 
                                              com um honroso 1º lugar geral; em 
                                              1998 obteve o diploma de 
                                              especialização em Dramaturgia 
                                              Clássica para teatro, cinema e televisão 
                                             
                                              no Instituto Dragão do Mar de Arte e 
Cultura. 


Antes de entregar­se à Literatura, Ruy Câmara exerceu os mais diversos ofícios, 
desde operador de máquinas operatrizes e de usinagem, instrutor mecânico, técnico 
em lubrificação de navios, locomotivas e de máquinas de terraplenagem; caixeiro­
viajante na Amazônia; representante comercial no Norte e Nordeste, agente 
exportador na América do Sul, América Central e Caribe, à diretor comercial de 
empresas multinacionais de petróleo. Aos 26 anos, Ruy Câmara criou e dirigiu o 1ª 
consórcio de exportação o Ceará, um marco para a consolidação da indústria da 
moda nacional no exterior.


Após as contínuas viagens que empreendeu por mais de 80 países e de haver 
assimilado diversas culturas, em abril de 1992, no casarão 2300 da rua Gilberto 
Studart, em Fortaleza, Ruy Câmara reuniu sua família e um punhado de amigos em 
torno do seu aniversário de 38 anos e anunciou que abdicara em definitivo de sua 
promissora carreira empresarial para se dedicar exclusivamente aos livros e ao ofício 
literário. 


Após 11 anos de clausura em sua biblioteca, sempre em convivência com autores e 
obras, Ruy Câmara estreou na literatura brasileira com Cantos de Outono, o 
romance da vida de Lautréamont, publicado pela Editora Record, obra que teve o 
seu lançamento nacional em 2003, na Academia Brasileira de Letras, no Rio de 
Janeiro. Aplaudida pela crítica e pela imprensa especializada do Brasil e América 
Latina, a obra de Ruy Câmara foi 1ª finalista do Prêmio Jabuti, da Câmara 
Brasileira do Livro, e arrepanhou o Prêmio de Ficção 2004, da Academia Brasileira 
de Letras, na categoria ­ melhor Romance de 2004.  


Como intelectual habituado às longas jornadas do pensamento, Ruy Câmara 
tornou­se uma voz respeitada nos meios sociais, políticos e acadêmicos do Brasil, 
tendo colaborado com diversos jornais e revistas, onde publica ensaios, crônicas e 
artigos abordando diversos temas de interesse coletivo.   


Em 2007 sua obra foi traduzida para cinco línguas e Ruy Câmara é instado a se 
lançar numa carreira internacional. Em 2008 sua obra entrou nos prelos de 
importantes editoras da América Latina e da Europa, tendo sido publicada como 
clássico contemporâneo na Romênia, Servia & Montenegro, Espanha, México, 
Guatemala, El Salvador, Honduras, Nicarágua, Costa Rica, Panamá, Porto Rico, 
República Dominicana, Venezuela, Colômbia, Equador, Peru, Bolívia, Chile, 
Paraguai, Uruguai e Argentina.  Em 2010 a obra será publicada nos Estados Unidos 
pela Amazon.com e estará disponível para o mundo anglo­falante. No momento 
Ruy Câmara trabalha no seu 2º romance, intitulado, O Alfarrabista (ficção) cujos 
direitos de publicação já estão cedidos para 30 países.
Guatemala, El Salvador, Honduras, Nicarágua, Costa Rica, Panamá, Porto Rico, 
República Dominicana, Venezuela, Colômbia, Equador, Peru, Bolívia, Chile, 
Paraguai, Uruguai e Argentina.  Em 2010 a obra será publicada nos Estados Unidos 
pela Amazon.com e estará disponível para o mundo anglo­falante. No momento 
Ruy Câmara trabalha no seu 2º romance, intitulado, O Alfarrabista (ficção) cujos 
direitos de publicação já estão cedidos para 30 países.


Pai de cinco filhos, frutos de dois casamentos anteriores, Ruy Câmara é casado há 17 
anos com Rossana, sua musa inspiradora e a quem dedica suas obras. 


Página na web: WWW.ruycamara.com.br


E­mail: ruycamara@uol.com.br


PROGRAMA ESPAÇO ABERTO


Pedro Bial entrevista o escritor Ruy Câmara.


Rio de Janeiro 13 de agosto de 2003.


Abertura


No Espaço Aberto a revelação de um romancista estreante, Ruy Câmara, que 
constrói em sua estréia uma Biografia ficcional do Conde De Lautréamont, um dos 
casos mais misteriosos e instigantes da história da literatura. Não deixe de ouvir Ruy 
Câmara falar e narrar um pouco essa aventura, esse mergulho na vida e na obra do 
precursor do surrealismo, Lautréamont.


Íntegra da Entrevista


Pedro Bial: Salve, bem vindos ao Espaço Aberto. Você provavelmente nunca ouviu 
falar de Lautréamont, portanto sabe muito pouco sobre esse poeta franco­uruguaio 
do século XIX. Você provavelmente não conhecia Ruy Câmara, portanto não sabe 
nada sobre este romancista estreante. Em Cantos de Outono, Ruy Câmara 
ficcionaliza a biografia de Isidore Ducasse, o Conde de Lautréamont, ao que me 
parece muito mais baseado em inspiração poética do que em fontes históricos. Mas 
isso é uma das coisas que vamos saber agora. 


Ruy, muito obrigado pela sua presença e parabéns por ter sobrevivido a essa 
dificílima empreitada. Antes de falarmos exatamente do livro, parece que você teve 
uma trajetória meio incomum; você era engenheiro, empresário, depois se tornou 
sociólogo, dramaturgo e aí virou escritor... Como foi que se deu isso?


Ruy: Bial, em primeiro lugar eu quero agradecer o seu convite e a sua gentileza de 
ter lido o romance Cantos de Outono, que deve ter tomado um pouco do seu tempo. 
A minha vida sempre foi marcada por tomadas de decisões, de altos e baixos, 
sobretudo na década de 90, que eu acompanhei e me ative, sobretudo, às 
transformações que ocorriam. Com isso eu assimilei muito bem o que precisava 
fazer de diferente para me sentir bem em relação a mim mesmo diante do mundo. A 
primeira coisa foi mudar radicalmente a minha concepção de vida e a forma de 
viver. É verdade que realizei muitos projetos noutras áreas até 1990. Em 1991 eu me 
vi diante de uma tragédia familiar, perdi minha filha Lia Câmara, e isso me obrigou 
a refletir muito sobre tudo. Então, a partir daquele momento eu comecei a atribuir 
outros valores à vida. Deixei de lado os negócios da família e passei a me identificar 
com a literatura como sendo a instância simbólica, ou melhor, o refúgio da minha 
fuga. 


Bial: Uma tábua de salvação? 


Ruy: Mais ou menos isso. A leitura de profundidade preenchia completamente o 
meu tempo e o meu vazio interior. Após alguns anos de clausura em minha 
biblioteca, eu tive a grande momento de encontrar esse personagem através de um 
livro terrível...
Ruy: Mais ou menos isso. A leitura de profundidade preenchia completamente o 
meu tempo e o meu vazio interior. Após alguns anos de clausura em minha 
biblioteca, eu tive a grande momento de encontrar esse personagem através de um 
livro terrível...


Bial: Isso era o que eu ia perguntar. Como é que foi esse encontro com 
Lautréamont. 


Ruy: É uma história muito engraçada. Um amigo poeta, José Alcides Pinto, que é 
muito festejado no Ceará, surrupiou Les Chants de Maldoror de uma importante 
biblioteca e me enviou pelo correio. O livro caiu em minhas mãos em 1995. Na 
leitura do primeiro parágrafo tomei um susto tremendo e logo percebi que tinha em 
mãos uma literatura estranhíssima, algo sem precedentes...


Bial: Você lembra da frase? 


Ruy: Claro. Praza aos céus que o leitor afoite e tornado momentaneamente feroz 
com isto que lê,  encontre sem se desorientar o seu caminho abrupto e selvagem 
através dos pântanos desolados destas páginas sombrias e cheios de veneno, pois, a 
não ser que invista em sua leitura uma lógica rigorosa e uma tensão de espírito pelo 
menos igual a sua desconfiança, as emanações mortais deste livro embeber­lhe­ão 
sua alma assim como a água ao açúcar... E por aí vai.   


Participação especial de Cláudio Willer:


Lautréamont é um mistério literário. Ele morreu em Paris, em 1870, aos 24 anos de 
idade. A causa da sua morte não é sabida, seu túmulo também desapareceu. Ele era 
uruguaio, filho de pais franceses e estudou na França. O realismo, a preocupação 
com o sentido é praticamente suprimida. As histórias que ele conta são fantásticas, 
são delirantes e representam uma inteira liberdade de criação. É a palavra­
linguagem de absoluta liberdade. Então ele indicou um caminho pra modernidade, 
que seria a criação em estado puro e liberta das convenções, sejam as convenções da 
literatura, ou as convenções da moral. Por isso ele é importante e é tido como um 
dos pilares da modernidade. 


Ruy: Em 1995 eu ousei enfrentar a literatura de Lautréamont e mergulhei fundo. 


Bial: O que lhe levou a reinventar Lautréamont?


Ruy: Creio que foi o "quase nada biográfico" que me estimulou a empreender uma 
caçada ao espectro de Lautréamont. Em 1996 fui a Paris com minha mulher, 
Rossana, e lá iniciei, sem muita pretensão, um levantamento bibliográfico, talvez 
pensando em fazer parte do núcleo dos autores importantes que escreveram sobre 
ele. Comecei a pesquisa na Biblioteca Nacional de Paris, onde há informações 
bibliográficas importantes e também muita repetição do que escreveram no início do 
século XX. Hoje tenho em meu poder uma vastíssima bibliografia, com mais de 500 
artigos e ensaios sobre a obra de Lautréamont. Nesse romance, aqui e ali, eu entro 
em confronto com algumas teses esdrúxulas escritas por proeminentes autores. Em 
1997 voltamos a Paris e numa caminhada, que se iniciou na Ile de la Cite, 
percorrendo igrejas e cemitérios, chegamos à rua du Faubourg Montmartre e 
avistamos, no frontão de um edifício, uma placa que fazia alusão a Lautréamont. Do 
átrio, onde puseram uma placa com um texto terrível de Lautréamont, vimos ao 
fundo um bistrô e fomos lá tomar um café. À mesa, já tomando vinho, vi uma 
janela fechada no 3° andar do edifício e comecei a imaginar: deve ter sido ali, 
provavelmente, onde aconteceu tudo, onde ele passou os últimos momentos... 


Participação especial de Cláudio Willer


Nas manhãs ensolaradas quando as janelas estão escancaradas, ele apoia­se num 
parapeito e diz: esta janela é mágica, mesmo quando estou desgostoso, acuado na 
cama, o sol entra sempre alegre. De volta a cama ele prega os olhos nas partes 
protuberantes da noviça e já não consegue mais resistir às intoxicações dos prazeres 
da carne.  
Nas manhãs ensolaradas quando as janelas estão escancaradas, ele apoia­se num 
parapeito e diz: esta janela é mágica, mesmo quando estou desgostoso, acuado na 
cama, o sol entra sempre alegre. De volta a cama ele prega os olhos nas partes 
protuberantes da noviça e já não consegue mais resistir às intoxicações dos prazeres 
da carne.  


Ruy: A aventura que começou no Montmartre, se estendeu pelo norte da Espanha, 
em San Sebastien, subimos para sul da França, percorrendo liceus, universidades, 
museus, bibliotecas, colecionadores, enfim, chegamos em  Bayonne, antigo Porto 
Basco. De lá fomos a Tarbes, a Pau, a Bordeaux, retornamos a Paris com algumas 
pistas novas e com a verdadeira foto de Isidore Ducasse, que está no meu site. 
Repito, a verdadeira e única foto de Isidore Ducasse e também outras informações 
preciosas que abriram caminhos para a concepção do romance. De Paris seguimos 
de trem para Bruxelas, onde se deu o encontro de Lautréamont com Baudelaire, e 
por fim desembarcamos no Porto de Montevidéu. 


Bial: Mas você se viu diante de uma escassez de documentos, eu presumo, 
documentos, digamos, rigorosamente históricos sobre...


Ruy: Claro que sim. Vi­me diante de um mito e da sua miséria biográfica. O pouco 
que se sabe da sua biografia se confunde com o muito que escreveram sobre sua 
obra. Na França, na Bélgica e até mesmo no Uruguai, não há quase nada de Isidore 
Ducasse, nem mesmo uma tumba, já que seu cadáver, pela sua desimportância à 
época, teve de ser trasladado da 35ª divisão do Cemitério Montmartre­Nord para um 
ossuário público no subúrbio de Paris e lá se extraviou para sempre. Em 1998 refiz 
todo o percurso.  Voltei a Montevidéu, que é berço do poeta. Lá, revirei arquivoss, 
comprei livros, mapas antigos, etc. As pistas indicadas em 1925 pelos irmãos, Alvaro 
e Gervasio Muñoz, me levaram ao atual Nº 544 da rua Camacuá, onde Célestine 
teria parido Isidore Ducasse. Estivemos na rua Bacacay, para onde o cônsul François 
Ducasse, já viúvo, teria se mudado em virtude do novo traçado urbanístico da 
cidade, com a construção da Rambla Costanera. De pista em pista chegamos ao 
quarto Nº 9, no Hotel Pyramides, onde o pai de Ducasse teria vivido seus momentos 
de glória e também a sua agonia. Hoje temos certeza que o cônsul François Ducasse 
morreu completamente solitário, velho e doente, praticamente falido, aos 80 anos, 
no dia 18 de novembro de 1889. Seus restos estão sepultados no jazigo Nº 713, no 
Cemitério Central, onde depositei uma pedra simbolizando que nenhum mistério 
resiste ao tempo e aos rigores de uma investigação séria. Estive algumas vezes na 
Catedral de Montevidéu, onde conseguimos com Maria Eugenia Arnaud, secretária 
geral da Cúria,  a cópia autêntica da Certidão de batismo de Isidore Ducasse. Enfim, 
andei por toda parte. Recentemente, após mil horas de novas pesquisas, eu e 
Rossana voltamos a Montevidéu, refizemos os percursos de modo  inverso e 
desvelamos algumas pistas novas que mais tarde serão reveladas aos fãs desse autor 
monumental que é Lautréamont. 


Bial: Mas ele não é monumental em termos de quantidade de livros?


Ruy: Não, não, Lautréamont deixou apenas um único livro. Poesias é uma obra 
menor, que ficou inacabada. Tenho essas obras em meu poder, ou melhor, uma 
reprodução fidedigna de Les Chants de Moldoror, edição de 1968, que após a 
publicação logo foi tirada de circulação, e também uma reprodução de Poesias, livro 
publicado postumamente, na sombra do mais importante, que é os Cantos.


Bial: Por que tiraram de circulação? A obra é muito obscena, violenta 
demais?


Ruy: Eu, particularmente, não vejo obscenidade alguma na obra de Lautréamont. 
Como diz o meu amigo JAP, obsceno mesmo é o escritor que escreve ruim. (Risos)  


Participação especial de Cláudio Willer: 


Porque não dissestes logo quem eras, cristalizações de uma beleza moral superior, 
moral com o peito ornado de grinaldas, de rosas e vetiver. Foi preciso que eu abrisse 
vossas pernas para vos conhecer, e que minha boca se pendurasse às insígnias do 
vosso pudor... Mas, coisa importante para se ter em mente: não esqueceis de todo dia 
lavar a pele de vossas partes com água quente, pois, senão, cancros venéreos 
cresceriam infalivelmente sobre as comissuras fendidas dos meus lábios insaciados...  
Porque não dissestes logo quem eras, cristalizações de uma beleza moral superior, 
moral com o peito ornado de grinaldas, de rosas e vetiver. Foi preciso que eu abrisse 
vossas pernas para vos conhecer, e que minha boca se pendurasse às insígnias do 
vosso pudor... Mas, coisa importante para se ter em mente: não esqueceis de todo dia 
lavar a pele de vossas partes com água quente, pois, senão, cancros venéreos 
cresceriam infalivelmente sobre as comissuras fendidas dos meus lábios insaciados...  


Ruy: O falso pudor é uma característica de toda sociedade que se orienta, em 
termos de moral, pelas idéias crucíferas, do medo, do pecado e do castigo, sem falar 
que naqueles anos a Suprema Corte Francesa era um horror em termos de falsa 
moral.  Era ao mesmo tempo inescrupulosa e conservadora. Era uma corte 
carcomida pelos cancros sifilíticos e pela corrupção da própria moral. As prisões 
escolares e as abadias eram o reino da pedofilia. Portanto, naqueles anos...    


Bial: Diga­se de passagem, 1868. (Risos) 


Ruy: Sim, estamos a falar do século XIX, século de perseguições aos autores 
transgressores, Flaubert, Baudelaire e muitos outros dessa linhagem, conceituada 
Maldita. Isidore Ducasse também seria perseguido e, para não apodrecer no cárcere, 
escondeu­se por detrás de Lautréamont, seu cognome. Aliás esse termo Maldito não 
é originariamente de Paul Verlaine, já que, bem antes dele, em 1868, Isidore Ducasse 
fez uma alusão ao termo numa carta enviada ao banqueiro Darasse, na qual 
menciona o nome de Ernesto Naville, que lhe prometera escrever sobre Les Chants 
de Maldoror e falar dessa obra nas suas conferências em Genebra e Lousanne, 
tematizando o Problema do Mal. Verlaine viria a falar disso somente em 1884. Antes 
dele, bem antes, em 1868, Lautréamont utilizou essa expressão numa carta ao 
banqueiro Jean Darasse. Ele já tinha consciência de que seria mal compreendido e 
perseguido.


Bial: Agora, você a partir de uma Certidão de Nascimento e um atestado 
de óbito põe de pé, um livro que fica de pé, desse tamanho (risos) quer 
dizer...


Ruy: Mas ele deixou também sete cartas (risos). 


Quem lê os Cantos de Maldoror com uma profundidade maior, encontra, aqui e ali, 
fragmentos autobiográficos de Isidore Ducasse, os quais, numa transplantação 
metafórica poder­se compreender o real sentido de algumas construções ficcionais 
que eu levei adiante para reinventar esse personagem no seu próprio universo. São 
nos fragmentos dessas cartas e nos recorte do seu texto que realçamos o dilema 
individual do personagem. Além das sete cartas originas que aparecem no romance, 
reproduzimos outras mais, naturalmente que são reinvenções daqueles momentos 
de tédio e de dor. Recorri a tudo isso porque eu tive a preocupação de reconstituir 
uma época de glória e caos e o pensamento dominante daquela época. Isso não foi 
fácil. A fase mais difícil nessa escritura foi encontrar a linguagem e o momento certo 
de puxar o personagem para a ação ou para a inação absoluta, porque tinha 
momentos em que ele ficava no estado de completa inanição de idéias e isso 
perspassava para o narrador. O momento mais terrível e que antecedeu a finalização 
do livro foi quando mergulhei no abismo do seu pensamento e descobri que o real 
sentido da vida de Isidore Ducasse era a negação da própria vida. 


Bial: De eventos tidos como reais, é mais ou menos aceito que o encontro 
com Baudelaire realmente se deu. Como você vê isso?


Ruy: Tudo me leva a crer que esse encontro realmente ocorreu, afinal Baudelaire 
era o ídolo voluptuoso de Isidore Ducasse. O encontro se deu na primavera de 1866, 
no Hotel Grand Miroir, em Bruxelas, um ano antes da morte de Baudelaire. Naquela 
época os autores franceses costumavam se exilar na Bélgica, como o fez Victor Hugo 
logo após a vitória de Luis Napoleão. No caso de Baudelaire, sua ida à Bélgica, a 
pretexto de fazer conferências sobre Delacroix e outros, foi um auto­exílio, uma 
forma de fugir dos credores. Imaginar esse encontro entre Baudelaire e 
Lautréamont, dois monstros sagrados da literatura universal, um em ruína física e o 
outro em plena juventude, foi um dos grandes momentos da minha experiência 
literária. Esse bloco narrativo exigiu­me um esforço gigantesco. Foi muito sofrido, 
mas também prazeroso. Esse encontro eu considero como um dos pontos altos do 
romance Cantos de Outono.  
forma de fugir dos credores. Imaginar esse encontro entre Baudelaire e 
Lautréamont, dois monstros sagrados da literatura universal, um em ruína física e o 
outro em plena juventude, foi um dos grandes momentos da minha experiência 
literária. Esse bloco narrativo exigiu­me um esforço gigantesco. Foi muito sofrido, 
mas também prazeroso. Esse encontro eu considero como um dos pontos altos do 
romance Cantos de Outono.  


Bial: Já a carta da mãe de lautréamont sugerindo a Baudelaire o título 
Flores do Mal, deve ser pura ficção?


Ruy: Claro que sim. Em matéria de ficção tudo é possível. (Risos)


Bial: Lautréamont, antecipando artistas do século XX, morreu de 
overdose, não foi?


Ruy: Eu tenho plena convicção que ele se matou ingerindo coquetéis mortíferos, 
portanto, morreu de overdose e de um ato ainda mais secreto, que está na sua 
infância em Montevidéu, para onde jamais voltou.


Bial: Ele morreu de overdose e de um ato que, na sua versão, foi 
misteriosamente herdado da mãe, que se entorpecia manipulando pétalas 
de papoula, beladona, mandrágora, etc. Você tem alguma indicação de 
que a mãe de Ducasse usava mesmo essas drogas?


Ruy: Não só ela. É verossímil que na Europa, como em todas as civilizações, desde 
os primórdios, o homem sempre procurou uma fuga, sempre procurou alteradores 
de consciência para suportar o real ou até mesmo para suportar o tédio de um longo 
inverno. Bial, você que passou muitos invernos na Europa, sabe o que o tédio e a 
solidão significam. Tem momentos que você não suporta mais aquela monotonia. 
Sem sol o tempo não passa e o ambiente fechado passa a ser uma prisão. Naquela 
época o recurso aos alucinógenos não tinha o efeito nem a noção maléfica dos dias 
atuais, das manipulações químicas e dos fármacos produzidos em escala industrial. 
Os alteradores de consciência eram consumidos como nas tribos mais primitivas. O 
sujeito ingeria uma pasta de haxixi como forma de ficar ali parado, calmo, sem 
aflições, completamente ausente a tudo, sem noção daqueles tédios infinitos. Não era 
só vício, mas também uma necessidade. Baudelaire escreveu belos ensaios sobre as 
drogas, Paraísos Artificiais, traduzidos no Brasil, se não me engano pelo Saramago. 
Tudo isso me leva a crer que Célestine, uma jovem francesa, transplantada para um 
pais em guerra permanente com os vizinhos, vendo as carroças de cadáveres 
passando em sua porta, vendo as valas públicas engolindo os mortos aos bocados de 
cem ou duzentos, vendo aquele corpos incinerados nas ruas de Montevidéu, e diante 
da ameaça constante de contrair a peste, é mais do que verossímil que ela não 
suportou, tanto que se matou. Além do mais ela estava mal casada e não suportava 
viver submetida a um homem autoritário, pois como sabemos, François Ducasse era 
um conquistador incorrigível e assíduo freguês dos bordeis em Montevidéu. 


Bial: Ela se mata e o filho sequer tinha completado dois anos de idade?


Ruy: Exatamente. Ela comete suicídio em dezembro de 1847 e deixa o filho 
entregue à própria sorte. Isidore Ducasse nunca perdoou a família pelo 
descometimento de sua mãe. Viveu 13 anos com o pai, sob a proteção de sua ama, 
Maná, até o dia do seu embarque para a França. Não podemos reprovar a decisão do 
cônsul François Ducasse, porque naquela época, educar os filhos na Europa era 
ponto de honra, era uma questão cultural relevante, de dominação e supremacia das 
famílias tradicionais que objetivavam a cúpula patricial de uma nação­colônia.


Bial: Por que os surrealistas fizeram de Lautréamont um modelo? Eu 
queria saber se você tem uma resposta para isso?


Ruy: Li recentemente, há 5 anos, um livro da Leyla Perrone­Moisés, intitulado 
Inútil Poesia, no qual há um artigo bastante esclarecedor sobre Lautréamont e os 
surrealistas. Eu penso que Lautréamont, ao romper o paradigma lógico da idéia 
preconcebida, ao quebrar a hegemonia aristotélica de narrar (começo, meio e fim), e 
ao impor o que se presume ser uma escrita automática, abriu um novo horizonte 
para a literatura ocidental. Com a ousadia ele foi acusado de haver cometido uma 
heresia literária, uma atrocidade imperdoável, tanto que, até hoje tem gente por aí 
Inútil Poesia, no qual há um artigo bastante esclarecedor sobre Lautréamont e os 
surrealistas. Eu penso que Lautréamont, ao romper o paradigma lógico da idéia 
preconcebida, ao quebrar a hegemonia aristotélica de narrar (começo, meio e fim), e 
ao impor o que se presume ser uma escrita automática, abriu um novo horizonte 
para a literatura ocidental. Com a ousadia ele foi acusado de haver cometido uma 
heresia literária, uma atrocidade imperdoável, tanto que, até hoje tem gente por aí 
que resiste um pouco a isso. Mas quem lê com rigor e esmero a adulteração literária 
da sua composição, percebe que tudo ali está solidamente apoiado dentro de um 
conjunto e de uma concepção extremamente lógica e bem ordenada. Quem lê os 
Cantos de Maldoror com um olhar bem posicionado, vai compreender que ali há um 
talento inventivo de alguém superdotado de uma imaginação poderosíssima para 
compor com tanta fertilidade. Essa, certamente, foi a percepção de André Breton 
quando, de repente, Cantos de Maldoror cai em suas mãos, numa daquelas noites 
em que ele e Louis Aragon se ocupavam em acalmar os loucos num asilo parisiense. 
Logo trataram de dar a ele o título de poeta maior da modernidade. Mas André Gide 
foi um dos primeiros, senão o primeiro a conceber o valor de Lautréamont. Puxou 
um autor que andava esquecido para o centro de um palco que o tornou emblema 
de vanguarda. Breton teve o mérito de pinçar Lautréamont da escuridão do século 
XIX e o tomou como inspirador desse movimento vanguardista, tão importante 
para as artes, em todas as suas formas e expressões. Salvador Dali bebeu muito nas 
fontes ducasseanas para criar aquelas obras fantásticas, aquele jogo de imagens que 
se abraçam e se fundem no mesmo espaço. 


Bial: E hoje, qual é a atualidade que permanece sobre a obra de 
Lautréamont? 


Ruy: Sua obra tem sido tema de importantes colóquios em diversas universidades de 
todas as partes do mundo, inclusive com o patrocínio da UNESCO. Lautréamont é 
um dos poucos autores do século XIX que continua sendo estudado. Ele é 
considerado unanimemente um mito da literatura. Sua obra tem amplitude porque 
influenciou toda uma concepção artística e com isso revolucionou o conceito de arte. 
Os dadaístas e surrealistas estão todos aí, no berço lautreamoniano. Então a 
importância desse autor é perene e universal porque, por mais que se pense que a 
concepção surrealista está sepultada, ela ressurge do nada, como ocorreu na minha 
aventura de escrever Cantos de Outono. A concepção suprareal surge do nada 
porque tem muitas formas de sobrevivência no íntimo do ser, como se vê na 
pretensão humanista da arte, da política, nas expressões dos jovens, na liberdade 
reprimida do nosso tempo, e até mesmo nas intenções dos pichadores de ruas.


Bial: Liberdade que se empresta ao artista depois que o século XX derruba essas 
barreiras e liberdade até para se expor. Por exemplo, o narrador de Cantos de 
Outono, você, neste livro, evidentemente que está contaminado por Lautréamont, 
você se deixa contaminar por ele. Como é que se dá isso?


Ruy: Não há outra forma de você escrever sobre um personagem grandioso sem se 
deixar influenciar pelas suas idéias. Quem se mete com Lautréamont há de 
incorporá­lo ou refutá­lo de imediato. O escritor que não incorpora o seu 
personagem corre o risco de ser fiel a ele e a si próprio. Então eu procurei ser 
duplamente fiel e para conseguir isso, eu não podia fugir da temática surrealista, 
como se vê nos personagens, Olhar do alto e Voz que narra, que nem sempre 
refletem a posição do narrador. Tudo isso faz parte de uma reflexão contextualizada 
dentro da concepção que metaforiza o real e também o que vigia no meado do 
século XIX. O maior desafio que enfrentei foi justamente ser fiel e respeitar essa 
contradição de identidade, essa forma de fazer literatura e arte pelo avesso.  


Bial: Inclusive, uma das frases mais bonitas do seu livro e reveladoras 
desses artifícios que você cita é: Do ângulo em que estamos, podemos 
dizer que tanto o Olhar oculto, quanto a Voz que narra, se expressam por 
códigos que exigem de nós, interlocutores mudos, um metacódigo 
referencial com o qual possamos identificar, na ação e no tempo, quando 
o Olhar diz o que a Voz nos faz ver. 


Ruy: O Olhar diz o que a Voz nos faz ver é mimético, ilusório..., muito de quem 
conta uma história mais por adivinhar ou recriar do que por apurar. (Risos) 


Bial: Vem cá, em português só há a tradução do Cláudio Willer? 
Ruy: O Olhar diz o que a Voz nos faz ver é mimético, ilusório..., muito de quem 
conta uma história mais por adivinhar ou recriar do que por apurar. (Risos) 


Bial: Vem cá, em português só há a tradução do Cláudio Willer? 


Ruy: Que eu saiba, de referência bibliográfica importante, sim. Eu soube que vai 
sair agora uma nova edição de Obras Completas de Lautréamont, o que é muito 
importante, afinal o Willer nos fez o favor de introduzir Lautréamont no Brasil, uma 
tradução dificílima e complicada. Por isso o Willer tem uma importância muito 
grande nesse resgate.


Bial: Qual é trajetória ideal que você sonha para esse livro? Não é um 
livro talhado assim para qualquer leitor pegar, deitar e rolar. É um livro 
que no início exige do leitor entrar num universo e até mesmo numa 
retórica nada coloquial, nada que se acha no cotidiano de hoje. Então, o 
que você sonha de trajetória ideal para seu livro? 


Ruy: Eu acho que esse romance precisa de um tempo para ser lido, relido e 
assimilado. Não se resume apenas à vida de Lautréamont, como se presume. As 
idéias estão todas aí. Creio que aos poucos ele irá ocupar o seu espaço e terá uma 
vida longa. O livro já está ao alcance do leitor, disponível em todas as livrarias do 
país, a Record  tem uma força muito grande de distribuição e tudo isso conta muito. 
Agora  vamos ganhar tempo cuidando das traduções. Tem aí um interesse editorial 
praticamente certo na América Latina, no ano que vem deve sair em espanhol, há 
também um interesse na França, que é o cenário de ação, portanto, as possibilidades 
são muitas. Precisamos trabalhar um pouco lá fora para que as coisas aconteçam. 
Sem falar do mérito literário, se é que tenho algum, a reinvenção do fenômeno 
Lautréamont desperta interesse em todas as partes do mundo. É surpreendente o 
número e a qualidade dos seus leitores secretos.    


Bial: E você já está adaptando a obra para o cinema, que você me 
contou... 


Ruy: É verdade. O roteiro já vai bem adiantado, mas ainda há muito a fazer. Em 
julho próximo irei novamente a Montevidéu para definir as locações. Recentemente 
um importante escritor ironizou a minha pretensão dizendo: você vai saber adaptar 
um livro com este para o cinema? E eu respondi: o mais difícil foi construir essa obra 
do nada. Logo, adaptá­la para um roteiro de cinema vai ser 1% do meu trabalho. 


Bial: Será, cara? (Risos) 


Ruy: Adaptar a obra que escrevi para um roteiro fílmico é fácil, mas até sair o filme, 
é outra história. (Risos) 


Bial: Está certo. Parabéns, Ruy, pela aventura bem sucedida. Eu acho que 
com esse livro muitos brasileiros irão entrar em contato com 
Lautréamont pela primeira vez, e é uma estréia luxuosa para você como 
romancista. 


Ruy: Também acho, Bial. Muito obrigado pela oportunidade e por suas palavras. 
Você é um cara muito admirado no Brasil e por todos nos no Ceará, onde o seu 
programa tem uma bela audiência. 


Bial: Então leve pessoalmente o meu abraço para todo mundo do Ceará. 
Nós então conversamos com o escritor Ruy Câmara, que lança o seu 
romance de estréia, Cantos de Outono, o romance da vida de 
Lautréamont. Aquele abraço e até a próxima no espaço aberto. 


Tchau.                 


___________ 


1­ Pedro Bial é poeta, escritor, jornalista e apresentador da Rede Globo de Televisão 
Tchau.                 


___________ 


1­ Pedro Bial é poeta, escritor, jornalista e apresentador da Rede Globo de Televisão 
e Globo News.


2­ Cláudio Willer é poeta, tradutor, crítico literário e presidente da União Brasileira 
de Escritores.


3­ Ruy Câmara é poeta, romancista, dramaturgo e sociólogo, autor de Cantos de 
Outono.     


BIBLIOGRAFIA DE RUY CÂMARA




Palavras­chave: Biografia 



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                                                                                           17 anos. Rep órter e 
                                                                                           editor do "Diário da 
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                                                        Noite" (Recife, 
                                                        Prêmio Esso de 
                                                        Jornalismo  ­ Região 
                                                        Nordeste (1978). 
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                                                        Danca    Desenhos de 

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                                                        Futebol    Gastronomia   

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                                                        Musica   Negocios   
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                                                        Serra Talhada   

                                                        Terrorismo   




                                                        ACOMPANHE 
                                                         Olinda Urgente   
                                                         Pernambuco 
                                                        Desenvolvimento   
                                                         Mídia Nordeste   
                                                         Alagoas 
                                                        Desenvolvimento   
                                                         Bahia 
                                                        Desenvolvimento   
                                                         Ceará 
                                                        Desenvolvimento   
                                                         Maranhão 
                                                        Desenvolvimento   
                                                         Paraíba 
                                                        Desenvolvimento   
                                                         Piauí 
                                                        Desenvolvimento   
                                                         Rio Grande do 
                                                        Norte 
                                                        Desenvolvimento   
                                                         Sergipe 
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