O documento descreve o caso clínico de um homem de 60 anos em situação de rua que apresenta lesões dermatológicas e dependência alcoólica. O homem dorme nas ruas há mais de 20 anos devido ao alcoolismo após a morte do filho. A equipe de saúde realiza atendimento de rua para esta população vulnerável, enfrentando desafios como acesso e segurança.
3. CASO CLÍNICO
J.R., 60 anos, negro, natural de Vitória. 1º grau
completo. Em situação de rua há mais de 20 anos.
Queixa-se de aparecimento de lesões eritemato-
descamativas em braços e pernas há cerca de 3
semanas. Teme que seja câncer. Acredita que sua
dependência alcoólica esteja causando tudo isso.
5. CASO CLÍNICO
Começou a beber aos 35 anos, depois da morte de
seu filho, que era envolvido com tráfico de drogas.
O alcoolismo o levou ao divórcio da esposa e a sair
de casa. Hoje tem residência fixa no território, mas
passa a maior parte do tempo nas ruas, inclusive
dorme nelas vários dias. Demonstra sentimento de
culpa, arrependido de suas escolhas passadas.
6. CASO CLÍNICO
Não sabe quantificar o consumo alcoólico. Bebe
todos os dias: cerveja, cachaça, entre outros. É
tabagista, cerca de 1 maço/dia. Nega uso de outras
drogas.
Sua renda advém de bicos: conserta produtos
eletrônicos.
8. POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA
“Existem as pessoas que ficam na rua, que estão
na rua e que são da rua.”
- Vieira, Bezerra e Rosa (1994)
População de rua absoluta x população de rua
relativa.
- ONU
9. ““
QUEM SÃO?
“Grupo populacional heterogêneo, caracterizado
por sua condição de pobreza extrema, pela
interrupção ou fragilidade dos vínculos familiares
e pela falta de moradia convencional regular. São
pessoas compelidas a habitar logradouros
públicos (ruas, praças, cemitérios, etc), áreas
degradadas (galpões e prédios abandonados,
ruínas, etc) e, ocasionalmente, utilizar abrigos e
albergues para pernoitar.”
- Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome
11. QUEM SÃO?
Imigrantes recentes que vêm de outras cidades em busca de
emprego ou tratamento;
Vítimas de desastres (desabamentos, incêndios, inundações);
Vítimas de violência e perseguição extrema, como os
dependentes químicos expulsos pelos traficantes de suas casas
e bairros;
Mulheres que sofrem violência doméstica e são acolhidas em
equipamentos da assistência social;
Os que vivem em acomodações temporárias (albergues
noturnos, abrigos de tempo integral);
Ocupantes de áreas de moradia degradadas.
12. QUEM SÃO?
Egressos de instituições de longa permanência;
Pessoas que dormem nas ruas sob marquises, viadutos,
pontes;
Viajantes chamados de “trecheiros”, que rodam em busca de
emprego ou acomodações provisórias;
Pessoas com transtornos mentais graves em abandono;
Pessoas com dependência química levando à perda dos
vínculos familiares e de emprego
Perda da capacidade de trabalho por desemprego ou doenças;
14. QUEM SÃO?
Ministério do Desenvolvimento Social e Combate
à Fome.
2007
Estudo realizado em 71 municípios (23 capitais +
48 municípios com população igual ou superior a
300mil habitantes) no Brasil.
15. QUEM SÃO?
Média de 0,061% da população em situação de rua;
Predominantemente masculina (82%);
39,1% se declararam pardos;
52,6% recebe entre R$20 e R$80 semanais;
Mais de 48% não concluíram o 1º grau;
Quase 49% estão há mais de 2 anos nesta situação;
A maioria (79,6%) consegue fazer pelo menos 1
refeição ao dia. Cerca de 19% não consegue se
alimentar todos os dias.
16. DO QUE SOFREM?
Doenças dermatológicas dos pés;
Escabiose, pediculose, impetigo, infecções por tinea,
celulites, abscessos, verrugas, acne rosácea,
dermatites, erupções eczematosas, xerose, prurido
e miíases.
Doenças infectoparasitárias: DSTs, parasitoses,
doenças infecciosas respiratórias (pneumonia e
tuberculose).
17. DO QUE SOFREM?
Problemas de saúde bucal;
Violências de uma forma geral
Agressões físicas;
Atropelamentos.
Sequelas
limitantes!
18. DO QUE SOFREM?
Maior prevalência:
dependência química
(drogas lícitas e ilícitas)
Importante dividir o
acompanhamento
com outros ramos
da medicina,
psicologia e
assistência social.
19. POR QUE MORAM NA RUA?
Diversos fatores motivadores:
Estruturais;
Biográficos;
Desastres de massa e/ou naturais.
Pelo estudo do Ministério do Desenvolvimento
Social e Combate à Fome:
35,5% Alcoolismo e/ou drogas;
29,8% Desemprego
29,1% Desavenças com pai/mãe/irmãos
20. COMO ATENDÊ-LOS?
Visita Domiciliar X Abordagem de
Rua
Locais insalubres;
Difícil acesso;
Inseguros;
Pouca ou nenhuma
privacidade;
Excesso de barulho
ambiental.
21. COMO ATENDÊ-LOS?
Não deixar de atentar:
Condições gerais da pessoa;
Onde se encontra;
Nível de consciência;
Sob efeito de drogas?
Estado de higiene;
Presença de feridas
ou próteses;
Sinais e sintomas
aparentes;
Se tem pertences
consigo.
22. COMO ATENDÊ-LOS?
Perguntar sobre o seu percurso;
Onde costuma dormir?
De onde veio?
Tem família na cidade?
Onde faz sua higiene?
Onde se alimenta?
Frequenta os equipamentos da prefeitura?
Oferecer sempre o endereço da US – por escrito, se
possível, e informar sobre os serviços disponíveis.
23. A SEGURANÇA DA EQUIPE
CUIDADOS MÍNIMOS NO TRABALHO EXTERNO
Usar camisa ou jaleco com o logotipo da instituição, sem
escondê-lo;
Roteiros previamente determinados; qualquer
modificação deve ser comunicada;
Retirar adornos de valor ou que atraiam atenção;
Evitar utilizar bolsas próprias – usar equipamentos
disponíveis pela secretaria de saúde;
Pedir licença ao entrar no “território” da pessoa;
24. A SEGURANÇA DA EQUIPE
CUIDADOS MÍNIMOS NO TRABALHO EXTERNO
Apresentar-se, dizer onde trabalha e o objetivo da
conversa;
Observar se há “cães-de-guarda”;
Qualquer situação anormal deve ser prontamente
comunicada a toda a equipe;
Em casos de violência, agir da forma mais tranquila
possível – não tentar resistir a furtos;
Evitar atuar quando houver ação da PM ou Guarda
Municipal;
25. A SEGURANÇA DA EQUIPE
CUIDADOS MÍNIMOS NO TRABALHO EXTERNO
Cada profissional deve ter em sua prancheta os telefones
celulares dos demais profissionais da US, da defesa civil,
dos bombeiros, da central de polícia, SAMU...
Nenhum profissional deve retornar aos locais de
atendimento de maneira isolada – sem conhecimento e
permissão do coordenador de equipe;
Perguntar se pode retornar.
26. ““
POR QUE FAZER CONSULTÓRIO DE RUA?
Desigualdes injustas.
“A sociedade brasileira convive hoje com uma
avançada construção legal que assegura o bem-
estar da população por meio de políticas
inclusivas e universais, ao lado de uma
institucionalidade precária que não garante o
acesso ou a utilização de serviços de qualidade na
medida das necessidades da cidadania.”
- Fleury, 2011
28. POR QUE FAZER CONSULTÓRIO DE RUA?
Desde o século XIX estudos já demonstram forte
relação existente entre as condições sociais em
que as pessoas vivem e sua saúde.
1976 – Assembleia da OMS – compromisso em
alcançar “Saúde para todos no ano 2000”.
1977 – Conferência de Alma-ata – assume que a
estratégia de APS é o melhor caminho para isso.
29. ““
POR QUE FAZER CONSULTÓRIO DE RUA?
1988 – Constituição brasileira de 1988
“(...) a saúde é direito de todos e dever do Estado,
garantido mediante políticas sociais e econômicas
que visem à redução do risco de doença e de
outros agravos e ao acesso universal e igualitário
às ações e serviços para sua promoção, proteção e
recuperação.”
30. ““
POR QUE FAZER CONSULTÓRIO DE RUA?
1988 – Lei que regulamenta o funcionamento do
SUS
“O dever do Estado de garantir a saúde consiste na
formulação e execução de políticas econômicas e
sociais que visem à redução de riscos de doenças e
outros agravos e no estabelecimento de condições
que assegurem acesso universal e igualitário às
ações e aos serviços para a sua promoção, proteção
e recuperação.”
31. ““
POR QUE FAZER CONSULTÓRIO DE RUA?
1988 – Lei que regulamenta o funcionamento do
SUS
“O dever do Estado de garantir a saúde consiste na
formulação e execução de políticas econômicas e
sociais que visem à redução de riscos de doenças e
outros agravos e no estabelecimento de condições
que assegurem acesso universal e igualitário às
ações e aos serviços para a sua promoção, proteção
e recuperação.”
32. POR QUE FAZER CONSULTÓRIO DE RUA?
1994 – PSF Programa Saúde da Família –
estratégia da APS do SUS.
Aliado a
Esbarra na forma itinerante de viver
das pessoas em situação de rua.
Diversas Discriminações
33. “
“
DISCRIMINAÇÕES SOCIAIS
Diversos estudos demonstram evidências de
iniquidades na saúde:
“Evidências apontam que as chances de
utilização dos serviços de saúde estão
fortemente associadas a variáveis sócio-
econômicas, tais como raça, anos de estudo,
ocupação, acesso a serviços públicos.”
- Neri & Soares, 2002
34. DISCRIMINAÇÕES SOCIAIS
Mulheres que se identificavam como pretas ou
pardas...
...tiveram menos acesso a exames de Papani-
colau.
(Amorim, Barros, Cesar, Carandina & Goldbaum, 2006)
...tiveram menos acesso à assistência ao pré-
parto e ao parto;
...tiveram menos acesso à escolha e aos
serviços de qualidade;
...receberam menos anestesia durante o parto.
(Leal, Gama & Cunha, 2005)
36. POR QUE FAZER CONSULTÓRIO DE RUA?
OMS : para superar essas barreiras, a criação de
novos modelos assistenciais diferenciados em
prestação de cuidados em saúde é necessária.
Belo Horizonte
2002
Primeira equipe de Estratégia da
Saúde da Família para população
em situação de rua do Brasil
Porto Alegre
2004
Segunda equipe de Estratégia da
Saúde da Família para população
em situação de rua do Brasil
37. POR QUE FAZER CONSULTÓRIO DE RUA?
Porque se trata de uma população com
particularidades que demanda uma organização dos
processos de trabalho que crie portas de acesso
específicas, que promova a equidade do acesso:
ampliando a justiça social.
Desafio futuro: envolver as pessoas desabrigadas
como participantes e responsáveis pelos seus
cuidados de saúde e retomando-as como cidadãs,
estimulando a inclusão social e autonomia das
pessoas.
38. Realidade na Rede de Vitória
CONSULTÓRIO DE RUA
Existe essa modalidade, mas é limitada aos
seguintes profissionais:
1. Enfermeiro
2. Assistente social
3. Psicólogo clínico
4. Auxiliar de enfermagem
39. “““Ausência sistemática, mas
potencialmente remediável, de
diferenças em um ou mais aspectos
do estado de saúde, sejam elas
sociais, demográficas ou geográficas
às populações ou aos subgrupos da
população.”
Barbara Starfield e seu conceito
de equidade em saúde.
40. Referências
CONSULTÓRIO DE RUA
1. GUSSO, G.; LOPES, J. M. C. Tratado de medicina de família e
comunidade: princípios, formação e prática. Porto Alegre: Artmed,
2012. Vol 1, 469-474.
2. FLEURY, S. Desigualdades injustas: o contradireito à saúde.
Psicologia e Sociedade, 2011; 23 (n. spe.), 45-52.
3. Prefeitura de Vitória – SEMUS. Nota Técnica: Códigos internos para
registro na rede bem estar de procedimentos realizados pelos
profissionais que atuam no Consultório de Rua. Vitória, 2016.
4. MACKENBACH, J.P.; STIRBU, I.; ROSKAM, A.R.; SCHAAP, M.M.; et al.
Socioeconomic inequalities in health in 22 european countries. N
Engl J Med 2008; 358:2468-81