1. ALFABETIZAÇÃO
TODOS PODEM APRENDER
Nas escolas em que circulam diversos tipos de texto,
como livros, jornais e revistas, os alunos lêem
e escrevem mais rapidamente e se tornam
capazes de buscar as informações de que
necessitam
Aos poucos, a escola brasileira percebe a necessidade de se
aprimorar na tarefa de alfabetizar. Cada vez mais, as redes
investem na capacitação docente e muitas adotam os ciclos
- que aumentam o tempo para os pequenos aprenderem a
ler e escrever. Nesse mesmo sentido vai a aprovação do
Ensino Fundamental de nove anos, ocorrida em fevereiro
último. A medida favorecerá uma parcela da população
que, por não ter acesso à Educação Infantil, estaria fora da
escola e longe de um ambiente alfabetizador.
Ainda há muito o que aprimorar nessa área e a tarefa não é
apenas dos professores das primeiras séries. "Estamos
sempre nos alfabetizando, a cada novo tipo de texto com o
qual entramos em contato durante a vida", afirma Telma
Weisz, criadora do Programa de Formação de Professores
Alfabetizadores (Profa), do Ministério da Educação (leia
entrevista ao lado).
O sucesso ocorre nas escolas em que a leitura e a escrita
são tratadas como conteúdo central e um meio de inserir o
estudante na sociedade. "Um fator determinante para a
alfabetização é a crença do professor de que o aluno pode
aprender, independentemente de sua condição social", diz
Antônio Augusto Gomes Batista, diretor do Centro de
Alfabetização, Leitura e Escrita da Universidade Federal de
Minas Gerais. Esse olhar do professor abre as portas do
mundo da escrita para os que vêm de ambientes com pouco
material escrito.
Trabalho nesse sentido ocorre no município de Catas Altas
(MG) - um dos três casos de sucesso baseados no
construtivismo mostrados nesta reportagem. Mesmo
recebendo crianças que não tiveram contato com o
chamado mundo letrado antes da 1ª série, os professores
conseguem alfabetizar ao final de um ano.
O município de São José dos Campos (SP) apostou na
Educação Infantil. Em meio a muita brincadeira, os
professores lêem diariamente para os pequenos e criam
situações de que a língua escrita faz parte. Já em Taboão da
Serra, na Grande São Paulo, duas especialistas de Língua
Portuguesa e Ciências conseguiram tornar estudantes de 5a
série com problemas de alfabetização aptos a acompanhar
as aulas. Lendo, pesquisando e escrevendo, os adolescentes
elaboraram panfletos informativos sobre prevenção à aids -
um trabalho que fazia sentido para eles e que tinha uma
função social.
Essas experiências ajudam a esclarecer as principais
dúvidas que surgem em sala de aula na hora de alfabetizar.
Com base nelas e na opinião de especialistas, respondemos
a nove questões que mostram ser possível formar leitores e
escritores competentes em aulas de qualquer disciplina ou
série.
Meus alunos de 1ª série não têm contato com a escrita.
Por onde começo?
O pouco acesso à cultura escrita se deve às condições
sociais e econômicas em que vive grande parte da
população. O aluno que vê diariamente os pais folheando
revistas, assinando cheques, lendo correspondências e
utilizando a internet tem muito mais facilidade de aprender
a língua escrita do que outro cujos pais são analfabetos ou
têm pouca escolaridade. Isso ocorre porque ao observar os
adultos a criança percebe que a escrita é feita com letras e
incorpora alguns comportamentos como folhear livros,
pegar na caneta para brincar de escrever ou mesmo contar
uma história ao virar as páginas de um gibi. Cabe à escola
oferecer essas práticas sociais aos estudantes que não têm
acesso a elas.
O ponto de partida para democratizar o contato com a
cultura escrita é tornar o ambiente alfabetizador: a sala
deve ter livros, cartazes com listas, nomes e textos
elaborados pelos alunos (ditados ao professor) nas paredes
e recortes de jornais e revistas do interesse da garotada ao
alcance de todos. Esses são alguns exemplos de como a
classe pode se tornar um espaço provocador para que a
criança encontre no sistema de escrita um desafio e uma
diversão.
Outra medida para democratizar esses conhecimentos em
sala de aula é ler diariamente para a turma. "A criança lê
pelos olhos do professor - porque ainda não pode fazer isso
sozinha -, mas vai se familiarizando com a linguagem
escrita", explica a educadora Patrícia Diaz, da equipe
pedagógica do Centro de Educação e Documentação para
Ação Comunitária (Cedac), em São Paulo.
Quando posso pedir que as crianças escrevam?
Elas devem escrever sempre, mesmo quando a escrita
parece apenas rabiscos. Ao pegar o lápis e imitar os
adultos, elas criam um "comportamento escritor". E, ao ter
contato com textos e conhecer a estrutura deles, podem
começar a elaborar os seus. No primeiro momento, as
crianças ditam e você, professor, escreve num papel
grande. Além de pensar na forma do texto, nessa hora os
estudantes percebem, por exemplo, que escrevemos da
esquerda para a direita. "Mostro que a escrita requer um
tempo de reflexão antes de ser colocada no papel", afirma
Cleonice Maria Rodrigues Magalhães, professora de 1a
série da Escola Municipal Agnes Pereira Machado, em
Catas Altas (MG). Ela participou do Programa Escola que
Vale, que capacitou professores de 1ª a 4ª série do
município durante dois anos e meio.
Antes da escrita, as crianças devem definir quem será o
leitor. Assim, quando você lê o texto coletivo, elas
imaginam se ele compreenderá a mensagem. Nas primeiras
produções haverá palavras repetidas, como "daí". Pelo
contato diário com textos, os alunos já são capazes de
revisar e corrigir erros. "Com o tempo, antes mesmo de
ditar, eles evitam repetir palavras e pensam na melhor
forma de contar a história", afirma Rosana Scarpel da
Silva, professora do Infantil IV (6 anos), da Escola
Municipal de Educação Infantil Maria Alice Pasquarelli,
em São José dos Campos. Em paralelo, é importante
convidar a garotada a escrever no papel. Isso dá pistas
valiosas sobre seu desenvolvimento.
Fonte: Revista Nova Escola, mar 2006.