O Aquecimento Global da atualidade como manifestação da contradição entre Civilização e Natureza. A Natureza descrita como o desenvolvimento da matéria e energia no universo, em sua forma especial de vida e em sua manifestação especialíssima da matéria ter consciência de si mesma e como entramos em contradição com as leis mais gerais do universo e que agora nos confronta com o desequilíbrio do sistema. Utilizando-me de várias áreas do conhecimento, desde a Economia Política de Marx, a dialética da Natureza de Engels, a teoria da Evolução de Darwin, a física teórica de Einstein, a hipótese Gaia de James Lovelock, a psicanálise de Freud dentre outros autores, traço um panorama de como nossa espécie entra em contradição com a natureza, que em determinado momento nos beneficia como espécie, mas que ultrapassando os limites individuais do ser humano através das máquinas e das relações de produção, ultrapassamos os limites que o planeta como um ser vivo tem para suportar nossas ações.
PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: COMUNICAÇÃO ASSERTIVA E INTERPESS...
Carlos Burke - ENSAIO SOBRE CONTRADIÇÃO. Civilização e Natureza: aquecimento global - síntese final?
1. Carlos Jorge Burke
ENSAIO SOBRE CONTRADIÇÃO
Civilização e Natureza: aquecimento global - síntese final?
Córrego do Macuco – ES - Brasil
2008/2010
2. 3
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
Parte I – Fundamentos Gerais
Cap. I – Um começo contraditório......................................................................................18
Cap. II – Uma contradição surpreendente...........................................................................26
Cap. III – Início da Vida - a contradição primordial...........................................................30
Cap. IV – A Vida em mutação.............................................................................................35
Cap. V – Contradição entre indivíduo e reprodução............................................................38
Cap. VI – Seleção de espécies..............................................................................................42
Cap. VII – Uma espécie diferente........................................................................................45
Cap. VIII – Um caminho diferente.......................................................................................50
Cap. IX – Um caminho contraditório...................................................................................54
Cap. X – Uma espécie distinguindo-se................................................................................58
Cap. XI – Canibalismo e escravidão....................................................................................60
Cap. XII – Escravidão e civilização.....................................................................................64
Cap. XIII – Energia humana e mecanismo de trabalho........................................................67
Cap. XIV – Os limites do cérebro e sua substituição por máquinas....................................71
Cap. XV – Os limites do planeta Terra................................................................................74
Cap. XVI – Somos o problema? .........................................................................................79
Cap. XVII – Problema sem solução?...................................................................................82
Cap. XVIII – Racionalidade, bem-comum e instintos.........................................................86
Cap. XIX – A Contradição final do Capitalismo?...............................................................90
Cap. XX – Um caminho sem alternativas?..........................................................................94
Parte II – Temática
Cap. XXI – Os instintos em contradição............................................................................103
Cap. XXII – Instintos e sociedade......................................................................................111
Cap. XXIII – A mulher no poder.......................................................................................116
Cap. XXIV – O retorno do pai...........................................................................................121
Cap. XXV – Expansão da mais-valia e desequilíbrio do planeta.......................................127
3. 4
Cap. XXVI – Sistemas de recompensas.............................................................................134
Cap. XXVII – Contradição entre Deus e o Diabo..............................................................142
Cap. XXVIII – A contradição judaico-cristã......................................................................146
Cap. XXIX – Redenção pela fé ou razão?..........................................................................151
Cap. XXX – O mundo das mulheres novamente!..............................................................157
Epílogo...............................................................................................................................162
Bibliografia.......................................................................................................................170
Agradecimentos
Ao meu tio Thomas Burke, biólogo radical, bio-sociologista, ao invés de sócio-biologista
como faz questão de frisar, que com suas críticas, nem sempre bem assimiladas, me fazem
pensar e repensar. Pela sua generosidade também em me ajudar com o português.
A André Duque, pela criação da logo CIENCIAR; à Diana Pádua pelas orientações
“blogueiras”; aos meus pais e a todos que tornaram possível esta obra.
4. 5
INTRODUÇÃO
A idéia deste ensaio surgiu originalmente, a partir do meu interesse pelo tema do
aquecimento global. Em minhas pesquisas, deparei-me com um autor muito interessante:
James Lovelock. Bioquímico de origem (alguns o consideram biólogo) possui uma
trajetória nada ortodoxa nos meios científicos. A principal contribuição que apontam para
sua ciência é a chamada Hipótese Gaia, onde, em linhas gerais, considera todo o planeta
Terra funcionando como se fosse um organismo vivo. Orgânico e inorgânico não são
elementos distintos. São estágios em transformação, que atraem e repelem, constroem-se e
destroem-se, provocando movimento permanente à vida. Inclusive esta idéia não é nova, e
sabendo disso, Lovelock adotou, por sugestão de um amigo, o nome para a sua hipótese, da
deusa grega da natureza, Gaia. Os gregos já se inspiravam no que consideravam serem os
quatro elementos fundamentais, terra, ar, fogo e água, para compor a relação do universo
com a vida.
Sua hipótese original surge de uma idéia relativamente simples, que desenvolveu
quando prestava serviços para a NASA (Agência Espacial Norte-Americana) na década de
60. Havia sido contratado para compor equipes multidisciplinares, encarregadas de
procurar vida ou sinais de vida em Marte.
Vários projetos foram elaborados para se chegar até Marte, utilizando-se das
tecnologias mais avançadas que a ciência de então pudesse elaborar, buscando-se pesquisar
in loco. Neste exato momento que escrevo (meados de 2009), desceu no solo marciano um
robô-sonda-laboratório, altamente sofisticado, para identificar vestígios de vida no subsolo;
na superfície, nada foi encontrado até hoje.
Bem, Lovelock, por ser bioquímico, sabia que a atmosfera de Marte era estável, em
equilíbrio, com 98% de CO2 (dióxido de carbono), 1% de O2 (oxigênio) e resíduos de
outros gases. O CO2 é um gás de exaustão, onde não se extrai mais nenhuma energia
diretamente. Comparando com a atmosfera da Terra, Lovelock teve um “insight”, ou uma
sacada, como dizemos. Partindo do fato de a atmosfera da Terra ser altamente reagente,
possuir 21% de oxigênio, menos de 0,01%% de CO2 e alguns outros gases reagentes como
CH4 (metano), nitrogênio na forma de ácido nitroso (NH4) e vapor de água, pensou: se a
Terra tem vida e sua atmosfera, do ponto de vista químico é improvável, a atmosfera
somente mantêm-se com estas taxas de determinados gases, em função da vida orgânica.
Não poderia ser um processo puramente físico e químico como até então se acreditava.
5. 6
“Foi nesse momento que vislumbrei Gaia, e um impressionante pensamento me ocorreu.
A Atmosfera da Terra era uma mistura de gases extraordinária e instável, e no entanto
eu sabia que a sua composição se mantivera constante ao longo de períodos de tempo
bastante extensos. Poderia ocorrer que a vida na Terra não apenas formasse a atmosfera,
mas que também a regulasse – mantendo-a em uma composição constante e em um
nível favorável para os organismos?
Eu não tinha a menor idéia de qual poderia ser a natureza do sistema de controle, exceto
que os organismos sobre a superfície da Terra deveriam fazer parte dele e que a
composição gasosa poderia ser apenas um dos fatores que estavam sendo regulados. (...)
Nem eu nem Dian Hitchcock prosseguimos com essa idéia na época. Estávamos ambos
se digladiando com nossos colegas na ciência da vida, (...), de que a análise atmosférica
era um método legítimo de detecção da vida. Eu devia ser muito ingênuo naqueles dias;
agora percebo que aceitar a nossa idéia significaria para eles admitir que quase
certamente não haveria vida em Marte. Tal admissão poderia ter levado ao
cancelamento da impressionante coleção de experimentos mais diretos para a detecção
da vida, e que seriam levados a Marte pela Missão Viking, e ao desemprego entre os
biólogos espaciais.” (LOVELOCK: 2006(a), p. 22)
Uma idéia assim tão simples não poderia ser bem aceita. Com um simples
espectrômetro (aparelho que permite, através da incidência da luz nos diferentes gases da
atmosfera, medir sua composição), determinar a presença de vida ou não.
A partir desta idéia, Lovelock buscou pesquisar a relação entre vida e não-vida,
entre orgânico e inorgânico e associou-se à bióloga norte-americana Lynn Margulis, que
construiu os fundamentos biológicos desta interação.
Além do tema sobre aquecimento global ser interessante em si, o que me despertou
maior interesse naquele primeiro momento, foi quando Lovelock explica os princípios da
troca de energia entre o orgânico e o inorgânico, baseado na lei física da Entropia: em
linhas gerais, toda matéria e o universo tende ao equilíbrio termodinâmico, que seria a
cessação de todo movimento no zero absoluto (-273ºC), a impossibilidade de se extrair
qualquer energia. Esta tendência é apontada pela expansão do universo, ou seja, seu
resfriamento, liberando energia para fora do sistema. A vida contradiz esta teoria, como
discutiremos em detalhe na Parte I; pela mesma lei, quando há troca de energia entre dois
corpos distintos, a energia se transforma, mas nunca se perde, realimentando o próprio
sistema.
Como sociólogo marxiano∗
, tenho familiaridade em minha maneira de pensar,
utilizando-me do conceito de “contradição”. Não como forças antagônicas irreconciliáveis,
que precisam ser eliminadas para satisfazer a elucidação do problema, mas a condição
básica que dá movimento ao universo material, forças que se atraem e se repelem ao
mesmo tempo, transformando sempre a realidade para uma nova dimensão. Para os
cientistas sociais e filósofos marxistas, a contradição fundamenta-se na História
∗
Bebi na fonte e não em autores “marxistas”.
6. 7
Econômica, nas relações de produção entre os Homens, principalmente, na contradição de
fundo entre classes sociais, que Marx chamou de Luta de Classes.
Esta maneira de pensar através dos contrários chama-se Dialética, a qual tem sua
origem no pensamento grego, sendo a premissa básica encontrada no modelo: tese-
antítese-síntese, onde uma afirmação (tese) deve encontrar imediatamente o seu contrário
(antítese) e a confrontação desses contrários levará, não a uma solução definitiva, mas a
uma síntese, ou seja, uma nova tese, que dará início a um novo pensamento, transformando
e colocando a realidade, permanentemente, em movimento.
Ao pensamento marxiano, foi emprestado o método dialético de Hegel, que havia
reposicionado a Dialética em modelos de sua evolução crítica, através da História da
Filosofia, até o pensamento moderno de então, início do século XIX. As novas premissas
do pensamento dialético de Hegel traziam os princípios da transformação da matéria: da
lei da transformação de Quantidade em Qualidade e vice-versa; da lei da
Interpenetração dos Contrários e da lei da Negação da Negação, esta última
sintetizando as duas anteriores (ENGELS: 2000, p. 34).
Para Marx e Engels, o pensamento dialético hegeliano trazia a base para o
conhecimento da realidade material, mas, apresentava-se invertido. Para Hegel, as sínteses
se davam através do próprio pensamento humano; para Marx e Engels, era a realidade
material e suas contradições nas relações humanas de produção, construídas ao longo da
História Econômica, que produziam as sínteses, sendo o pensamento humano apenas a
representação ideal destas relações. Por isso, chamavam o método de Hegel de
materialismo dialético e o método utilizado por eles, baseado em Hegel, mas distinguindo-
se deste, de materialismo histórico.
Neste ensaio, porém, não pretendo discutir o método dialético em si, o que nem
cabe nas minhas possibilidades e capacidade de pesquisa. Este não é um livro filosófico no
sentido metodológico. Apenas quero deixar registrado que o princípio da contradição
norteará toda minha abordagem ao longo do trabalho e na qual está baseado.
Pretendo que o método dialético fique claro na maneira de apresentar os
fundamentos de minhas pesquisas, o que ao final seria da maior importância, já que, de
nada adiantaria eu dizer que estou usando o método dialético e meu pensamento não
alcançar suas premissas. Lembro-me agora (sem lembrar-me do livro específico), quando
fazia uma leitura de Demerval Saviani (conhecido autor da área de Educação no Brasil),
onde ele afirmava que como orientador de cursos de pós-graduação, recebia muitos
trabalhos acadêmicos, onde nas premissas metodológicas os autores afirmavam usar o
7. 8
método dialético como fundamento, mas que, durante a leitura, encontrava muito pouco de
dialético. Esta distinção de métodos era muito corrente no passado recente como
posicionamento político, para caracterizar o autor como de esquerda ou de direita, marxista
ou funcionalista, por exemplo. Assim, se dizer dialético era dizer-se de esquerda.
Agora, diz-se dialético para dizer-se “ultrapassado”.
A gênese do ensaio
Quero utilizar esta introdução para mostrar como este trabalho foi se configurando
e como descobri que muitos autores importantes, taxados de não-dialéticos, em verdade,
são dialéticos, mesmo sem defenderem esta posição. Lidam em profundidade com as
forças contrárias de seus campos de pesquisa, produzindo transformações importantes para
a ciência e o conhecimento humano.
Marx, quando desenvolveu seus estudos, sabia da importância das Ciências
Naturais como fundamento para se conhecer a história humana. Afirmava, inclusive, só
existir uma Ciência possível: a Ciência da História. Esta História, porém, divide-se em
História Natural e História Econômica, inter-relacionando-se e influenciando-se. Tinha isto
em mente, devido às críticas feitas ao seu pensamento, de levar em consideração apenas os
aspectos econômicos da sociedade, sendo acusado de uma espécie de “reducionismo
econômico”. Mas, afirmava já ser tarefa grandiosa demais apontar os aspectos econômicos
da história humana, sendo estas, porém, em sua opinião, a base fundamental para as
transformações sociais, já que o capitalismo não era em si uma condição da Natureza, mas
um produto das relações humanas concretas ao longo da história. Desta forma, seria
possível dominar e transformar estas relações, através da racionalidade da produção,
podendo a sociedade chegar a uma nova etapa do desenvolvimento humano, libertando o
trabalhador de sua condição de explorado por outra classe, para que seu potencial
individual pudesse, assim, se desenvolver.
Meus primeiros estudos mais aprofundados como sociólogo, foram realizados sobre
as obras de Marx e Engels, desenvolvendo em mim a familiaridade com o princípio da
contradição nas relações econômicas de produção. Daí resultou em minha obra: “Ensaio
sobre o Capitalismo Contemporâneo – uma abordagem marxiana”, publicado de forma
independente em 2006.
Algum interesse pelos aspectos da História Natural, principalmente as questões
biológicas, foram despertadas em mim por meu tio Thomas Burke, um auto-proclamado
8. 9
biólogo radical. Um primeiro trabalho que me apresentou foi o “Gene Egoísta”, de Richard
Dawkins, que me causou profunda impressão à época e nele permanece até hoje. Resolvi
assim me aprofundar mais nos aspectos da biologia.
Após minhas leituras aprofundadas sobre O Capital de Marx, percebi que autores
clássicos são fontes fundamentais para o aprofundamento do conhecimento humano e a
aproximação com a realidade. Trazem em suas obras, de forma condensada e ao mesmo
tempo amplificada e inovadora, o acumulo das grandes contribuições do desenvolvimento
da ciência e do pensamento humano ao longo da história.
O que costumamos fazer em nossos estudos acadêmicos é utilizarmo-nos de autores
secundários ou mesmo de textos esparsos dos clássicos para fundamentar nossas idéias.
Claro que o estudo sistematizado de um clássico, ainda mais nos dias de hoje, apresenta
uma dificuldade enorme de tempo e disponibilidade. Penso também que há uma descrença
nos clássicos, por considerá-los “ultrapassados”. Os chamados pós-modernos têm
contribuído para esta descrença. Mas, ao final, os clássicos parecem nos trazer uma idéia
mais concisa sobre o mundo, do que milhares de horas lidas de textos ou obras esparsas.
Optei assim, com os riscos que isso também traz de negligenciar novas idéias, de
fundamentar meus conhecimentos neles.
Assim parti para a leitura de Darwin, visando compreender as bases da seleção
natural e da evolução biológica da Natureza. Já havia tomado contado com o pensamento
darwiniano, através de Marx, que o utilizara em sua obra O Capital, para relacionar o
desenvolvimento das ferramentas humanas com as ferramentas que os seres vivos
desenvolvem através da seleção natural, especializando-as para determinado fim. Sugeriu
Marx, então, um estudo específico sobre o desenvolvimento das ferramentas e a
importância desta especialização para a transformação da manufatura em indústria
moderna e, consequentemente, da consolidação do capitalismo, no mesmo tempo que
criava as bases para a sua mudança.
Enquanto eu lia Lovelock e sua Hipótese Gaia, ficavam mais claras as relações
entre o orgânico e o inorgânico, e uma idéia me ocorreu: há uma contradição original, que,
apesar de nossa espécie ter tomado um rumo diferente das outras espécies, ainda poderia
condicionar as relações humanas em geral, pois, justamente, no comprometimento da vida
atual no planeta pelas nossas ações econômicas, estaria a síntese dessa mesma contradição?
Procurei, por isso, familiarizar-me melhor com os princípios da energia e matéria e
procurei entender (se é que entendi pelo menos um pouco) a Teoria da Relatividade
Especial e Geral de Einstein. Para surpresa minha, constatei que o mesmo princípio entre
9. 10
forças que se atraem e se repelem ao mesmo tempo, estão presentes em seu pensamento,
constituindo a gravitação a manifestação desta contradição, onde a matéria distorce o
espaço-tempo e cria as bases do movimento, através da atração e repulsão. Einstein intuiu
que Newton devia ter notado que a gravidade não poderia ser apenas uma força de
“influência”, sem ser influenciada. Mas, para a mecânica na Terra, funcionava
perfeitamente, como força apenas de atração.
O universo einsteniano como um todo está em constante movimento e
transformação, na forma de energia e na forma de matéria, se opondo e se
complementando. Desta maneira, Einstein iguala energia à matéria em sua famosa equação
E = m.c² (energia é igual à massa vezes a velocidade da luz ao quadrado). Afirma,
inclusive, que o que mantém elétrons unidos em torno do núcleo atômico, já que são forças
contrárias que se atraem e se repelem, é o mesmo princípio para a matéria em geral: a
gravitação (“nota de rodapé: A Teoria da Relatividade Geral sugere a idéia de que as
massas elétricas de um elétron são mantidas juntas por meio de forças gravitacionais”
(EINSTEIN: 1999, p. 46)).
Posteriormente (após ter escrito a maioria das bases dos capítulos), aprofundei
minhas leituras sobre Física Teórica, utilizando-me dos vários clássicos, como Paul Dirac,
Heisenberg, Schrödinger, Richard Feynmann, Abdus Salam e, principalmente, George
Gamow, que desenvolveu os conhecimentos das reações termonucleares nas estrelas e
assim chegou ao aperfeiçoamento da teoria sobre a origem do universo, conhecida como
Big Bang. Gamow foi também um excelente divulgador (para leigos como eu) da física em
geral.
Os físicos há muito estão tentando descobrir como as várias formas de manifestação
da energia e matéria, a gravitação, a energia fraca, o eletromagnetismo e a energia forte
(que, aliás, mantêm prótons unidos no núcleo atômico mesmo estes se repelindo pelo
eletromagnetismo), se inter-relacionam para formar a matéria e todo o universo (estão
buscando a chamada “Teoria de Tudo”); para isso construiu-se o mais moderno acelerador
de partículas (LHC – Large Hadron Collider) na Suíça, onde um túnel de 27km de
extensão já começou a provocar a colisão monitorada de prótons, para tentar definir como
surgiu a partícula fundamental de criação da matéria original do universo. Que
contradição! Para explicar um princípio fundamental, precisou-se criar a máquina mais
complexa do mundo.
Além da tentativa, nem sempre bem sucedida, de entender Física Teórica, minha
atenção anterior já tinha se voltado para entender o surgimento da vida, que em si poderia
10. 11
trazer alguma contradição em seu desenvolvimento, e como Lovelock aponta, o princípio
da Entropia, que é a tendência física da matéria a dissipar energia, tendendo ao equilíbrio,
se aplica de maneira “distorcida” em relação à vida.
Quando certa ocasião preparava um material didático para a disciplina de
Metodologia Científica, deparei-me com a citação das autoras (ver LAKATOS &
MARCONI: 2007) sobre alguns fundamentos da dialética apontados por Engels em seu
livro, “A Dialética da Natureza”. Era um livro que eu desconhecia por completo, apesar de
ler a tempos Marx e Engels. Interessou-me sua leitura e para surpresa minha, apesar de ser
apenas um esboço de um livro que pretendia fazer, Engels aborda, justamente, o
pensamento moderno da ciência da natureza no século XIX, seus avanços e retrocessos, os
princípios de física, química, biologia e como as forças contrárias atuam no universo, no
surgimento da vida e no pensamento humano. A contradição inicial que eu buscava, estava
exposta, mesmo que de forma incompleta, ali.
Engels trata da relação entre contrários na física, a gravitação, matéria e energia,
repulsão e atração, como o princípio básico do movimento e da transformação. Mostra-nos
como a ciência se apodera do pensamento filosófico e, ao mesmo tempo, nega-lhe a
origem, assumindo para si as descobertas mais importantes. Demonstra como Hegel
resgatou na História da Filosofia os princípios do pensamento científico e criticou as
distorções no pensamento humano ao longo da história.
Engels também aponta o princípio das transformações constantes de Quantidade em
Qualidade, onde a matéria assume estados diferentes ao longo de seu desenvolvimento,
voltando ao estágio inicial de energia, onde o universo em expansão, apesar de estar
esfriando, pode encontrar-se novamente a caminho de seu princípio original. Atualmente, a
teoria dos “buracos negros” traz esta afirmação do retorno ao ponto de origem, que explica
a própria origem do universo, popularmente conhecido como Big Bang.
Como diz o famoso físico Abdus Salam, o universo é “pulsátil”, expande-se e se
contrai ao mesmo tempo.
Engels trata então dos princípios que norteiam a vida, como contraditórios, energia
e matéria em constante transformação. Aponta a teoria de Darwin como a confirmação na
prática, da relação dialética entre contrários, em constante mudança: a seleção natural,
tendo como princípio a sobrevivência do mais apto e a transferência destas características
hereditárias, caminha para uma nova espécie, negando a anterior que lhe deu origem. Este
princípio encontra-se também na negação permanente da célula germinal, que se
desenvolve até um ser complexo, para retornar a sua forma original, indefinidamente.
11. 12
Engels, aparentemente, com este livro, pretendia unificar a Ciência da Natureza
com a Ciência Econômica, o que Marx já apontara em seu prefácio de O Capital; porém,
tomava o cuidado de não armar ideologicamente os que tentavam apontar como “natural” a
exploração dos trabalhadores pelos mais aptos, já que na natureza, este princípio
fundamentava a teoria darwiniana. Assim, também como Marx, buscava, justamente, na
racionalidade da ciência, as bases para estruturar uma nova sociedade. Os conflitos gerados
no capitalismo terminariam pela eliminação da contradição de classes, um produto
histórico das relações humanas e não uma condição natural para eles.
Naquele livro inacabado, Engels buscava demonstrar também, como o pensamento
dialético aproxima-se do próprio funcionamento do universo, que se desenvolve através de
forças contrárias. Esta “coincidência” do pensar dialético com o universo, expressa apenas
que o cérebro e, consequentemente, o pensamento humano, deriva do universo em
movimento e, não o contrário, como costumamos acreditar pelas nossas próprias
idealizações.
O pensamento dialético foi desenvolvido de forma clássica e intuitiva pelos gregos
e, mais modernamente, no curso do desenvolvimento da própria ciência natural. No
período conhecido como Renascimento, resgatam-se os gregos e com o desenvolvimento
das relações capitalistas de produção, permitiu-se, com a separação do trabalho manual do
trabalho intelectual, o desenvolvimento da ciência, independente do trabalhador e sua
aplicação prática, ganhando assim a ciência grande impulso (ver Burke, 2006).
Mas, por outro lado, o desenvolvimento da civilização moderna e a divisão do
trabalho na sociedade e na própria indústria, reduziram o pensamento humano à sua
especialização, utilizando-se cada vez mais da linguagem matemática, que não contém em
si, princípios de forças contrárias em constante transformação. O método de reduzir o todo
em seus elementos mais simples, sempre foi utilizado pelo pensamento humano. A questão
é juntá-los depois em sua dinâmica abrangente e em movimento.
Por isso os físicos contemporâneos estão buscando aquela “Teoria de Tudo”,
tentando unificar todas as importantes teorias da física (Mecânica Clássica, Relatividade e
Mecânica Quântica), para explicar as várias forças em movimento na Natureza.
Einstein já havia “transformado” a Mecânica Clássica newtoniana em sua Teoria da
Relatividade Restrita e depois na Relatividade Geral. Negou a Mecânica Clássica, no
mesmo tempo que a afirmava, ampliando sobre suas bases o conhecimento sobre o
universo.
A Mecânica Quântica, por outro lado, criou uma teoria a parte para explicar o
12. 13
funcionamento do átomo. Einstein, inclusive, nunca aceitou de bom grado a possibilidade
de uma teoria à parte. O físico inglês Paul Dirac tentou unificar a Relatividade com a
Mecânica Quântica e acabou prevendo a existência do que chamou de anti-matéria, depois
apelidada de pósitrons quando comprovada sua existência. Chamaram-na de pósitrons,
pois, são elétrons que se formam no núcleo do átomo, mas com carga positiva; anti-
matéria, porque destrói os elétrons com carga negativa assim que os encontra, eliminando a
si mesmos. Veremos na Parte I como a Mecânica Quântica de Niels Bohr e Heisenberg
chega numa contradição que este chama de “incerteza”, o que perdura até os dias de hoje,
como elemento introduzido na matemática para satisfazer, ainda em nossos dias, uma
incapacidade humana de conhecer matéria e energia em sua forma elementar.
Há uma dificuldade aumentada para nós leigos: é que a facilidade atual de testar
modelos matemáticos através dos computadores potencializou ao infinito o pensamento
especializado, o que afasta ainda mais a maioria das pessoas de pensar de forma mais
abrangente; enxerga-se a ciência como inatingível. Vemos que muitos físicos anteriores,
inclusive Einstein, tinham a preocupação de tentar facilitar ao público em geral o
entendimento de suas descobertas, publicando obras de divulgação simplificadas. Hoje
tenho minhas dúvidas se há esse interesse. Vamos ver se os “Teóricos do Tudo” nos
ajudam, simplificando o entendimento do universo material.
A espinha dorsal
Quando buscava inicialmente uma espinha dorsal para este trabalho, unificando a
contradição do universo, à contradição da vida, à contradição de nossa espécie e o
aquecimento global na atualidade, mais um aspecto contraditório somou-se às minhas
pesquisas. Este conhecimento se encaixou posteriormente, porque foi adquirido motivado
por um interesse pessoal.
Eu há tempos fazia estudos sobre terapias alternativas. Uma que tomei
conhecimento no início da década de 90 e me chamou à atenção, foi a Bionergética
desenvolvida por Alexander Lowen, norte-americano. Quando comecei a estudá-lo, muitos
dos princípios que utilizava, eram trazidos das teorias desenvolvidas por Wilhelm Reich,
ao qual tinha podido o próprio Lowen se submeter em terapia na década de 50 nos EUA.
Interessei-me então por Reich e seus princípios energéticos, de como se manifestavam no
funcionamento do organismo humano e, inclusive, em sua relação com o universo.
Reich havia sido discípulo de Freud e abandonado os métodos da psicanálise,
13. 14
desenvolvendo sua própria teoria, chamada de orgonoterapia, em função da energia que
considerava fundamental para a vida, que batizou de orgone, disponível de forma
abundante no universo.
Como Reich havia sido discípulo de Freud, resolvi então - depois de muito relutar,
por puro preconceito, já que era um marxiano!, dialético! - tomar contato com a obra de
Freud, afinal, um clássico. Para minha surpresa, Freud utilizava os princípios fundamentais
da contradição entre forças instintuais biológicas e as forças civilizatórias, os instintos de
preservação e destruição, que se complementam e se repelem. Em carta a Einstein, Freud
compara-os aos princípios de atração e repulsão de sua física:
“De acordo com nossa hipótese, os instintos humanos são de apenas dois tipos: aqueles
que tendem a preservar e a unir — que denominamos ‘eróticos’, exatamente no mesmo
sentido em que Platão usa a palavra ‘Eros’ em seu Symposium, ou ‘sexuais’, com uma
deliberada ampliação da concepção popular de ‘sexualidade’ —; e aqueles que tendem a
destruir e matar, os quais agrupamos como instinto agressivo ou destrutivo. Como o
senhor vê, isto não é senão uma formulação teórica da universalmente conhecida
oposição entre amor e ódio, que talvez possa ter alguma relação básica com a polaridade
entre atração e repulsão, que desempenha um papel na sua área de conhecimentos”.
(FREUD – Carta de Freud à Einstein – “Novas Conferências Introdutórias sobre
Psicanálise e Outros Trabalhos” – Volume XXII – (1932-1936).
Está também em Freud a base biológica emprestada a Darwin, para explicar as
relações entre o desejo instintivo e a necessidade de controle destes instintos, controle este
já utilizado pelos povos primitivos, através da instituição do totem e do tabu, dos quais
fundamenta, posteriormente, sua abordagem sobre as religiões monoteístas. A organização
social em clãs com casamentos exógenos, que Freud empresta a vários antropólogos,
inclusive Lewis Henry Morgan, norte-americano, está também em Engels, que se baseia
neste autor para escrever seu clássico “A Origem da Família, da Propriedade Privada e do
Estado”, onde caracteriza os vários estágios do desenvolvimento social desde o
primitivismo, a destruição das formas anteriores, até se chegar ao Estado moderno.
Percebi claramente assim que, em todos estes clássicos, apesar de aparentemente
estarem em seus campos de pesquisa específicos e tratados muitas vezes como autores
inconciliáveis, tratam basicamente do mesmo assunto: o Universo, a Vida em seu
desenvolvimento e em particular a vida humana, relações e tendências.
Retornando agora ao ponto de partida, considero James Lovelock um clássico,
colocando-o entre os grandes pensadores e que me despertou para a inter-relação, não
somente dos aspectos naturais, mas a abrangência da vida na Terra e nosso papel de
construtor e destruidor, não apenas aos de nossa espécie, mas de todo o planeta.
14. 15
Através do fio condutor da Contradição, buscarei apresentar ao leitor,
principalmente o leigo com interesse por ciência em geral, uma combinação de todos os
elementos que se encontram no pensamento humano e foram desenvolvidos por todos estes
autores que chamo de clássicos, que através de suas obras, somam-se a todos os outros aos
quais se utilizaram para suas descobertas científicas. Afinal, o conhecimento humano é um
produto de toda a sociedade ao longo da história.
Tenho uma forma de compor meus trabalhos que é absorver, através da leitura, as
várias obras envolvidas. Não faço inicialmente anotações específicas. Quero que através de
meu corpo (não somente meu cérebro isoladamente), os conhecimentos assumam a
dimensão que minha capacidade e minhas limitações possam ter. Deixo as idéias fluírem
sem preocupações com possíveis incongruências. Não as julgo previamente. Não as
suprimo. Procuro encontrar os pontos de convergência e em quê me ajudariam a pensar e
entender a realidade atual. Este é meu foco principal de construção do conhecimento:
utilizo os autores, seus conhecimentos, para tentar entender a realidade em sua
abrangência, naquilo que me é possível atingir.
Porém, muito das minhas afirmações, posso não saber ao certo qual a origem; se em
mim manifestam apenas um rumo inesperado e inexato, devido às minhas limitações, ou se
são de fato percepções novas (aprendi também com os clássicos, que o essencial sobre o
universo e a vida já foi dito por diversos autores muito antes de nós, seja de forma
reveladora, seja de forma distorcida).
Para trabalhos estritamente acadêmicos, este método que utilizo pode ser
considerado impróprio. A exatidão dos conceitos utilizados e por quem foi dito é um
princípio fundamental exigido. Peço desculpas aos acadêmicos por este meu caminho
cheio de tropeços. Gostaria de salientar, porém, que volto, ao término do manuscrito
inicial, e faço uma releitura das obras e busco, aí sim, aspectos precisos que os autores
disseram e trago-os, na medida do possível, para a obra então já construída.
De qualquer maneira, muitas coisas escaparão da citação exata e assim faço questão
que seja, para que a obra tenha a dimensão de minha capacidade de pensar. Muitas
informações utilizadas estão disponíveis nos meios de comunicação de massa, inclusive, na
internet, sob domínio público; ficaria enfadonha a colocação das fontes.
Os resumos de vários livros utilizados, impossível de serem usados como citações
em papel impresso ou mesmo para o desenvolvimento da leitura, estão disponíveis para
solicitação no blog www.carlosburke.com.br.
Para as citações de Freud, coloquei as informações sobre a obra, sem citar a página;
15. 16
adquiri as obras completas de Freud em meio digital, no qual não existe uma página
numérica correspondente.
Na Parte I, busco construir os fundamentos gerais sobre as causas da contradição
entre sociedade humana e natureza que levaram a manifestação atual na forma de
aquecimento global. Parto da contradição no universo, o desenvolvimento da matéria e
energia, sua relação com o desenvolvimento da Vida e como nossa espécie entra em
contradição com ela e se desenvolve, provocando agora uma nova contradição.
Na Parte II, abordo temas específicos, relacionados a assuntos levantados na Parte
I, como forma de aprofundá-los em mais detalhes.
Meu objetivo principal é proporcionar aos leitores comuns o acesso, mesmo que
limitado, a alguns conhecimentos aparentemente desconexos de áreas do conhecimento
diferentes, conduzindo-os por um caminho que em mim se construiu cheio de tropeços e
dúvidas, mas que possam também ser absorvidos em sua mente e corpo, destruindo e
reconstruindo, repulsando e atraindo, colocando em movimento, uma tentativa particular,
para uma visão abrangente sobre a Vida.
16. 17
Parte I
Fundamentos Gerais
“A energia pode ser separada entre renovável e não renovável de acordo com
sua origem? Não, não pode. A primeira lei da termodinâmica, uma das três
grandes leis do universo, declara que, "a energia é sempre conservada", mas
não menciona nada sobre ser renovável. Neste universo, a energia não pode ser
renovada: tudo que podemos fazer é pegá-la, utilizá-la e sermos gratos”.
James Lovelock
17. 18
Capítulo I
Um começo contraditório
Partindo do princípio de que tudo que existe no universo é feito do mesmo
elemento, significa de forma bem simples que tudo tem uma origem comum. Os gregos,
com Demócrito à frente, intuíram este elemento fundamental e chamaram-no de Átomo,
que para eles era a menor partícula indivisível, o “tijolo fundamental”. Inclusive átomo em
grego significa “indivisível”.
A ciência moderna, no início no século XX, com Ernest Rutherford, comprovou
que o átomo não era a menor partícula indivisível existente e podia ser subdividido em
elétrons, prótons e nêutrons, estes dois últimos formando o núcleo atômico (núcleon), e o
elétron, mantendo-se “girando” ao seu redor.
O interessante é que elétrons e prótons têm cargas contrárias e convencionou-se
chamar elétrons de negativo e prótons de positivo. Ou seja, forças contrárias que se atraem
e se repelem ao mesmo tempo, provocando movimento. Este modelo simples, de um
núcleo e elétrons ao redor, como se fossem planetas orbitando em torno do Sol, foi
contestado pelo físico dinamarquês Niels Bohr, que dizia não ser possível explicar o átomo
com os conceitos até então desenvolvidos pela mecânica clássica e criou o conceito de
“salto quântico” para os elétrons, iniciando uma discussão acalorada com os físicos
tradicionais, como Einstein.
Estava iniciada a física especial conhecida como “mecânica quântica”. Quântica em
função do conceito de quantum de luz desenvolvido pelo físico Max Planck em 1900, onde
afirmava que a luz era formada por “pacotes” que se assemelhavam à matéria e a ondas ao
mesmo tempo. Einstein através da teoria da relatividade geral previu este comportamento
da luz, o que foi comprovado por observação de estrelas sob o efeito da gravitação do Sol
em eclipse total. Inclusive em 1919, o estado do Ceará no Brasil serviu de base de
observação.
Um auxiliar de Bohr chamado Werner Heisenberg chega à conclusão que o átomo
em seu funcionamento era “incognoscível”, ou seja, impossível de ser conhecido pela
mente humana, já que não há a possibilidade de se ter certeza de seu funcionamento. Tem
uma existência “contraditória”, ora como energia, ora como matéria. Criou assim o
“princípio da incerteza” para fundamentar sua teoria. Vejamos o que o próprio Heisenberg
fala sobre sua descoberta:
18. 19
“Não pretendemos de forma alguma que as ocorrências no universo dependam de
nossas observações, mas assinalamos que a ciência natural se encontra entre a natureza
e o homem e que não podemos renunciar ao uso da intuição humana ou das concepções
inatas. Semelhante caráter da teoria quântica já torna difícil seguir inteiramente o
programa da filosofia materialista e descrever as menores partículas de matéria, as
partículas elementares, com a realidade verdadeira. À luz da teoria quântica, tais
partículas elementares não são mais reais no mesmo sentido que os objetos da vida
quotidiana, árvores ou pedras, mas se apresentam como abstrações derivadas da matéria
real da observação, no verdadeiro sentido. Mas, se se faz impossível atribuir às
partículas elementares tal existência no sentido mais genuíno, mais difícil ainda se torna
considerar a matéria como “verdadeiramente real”. Por isso, duvidas ocasionais foram
levantadas nos últimos anos, a partir do campo do materialismo dialético, contra a atual
interpretação da teoria quântica” (BORN: 1990, p. 19).
Heisenberg dizia então que o funcionamento do átomo não pode ser conhecido,
pois não se sabe quando está no estado de matéria (partícula) e quando está no estado de
energia (onda). Não haveria a possibilidade de uma imagem para essa função. A sua
representação somente poderia ser feita por uma fórmula matemática. Inclusive o simples
fato de tentar observar seu funcionamento já altera suas características.
Em um programa recente que assisti na televisão, um físico explicando o princípio
da incerteza de Heisenberg, termina dizendo que isso é uma “contradição.” E é mesmo!
Contradição aqui para os físicos significa a impossibilidade de comprovação. Para o
pensamento dialético, é a base do movimento universal, sua expressão: forças contrárias
que se atraem e se repelem ao mesmo tempo, transformando-se umas nas outras. O próprio
Heisenberg tentando negar o materialismo, já que fundamentava seu “princípio da
incerteza” no idealismo de Platão, o afirma:
“Entrementes, nos últimos vinte anos o desenvolvimento da física atômica conduziu-nos
para ainda mais longe dos conceitos fundamentais da filosofia materialista na acepção
antiga (grega). Experiências mostraram que os corpos que devemos considerar
indubitavelmente como as menores partículas de matéria, as chamadas partículas
elementares, não são eternos e inalteráveis, como Demócrito supunha, podem
transmutar-se um no outro (grifo meu)” (BORN: 1990, p.21).
No encontro dos físicos em Bruxelas em outubro de 1927 acabou vencendo a teoria
de Bohr e Heisenberg com o “princípio da incerteza”, conhecida como “interpretação de
Copenhague” (Bohr era dinamarquês), sendo adotado como o fundamento da física
moderna de então. A “imagem” de forças contrárias que se atraem e se repelem ao mesmo
tempo, transformando-se mutuamente, que Einstein intuiu e depois comprovou em sua
teoria, para os físicos deve ser uma imagem difícil, se não conseguirem materializá-la em
fórmulas matemáticas. Heisenberg resolveu o problema matemático incluindo a
impossibilidade do conhecimento de outra forma que não a própria matemática. Como esta
19. 20
não tem ainda um método que preveja forças contrárias que se transformem uma na outra,
“o que não tem solução, solucionado está”. É impossível de conhecer sua materialidade.
Richard Feynmann, físico norte-americano, famoso pelas teorias e pela
excentricidade, desenvolveu diagramas próprios para explicar a mecânica quântica; através
da matemática achava enfadonho e sem saída possível. Desta forma, desenvolveu novas
teorias para a mecânica quântica, chamada de eletrodinâmica quântica. De qualquer
maneira, o princípio da incerteza é seu pilar de sustentação, ao que o próprio Feynmann
diz:
“O princípio da incerteza "protege" a mecânica quântica.
Heisenberg reconheceu que, se fosse possível medir o momento e a posição
simultaneamente com maior precisão, a mecânica quântica desmoronaria. Assim,
propôs que deve ser impossível. Daí em diante, as pessoas se debruçaram sobre o
problema e tentaram descobrir formas de fazê-lo, mas ninguém conseguiu descobrir um
meio de medir a posição e o momento de algo - um filtro, um elétron, uma bola de
bilhar, qualquer coisa - com qualquer precisão maior. A mecânica quântica preserva sua
perigosa mas correta existência” (FEYNMAN: 1999, p. 198).
As partículas subatômicas já são divididas em quarks atualmente e provavelmente,
com o acelerador de partículas (LHC), pelo qual se fará chocarem-se prótons, poderá
confirmar-se o que a física teórica moderna prevê: partículas menores ainda, que o físico
Peter Higgs chamou de bóson (Revista Veja - 25/06/08). Com o avanço da física
experimental em paralelo ao avanço da tecnologia, na década de 80, já se chegava a um
total de mais de 80 partículas novas descobertas. E havia umas tantas teorias para explicá-
las. Depois os físicos tentaram ordenar a confusão e chegaram à conclusão que os
experimentos apenas revelavam as várias manifestações possíveis da matéria, não podendo
receber um nome diferente a cada experimento.
Mas, uma das questões principais que os físicos querem responder é: como a
energia transforma-se em matéria e esta em energia e assim sucessivamente; e como
prótons e elétrons atraindo-se, não se chocam e mantêm-se unidos? Talvez este “princípio
da incerteza” de Heisenberg transforme-se numa certeza: a contradição é a base do
movimento no universo.
Einstein, em sua Teoria da Relatividade Geral, apontava que a Gravitação, não é só
uma força de atração como a sentimos na Terra, mas considerando-se todo o universo, é
também uma força de repulsão: a matéria distorce o próprio espaço-tempo, que somente
pode constituir-se de matéria, criando os campos gravitacionais, interagindo com a matéria
ao redor, produzindo movimento. Inclusive na fórmula E=m.c², indica que quando a
20. 21
matéria se manifesta como energia, carrega sua correlação com a massa e a velocidade da
luz, transformando-se novamente em matéria. A própria luz é matéria, fótons, quanta.
Mais dialético e simples que isso impossível.
Já é sabido que as galáxias também exercem um campo gravitacional entre si
(quem sabe se nosso universo também não está inserido num contexto de forças contrárias
que se atraem e repelem com outros universos?). Einstein considerava assim, por princípio,
que o que mantinha a massa dos elétrons ao redor do núcleo, era a Gravitação, mesmo ao
nível subatômico, ou seja, a distorção do espaço-tempo cria, ao mesmo tempo, atração e
repulsão. Isto é pura contradição1
.
Engels, pelo menos 30 anos antes de Einstein, já apontava o princípio da atração e
repulsão em seu livro “A Dialética da Natureza”, como complementares,
“A forma fundamental de todo movimento é, portanto, a aproximação e o afastamento, a
contenção e a expansão, em suma: a velha oposição polar denominada atração e
repulsão.
É necessário anotar expressamente: atração e repulsão não devem ser concebidas, neste
caso, como pretensas forças, mas sim como formas elementares do movimento. Na
verdade, já Kant havia concebido a matéria como uma unidade de atração e repulsão.
(ENGELS: 2000, p. 43).
E apontava o que Hegel já havia dito um século antes de Einstein,
“O próprio Hegel esclareceu a verdadeira natureza das determinações da essência.
Enciclopédia, I, § Ill, Zuzartz: "Na essência tudo é relativo". (Por exemplo, positivo e
negativo, que só tem sentido se levarmos em conta a sua relação, e não cada um
separadamente)” (ENGELS: 2000, p. 132).
Einstein comprova com sua teoria da relatividade que a matéria tem correlação
direta com o movimento de atração e repulsão que cria o espaço-tempo. O tempo não é
mais linear, independente da matéria. O próprio Hegel já havia afirmado que não existe
espaço-tempo sem matéria:
“citado por Engels: [(Hegel, Naturphilosophie (Filosofia da Natureza), "Espaço e tempo
estão preenchidos com matéria... da mesma forma que não há movimento sem matéria
também não há matéria sem movimento" (Pag. 6”).” (ENGELS: 2000, p. 137).
1
Einstein nunca aceitou a física quântica como explicação isolada. Para a mecânica quântica o
funcionamento do átomo não é o mesmo que para o universo em geral, pois as leis que supostamente
aparecem no nível subatômico é uma “incerteza” pelos limites da mente humana? Parece ter algo errado aí.
Mas a especialização da ciência exclui a nós, pobres mortais, de qualquer discussão de tamanha “certeza”
quanto a “incerteza”.
21. 22
Matéria e Energia principiam tudo, sendo uma expressão “contraditória” da outra.
O princípio de tudo
O pensamento humano sempre cogitou a idéia do princípio de tudo. Mesmo a
ciência moderna, após o Renascimento e o surgimento de pensadores como Descartes ou
Newton, não conseguiram desvencilhar-se totalmente das idéias religiosas, onde um
criador, pelo menos, iniciaria o processo e depois as leis “imutáveis” da natureza se
encarregariam de por o universo em movimento.
Foi com Kant mais modernamente, no século XVIII e ao tempo de Descartes,
século XVII, com Baruch Spinoza, que a idéia de um criador que principia tudo começa a
ser questionada.
Desde o fim do Império Romano no século V e o domínio da Igreja Católica sobre
as bases da produção feudal, o conhecimento religioso no Ocidente prevaleceu por mais de
mil anos. Ao final, já por volta do século XV e XVI, com as ameaças de derrocada total do
sistema feudal e com ele o poder da igreja católica, esta intensificou a repressão através da
ação inquisitória, mandando os que se opunham à ideologia religiosa para a fogueira.
Alguns pensadores, como Galileu Galilei, escapou, negando o que tinha afirmado
antes, que o Sol era o centro do universo conhecido e não a Terra. Giordano Bruno, em
1600, não aceitou renegar suas idéias e foi queimado pela Inquisição. Galileu, que tinha
sido seu contemporâneo, entendeu bem o recado e preferiu viver.
A ciência moderna não defende um princípio para o universo conhecido, através de
um criador, obviamente, mas chama - tentando demonstrar justamente que não existe um
criador – a matéria/energia original que dá início ao universo de “Partícula de Deus”, a
qual se busca entender a existência “definitiva” através do acelerador de partículas LHC.
A teoria da origem do universo mais aceita pela ciência atual é conhecida
popularmente como Big Bang (Grande Explosão), aperfeiçoada pelo ucraniano, radicado
nos Estados Unidos, George Gamow. Interessante que o físico inglês Fred Hoyle, que
cunhou a expressão “Big Bang”, o fez de uma forma jocosa, buscando desconsiderá-la. Ele
e Gamow tinham divergências públicas acaloradas sobre as reações termonucleares nas
estrelas e o funcionamento do universo. Hoyle era mais afeito a acreditar num universo
“estático”, estacionário e não em expansão.
Esta discussão se desenvolveu em função da descoberta da energia forte que
mantinha os prótons no núcleo atômico unidos, apesar de repelidos pelo eletromagnetismo.
22. 23
Como poderia elementos que se repelem manterem-se unidos? Quando os átomos são
submetidos à pressão e temperatura elevadíssimas, o núcleo pode se fundir. A aproximação
dos prótons por esta energia superior anula o eletromagnetismo, transformando-o de
repulsão em atração. Mas, nas pesquisas de Hoyle e Gamow, percebeu-se que a
temperatura e pressão de uma estrela como o Sol não eram suficientes para produzirem
todos os elementos naturais disponíveis no Universo e que deveria haver um local mais
quente ainda no universo que pudesse manter os prótons unidos no núcleo atômico.
Com o desenvolvimento da astronomia, se descobriu muitos tipos de estrelas,
conhecidas como gigantes-vermelhas, gigantes-brancas, azuis, anãs-brancas, novas e
supernovas, onde esta temperatura poderia ser atingida. Mas, foi com a descoberta das
estrelas chamadas de supernovas que o impasse se resolveu.
Supernova na verdade são estrelas que se encontram na fase final de suas vidas, ou
seja, sua destruição concentra tanta energia e calor que transforma os átomos de
Hidrogênio e Hélio em novos átomos mais pesados, agrupando prótons no núcleo atômico
e os liberam para um novo ciclo no universo depois da extinção da estrela. Quanto mais
pesado o átomo, mais prótons agrupados têm e mais instável se torna, tornando-se raro no
universo.
Como Gamow afirmou, as estrelas nascem e morrem. Os vários nomes que
recebem, como citei acima, são estágios diferentes da vida das estrelas. Foi chamada de
“nova” (novae) no início das observações astronômicas pelos antigos. Em sua fase final a
estrela pode aumentar em bilhões de vezes sua luminosidade em relação ao nosso Sol,
aparecendo no céu como uma “nova” estrela, sendo na verdade, uma fase que antecede sua
destruição total. Deveria ser chamada então de “supervelha”!?
George Gamow intuiu que o elemento básico, o hidrogênio, o átomo mais simples
do universo, com apenas um próton e um elétron, não poderia surgir na própria estrela, já
que dava origem a elas e todas as reações termonucleares posteriores e, obviamente, a
formação de todos os outros átomos mais pesados. O início gasoso de uma estrela, que
através da gravitação tende a concentrar a matéria em seu núcleo e aquecê-lo, transforma o
hidrogênio em hélio, desencadeando as outras reações nucleares. A pressão e temperatura
necessárias para criar o átomo de hidrogênio deveriam ser ainda maiores que as estrelas
conhecidas produzem em seu interior. Nosso Sol, por exemplo, uma estrela relativamente
pequena, tem em seu núcleo uma temperatura de 20 milhões de graus Kelvin, e em sua
superfície 6.000ºK.
Somente em um “momento único” de alta pressão e temperatura poderia
23. 24
desencadear o surgimento da matéria elementar em nosso universo. Outra teoria que
corrobora com essa tese de um início único para nosso universo é o fato deste estar em
expansão, comprovado pelo astrônomo Hubble, quando media as distâncias entre as
galáxias e percebeu que elas se afastavam. Este movimento de expansão,
consequentemente, leva ao resfriamento da matéria, uma tendência universal, expressada
na lei da Entropia.
Na década de 60, dois cientistas que se utilizavam de uma antena usada em
telecomunicações para experiências com eletromagnetismo na órbita terrestre, captaram
um chiado que não conseguiam eliminar de nenhuma forma. Chegaram até a limpar os
cocos de pombos que tinham por lá, achando que podia ser a causa das interferências; e
depois chegaram à conclusão que somente poderia ser o “barulho” da grande explosão,
uma radioatividade de fundo que permanecia se manifestando no universo pela sua
expansão. Era a prova de uma origem comum ao universo.
Uma medição recente estabeleceu que o universo conhecido teria,
aproximadamente, 13,8 bilhões de anos. Interessante que quando Gamow desenvolvia seus
estudos no final da década de 30, os físicos calculavam que o universo deveria ter 2 bilhões
de anos. Alguns elementos radioativos, como o urânio e o tório, se deixados em estado
natural, demoram bilhões de anos para perderem sua atividade radioativa e se
transformarem em elementos estáveis, como o chumbo. O tório pode demorar até 16
bilhões de anos. A raridade daqueles elementos no universo indicava a Gamow que o
universo poderia ser mais velho do que imaginavam até ali. E bota mais velho nisso...
O que nos interessa para este trabalho é perceber que desde o início, o universo vem
em um processo de desenvolvimento e constante transformação, através da relação de
forças contrárias contidas na matéria e que está em permanente movimento, ora se
juntando para formar gases e dar origem a estrelas, que irão liberar energia, formar
planetas, galáxias, para novamente consumirem-se e transformarem-se, ora voltando ao
ponto de partida em um possível “buraco negro”.
Um dos debates que se faz na ciência moderna sobre os chamados “buracos negros”
é que surgem com o colapso de estrelas gigantescas que distorcem o espaço-tempo,
formando um campo de atração da matéria tão intenso que nem a luz escapa do campo
gravitacional. Quando a energia e matéria se acumulam em níveis extraordinários, entra em
colapso novamente e libera todo seu conteúdo, tornando-se um novo ciclo de formação da
matéria e energia em movimento de expansão. Contração e expansão como elementos
ligados.
24. 25
Desta forma, o nosso universo conhecido pode ser um ciclo de surgimento,
desenvolvimento e extinção, mas não como extinção definitiva, mas infinita, onde novo
ciclo se iniciaria do princípio, através de nova concentração de energia e matéria, ou novos
"buracos negros".
O pensamento dialético carrega este princípio da negação e retorno a um começo,
onde a síntese de um processo em transformação é a negação da forma anterior, como
quando uma nebulosa formada por gases aquece em seu núcleo e transforma-se em uma
estrela e, posteriormente, em planetas que ficarão sob sua órbita. A estrela que vai se
materializando é a negação de sua forma gasosa e quando entra em colapso após a extinção
de seu combustível, volta à forma original, negando sua forma anterior e assim
sucessivamente.
Interessante frisar, como citei na Introdução, que o pensamento de Hegel coincide
em alguns aspectos essenciais com o pensamento de Einstein. Talvez por isso o
pensamento deste físico tenha coincidido com o funcionamento do universo. Como afirma
Engels, a Dialética é a representação consciente do universo em movimento, do qual a
mente humana deriva.
No prefácio da obra “A Dialética da Natureza”, o biólogo Haldane cita que Einstein
tomou conhecimento, em 1924, desta obra de Engels. Pediram sua avaliação para a
publicação, já que era uma obra científica de mais de 50 anos e inacabada. Pelo que conta
o prefaciador, Einstein tomou contato apenas com a parte que tratava das descobertas sobre
Eletricidade no século XIX, expostas por Engels. Mesmo não achando nada de relevante
para a física moderna da época, Einstein sugeriu que o trabalho fosse publicado. Talvez se
tivesse lido a obra toda, teria se surpreendido com a proximidade de suas conclusões com
as de Hegel, citadas por Engels.
25. 26
Capítulo II
Uma contradição surpreendente
O surgimento de nosso sistema solar seguiu o caminho de desenvolvimento e
evolução do universo, em constante transformação. Há aproximadamente 5,5 bilhões de
anos, uma nebulosa formada por gases aquece em seu núcleo e dá início a um ciclo de
formação de uma estrela, que sob o peso de seu campo gravitacional, concentra a matéria
em seu centro, aquece e inicia os movimentos de fusão termonuclear. Atrai e repele ao
mesmo tempo. Há várias teorias sobre o surgimento dos planetas. Gamow defendia a teoria
da atração entre duas estrelas quando o universo ainda era mais jovem e as estrelas não tão
afastadas. Desta forma, a atração e repulsão entre esses corpos gigantes criavam marés que
distorciam o material em fusão de seus corpos, podendo soltar “gotas” do material que, se
distanciando do corpo principal, tendiam a se resfriar rapidamente, formando corpos
sólidos. Esta profusão de material sob influência de atração e repulsão do Sol, se chocava,
fundindo-se e dividindo-se até acontecer a estabilidade do sistema.
Independente da forma como surgiram os planetas, como o princípio da Dialética
nos mostra, há transformação de quantidade em qualidade diferente e vice-versa, e novos
tipos de matéria vão surgindo com as reações químicas na formação de novas moléculas no
processo de resfriamento, na composição de novos elementos, neste ambiente em profusão
caótica e ao mesmo tempo ordenado.
Os planetas tenderam, lentamente, ao resfriamento, ou seja, ao equilíbrio
termodinâmico, assim como a própria estrela um dia se extinguirá e atrairá todos os corpos
celestes sob seu campo gravitacional ao colapso, mas, que significará também, um novo
início.
A ciência moderna afirma que a nossa estrela, o Sol, entrará em colapso a
aproximadamente 5 bilhões de anos, não sem antes passar por diversas transformações,
como acontece com todas as estrelas.
Nosso planeta Terra, assim como toda energia materializando-se, resfriava da
superfície para o interior. Os elementos químicos mais pesados decaíram para o centro,
formando o núcleo terrestre. Os menos densos formaram a crosta terrestre, expelidos como
magma vulcânico. Os elementos mais leves, gasosos, formaram a atmosfera e em
precipitação, os elementos em estado líquido. Porém, este é um processo em constante
transformação, onde os gases atmosféricos são absorvidos pelos elementos sólidos e
26. 27
líquidos, ou melhor, reagiam com estes e os elementos sólidos e líquidos transformavam-se
com o magma expelido, colocando o planeta em constante mudança físico-química.
Este processo de formação do planeta Terra tem, aproximadamente, 4,5 bilhões de
anos e continua ainda hoje em desenvolvimento, mas muito mais estável do que em seus
primórdios.
Se o espaço-tempo é formado pela matéria e energia em movimento, nosso planeta
no início era muito diferente do que é hoje. Todas as reações químicas possíveis se davam
entre os elementos principais e estruturantes, como Carbono, Hidrogênio, Oxigênio,
Enxofre, Ferro, Potássio, Nitrogênio, Fósforo, formando e transformando sólidos, líquidos
e gases, permanentemente.
Lovelock em sua análise sobre Marte, diz que é um planeta em equilíbrio: cessou
qualquer reação química possível. Por ter gravitação menor do que a Terra, não conseguiu
conter as moléculas de água na forma vapor, e desestruturadas pelo calor, principalmente o
Hidrogênio, sendo o átomo mais leve, tendeu a seguir caminho rumo ao espaço, onde
encontrará seu destino de transformar-se em uma nova estrela, ou moléculas de água, ou
mesmo matéria orgânica natural na forma álcool em algum planeta.
A questão é que átomos de Hidrogênio permanecem em um planeta na forma de
vapor de água e retornam ao ciclo planetário na forma de chuva. Porém, quando o planeta
aquece demais, o Hidrogênio se desprende da molécula de Oxigênio e não permanece na
atmosfera na forma de vapor, extinguindo toda a água na forma líquida. Marte ainda tem
água na forma sólida nos pólos. Porém, me parece que, se encontrarem alguma coisa,
somente poderão encontrar vestígios, já que por princípio da contradição, não há mais
nenhum movimento no planeta, o que é confirmado pela atmosfera estável, permitindo
afirmar que não há vida ativa.
Segundo Lovelock, nossa atmosfera inicial, quando tendia à estabilidade, tinha
características particulares, diferentes das atuais.
“O Hadeano (período entre 4,6 e 3,7 bilhões de anos) durou aproximadamente 1 bilhão
de anos e ao longo desse tempo a Terra esfriou e desenvolveu gases que se tornaram a
sua primeira atmosfera duradoura. Os gases que compunham o ar desse período eram,
provavelmente, o dióxido de carbono, o vapor de água, o nitrogênio, o monóxido de
carbono e pequenas quantidades de hidrogênio. Saber qual era exatamente a composição
é menos importante do que o fato de que aquela era a mistura certa para manter a
superfície aquecida, embora o Sol fosse 25 por cento menos luminoso do que agora. O
Hadeano ocorreu há tanto tempo que não restou nenhuma rocha que pudesse
proporcionar evidências científicas a respeito das condições que vigoravam naqueles
tempos violentos. É provável, porém, que houvesse abundância de água e uma produção
de hidrogênio que fosse suficiente para impedir o aparecimento de oxigênio livre.”
(LOVELOCK: 2006(a), p. 79).
27. 28
Para este trabalho, interessa, basicamente, a contradição primordial que deu início à
vida. Lovelock, inclusive, com seu humor inglês, diz que não é tão importante saber
"como" a vida surgiu, "já que temos certeza que ela surgiu", mas, como se desenvolveu e
está agora ameaçada.
Portanto, não pretendo discutir como a vida surgiu, mas seu desenvolvimento a
partir de uma contradição.
Simplicidade e complexidade
Pelo princípio da lei da Entropia, toda matéria tende ao equilíbrio, que em física
significa a impossibilidade de se extrair qualquer energia e cessa qualquer movimento.
Vimos também que o universo traz este princípio e, pelo fato de estar em expansão,
significa que está resfriando, ou seja, perdendo energia para fora2
do sistema e cessará de
existir um dia.
Outra lei da Entropia, porém, afirma que quando a matéria troca energia entre si,
esta energia se transforma, mas não se perde, realimentando o sistema. Não sou
conhecedor das teorias físicas especializadas, mas, pensar por contradição, ou
dialeticamente, sugere que, talvez, esta lei da Entropia tenha validade, como afirmou
Engels, não somente para a matéria em si, em sua dinâmica dentro do sistema, mas, para o
próprio universo como um todo. Sempre retornaria ao seu ponto original de formação da
matéria e liberação de energia, consequentemente, na formação de um novo espaço-tempo,
o que pode ser a função dos “buracos negros”, como princípio de tudo.
Quando pensamos em um início, pensamos em sua forma mais simples. Por isso, a
ciência sempre buscou reduzir a realidade às suas partes, para melhor entendê-las. A
questão depois é não se perder nas particularidades e esquecer as partes em sua dinâmica
no todo. Lovelock chama a visão do todo de holística. Por isso, a física moderna tenta
identificar a partícula original, a “partícula de Deus”, a mais simples e fundamental que
deu origem ao universo, para, justamente, poder entender toda a sua relação com a
complexidade.
Parece que a matéria e energia em seu processo contraditório de atração e repulsão,
colocando-se em movimento, transformando-se constantemente, tende sempre a negação
do simples, num caminho para a complexidade. Mas, a mesma matéria em movimento,
2
Este “para fora” pode significar a concentração dessa energia e matéria em algum ponto específico, um
“buraco negro” primordial, que dará início a um novo ciclo universal, um novo “Big Bang”.
28. 29
continua negando esta complexidade, retornando ao simples, que ao final é o elemento que
a condiciona, nas mais variadas formas de manifestação ao longo de seu caminho no tempo
e no espaço.
Talvez este também seja o caminho deste trabalho: parto de uma contradição
primordial, forças contrárias que se atraem e se repelem, que estão na trajetória da
evolução da própria vida e de nossa espécie em particular, para conseguirmos pensar nossa
realidade atual tão complexa.
29. 30
Capítulo III
Início da Vida - a contradição primordial
A vida somente poderia surgir da forma mais simples, através da matéria
organizada também de forma elementar. Há registros de elementos orgânicos de 3,8
bilhões de anos, ou seja, aproximadamente, 700 milhões de anos depois de nosso planeta
ter começado seu ciclo de desenvolvimento, 1,7 bilhões de anos do início de nossa estrela e
10 bilhões de anos depois de nosso universo conhecido ter iniciado.
Penso que a vida expresse em si a contradição universal da matéria e energia.
Existe um princípio fundamental para que seja considerada “Vida”: a matéria ponderável,
além de ter a capacidade de transformar matéria disponível em energia e esta energia em
matéria, restringida em um espaço delimitado, criando assim um sistema interno com
elementos do meio externo, deve ter ainda a capacidade de fazer funcionar tudo
novamente, através de trocas constantes matéria/energia – mundo interior/exterior,
“indefinidamente”.
Se colocarmos o exposto acima na linguagem biológica que conhecemos, a vida se
desenvolveu com seres unicelulares, em sua forma mais simples, delimitados por uma
membrana e com capacidade de reproduzir-se.
Este sistema “vida” de troca de energia entre formas materiais postas em
movimento é a própria contradição do universo previsto na primeira lei da entropia,
demonstrando que a energia que tende a dissipar-se, se trocada, materializada e
transformada, não se perde. Portanto, por princípio, a Vida é possível em todas as partes do
universo. Está sujeita as mesmas leis.
Uma questão importante que remeteria a infinitude do universo, desde que se aceite
que possa retornar a um ponto de origem (buracos negros), é que a vida unicelular se
reproduz como cópia de si, ou seja, tendo o Ser individual capacidade de reproduzir-se
indefinidamente, a Vida se torna infinita, contrariando o princípio da finitude da matéria
tendendo ao equilíbrio termodinâmico, da segunda lei da entropia.
Mesmo sabendo que o próprio Sol certamente se extinguirá, extinguindo todas as
formas de matéria organizada ao seu redor, a Vida expressa em si, a infinitude do universo,
em sua forma original, mais simples. Por isso, a lei da Entropia traz esta contradição: no
mesmo tempo que aponta a tendência ao equilíbrio, sendo na verdade a paralisação total do
movimento traz a lei contraria de conservação do movimento, através da troca constante de
30. 31
matéria/energia. Se pensarmos dialeticamente, pela interpenetração de forças contrárias, o
aparente antagonismo desaparece.
Poderíamos dizer que a Vida3
conserva a energia que é dissipada pelo Sol, que
tende ao equilíbrio termodinâmico, transformando-a em matéria e novamente em energia,
indefinidamente, contrariando assim, ou melhor, negando contraditoriamente as leis do
universo, no mesmo tempo que as confirma.
Uma das questões que mais se discute sobre a vida, não seria sua “possibilidade”,
mas, a “probabilidade” dela acontecer no restante do universo4
, já que as condições para
que o sistema-vida desenvolva-se, renove-se indefinidamente e, além do mais, torne a
matéria consciente de si mesma, é quase nula. Ainda mais que, no processo de
desenvolvimento da energia e matéria no universo, estas condições físico-químicas se
apresentam e se modificam constantemente, não permitindo a origem da vida, se todas as
condições prévias para seu surgimento não estiveram dadas, que nem de perto sabemos
todas quais são. É fácil entender isto: sob a Terra atual, não há mais as condições para que
a vida se origine do zero.
Temos todos, portanto, a mesma origem orgânica de há 3,8 bilhões de anos e
inorgânica de 13,8 bilhões. Bom, mas como disse Lovelock, "basta saber que a vida
surgiu".
A vida em desenvolvimento
Há várias teorias de como a vida surgiu, mas, independentemente da forma, a vida
só poderia se materializar e se desenvolver a partir da energia mais disponível – a energia
solar.
“Depois que a vida de fato começou, de início lentamente, mas depois numa escala
maior, ela passou a afetar o ambiente da Terra. Os cientistas não sabem quais foram os
primeiros organismos. Poderiam ser bactérias que usavam a energia solar, livremente
disponível, ou que ganharam energia por meio da fermentação de detritos orgânicos
resultantes de tentativas prévias e infrutíferas de constituição da vida. Podemos dizer
com segurança que logo depois que a vida começou, a fotossíntese – o aproveitamento
3
“O equilíbrio, ou o que os cientistas preferem chamar de “equilíbrio termodinâmico”, pode ser bem
explicado como um estado estável do qual não se pode extrair mais energia, (...). Para um químico, o estado
de equilíbrio está mais perto da morte do que do contentamento, uma vez que ele é alcançado apenas quando
toda a energia livre é consumida. Nada neste planeta se encontra em estado de equilíbrio”. (LOVELOCK:
2006(a), p. 21).
4
Neste exato momento em que faço uma revisão do texto (Out/09) foi anunciado o lançamento da sonda
espacial Kepler para identificar em nossa galáxia planetas semelhantes à Terra e que possam ter alguma
forma de vida. Custou 600milhões de dólares.
31. 32
da energia solar para produzir açucares simples – tornou-se a fonte primária de energia
para a vida.” (LOVELOCK: 2006(a), p. 80).
Desta maneira, os primeiros seres unicelulares desenvolveram a capacidade de
realizar a fotossíntese, ou seja, através da luz solar, transformar CO2 (dióxido de carbono)
+ H2O (água) em matéria orgânica - C6H12O6 - e liberar O2 (oxigênio) ao sistema, um
gás altamente reagente, energético, portanto.
O dióxido de carbono por ser um gás de exaustão, de onde não se retira mais
nenhuma energia diretamente, estava disponível na atmosfera inicial da Terra já que era
emitido em abundância, principalmente, pela atividade vulcânica.
O O2 liberado para a atmosfera não permanecia muito tempo isolado, oxidava
outros elementos, por exemplo, o ferro, disponível em abundância na superfície da terra5
.
Desta forma, a vida em sua forma mais simples, surge pela contradição universal da
matéria liberar energia tendendo ao equilíbrio (no caso, nossa estrela, o Sol) e ao mesmo
tempo, a energia que se dissipa para fora do sistema é retida pela matéria, transformando-
se, evita que se perca e realimenta o sistema.
É desta maneira que James Lovelock enxerga a Terra, como um ser único, Gaia.
Vida e não-vida no planeta passam a pertencer ao mesmo sistema, atraindo-se e repelindo-
se, transformando-se em forças contrárias complementares, em orgânico e inorgânico,
criando as próprias condições para se desenvolver:
“O nascimento de Gaia ocorreu quando a evolução dessas bactérias simples, conforme a
seleção natural darwiniana, e a evolução do ambiente da superfície planetária e da
atmosfera deixaram de ser dois processos separados e independentes. Quando a vida
começou a mudar a atmosfera, a seleção natural assegurou que a mudança só poderia se
5
Há uma teoria atual afirmando que a abundância de ferro na crosta da Terra foi fornecida inicialmente por
meteoros que se chocavam constantemente com o planeta e derivam do “Cinturão de Meteoros” do sistema
solar, situado entre Marte e Júpiter, em relação aos quais ficou comprovado possuírem grande quantidade de
ferro em sua composição. Originam-se de um planeta que se desintegrou, permanecendo seu núcleo mais
denso na forma de corpos celestes. O átomo de ferro, aliás, tem o núcleo mais estável que existe, com 26
prótons. Sua estabilidade coincide com sua abundância no universo, sendo o elemento mais disponível depois
do hidrogênio e hélio. O ferro surge justamente pela tendência à estabilidade dos núcleos atômicos, pelo
decaimento radioativo. Quanto mais pesado o núcleo de um átomo, mais instável se torna e mais raro. Por
isso o elemento urânio que possui 92 prótons é usado para a fabricação de bombas atômicas. Concentra
grande quantidade de energia forte em seu núcleo, que mantêm os prótons unidos, através das fusões
nucleares. Expressa assim a imensa energia produzida em alguma estrela supernova. Quando se faz a fissão
do núcleo atômico com bombardeio de nêutrons, a energia é liberada por reação em cadeia e de uma vez. Por
isso sua grande capacidade de destruição. A Bomba de Hidrogênio é o processo de fusão nuclear do
hidrogênio pesado, chamado deltério, em hélio, o que necessita de alta pressão e temperatura, o que é
conseguido com uma bomba atômica. Portanto, o estopim da bomba de hidrogênio é uma bomba atômica,
assumindo assim proporções maiores de destruição. Dominamos a Natureza para construir e destruir.
Lovelock defende que a energia atômica é a mais limpa que existe para ser utilizada na produção, causando
alvoroço, pois, somente “vemos” seu lado destrutivo.
32. 33
dirigir para um ambiente favorável. A auto-regulação do clima e da química da Terra se
tornou então uma conseqüência natural e inevitável (...).” (LOVELOCK: 2006(a), p.
83s).
Com o surgimento da vida e o desenvolvimento da fotossíntese, a atmosfera
terrestre já não se "comportava" apenas através das leis universais da física e da química,
mas começava a compor-se, com proporções que somente através da Vida pode ser
possível.
Com o desenvolvimento da produção de matéria orgânica através da fotossíntese,
foi possível o surgimento e adaptação de outras formas de organização de vida, tão simples
quanto aquelas, mas que, ao invés de processarem a energia mais disponível, a energia
solar, processavam a energia contida na matéria orgânica que era liberada para o sistema
pelos Fotossíntetizadores, que não as absorviam totalmente. Desta forma, desenvolveram-
se os seres Fermentadores ou metanogênicos (produtores do gás metano), que através do
processo anaeróbico (ausência de oxigênio), quebravam a molécula orgânica,
transformando-a em dióxido de carbono e liberando gás metano (CH4) à atmosfera
Por fim, surgem seres também unicelulares muito simples, que se alimentavam
diretamente destes outros seres, trazendo-os para o seu interior, transformando a energia
contida em seus corpos como energia para si. Liberavam o que não era aproveitado como
matéria orgânica, ou mesmo elementos químicos decompostos, que seriam reaproveitados
pelos Fermentadores ou Fotossintetizadores, ou mesmo modificando as reações químicas
de rochas e outros gases.
Estes seres que se apropriavam da energia contida em outros seres são chamados de
Consumidores. Passavam também a consumir outros consumidores.
Se fossemos fazer um encadeamento de fatos, a vida surgiu, melhor, se
desenvolveu, através da fotossíntese, utilizando-se da energia mais disponível no sistema, a
energia solar e das moléculas de Carbono e Oxigênio contidas no gás Dióxido de Carbono,
mais água, abundantes na crosta inicial. Com a reprodução do sistema fotossintetizador, a
partir dele mesmo, através de mutações genéticas na reprodução dos seres, ou mesmo de
forma independente, desenvolveram-se os fermentadores, que se utilizaram dessa matéria
orgânica produzida pela fotossíntese na ausência de oxigênio, para produzirem sua energia;
e, por fim, seres que passaram a consumir a energia contida nos próprios seres na presença
de oxigênio, formando um sistema integrado.
A atmosfera da Terra e o planeta como um todo começava a se modificar a partir
desta nova forma de organização e desenvolvimento da matéria, tornando-se a expressão
33. 34
de uma contradição: forças que se atraem e se repelem, destroem-se e complementam-se,
pois temos o início de uma atmosfera improvável quimicamente6
, se deixada às leis
“imutáveis” do universo. Uma nova síntese, negação da negação.
6
“Fotossintetizadoras: os detalhes sobre a origem da vida são indescritíveis, mas logo depois que as
primeiras formas de vida apareceram na Terra, os organismos provavelmente aprenderam a utilizar o prêmio
energético da luz solar para crescer e se sustentar. As primeiras bactérias fotossintetizadoras utilizavam a luz
solar em uma complexa série de passos graças aos quais elas retiravam carbono do dióxido de carbono do ar
e do oceano e o empregavam para construir os seus corpos. O atual sistema de fotossíntese utilizando a
clorofila foi um dos primeiros passos. O oxigênio era excretado como um subproduto. O ambiente primitivo
da Terra era reativo com relação ao oxigênio e não havia acúmulo desse gás como há hoje.
Fermentadoras ou Metanogênicas: um mundo com bactérias fotossintetizadoras só poderia ser instável.
Elas logo trancariam no seu corpo a maior parte do carbono disponível. A remoção de dióxido de carbono
por elas enfraqueceria tanto a estufa que o mundo teria congelado, e a vida cessaria. Isso nunca aconteceu.
Junto com as fotossintetizadoras coexistiam as bactérias fermentadoras simples, as metanogênicas. Esses
organismos processavam a matéria orgânica feita pelas fotossintetizadoras e devolviam carbono ao ar como
uma mistura de metano e dióxido de carbono, restaurando a estufa. Um bônus oferecido pela presença do
metano foi a criação de uma camada de “smog (neblina e fumaça) orgânico” na atmosfera superior,
protegendo a superfície contra a radiação ultravioleta, desempenhando um papel muito semelhante ao da
camada de ozônio atualmente.
Consumidoras: limitadas a pacotes isolados perto da superfície, onde oxigênio suficiente seria produzido
pelas fotossintetizadoras para sustentá-las, as primeiras bactérias consumidoras teriam vivido de produtos
orgânicos formados pelas fotossintetizadoras.” (LOVELOCK: 2006(a), p. 84s).
34. 35
Capítulo IV
A vida em mutação
A vida é uma forma especial de movimento: consegue interagir com o meio
externo, transformando-o e transformando-se, organizando a matéria e energia em formas
sempre mais adaptadas a estas próprias transformações.
O grande mistério é como esta organização da matéria surgiu e desenvolveu-se,
como informação molecular disponível em um espaço-tempo específico, de um sistema
específico, talvez único no universo conhecido. Portanto, grandioso e frágil ao mesmo
tempo.
O mecanismo de desenvolvimento da vida foi mais bem explicado até agora, em
seus aspectos práticos, por Darwin, com a teoria da seleção natural, onde o mais apto (não
o mais forte como costumamos dizer) transfere suas características de organização material
aos seus descendentes, através da informação genética. É importante frisar que esta
adaptação se dá por transformações na organização genética do ser, de forma aleatória, no
momento da reprodução. Os seres unicelulares, a forma mais elementar de organização da
matéria como vida, simplesmente duplicam suas informações genéticas e sua organização
material, podendo neste processo sofrer mutações.
Este mecanismo básico da vida opõe sempre uma nova forma a forma anterior,
mesmo que não tenha sofrido nenhuma modificação. Porém, a probabilidade de
informações duplicadas sofrerem mudanças é sempre muito grande. Se a modificação no
Ser for favorável à sua sobrevivência, prevalecerá, do contrário, será descartada.
Dizemos sempre que há uma “adaptação ao meio”. É no relacionamento com o
meio externo, que inclui outros seres, da mesma e de outras espécies, que o ser obtém os
recursos necessários para continuar existindo; sejam recursos na forma de energia solar,
matéria orgânica liberada ao sistema, ou os próprios seres vivos como fonte de energia.
Darwin frisava muito bem que a seleção natural não tem nenhum propósito pré-
estabelecido e que em princípio, favorece apenas o indivíduo e não a espécie, como o
conjunto de indivíduos com características genéticas semelhantes. É justamente este
aspecto contraditório, de favorecer o indivíduo e não a espécie, que permite o surgimento
de novas variedades mais adaptadas, que se diferenciam de sua espécie de origem,
superando-a e transformando-se em uma nova espécie.
James Lovelock e Lynn Margulis nos mostram como as formas mais simples de
35. 36
vida, onde a reprodução se dá por divisão do próprio indivíduo, prevaleceram por bilhões
de anos, como formas adaptadas ao ciclo evolutivo do universo e, em particular, de nosso
sistema solar; fossem eles os mais primitivos, sem nem mesmo um núcleo, os procariotes,
fossem os mais desenvolvidos, com núcleo e mitocôndrias, os eucariotes.
Apontam muito claramente a dependência de toda a vida na Terra destes seres
unicelulares:
“A evolução dos organismos vivos encontram-se tão estreitamente acopladas à evolução
do ambiente que juntos eles constituem um único processo evolutivo no qual a vida,
literalmente falando, molda o ambiente para que ele se ajuste a ela. E nessa história
notável são os menores e mais humildes organismos que desempenham o papel
principal.” (LOVELOCK: 2006(a), p. 99).
Somente mais recentemente na história evolutiva da vida, começaram a surgir os
seres multicelulares.
Um aspecto que Lovelock chama a atenção é que, com o desenvolvimento da vida,
a relação da matéria viva com o meio inorgânico, o transforma e o mantém com reações
químicas improváveis pelas leis universais da química: nossa atmosfera mantém uma taxa
de 21% de oxigênio e 0,01% de CO2, ou seja, a transformação pela vida, da energia mais
disponível, a energia solar, em matéria, retém o carbono contido no CO2 em suas variadas
combinações e libera oxigênio ao sistema, um gás altamente reagente, energético, portanto.
Não haveria a atmosfera que temos hoje sem Vida. Portanto, a vida depende da
energia disponível do Sol que tende a se extinguir, um princípio básico do funcionamento
do próprio universo, mas, transformando a energia em matéria orgânica, cria um sistema
que se opõe a este princípio: torna a vida infinita, sempre se renovando.
A vida criou e desenvolveu as próprias condições de sua existência, por seleção
natural, a partir dos seres individuais que a compõe, porém, formando um todo estruturado,
orgânico e inorgânico.
A taxa de 21% que temos hoje de oxigênio, nem sempre foi assim. No início da
vida na Terra a atmosfera mais provável era de saturação de CO2, já que havia grande
quantidade de atividade vulcânica. Foi, justamente, esta saturação que permitiu que um
mecanismo de quebra da molécula de Carbono, separando-a do Oxigênio, utilizando-se da
energia solar, surgisse.
Quando a Vida já estava suficientemente desenvolvida, este mecanismo de
soterramento de Carbono prevaleceu e as taxas de O2 começaram a subir. Este gás
altamente energético começou a ser utilizado pelas formas de vida que necessitavam de
36. 37
maior energia para sobreviver, por exemplo, as bactérias consumidoras que precisavam se
locomover para capturar outras bactérias para transformá-las em energia própria.
Desta forma, utilizar o oxigênio daria uma vantagem adaptativa em relação a outros
competidores. A mitocôndria celular tem o papel de utilizar o oxigênio como combustível
energético. Lynn Margulis tem uma teoria de que este desenvolvimento se deu por
“endossimbiose”, ou seja, duas bactérias diferentes acabaram unificadas, fundindo-se, o
que gerou uma vantagem adaptativa no aproveitamento do recurso agora disponível. A
conclusão baseia-se no fato de que as informações genéticas das mitocôndrias são
diferentes das informações do núcleo celular.
Com as taxas de O2 aumentando na atmosfera, foi possível o surgimento de
organizações celulares mais complexas, com maior dispêndio de energia. Lovelock aponta
que as taxas atuais de O2 estabilizaram-se neste patamar por volta de 1 bilhão7
de anos
atrás, portanto, 2,8 bilhões de anos após o surgimento da vida. Assim, a vida mais
complexa só foi e é possível, em função da vida em sua forma mais simples. Aliás, como
todo o universo, que depende de sua forma mais simples de organização da matéria, o
átomo de hidrogênio, surgido apenas em um instante original.
Outro dado que comprova a mudança na atmosfera do planeta, com aumento na
taxa de oxigênio, é o fato de que os fósseis disponíveis de seres multicelulares com
estrutura sedimentar de cálcio, interna ou externa, datarem por volta de 600 milhões de
anos. Anteriormente, não se encontra este tipo de fóssil, o que sugere apenas a existência
dos seres unicelulares, ou multicelulares sem aquela estrutura, pois, seus fósseis, são
praticamente impossíveis. O que se encontra como “fósseis” dos seres unicelulares são as
reações químicas orgânicas que deixaram no meio inorgânico. O mais antigo vestígio
encontrado até hoje data de 3,8 bilhões de anos, daí ser usada esta data como provável
início da vida na Terra8
.
7
“Depois que as comunidades de células se consolidaram como organismos multicelulares, houve uma
maior necessidade de oxigênio, e de meios quantitativamente mais eficientes de aumentar o seu suprimento
por meio de soterramento de maiores quantidades de carbono. É possível que o oxigênio no ar tenha
começado a surgir em abundância quando os organismos que precisavam dele evoluíram, possivelmente por
volta de 1 bilhão de anos atrás.” (LOVELOCK: 2006(a), p. 106).
8
Depois que já havia escrito este trecho saiu uma notícia na imprensa que encontraram vestígios de vida no
planeta de 4,2 bilhões de anos atrás.
37. 38
Capítulo V
Contradição entre indivíduo e reprodução
O mecanismo básico de reprodução da vida, onde o ser se divide em uma forma
semelhante e ao mesmo tempo a modifica pelas mutações genéticas, tornou o princípio da
tendência ao equilíbrio termodinâmico, ou seja, a falta de movimento, em movimento
constante, permanente, infinito.
Podemos dizer que o Ser individual e o princípio da vida, coincidem em sua
infinitude.
Quando a complexidade do Ser aumentou com as transformações ocorridas no
planeta, vinculada ao aumento da taxa de oxigênio, e a própria evolução dos seres vivos, a
funcionalidade do Ser também se tornou mais complexa, gerando células com funções
específicas, materializando-se em órgãos também específicos (atualmente, com a
descoberta das células-tronco, este princípio fica mais claro – um tipo de célula dá origem
a todas as demais – o mesmo princípio do surgimento da matéria no universo).
Uma tendência do padrão mais simples caminhar para o mais complexo é a
organização da matéria perder sua simetria, principalmente interna. Apesar do universo
como um todo ser formado do mesmo elemento básico, a matéria em sua complexidade
assume formas diferenciadas e não-simétricas em sua organização. Assim, também, se dá
com os seres vivos, onde a organização celular mais complexa exige a combinação de
formatos assimétricos, apesar de necessitar haver uma harmonia entre as partes, já que
qualquer elemento que comprometa o funcionamento do sistema como um todo será
descartado, com a eliminação da própria organização da matéria, por seleção natural.
Quando os seres vivos começaram a se desenvolver como indivíduos mais
complexos e perderam a simetria de seu conjunto, não era mais possível se reproduzir por
divisão individual apenas, como é o princípio da vida em sua infinitude.
É preciso então que o indivíduo se desenvolva até um estágio e retorne à sua forma
original, mais simples, unicelular. Dois mecanismos contrários e que se complementam se
desenvolveram para que isso acontecesse: o sexo e a morte do indivíduo.
Os seres unicelulares ou multicelulares rudimentares simétricos se dividem a partir
do próprio indivíduo, não havendo a necessidade de sexo (apesar de estar comprovado que
as bactérias trocam material genético livremente, podendo ser consideradas, como afirma
Margulis, uma única espécie), nem de morte do indivíduo, já que este se divide em dois e
38. 39
assim em progressão geométrica. Por rapidamente sofrerem mutações, as bactérias são
mais adaptadas; elas trocam material genético livremente, como nos comprovam as
bactérias nocivas ao ser humano e que tanto infernizam os hospitais e enriquecem os
laboratórios, com a necessidade de antibióticos cada vez mais potentes. Afinal, bactérias
possuem “somente” 3,8 bilhões de anos de adaptação.
Inicialmente, o retorno à forma original de um ser complexo em um ser unicelular,
para se continuar o ciclo da vida, devia ser um mecanismo estruturado no próprio
indivíduo. A troca de material genético estaria disponível pelas diferentes células que
compõe seu organismo, algumas assumindo esta função específica de reprodução, como é
o caso de seres hermafroditas; ou mesmo a reprodução assexuada, onde o indivíduo gera a
célula germinal que será cópia de si mesmo, ou um clone.
Por outro lado, em função da seleção natural, quanto mais se troca material
genético entre indivíduos diferentes, maior será a chance da prole desenvolver
características dos mais adaptados da espécie e não ficar à mercê das mutações
degenerativas que ocorrem no indivíduo que, simplesmente, divide seu material genético.
Lovelock em seu livro - “Gaia – cura para um planeta doente” - criou uma imagem
interessante para ilustrar esta situação: se você pegar várias notícias com o mesmo texto e
suprimir palavras aleatoriamente em cada uma delas (ele fala de exemplares do mesmo
jornal que levam tiros numa guerra) e depois juntá-los para formar uma única noticia, a
probabilidade da mensagem se completar novamente como o texto original é enorme. Mas,
se você perder palavras em um único texto e o vai duplicando por cópia e perdendo
palavras a cada nova cópia, o texto ao longo do tempo deixa de ter sentido. Portanto, a
probabilidade de degeneração genética aumenta mais, quando ocorre troca de material
genético entre seres com parentesco próximo: as “palavras” faltantes serão as mesmas e
não há como complementá-las.
Assim, os seres mais complexos que desenvolveram mecanismos de troca de
material genético com outros indivíduos, obtiveram uma melhor eficiência evolutiva.
Inclusive, por esta função específica na reprodução, surge a distinção de sexo entre
indivíduos, macho e fêmea e, consequentemente, de adaptação por seleção natural e
“seleção sexual”, conforme afirmou Darwin.
O chamado dimorfismo sexual, onde características no macho e fêmea aparecem,
em um, mais desenvolvidas e no outro, atrofiadas, como é o caso das mamas no homem e
na mulher ou o pênis e o clitóris, demonstra esta origem comum e que depois assumiu
funções específicas, separando-as. No feto, justamente, esta distinção não aparece na fase
39. 40
inicial e Freud percebeu nas crianças, que não há esta distinção entre feminino e masculino
também nos primeiros anos de desenvolvimento da psicologia infantil, ganhando contornos
de distinção no desenvolvimento da sexualidade, até aproximadamente os 5 anos de idade,
ao qual Freud chamou de Complexo de Édipo. Estes temas aparecerão no contexto dos
capítulos da Parte II, onde tratarei de temas específicos.
Não podemos esquecer que esta troca de material genético não se dá
necessariamente com a introdução de algum órgão reprodutor em outro indivíduo, mas a
combinação do material genético entre duas células de indivíduos distintos, que pode
ocorrer em qualquer meio. Devemos salientar que, comprovadamente, a vida se
desenvolveu e se proliferou na água e só muito recentemente em terra.
As plantas também fazem sexo, com a ajuda de outros seres ou mesmo com a ajuda
de fenômenos naturais, como o vento. O que caracteriza sexo, portanto, é a necessidade
premente de troca de material genético entre os seres individuais, principalmente, os
complexos, para que a vida dê prosseguimento. Diferentemente dos seres mais simples,
que não dependem, necessariamente, deste mecanismo para se reproduzirem.
Sexo e morte
Mas, por que a complexidade, que desenvolveu o sexo, traz também a necessidade
do indivíduo morrer?
A meu ver, porque as células, como o elemento estruturador simples, têm um
período de vida determinado e devem também se reproduzir, dividindo-se. Só conseguem
isso no ser multicelular, como função de organização total do indivíduo complexo,
unificado. As células não existem mais isoladamente. Como o princípio da vida é infinito,
desde que o ser possa se dividir e continuar existindo em sua forma anterior, isso somente
é possível no ser complexo, voltando à forma original, básica, mais simples possível. Isto,
agora, acaba sendo a função do indivíduo como um todo: voltar à forma original e
reproduzir seus genes, através de uma célula específica germinal, independente em sua
função do ser que a originou. Quando isto acontece, o ciclo se completa e as células
individuais que compõem o indivíduo precisam morrer. Sua função básica, evolutiva,
universal, de preservar a própria vida, já se materializou em um novo ser, independente de
si mesmas.
Como dissemos anteriormente, a energia e matéria somente se conservam se
estiverem em movimento constante. Assim, na complexidade, para a Vida continuar
40. 41
infinita, o indivíduo tem que ser finito. Como o ser complexo não tem a possibilidade de
reproduzir a si mesmo, dividindo sua estrutura, não há como permanecer desenvolvendo-se
permanentemente. Tenderá sempre ao equilíbrio termodinâmico, uma lei universal da
matéria. Seria desperdício de energia manter um indivíduo complexo para sempre: a
matéria e a energia já se renovaram em um novo ser. Precisa o ser complexo voltar assim à
sua forma elementar, inorgânica, decompor-se para permanecer integrado ao sistema.
Somente assim há renovação e movimento.
Desenvolveu-se sexo e como sua expressão contrária e que lhe complementa,
morte9
. Que bela contradição!
Veremos na Parte II estes princípios de preservação e morte que aparecem nas
explicações de Freud sobre os instintos e o comportamento humano.
9
Os franceses chamam o orgasmo de petit mort.
41. 42
Capítulo VI
Seleção de espécies
É muito difícil para as pessoas em geral aceitar, ou mesmo entender, como um ser
pode se transformar em outro ao longo do tempo, quando o olhamos apenas externamente
e em sua forma atual. Darwin em seu livro “A Origem das Espécies” usa, o que chama de
“Seleção Artificial”, para ilustrar estes acontecimentos, já que em sua época ainda não se
conhecia o mecanismo genético na formação e desenvolvimento da vida.
Seleção artificial é o que o homem fez mais intensamente ao longo de sua história
econômica, onde a partir do domínio da agricultura a pelo menos 14mil anos, começa a
selecionar determinadas características de plantas e animais que lhe serviam em seu
cotidiano. Assim, preservava, mesmo que de forma inconsciente, características genéticas
na prole que lhe interessavam e descartava as que não lhe interessavam. Desta maneira,
acabava por transformar as características originais do ser encontrado na natureza, o que o
tornava distinto ao longo do tempo em relação ao resultado obtido.
Quando olhamos um chiuaua, um cãozinho mais parecido com um ratinho,
imaginamos que sua origem genética é de um lobo? Ou que brócolis, couve-flor, couve,
tem origem em uma mesma planta? Hoje, com o domínio da ciência genética, é possível
comparar a estrutura dos genes e não somente a aparência do ser em si, para afirmar, se
tem ou não, a mesma origem, pelo menos na história evolutiva recente, o que pode
significar milhares de anos.
Isso também basta para salientar que a estrutura do DNA (ácido
desoxirribonucleico) contido em todos os seres, dos mais simples aos mais complexos, tem
a mesma estrutura molecular básica (Adenina, Citosina, Guanina e Timina), demonstrando
que temos a mesma origem comum. Se ampliarmos este raciocínio para os elementos que
compõem o universo, somos necessariamente “filhos” do desenvolvimento que se iniciou,
pelo menos nesse nosso universo conhecido, há 13,8 bilhões de anos.
Darwin usou o princípio da seleção artificial para ilustrar a seleção natural. Porém,
salientava, com veemência, que a seleção artificial era controlada pelo homem para
satisfazer as suas próprias necessidades e não a do ser em si, trazendo inclusive muitas
vezes uma degenerescência para este, já que o homem dominava apenas as mudanças nas
características aparentes e de comportamento do ser.
As mudanças na estrutura genética, não eram passíveis de controle direto, causando