This document summarizes the story of Merlin as told by Robert de Boron. It describes how the demons, angry at being defeated by Jesus Christ, decided in a council to create an Antichrist through the impregnation of a woman by an incubus demon. Their goal was to mislead humanity away from the path of Christ. Merlin was born from this unholy union and was given powers of prophecy and knowledge to deceive people, but instead he used his gifts to serve God and prepare the way for King Arthur.
1. Merlim, o Mago
e o Livro do Graal
histórias simbólicas do ciclo arturiano
2.
3. Robert de Boron
Merlim, o Mago
e o Livro do Graal
histórias simbólicas do ciclo arturiano
apeiron
edições
4. Merlim, o Mago e o Livro do Graal
Pintura de Gabriela Marques da Costa
Apeiron Edições 7
5. Índice
Nota do Editor 11
Merlim, o Mago 15
Apêndices
O possível fim de Merlim segundo o Manuscrito de Modena 197
O possível fim de Merlim segundo o Manuscrito de Didot 201
6. Merlim, o Mago e o Livro do Graal
Nota do Editor
Pela sua importância histórica e o seu significado simbólico, es-
colhemos como primeiro título da Apeiron Edições, a obra de Robert de
Boron, Merlim, o Mago e o Livro do Graal.
Os primeiros registos sobre o mago Merlim datam dos inícios do sé-
culo X. Inicialmente chamado Emrys, só mais tarde se tornou conhecido
como Merlim, versão latinizada da palavra gaulesa Myrddin.
Merlim, personagem de origem misteriosa, mago com poderes so-
brenaturais e concebido num concílio de demónios, confia ao narrador
Brás, confessor de sua mãe, a tarefa de pôr a sua missão profética por
escrito. O Livro do Graal vai surgindo à medida dos acontecimentos,
profetizando que nunca a estória de uma vida será ouvida com tanto
agrado como a de Artur e dos Cavaleiros da Távola Redonda.
Robert de Boron situa a personagem Merlim num momento crucial.
Ao perceberem que o seu poder corria um grave risco com a vinda do
Redentor, os demónios resolveram, em concílio, criar o Anticristo, por
meios (magia negra) que violam as leis naturais da criação. Assim, um
íncubo (diabo) fecundou o corpo de uma pura donzela, tal como, em
sentido contrário, o Espírito Santo fizera com a Virgem. O rebento nas-
cido dessa relação diabólica teria a missão de afastar a humanidade do
caminho do Bem, traçado por Cristo, e de conduzi-la para os abismos
infernais.
Há, na narrativa de Robert de Boron, uma relação tão íntima entre
Merlim e o Graal, que o próprio Mago tornou-se o autor da estória, na
medida em que é ele quem transmite os factos a serem registados pelo
seu fiel escriba Brás. Desse modo, Merlim cumpre a missão de preparar
os reis e o povo para o advento do mais puro de entre todos os ca-
valeiros da Terra, único digno de ocupar o cadeirão vazio na Távola
Redonda, fundada pelo Rei Artur.
O Editor
Apeiron Edições 11
7. Quando o Homem desperta para um grande sonho e
acredita nele com toda a força da sua alma...
todo o universo conspira a seu favor
Goethe
8. Merlim, o Mago e o Livro do Graal
1
O inimigo ficou muito irritado quando Nosso Senhor desceu aos in-
fernos e libertou Adão e Eva e quantos mais lhe agradou. Quando os
demónios viram isso, ficaram muito maravilhados, reuniram-se em con-
selho e disseram entre si:
– Quem é este homem que nos levou de vencida? Porque é que,
com toda a nossa força, nada há que possamos fazer para impedir que
continue a fazer o que bem lhe apraz? Nunca poderíamos imaginar que
algum homem nascido de mulher pudesse escapar às nossas garras. E
eis que este nos destrói! Como pode ter nascido sem fazer parte dos
pecados deste mundo, ao contrário de todos os outros homens?
Um dos demónios respondeu então:
– Fomos vencidos pelo que julgávamos que mais nos valeria. Lem-
brai-vos do que diziam os profetas que anunciavam que o Filho de Deus
viria à Terra para apagar o pecado de Adão e Eva e dos seus descen-
dentes. Nós apoderamo-nos daqueles que proclamavam que esse ho-
mem viria à Terra e livrá-los-ia das penas do inferno. E eis que acon-
teceu o que não se cansavam de anunciar. Esse homem arrebatou-nos
aquilo de que nos tínhamos apoderado e nada podemos contra ele. Ele
arrebatou-nos todos aqueles que já tínhamos sob o nosso domínio e que
mais ninguém nos podia retirar. Como foi que isso aconteceu? Como é
que já não os teremos mais?
– Não sabeis então, prosseguiu outro demónio, que ele faz com que
se lavem com água, em seu nome, para que essa água lave o delito de
pai e mãe, precisamente aquele pecado pelo qual os teríamos sob o
nosso domínio, como sempre os tivemos? Doravante perdemo-los todos,
por causa dessa água, e não temos nenhum poder sobre eles, a menos
que venham a nós pelos seus próprios pecados. Deste modo, o nosso
poder ficou rebaixado e bloqueado. E há mais ainda: ele anunciou que
vai ordenar e deixar ministros seus na Terra para salvá-los, ainda que
venham a participar das nossas obras, bastando para tal que as re-
neguem, que se arrependam e façam o que lhes for ordenado. Assim os
Apeiron Edições 15
9. Robert de Boron
perderemos, se forem moderados. Aquele que veio à Terra para salvar a
humanidade e quis nascer de uma mulher, sem que o soubéssemos, sem
pecado de homem e de mulher, propiciou um benefício inteiramente
espiritual. E se o víssemos e o tentássemos de todos os modos ao nosso
alcance, não encontraríamos nele nenhuma das nossas obras, tal é a sua
determinação em salvar os homens. Tanto amou os homens, que quis
morrer para salvá-los e tirá-los do nosso jugo. Deveríamos então buscar
agora um meio de reconquistar os homens, antes que se possam ar-
repender e antes que digam a quem lhes concedeu o perdão que esse
homem os redimiu com a sua morte.
Então disseram todos juntos:
– Perdemos tudo, visto que ele pode perdoar os pecados até ao
último instante da vida do homem. E, se o encontrar nas suas obras,
estará salvo; e ainda que esteja nas nossas obras até ao fim, se se
arrepender e cumprir o que mandam os seus ministros, perdê-lo-emos.
Assim perderemos a todos, se não os retivermos. Mas quem é que nos
prejudicou mais e nos estorvou e propiciou a vinda dele à Terra?
Então prosseguiram dizendo entre si:
– Quem nos prejudicou mais foram aqueles que anunciaram a sua
vinda. Por meio deles é que nos aconteceram os maiores prejuízos.
Quanto mais anunciavam a sua vinda, mais nós os atormentávamos.
Parece mesmo que ele se apressou em vir ajudá-los e socorrê-los dos
tormentos que lhes causávamos. De que modo conseguiríamos alguém
que falasse aos homens e dissesse quais são os nossos objectivos, qual o
nosso poder e a nossa maneira de agir, e que tenha, como nós, poder de
saber o que acontece, o que se diz e o que se faz? Se contássemos com
um homem com esse poder, que soubesse essas coisas, e pudesse viver
com os outros homens na Terra, ele poderia ajudar-nos muito a enganá-
-los, assim como os profetas que estavam do nosso lado e prediziam o
que nunca imaginávamos que pudesse acontecer. Esse homem narraria
as coisas ditas e feitas num passado distante ou próximo e ganharia a
confiança de muita gente. Então disseram todos juntos:
– Excelentes resultados conseguiria quem pudesse criar um tal ho-
mem. Todos acreditariam nele.
Disse um deles:
16 Apeiron Edições
10. Merlim, o Mago e o Livro do Graal
– Não tenho o poder de conceber nem de fecundar uma mulher,
mas se tivesse, faria com gosto, porque tenho uma mulher que faz e diz
tudo o que eu quero.
Disse um outro:
– Mas há entre nós quem possa assumir a figura humana e fecundar
uma mulher, e convém que a engravide o mais discretamente possível.
Assim disseram e decidiram que gerariam um homem que enganaria
os outros. São loucos demais, porque imaginam que Nosso Senhor, que
tudo sabe, ignora as suas obras. O diabo então decidiu fazer um homem
que tivesse a sua memória e a sua inteligência para enganar Jesus Cris-
to. Deste modo podeis saber quanto louco é o diabo, e muito devemos
temer, porque tão louca coisa nos engana.
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