MPPE pede novo afastamento do prefeito de São Lourenço
Ação de improbidade prefeito - adriano dill - cessão de uso - sem licitação [06.2014.00000019-8]
1. MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA
EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO
2ª VARA CÍVEL - COMARCA DE XANXERÊ
O
MINISTÉRIO
PÚBLICO
DO
ESTADO
DE
SANTA
CATARINA, pelo Promotor de Justiça titular da 2ª Promotoria de Justiça de
Xanxerê, com fundamento nos arts. 127 e 129, III da Constituição da
República, bem como no art. 17 da Lei n. 8.429/92 e no art. 5º da Lei nº
7.347/85, e nas informações colhidas no Procedimento nº 06.2013.000132361, propõe AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA COM PEDIDO DE
DECLARAÇÃO DE NULIDADE DE ATO ADMINISTRATIVO em face de:
ADEMIR
JOSÉ
GASPARINI,
brasileiro,
casado,
Prefeito
Municipal, nascido em 20 de novembro de 1958, em Xaxim, filho de Isidoro
Gasparini e de Elide Trentin Ebertz, RG nº 1.015.291-SC, com domicílio
funcional na rua José de Miranda Ramos, 455, Xanxerê;
2. MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA
ADRIANO MARCOS DILL & CIA LTDA, pessoa jurídica de
direito privado, inscrita no CNPJ sob o nº 97.541.812/001-86, representada
pelo senhor Adriano Marcos Dill, CPF nº 017.598.309-76, residente na rua
Deolindo Ferronato, 506, Bairro Monte Castelo, Xanxerê;
MUNICÍPIO DE XANXERÊ, pessoa jurídica de direito público,
inscrita no CNPJ sob o nº 83.009.860/0001-13, representada pelo Prefeito
Municipal Ademir José Gasparini, com domicílio funcional na rua José de
Miranda Ramos, 455, Xanxerê.
1. Objetivo da ação
Esta ação de improbidade administrativa tem por objetivo obter
provimento jurisdicional que declare a ocorrência de ato de improbidade
administrativa que, ao ceder irregularmente o uso de imóvel público para
particular, sem licitação, causou prejuízo ao erário e contrariou os princípios da
administração pública praticado por Ademir José Gasparini em favor de Adriano
Marcos Dill & Cia Ltda. em agosto de 2013, aplicando as sanções
correspondentes ao agente.
Requer-se
também
seja
decretada
a
nulidade
do
ato
administrativo (Contrato de Cessão de Uso nº 5/2013), determinando aos
responsáveis as providências necessárias para que a situação fática retorne ao
status quo.
2. Atos de improbidade administrativa
Em outubro de 2013 a 2ª Promotoria de Justiça recebeu inusitado
comunicado da Agência de Xanxerê da Casan (fl. 4), apresentando dúvida
sobre a legalidade da ligação de água num imóvel urbano de propriedade do
Município de Xanxerê e que estava sendo utilizado, mediante contrato de
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cessão de uso, por particular (fl. 5).
Diante da peculiaridade da situação, já que imóveis públicos não
podem ser cedidos a particular sem prévia licitação, muito menos quando se
tratar de área destinada a praça pública, como no caso dos autos, a 2ª
Promotoria de Justiça iniciou a realização das diligências necessárias a apurar
integralmente os fatos.
Identificou-se, então, que em agosto de 2013 o Município de
Xanxerê, pelo Prefeito Municipal Ademir José Gasparini, entabulou com Adriano
Marcos Dill & Cia Ltda. o Contrato de Cessão de Uso nº 5/2013, pelo qual cede
o uso do terreno urbano registrado sob o nº 26.006 no Cartório de Registro de
Imóveis de Xanxerê.
Este imóvel, conforme consta da cópia da Matrícula nº 26.006,
pertence de fato ao Município de Xanxerê e é destinado a servir de "praça
pública" (fl. 37).
Tal cessão foi autorizada pela Câmara de Vereadores, pela Lei nº
3.545/2013. Todavia, evidentemente, a autorização da Câmara não dispensa a
necessidade de licitação, tal como previsto no art. 17 da Lei de Licitações, nem
tampouco o cumprimento dos demais requisitos legais.
Diante desta constatação, o Ministério Público requisitou ao
Prefeito Municipal que informasse se houve licitação para a cessão de uso do
imóvel (fl. 32) e que realizasse vistoria para identificar se o imóvel cedido é que
estava de fato ocupado por Adriano Marcos Dill Ltda.
A
resposta
apresentada
pelo
Prefeito
Municipal
foi
propositalmente omissa em relação à existência ou não de prévia licitação.
Como poderá constatar Vossa Excelência da leitura daquele documento (fl. 48),
limitou-se o Administrador Municipal a informar que em vistoria realizada pelo
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departamento competente não se constatou a ocupação de imóvel diverso do
cedido, sem contudo informar se houve ou não licitação.
Neste ponto é preciso observar que, estivesse de boa-fé o senhor
Prefeito Municipal, certamente teria de pronto revisto seu ato e determinado a
anulação do contrato de cessão de uso. Era o mínimo que se poderia esperar.
Não foi o que ocorreu.
Na sequência, para deixar absolutamente clara a ilicitude em que
vinha incorrendo o prefeito, o Ministério Público recomendou expressamente,
por meio de ofício (fl. 44) a revogação da concessão de uso. No documento,
foram expressamente citados a legislação aplicável e o entendimento do
Tribunal de Contas do Estado.
Em resposta à recomendação, novamente, de forma evasiva, o
senhor Prefeito Municipal se limitou a afirmar que "a cessão de uso, em forma
de comodato, foi precedida de autorização legislativa, por meio da Lei nº AJG
nº 3545/13, a fim de se amparar o empresário e este continuar gerando
empregos e receita para o Município, em virtude de que o proprietário de
imóvel particular que a empresa vinha utilizando, por meio de locação, ter
solicitado a desocupação do mesmo. Isso motivou a cessão do terreno em
questão, com a exclusiva destinação de depósito dos bens e materiais da
empresa, o que vem ocorrendo" (fl. 49).
Em outras palavras, pela segunda vez, e desta feita depois de
receber recomendação expressa do Ministério Público, citando inclusive o
Prejulgado nº 1344 do TCE/SC, o Excelentíssimo Senhor Prefeito Municipal
simplesmente ignorou a Lei de Licitações e preferiu manter vigente contrato de
cessão de uso de imóvel destinado a praça pública, para que uma empresa
depositasse artefatos de cimento, telhas e pedras, o que até os dias atuais
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perdura.
3. Direito
3.1. Necessidade de prévia licitação para a cessão de direito de uso
A Lei nº 8.666/93 é clara em exigir também das concessões de
direito real de uso a prévia licitação:
Art. 17.
A alienação de bens da Administração Pública,
subordinada à existência de interesse público devidamente
justificado, será precedida de avaliação e obedecerá às seguintes
normas:
I - quando imóveis, dependerá de autorização legislativa
para órgãos da administração direta e entidades
autárquicas e fundacionais, e, para todos, inclusive as
entidades paraestatais, dependerá de avaliação prévia e
de licitação na modalidade de concorrência, dispensada
esta nos seguintes casos: [...]".
Marçal Justen Filho analisa o dispositivo e ensina que "deve
reputar-se que as regras acerca de alienações abrangem amplamente
outras
modalidades
de
relacionamento
entre
Administração
e
particulares, versando sobre bens e potestades públicas. A Lei alude, na al. 'f'
do inc. I, à concessão de direito real de uso de bens imóveis. Há
expressa referência à permissão e à locação de bens imóveis. Rigorosamente,
essas figuras não se enquadram no conceito de 'alienação', mas estão
abrangidas
nas
regras
correspondentes
eis
que
envolvem
a
transferência pela Administração da posse e de faculdades de uso e
fruição quanto a bens públicos. As locações e as permissões de uso, tanto
quanto as concessões de uso, são disciplinadas pelas regras desta Seção. Os
interesses em jogo são similares e há uma equivalência quanto ao tipo de
relacionamento entre a Administração e os particulares"1.
1
JUSTEN Fº, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 10ª ed. São
Paulo : Dialética, 2004, p. 172
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O Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina também é
absolutamente claro a respeito, orientando, por meio do Prejulgado nº 1344, o
seguinte: "quando os incentivos para instalações de empreendimentos no
Município envolverem a disponibilização de bens imóveis públicos (terrenos) a
particulares (pessoas físicas ou jurídicas), deve-se privilegiar o emprego do
instituto da concessão do direito real de uso, para melhor resguardar o
interesse e o patrimônio públicos, mediante licitação (art. 17, §2º, da Lei
Federal nº 8.666/93) e prévia autorização legislativa onde também disponha
sobre as condições da concessão, inclusive sobre o vínculo às atividades para
as quais houve a concessão, prevendo a reversão do bem para o Município
após o transcurso do prazo da concessão ou quando não mais sejam atendidas
às condições da concessão, devendo estar demonstrado o interesse público" (fl.
24).
3.2. Improbidade administrativa
A conduta praticada configura o ato de improbidade do art. 10 da
Lei nº 8.429/92: “Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que
causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje
perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos
bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente:
[...] II - permitir ou concorrer para que pessoa física ou jurídica privada
utilize bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das
entidades mencionadas no art. 1º desta lei, sem a observância das
formalidades legais ou regulamentares aplicáveis à espécie; [...] VIII frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente".
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Note-se que a improbidade do art. 10 também se configura com o
mero "desvio", com o "malbaratamento"2, não sendo necessário o efetivo
prejuízo ao patrimônio público, ou seja, uma perda mensurável em dinheiro.
De qualquer forma, a improbidade constatada nos autos também
configura infração ao disposto no art. 11 da Lei de Improbidade Administrativa:
“Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da
administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de
honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições”.
A licitação tem justamente por objetivo conferir imparcialidade
(ou impessoalidade às escolhas do administrador público). No caso dos autos o
que ficou evidente é que um empresário residente no município teve o contrato
de locação do imóvel que ocupava para depositar seu produto e, como se isso
dissesse respeito ao interesse público, o Município resolveu "ampará-lo" sob o
vago argumento de "gerar empregos e receita", que nem ao menos foram
mensurados. Não se realizou a necessária concorrência, para identificar quem,
dentre tantos interessados certamente existentes no Município, geraria maior
receita ou empregos; não se identificou nem ao menos o valor de mercado do
imóvel; não se deu publicidade à oportunidade, para que os demais, novos e
antigos empresários, pudessem se estabelecer no local. A imparcialidade e a
legalidade, como se vê, foram completamente abandonadas.
E isso tudo, ficou evidente nos autos, com nítido dolo. Estivesse
de boa-fé o Administrador Municipal, teria prontamente anulado a cessão, já
quando da primeira requisição do Ministério Público. Mas não, mesmo diante de
um segundo alerta, mais explícito ainda, por meio de recomendação, preferiuse manter a nulidade vigente, contrariando a Lei de Licitações, o Tribunal de
2
De acordo com o Dicionário Aurélio: "1. Vender abaixo do custo; vender com prejuízo. 2.
Empregar ou gastar de forma inconveniente; dissipar; desperdiçar, desbaratar. 3.
Empregar ou aplicar indevidamente".
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Contas e o Ministério Público do Estado de Santa Catarina.
4. Sanções
As condutas ensejam a aplicação das sanções previstas no inciso
II e III do art. 12 da Lei nº 8.429/92. Eis as sanções aplicáveis ao caso: perda
da função pública, suspensão dos direitos políticos de cinco a oito anos,
pagamento de multa civil de até duas vezes o valor do dano, se houver, ou de
até 100 vezes o valor da remuneração do agente, proibição de contratar com o
Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta
ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja
sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos.
5. Pedidos
Ante o exposto, o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE
SANTA CATARINA requer:
a) a autuação da inicial, nos termos do procedimento previsto na
Lei de Improbidade Administrativa;
b) a notificação dos demandados, para a defesa preliminar, nos
termos do artigo 17, § 7º, da Lei nº 8.429/92, devendo o Município de Xanxerê
apresentar cópia do contracheque do Prefeito Municipal relativo ao mês de
agosto de 2013;
c) o recebimento da inicial e a citação dos requeridos para,
querendo, contestarem o feito, observado o procedimento previsto na Lei nº
8.429/92;
d) a produção de prova testemunhal, pericial e documental que
porventura for necessária;
e) a condenação do requerido Ademir José Gasparini às seguintes
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sanções: e1) pagamento de multa no valor de até 100 vezes a sua
remuneração de agosto de 2013; e2) suspensão dos direitos políticos por cinco
a oito anos; e3) proibição de contratar com o Poder Público ou receber
benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda
que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo
de cinco anos;
f) decretação da nulidade do Contrato de Cessão de Uso nº
5/2013, determinando-se aos requeridos, solidariamente, sob pena de multa
diária, no prazo de 30 dias, a desocupação do local e a restauração do local,
inclusive do gramado;
g) a condenação dos requeridos em custas, despesas processuais
e honorários advocatícios (estes conforme art. 4º do Decreto Estadual nº
2.666/04, em favor do Fundo de Recuperação de Bens Lesados do Estado de
Santa Catarina).
Dá-se à causa o valor de R$ 50.000,00.
Xanxerê, 4 de fevereiro de 2014
Eduardo Sens dos Santos
Promotor de Justiça