Este artigo discute a situação da delegação da Cruz Vermelha Portuguesa em Braga sob a liderança de Armando Osório. Ele destaca os desafios de financiamento enfrentados pelas valências sociais da instituição e a necessidade de encontrar novas fontes de receita para compensar os cortes estatais. Apesar das dificuldades, Osório mantém o compromisso da Cruz Vermelha com a emergência social.
1. Tiragem: 8000 Pág: 12
País: Portugal Cores: Cor
Period.: Diária Área: 27,16 x 34,56 cm²
ID: 44904051 24-11-2012 Âmbito: Regional Corte: 1 de 4
DA ACÇÃO SOCIAL ESCOLAR À EMERGÊNCIA SOCIAL
Armando Maria da Cunha Osório Araújo preside, desde Junho de 2011,
En
à delegação de Braga da Cruz Vermelha Portuguesa.
Entre 1975 e 2003, o convidado do programa ‘Primeiro Plano’, da Rádio Antena
Minho - Correio do Minho, exerceu o cargo de administrador dos Serviços de Acção
Social da Universidade do Minho. A sua ligação à academia ficou selada com a
atribuição de sócio honorário de quase todos os grupos culturais de estudantes.
Um auditório da sede da Associação Académica tem o seu nome.
Armando Osório teve, num passado já um pouco distante, um incursão pela vida
política. De 1985 a 1990, exerceu funções de vereador na Câmara Municipal de
Braga, eleito pelo PSD.
ARMANDO OSÓRIO ENTREVISTA CVP
Só quem for cego é
respeitar as pessoas que não querem ser
institucionalizadas.
P - Mas as valências que existem em
Braga respondem às necessidades dos
‘sem abrigo’?
que não vê a fome
R - Quando detectamos pessoas com ne-
cessidades de alojamento, mesmo com o
nosso CAT cheio, há possibilidade de
serem acolhidas em pensões com o apoio
da Segurança Social.
P - Ao CAT que a CVP tem a fun-
A emergência social é a missão central da Cruz Vermelha Portuguesa, considera o cionar em Nogueira está associada uma
presidente da delegação de Braga. Em entrevista, Armando Osório aponta poupança horta biológica, um projecto apoiado
pela Fundação EDP.
de 30% nas despesas correntes da instituição, fruto do rigor imposto na gestão da R - Essa horta é feita com o trabalho dos
próprios utentes do CAT.
instituição.
P - É uma forma de socializar essas
pessoas, de lhe criar competências?
R - E também auto-estima. Mais recen-
temente, estabelecemos uma parceria
com o Projecto Homem, que tem insta-
lações próximas das nossas, para o acom-
panhamento dos nossos utentes por técni-
cos ligados à problemática da toxico-
dependência.
P - A horta biológica já está a pro-
duzir?
R - Sim. Temos uma parceria com a As-
sociação das Terras Altas do Homem, Cá-
vado e Ave (ATAHCA) para um centro do
projecto ‘PROVE - Promover e Vender’
na nossa creche, onde temos já 80 con-
sumidores. Os utentes do CAT fazem as
cestas com produtos agrícolas que são
distribuídas à sexta-feira. Temos também
a funcionar no CAT um serviço de la-
vagem de automóveis.
P - Têm necessidade de aumentar a
capacidade de alojamento do CAT?
R - Em colaboração com a Câmara,
temos um apartamento para residências
partilhadas e vamos ter mais dois.
P - A delegação de Braga foi pioneira,
ROSA SANTOS
no seio da CVP, na criação de valências
sociais. É uma aposta para continuar
> josé paulo silva jantar foi um pedido de ajuda urgente, que é alojado numa instituição apoiada no futuro?
porque a a Segurança Social só nos paga pelo Estado deixa de receber esse rendi- R - Jean-Henri Dunant criou a Cruz Ver-
P - A delegação de Braga da Cruz Ver- 80% dos custos de funcionamento. Os mento. Não podemos cobrar nada. melha para cuidar dos feridos em tempo
melha Portuguesa (CVP) promoveu restantes 20% ultrapassam os 30 mil eu- de guerra. Hoje a emergência é social. A
ontem um jantar de solidariedade a fa- ros. P - A CVP tem em Braga uma vasta emergência social é uma área onde a CVP
vor do Centro de Acolhimento Tempo- acção na área da acção social. A si- se sente bem e motivada.
rário (CAT). Esta valência que necessi- P - Os utentes do CAT não pagam. tuação de crise que vivemos faz multi-
ta do apoio da sociedade? R - Os utentes não têm dinheiro. Ante- plicar os casos de emergência social? P - Há projectos novos para avançar?
R - O CAT increve-se nos princípios de riormente, quando recebiam rendimento R - Sim. Infelizmente, esses casos têm R - Nós queremos melhorar o que esta-
solidariedade e humanidade da CVP. Te- social de inserção, pagavam uma pequena aumentado. Em Braga, há uma rede so- mos a fazer. Como os projectos que temos
mos capacidade para acolher 47 pessoas e percentagem, e era justo que assim o cial e só fica na rua quem quer. Somos não são pagos na totalidade pelo Estado,
mais algumas estão em lista de espera. O fizessem. Com a nova legislação, alguém uma instituição humanitária e temos de temos de rentabilizar bem os recursos.
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Period.: Diária Área: 27,77 x 34,25 cm²
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> “Não assino mais nenhum contrato deficitário com o Estado”.
ARMANDO OSÓRIO ENTREVISTA CVP
Muita gordura que havia
na Cruz Vermelha acabou
P - A CVP tem uma equipa de acom-
panhamento dos ‘sem abrigo’, a equipa
de rua ‘Aproximar’. Recentemente,
alertou para o perigo de interrupção de
um programa de distribuição de meta-
dona protocolado com o Ministério da
Saúde...
R - Espero que o programa não acabe.
Os técnicos dizem-me que não vai acabar,
que vai ser renovado. Os responsáveis
sabem que as 60 ou 70 pessoas que são
apoiadas por nós, se deixam de ter a
metadona distribuída na rua, não vão ao
Centro de Saúde buscar esse substituto da
cocaína. A nossa equipa também faz
despistagem de tuberculose e HIV e en-
caminha doentes para os hospitais. Este
programa acabou em Junho, assinámos
um contrato até ao final do ano e estou
crente que vamos renovar esse contrato.
P - O fenómeno da toxicodependência
já foi mais visível nas nossas ruas?
R - Também por influência do trabalho
de acompanhamento que é feito pelas
instituições e pelo próprio Estado, mas
não estou em condições de dizer que o
fenómeno está a diminuir.
P - A comunidade imigrante tem tam-
bém merecido uma atenção especial da
CVP em Braga. O que estão a fazer
nesta área?
R - Olhe, uma notícia que posso dar em
primeira mão é que o nosso Centro Local
de Apoio à Integração de Imigrantes
ROSA SANTOS
(CLAII) vai continuar. Esta semana con-
seguimos da direcção nacional da CVP
apoio para pagar o défice acumulado de P - A delegação da CVP gere outras mo-nos bem neste ambiente. delegação: o empresário Ermelando Se-
15 mil euros. O financiamento do Alto valências sociais. P - Embora também tenhas as valên- queira. O que mais me agrada com a sua
Comissariado para a Imigração e Diálogo R - Temos apoio domiciliário, o acom- cias sociais clássicas... presença é que passei a ter na direcção al-
Intercultural cobre 50 a 60 por cento das panhamento dos beneficiários de rendi- R - Temos uma creche a funcionar bem guém do meio empresarial, com uma
despesas. Temos um défice calculado de mento social de inserção da freguesia de em Braga e um lar de terceira idade em visão muito própria. A presença de Erme-
15 mil euros que não podíamos continuar S. Lázaro que estão a aumentar muito, Terras de Bouro. lando Sequeira já está a dar frutos no ri-
a acumular, embora saibamos que o projectos de acompanhamento de mino- gor da gestão. Vem de encontro ao nosso
CLAII é o único local em Braga que faz o rias étnicas em Santa Tecla e Prado. P - Quando tomou posse como presi- objectivo de combate ao desperdício e de
acompanhamento humanizado dos imi- dente da delegação de Braga da CVP unidade de acção em todas as valências.
grantes. Fazemos cerca de um milhar de P - A CVP assume em Braga valências comprometeu-se a criar um grupo de
atendimentos por ano. O CLAII era uma sociais que mais ninguém porque são consultores. São, no fundo, beneméri- P - E de uma gestão mais empresa-
valência que estava em risco. deficitárias e lidam com populações de tos e mecenas? rial?
risco? R - Mas com ideias. Estou muito feliz R - Há dois anos começámos a impor al-
P - Há défice de financiamento públi- R - Mas isso é a missão da CVP. Senti- com uma boa aquisição para a direcção da gumas regras e as despesas de funciona-
co do CAT, também do CLAII... mento diminuiram em mais de 30%.
R - O Estado é um bocado abusador. Havia muita gordura que acabou.
Transfere para as instituições aquilo que
são as suas obrigações e nós ainda temos P - Mantém-se a ideia de substituição
que arranjar as verbas em falta. Eu não lll da actual sede por instalações mais fun-
assino mais nenhum contrato deficitário cionais?
Esta semana conseguimos da direcção nacional da Cruz Vermelha
com o Estado. Não posso andar sempre a R - O projecto está adiado. Pode ser que
incomodar a sociedade civil para equili- portuguesa apoio para pagar o défice acumulado de 15 mil euros do depois da crise se consiga. Esperemos
brar o orçamento. Centro Local de Apoio à Integração de Imigrantes. que a casa não caia.
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ID: 44904051 24-11-2012 Âmbito: Regional Corte: 3 de 4
> “A nossa estrutura manteve-se igual durante muitos anos”.
ARMANDO OSÓRIO ENTREVISTA CVP
Estrutura de emergência
médica é complicada
vossos apelos?
R - Muitos. Lançámos uma campanha
de angariação de sócios e há muita gentre
a aderir. Uma coisa que não achava dig-
nificante era o número de sócios da dele-
gação da CVP.
P - Quantos eram?
R - Não chegavam a 300. Com a cam-
panha que comecámos em Junho já temos
perto de 2500. Ainda há um certo
desconhecimento da população sobre
aquilo que a CVP faz.
P - Ao nível do voluntariado mais acti-
vo tem havido resposta?
R - Sobretudo ao nível da juventude. O
nosso departamento de juventude está a
fazer um trabalho excelente. A Universi-
dade do Minho é um foco muito impor-
tante para nós. Trabalhamos muito com a
Universidade em estágios nas áreas da
Educação e Psicologia.
P - O vosso campo de acção funciona
como laboratório para esses estu-
dantes?
R - É verdade.
P - Entre 1975 e 2003 foi adminis-
tração dos Serviços de Acção Social da
Universidade do Minho. Directa ou in-
directamente, lidou com muitas si-
tuações de dificuldades económicas.
Agora estará mais próximo dos proble-
mas. Olhando para trás, quer a dio-
grafia faz da evolução sócio-económica
DR
da região?
R - É a diferença entre o céu e o inferno.
P - Como está a a funcionar o sector R - Não podemos concorrer contra este com o Sporting de Braga e o Clube Au- Na Universidade do Minho lidei com as
de emergência médica da delegação da sistema. Se calhar a culpa é nossa. Esta é tomóvel do Minho, mas isso é pouco. dificuldades, mas havia meios, havia di-
CVP? uma área que precisa de soluções que se- nheiro. Hoje é uma luta diária.
R - Essa foi a matriz inicial da CVP. jam o menos dolorosas possível. Tentá- P - O voluntariado é a base de traba-
Tínhamos uma estrutura anterior ao mos um concurso com o Hospital de Bra- lho da CVP, mas as necessidades ac- P - Sente-se mais impotente para re-
próprio INEM. Houve um açambarca- ga, mas nunca nos disseram nada. Surgiu tuais obrigam a contratação de pessoal solver problemas?
mento do transporte de doentes por parte também a possibilidade de sermos um especializado... R - Agora não há meios. Nunca um
do INEM e a nossa estrutura manteve-se posto do INEM. R - O voluntariado é a nossa matriz, mas aluno da Universidade do Minho passou
igual durante muitos anos. Temos nesta a delegação de Braga tem 114 funcio- fome. Hoje damos comida a dezenas de
área muitos voluntários com qualidade. P - Em termos de gestão da delegação nários. pessoas através da nossa equipa de rua,
Não posso dizer que tenho uma unidade da CVP, a área da emergência médica para além das refeições que fornecemos
deficitária quando há dezenas de volun- preocupa-o? P - Como diz, o voluntariado é a vossa no CAT. Ninguém nos paga essas re-
tários que trabalham de graça. Nós trabal- R - Preocupa-me porque temos lá matriz. Neste particular as coisas têm feições porque ainda não fomos integra-
hamos de graça e o serviço é deficitário dezenas de voluntários. Temos acordos corrido bem? A sociedade responde aos dos na rede de cantinas sociais. Estamos à
porquê? A estrutura que existe é muito espera que nos integrem.
complicada. Estamos a ver se conse-
guimos arranjar novas formas de rendi- P - A fome voltou a ser uma realidade
mento, se não... em Braga?
lll R - Só quem for cego é que não vê.
P - O sector do transporte de doentes Se perguntar a outras instituições sociais,
é agora mais concorrencial com a en- O voluntariado é a nossa matriz, mas a delegação de Braga da Cruz a ideia delas não será diferente da mi-
trada de operadores privados. Vermelha Portuguesa tem 114 funcionários. nha.
4. Tiragem: 8000 Pág: 1
País: Portugal Cores: Cor
Period.: Diária Área: 26,85 x 11,39 cm²
ID: 44904051 24-11-2012 Âmbito: Regional Corte: 4 de 4
ENTREVISTA ARMANDO OSÓRIO, PRESIDENTE DA DELEGAÇÃO DE BRAGA DA CRUZ VERMELHA PORTUGUESA >> 12 a 14
“SÓ QUEM FOR
CEGO É QUE
NÃO VÊ A FOME”
A emergência social é a missão central da Cruz Vermelha
Portuguesa, considera o presidente da delegação de Braga.
Em entrevista, Armando Osório aponta poupança de 30%
nas despesas correntes da instituição, fruto do rigor imposto
na gestão da instituição. Quanto ao futuro, garante que o pro-
ROSA SANTOS
jecto da nova sede está suspenso pela crise económica que
assola o país, mas adverte que não pode ser esquecido.