1. "SIMPÓSIO ECUMENISMO E MISSÃO – TESTEMUNHO CRISTÃO EM UM
MUNDO PLURAL"
Partilha do Simpósio Nacional Ecumenismo e Missão 2014
São Paulo, agosto de 2014
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Artur Peregrino*
“As religiões servem na medida que ensinam a amar; se não o fazem,
são nocivas porque subtraem energias humanas do seu fim
verdadeiro” (Comblin).
Testemunho cristão, em um mundo plural. Foi com esse lema que
aconteceu o Simpósio Ecumenismo e Missão. O Conselho Nacional de Igrejas
Cristãs (CONIC) promoveu o evento, em Vargem Grande Paulista (SP), entre os
dias 21 e 24 de agosto, o qual foi organizado, em parceria com a Pontifícia
Universidade Católica do Paraná (PUC-PR) e com as Comissões do
Ecumenismo, do Laicato e da Ação Missionária da Conferência Nacional dos
Bispos do Brasil (CNBB).
O Simpósio foi aberto, com uma Celebração, na qual houve a participação
das Igrejas participantes do CONIC, a saber: Igreja Evangélica de Confissão
Luterana no Brasil; Igreja Episcopal Anglicana do Brasil; Igreja Católica – CNBB;
Igreja Presbiteriana Unida do Brasil, Igreja Ortodoxa Síria.
Com momentos de espiritualidade, houve um resgate da caminhada
histórica do Movimento Ecumênico no Brasil, recordando a Conferência do
Nordeste e o Concílio Ecumênico Vaticano II.
O Pastor da Igreja Luterana no Brasil, Zwinglio Motta Dias, destacou a
importância da Conferência do Nordeste para o mundo Protestante no início dos
anos 60. A Conferência do Nordeste aconteceu, no Recife, em 1962 dentro de
uma conjuntura internacional peculiar e foi um momento significativo que trouxe,
à tona, os esforços de mobilização social. Pela primeira vez, na História do
Protestantismo, os seus membros contaram com apoio da Academia. Destacou
que o Protestantismo não foi capaz de perceber a dimensão social, cultural e
nacional que era muito diferente dos Estados Unidos. Foi o desafio da realidade
– injustiça e luta social – que levou a compreensão de um ecumenismo político.
Muito mais por jovens das Igrejas que dos Setores institucionais. A Conferência
do Nordeste foi derrotada, pelas Igrejas. Após o Golpe Militar, voltou-se à velha
pequenez de um moralismo inconsequente que fechava-se à Graça do Cristo.
Mas o Brasil democrático, hoje, torou-se, apenas, possível por causa das
pequenas lutas do passado.
* Mestre em Antropologia pela UFPE; prof. do Curso de Teologia na Unicap e integrante do
Instituto Humanitas Unicap; pesquisador do Grupo de pesquisa UNICAP/CNPq Religiões,
identidades e diálogos, na linha de pesquisa Diálogos inter-religiosos. Email:
arturperegrino@gmail.com
2. O Professor JoanildoBurity, da Fundação Joaquim Nabuco, enfatizou a
caminhada histórica, destacando, além da Conferência do Nordeste (1962), o
Evangelho Social (1914), o Socialismo Religioso (1919), a Igreja Confessante
(1938), a “Sociedade Responsável” (Assembléia Constitutiva do CMI 1948).
Depois de 1962, caminha-se para uma conjuntura de virada pentecostal. Os
pentecostais se posicionaram na invisibilidade (anos de 1950) à minoritização
(anos 1980) e à hegemonia do Campo protestante (anos 2000). Considera-se,
também, a fragmentação da geração ecumênica e de sua elaboração teológico-política.
Criam-se muitos grupos que procuram viver um ecumenismo, debaixo
do guarda-chuva do Catolicismo Libertador. Também o impacto da pluralização:
ideologias, identidades, diversidade religiosa, impactos da globalização. Nas
Igrejas Protestantes, esteve muito próximo o esvaziamento da presença de
geração ecumênica. Outra geração ecumênica vai chegando, mas de maneira
diferente. Exige-se uma nova postura de diálogo. O Ecumenismo torna-se
apenas, um aspecto. Não é mais como antes: a luta contra o sistema. Constata-se,
também, a desterritorialização do Cristianismo. O Movimento Ecumênico
coloca-se dentro de um novo contexto. Existe um claro movimento para o Norte,
proporcionado pelo Movimento Pentecostal. Na realidade, ocorre um movimento
do Sul para o Norte. Vive-se hoje, um desafio. A pergunta é a seguinte: sem
carismáticos e pentecostais haverá futuro ecumênico? A resposta é não. Mesmo
nos movimento ecumênico há presença carismática e pentecostal. Nesse
redesenho global, hodierno, o movimento carismático e pentecostal é núcleo
central. Não é possível saber o quê e o como fazer. Todos se encontram nas
mãos do Espírito.
O Padre Oscar Beozzo, teólogo e historiador, destacou que após a
celebração de encerramento da Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos,
na Basílica de São Paulo Extramuros, o inesperado anúncio do Concílio, por
João XXIII: 25 de janeiro de 1959. “Pronuncio perante vós, por certo tremendo
um pouco de emoção, mas ao mesmo tempo com humilde resolução de
propósito, o nome e a proposta de duas celebrações: um Sínodo diocesano para
a Urbe e um Concílio geral para a Igreja universal”. Destacou que João XXIII fez
o discurso de abertura (Gaudet Mater Ecclesia) onde propõe algumas linhas
mestras. Vejamos:
Atitude confiante e positiva - afastando-se dos Profetas da Desventura que
anunciam acontecimentos sempre infaustos, como se estivesse iminente o fim
do mundo (IV.3), ressalte-se, serenamente, a apresentação da verdade. A Igreja
deve responder às exigências do nosso tempo. Uma coisa é a substância do
“depositum fidei”, isto é, as verdades contidas na nossa doutrina, e outra é a
formulação com que são enunciadas, conservando-lhes, contudo, o mesmo
sentido e o mesmo alcance (VI.5). Busca ecumênica pela unidade dos católicos,
dos cristãos, dos fieis de Religiões não cristãs e de todo gênero humano.
Veneráveis irmãos, isto se propõe o Concílio Ecumênico Vaticano II, que, ao
mesmo tempo, que une as melhores energias da Igreja e se empenha por fazer
acolher pelos homens mais favoravelmente o anúncio da salvação, como que
prepara e consolida o caminho para aquela unidade do gênero humano, que
se requer como fundamento necessário para que a cidade terrestre se conforme
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3. à semelhança da celeste «na qual reina a verdade, é lei a caridade, e a extensão
é a eternidade (VIII.4). A Igreja sempre se opôs a estes erros; muitas vezes até
os condenou com a maior severidade. Agora, porém, a esposa de Cristo prefere
usar mais o remédio da misericórdia do que o da severidade. Julga satisfazer
melhor às necessidades de hoje mostrando a validez da sua doutrina do que
renovando condenações (VII.2). Será preciso atribuir muita importância a esta
forma e, se necessário, insistir com paciência, na sua elaboração; e dever-se-á
utilizar a maneira de apresentar as coisas que mais correspondam ao magistério,
cujo caráter é prevalentemente pastoral (VI.5). Que o Concílio corresponda
às necessidades e esperanças dos diversos povos. Queira o céu que as vossas
canseiras e o vosso trabalho, para o qual se dirigem não só os olhares de todos
os povos, mas também as esperanças do mundo inteiro, correspondam
plenamente às aspirações universais (IX.4).
Assim, o Padre Oscar Beozzo destacou que é fundamental olhar para
essa caminhada longa da Igreja que se abriu para o diálogo com o mundo.
Destacou que, em 05 de junho de 1960 – surge o Secretariado para a unidade
dos Cristãos que teve, como secretário o Cardeal Agostinho Bea. Isso foi uma
porta aberta da Igreja para o diálogo porque, até então, a Igreja Católica não
tinha uma interlocução com as Igrejas cristãs.
Debates, a partir das temáticas expostas, conduziram para outro
momento em que foram apresentados uma análise e um diagnóstico dos
desafios para a Missão. Este momento teve a contribuição da Ir. Ignes
Costalunga ( PUC-PR) que refletiu sobre a complexidade do mundo em que se
vive. Perguntava: o que há em nossas instituições? O que significa fé, sim,
Instituição, não? Também, o Pastor Roberto Zwetsch (EST- Escola Superior de
Teologia - RS) enfatizou que, em relação ao Brasil, dever-se-ia perceber a
grande ascensão da Igreja Católica e, também, de Igrejas do Protestantismo
histórico. Enfim, todas essas alterações têm consequências para a prática do
Ecumenismo e da Missão.
O Documento “Testemunho Cristão num mundo plural” – recomendações
sobre a prática do testemunho - foi objeto de estudos para trabalhos em grupos.
O documento foi apresentado, pelo Pastor Walter Altmann (Pastor da Igreja
Luterana no Brasil - IECLB) que destacou a importância do supramencionado
documento, o qual, pela primeira vez na história, foi elaborado, em conjunto, pelo
Conselho Mundial de Igrejas, pelo Pontifício Conselho para o Diálogo Inter-religioso
e pela Aliança Evangélica Mundial. No final da explanação sobre o
Documento lançaram-se três perguntas que fizeram refletir sobre a relação entre
Missão e Ecumenismo. As questões chamaram atenção para o contexto plural,
as agendas múltiplas, os direitos humanos, sociais, culturais, econômicos e
ambientais. Perguntava-se, como questão fundamental, o que é preciso mudar,
nas compreensões missionárias, eclesiológicas, de todos.
Palestras com os temas “Bíblia e Missão” e “Missão e ecumenismo:
documentos, perspectivas de ação comum” foram os últimos elementos
trabalhados para elaboração de um Documento comum, entre os participantes,
com o título “Testemunho Cristão brasileiro em um mundo plural”.
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4. A Professora Wanda Deifelt (EST- Escola Superior de Teologia - RS)
apresentou o tema revisitando metodologias missionárias, a partir dos Atos dos
Apóstolos. Lembrou o (des)encontro entre as religiões a partir de John Hick que
menciona três modelos de interação: exclusivismo (no qual o outro é
demonizado e deve ser subjugado à “verdade” da Religião dominante ou
colonizadora), inclusivismo (onde o aspectos de outras tradições religiosas ou
filosofias de vida são interpretadas como expressões incipientes da Religião
dominante), pluralismo (no qual há um diálogo interreligioso enfocando
aspectos mais comuns/compartilhados, ou seja, aquilo que une e não o que
separa).
O biblista Carlos Mesters nos ajudou a responder à questão de como
anunciar Deus, hoje. Dizia que uma nova experiência de Deus não vem, com a
razão, mas vem pelos pés. Muito mais que falar sobre Deus é viver a maneira
de Deu. A Boa Nova é descobrir o rastro de Deus. Para agir, no mundo, é preciso
olhar, de perto, como Jesus foi “missionário de Deus”. Alguns traços
fundamentais de Jesus que passam a ser elementos fundamentais para a
Missão cristã no mundo. Veja-se: Jesus acolhe os excluídos, sobretudo os
doentes; Jesus vai ao encontro das pessoas, inclusive chamando-as para segui-lo;
Jesus reconstrói a vida comunitária nos povoados da Galiléia; Jesus recupera
a dimensão caseira e festiva da Fé; Jesus recupera a igualdade entre homem e
mulher; Jesus supera as barreiras de gênero, religião, raça e classe; Jesus
recupera o humano universal. Carlos Mesters fez uma reflexão sobre a prática
missionária na época do cativeiro bíblico e hoje. Por fim, concluiu dizendo que é
preciso tirar o véu para revelar o Reino de Deus.
Na parte final do simpósio, foi feito um trabalho de grupo para ler e
destacar elementos para um testemunho cristão, num mundo de pluralismo
religioso. Destaque-se o relato de um dos grupos que apresenta a noção por
onde andou a conclusão do simpósio. Veja-se: definir, preliminarmente,
conceitos de Ecumenismo e Missão; tomar em conta as iniciativas que as bases,
já, realizaram, dando-lhes apoio, reconhecimento e incentivo; recolher
experiências e iniciativas que foram apresentadas no Seminário, pois estas
podem ajudar na compreensão, tanto do Ecumenismo como da Missão;
foi enfatizada a necessidade de as Igrejas reconhecerem, de maneira mais
ampla e autorizada, os Ministérios femininos e que implementem a
participação das mulheres, em todas as esferas de decisão das Igrejas;
cada Igreja invista na formação ecumênica dos leigos e leigas, assim como na
dos clérigos; que os que ensinam na área do ecumenismo e do diálogo inter-religioso
tenham, também, uma prática, neste mesmo campo do Ecumenismo e
do diálogo com outras Religiões; que regiões, dioceses e até mesmo paróquias
e comunidades tenham pessoas ou Comissão responsável pelo diálogo
ecumênico e por iniciativas conjuntas com outras Igrejas e Religiões;
recomenda-se que todas as Igrejas e membros fraternos presentes coloquem o
Documento “Testemunho Cristão” nos seus “sites” e “blogs”; seria bom que, em
certo trecho do Documento, por iniciativa do CONIC, seja inserido um adendo
sobre a importância da equidade de gênero, no diálogo ecumênico e
interreligioso.
Uma Celebração ecumênica, com destaque para a unidade na
diversidade, concluiu o Simpósio Ecumenismo e Missão - Testemunho cristão
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5. em um mundo plural. Promovido pelo Conselho Nacional de Igrejas Cristãs
(CONIC), com apoio das Comissões para o Ecumenismo, Laicato e Ação
Missionária da CNBB e da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC/PR),
o evento reuniu cerca de 100 representantes de diversas Igrejas cristãs, em
Vargem Grande Paulista (SP). A Pastora Rome Bencke, Secretária-geral do
CONIC agradeceu a todos, no final da Celebração e disse “que todo material do
Simpósio será estudado com carinho, mas que fazendo um discernimento com
a coordenação do Simpósio, achou-se por bem, por vários motivos, não elaborar
um documento final neste momento. Atente-se para o Espírito que sopra onde,
quando e como quer”.
Vale destacar dois Eventos nos quais deve haver empenho, de maneira
particular. O primeiro é a Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos que
acontecerá em 2015 e será preparado pelo Brasil. Será uma contribuição do
Brasil para o mundo. O segundo é a Campanha da Fraternidade de 2016 que
voltará a ser ecumênica. Com esses comunicados, todos se abraçaram e
voltaram para suas casas na disposição de lutarem pela unidade dos cristãos e
agirem em favor do diálogo entre as religiões.
Elias Wolff, assessor da Conferência Nacional do Bispos do Brasil para o
ecumenismo e o diálogo inter-religioso, nos exortava no final: “Com todos,
avançamos pelas tortuosas, mas belas e esperançosas, trilhas da reflexão sobre
os caminhos de Diálogo ecumênico, inter-religioso e intercultural”.
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