O livro conta a história de uma menina de oito anos que vive na zona rural com seu pai, mãe e dois irmãos. Sua escola é longe de onde mora, mas para ela nem parece, pois se diverte com as coisas que vê pelo caminho. No percurso, encontra sua tia costureira, suas primas, que vão com ela para escola e sua avó, que é merendeira. Todos sempre têm algo interessante para ensinar à garota: trava-línguas, brincadeiras, matemática no cotidiano e regras de convivência. Este conto foi escrito baseado nas vivências de infância da autora e ilustradora Jamile Menezes, para mostrar que criança não aprende só na escola, mas com tudo e todos ao seu redor.
4. Para todas as crianças,
inclusive as que
vivem dentro
de cada adulto.
“Quem pra chegar na escola leva uma vida...
Pra quem essa vida já é uma escola”
(Anderson Cunha / Sertanília)
5. ra uma vez uma menina chamada Joana. Ela morava na zona rural com seu pai,
sua mãe e seus dois irmãos. Lá, os trabalhos do dia começavam assim que o sol nascia:
seu pai ia para a roça, sua mãe cuidava da casa, ela e seus irmãos ajudavam os pais em
alguma tarefa. Joaninha era uma criança de oito anos, mas já sabia que tinha
responsabilidades e cumpria todos os seus deveres. Sua escola era bem longe de onde
morava, mas para ela nem parecia, pois era uma menina observadora e sensível que
se divertia inventando histórias e músicas com as coisas que via pelo caminho.
E
6.
7. Um dia, Joana acordou cedo e foi
tomar seu café da manhã. Na mesa
tinha bolo de fubá, biscoitos, café com
leite, suco de acerola e pão com
manteiga: tudo feito pela sua mãe.
Depois, arrumou a casa, lavou os
pratos e foi fazer seu dever de casa, da
matéria de geografia.
8. Era para fazer um desenho sobre o relevo, mas Joaninha não entendeu direito e pediu
ajuda ao seu pai, que disse:
– Olha aquele lugar bem alto onde fica a igreja, filha. Lembre-se da praia onde a gente
tomou banho nas suas férias e da roça de banana, que é bem plana.
Joana imaginou, lembrou de tudo e disse:
– Sim, papai, lembrei. E agora?
E seu pai disse, um pouco confuso:
– Olha, eu sei que isso é relevo,
mas o nome eu não lembro...
Tem tempo que eu saí da escola.
Só sei que a igreja fica na
montanha, a roça de banana
fica numa plan... planagem...
– Planalto, planície, montanha
e mar! É isso mesmo! Agora eu
me lembrei da professora
explicando! Valeu, papai!
9. Joana saiu de casa bem cedo para chegar na escola no horário. Passou na casa
da sua tia, que estava costurando, mas parou para cumprimentá-la.
– Oi, titia! Que jarro bonito na sua mesa!
E sua tia disse, sorrindo:
– Oi, minha linda! Por falar em jarro,
vou te ensinar um trava-língua:
“Em cima da mesa tem um jarro
Dentro do jarro tem uma aranha
nem a aranha arranha o jarro
nem o jarro arranha a aranha”.
– Vou treinando no caminho
para a escola!
Joaninha foi pensando em
como as palavras podem ter
significados diferentes só
por causa de uma letra.
10. Joana passou pela roça de cacau do seu
pai, onde ela aprendeu que as copas das
árvores não são só verdes: podem ser
vermelhas, roxas e até amarelas. Depois, ela
passava por uma casa de farinha e todos
paravam de raspar mandioca por um instante
para vê-la passar. Joaninha era tímida,
apenas sorria e andava bem rápido, porque
não gostava de ser olhada por tanta gente.
11. Joana encontrava sua prima Ana e iam juntas para a escola.
Então, as duas caminhavam em direção a um pasto cheio de bois,
mas andavam devagar, pois às vezes os bois corriam atrás delas.
Seguiam até perto da vargem, uma planície inundada que fica na
margem de um rio, e chamavam sua outra prima, Eva. Enquanto
esperavam embaixo de uma árvore, trocavam cartinhas falando
de amizade, com versinhos e desenhos que elas mesmas faziam
uma para outra.
12. jaqueiras, pés de jambo, seriguela,
c
a
c
a
u
, jabuticaba
e
várias outras frutas.
Eva morava num lugar be
m
a
l
t
o
e rodead
o
d
e árvores:
13. Chegando na escola, Joana foi direto falar com a merendeira,
que era sua avó. As crianças da escola costumavam fazer fila para
pedir “bença, tia Tonha!”, mas só Joana dizia “bença, vovó!” e
conversava sobre sua mãe e sobre seus irmãos com a simpática
senhora que trabalhava há muito tempo fazendo a merenda.
14. Quando começou a aula de
matemática, Joana sentiu um frio
na barriga: era a matéria de que
menos gostava. Nunca entendeu
para quê tanto número, não sabia
fazer conta de cabeça e sempre
usava os dedos dos pés quando a
conta era muito grande.
Nesse dia, a aula era sobre divisão
e a professora falou tanto número,
tanto “noves fora, zero” que Joana
ficou com dor de cabeça. Os
números não entravam de jeito
nenhum na mente dela e, de tanto
eles baterem para entrar, a cabeça
doeu. Então, ela pediu licença,
saiu da sala e foi conversar
com a sua avó.
15. – Poxa, vovó! Eu odeio matemática! Nunca vou usar isso na vida! Quando eu
crescer, quero ser artista! Eu adoro desenhar com Ana e Eva, mas a gente briga
por causa dos hidrocores: uma quer pegar mais que as outras e aí discutimos.
Parece que elas não sabem dividir as coisas...
– Mas, Joaninha, você disse que não gosta de matemática, que não
vai usá-la para nada, mas acabou de dar um exemplo de como os
números são importantes.
– Oxe, vovó, nada a ver! Eu tô falando de desenho,
de briga... O que isso tem a ver com matemática?
– Ô, minha netinha... Pegue uns hidrocores ali
que eu vou te explicar.
16. Joana foi até a sala e pegou um estojo com 24
hidrocores. Então sua avó começou a explicar:
– Aqui temos 24 hidrocores, certo? Se você e suas
primas quiserem desenhar e cada uma tiver que ter
a mesma quantidade, o que vocês devem fazer?
– Brigar?
– Não, menina, que maluquice! Vocês têm que
dividir! 24 hidrocores divididos para três pessoas,
quanto dá?
Então, a menina foi separando um para cada,
dividindo em três grupos com oito cores.
17. Aos poucos, Joana percebeu: o que ela
estava fazendo também era matemática. É
possível percebê-la no cotidiano, não só com
hidrocores, mas com as frutas, com os
brinquedos, com as datas, com as horas...
Por falar em horas, já estava quase na hora do
recreio quando Joaninha agradeceu à avó, pois
agora não odiava tanto os números: eles estão
em todo lugar e não têm como fugir.
Então, a garota foi feliz para a sala e
conseguiu resolver todas as contas de
divisão que a professora passou.
Quando deu a hora do recreio, ela
saiu mais alegre ainda para brincar.
18. Brincadeiras são coisas sérias e quem
desobedece às ordens acaba bagunçando
tudo e ninguém brinca. Sem perceber, Joana
foi aprendendo regras de convivência: a
respeitar o colega, a ajudar o próximo e
a segurar na mão de todo mundo.
No recreio, Joaninha chamou Ana
e Eva para brincarem de “Adoleta”,
“Amarelinha”, “Chicotinho queimado”,
“Três-três passará” e “Pobre de marré deci”.
Elas aprendiam essas brincadeiras com as
crianças mais velhas e brincavam seguindo
as mesmas regras, mesmo sem entender.
19. O recreio acabou e a professora pediu aos alunos para retornarem à sala. Joana voltou
pensativa, lembrando-se de tudo que tinha acontecido durante o dia, dos seus pais que só
tinham estudado até o quinto ano e sabem mais coisas do que ela, que estuda na escola há
um tempão. Lembrou-se da conversa que teve com sua avó e se perguntou como ela
entendia tanto de matemática sem ter estudado quase nada. Pensou na professora e em
como deve ser difícil ensinar várias matérias para tanta gente e depois ficou sorrindo
sozinha, lembrando-se
das brincadeiras com suas
primas e das quedas que
tinha tomado, brincando
de pega-pega. Agora ela
estava ali, de pé, pronta
para aprender mais coisas
com a professora, com sua
avó, com suas amigas
e com todo mundo que
ela conhecia.
20. A aula de português começou e a professora
pediu para que todos escrevessem um texto
sobre o que tinham aprendido durante o dia.
Alguns escreveram rapidinho, entregaram e
foram embora. A aula acabou e Joana já estava
escrevendo a segunda página, então a professora
se aproximou e perguntou o que ela tanto
escrevia. O texto de Joaninha dizia o seguinte:
21. Hoje eu aprendi que acordar cedo é ruim, mas também é bom
porque dá para fazer um bocado de coisas. Aprendi que a comida
que mamãe faz é mais gostosa, porque ela faz com muito carinho
para que todo mundo coma bastante e não fique com fome. Aprendi
com minha tia que temos que tomar cuidado com as palavras, porque
às vezes queremos dizer uma coisa e dizemos outra. Aprendi também
que papai e vovó são bem inteligentes, mesmo não tendo estudado na
escola tanto tempo que nem eu, porque, toda vez que eu pergunto
uma coisa, eles sabem. Aprendi que meus irmãos são chatos, mas
quando eu preciso de alguém para me ajudar nos trabalhos, eles me
ajudam. Aprendi com o povo da casa de farinha que sempre vai ter
alguém olhando para você, mesmo que você não queira. Aprendi com
os bois que, mesmo com pressa, é importante andar devagar.
Aprendi com minhas primas que é muito bom ter amigos, porque a
gente pode conversar, brincar, escrever cartas e, mesmo que a gente
brigue por causa dos hidrocores, tudo bem, porque 24 dividido por 3
dá 8.
22. Aprendi que na hora da brincadeira todo mundo é igual, porque
até as meninas do 5º ano brincam com quem é do 3º, os meninos brin-
cam com as meninas e todo mundo se diverte.
Aprendi com a professora que deve ser chato ensinar pra muita
gente, porque ficam gritando na sala e a cabeça dela deve doer. Mas
ela é legal porque consegue ensinar muitas coisas legais também. Hoje
mesmo ela me ensinou que o texto deve começar com letra maiúscula e
afastado da margem, não sei por que, mas eu escrevi assim, pois
papai disse que a gente tem que obedeser aos mais velhos.
Obs: Agora a professora me disse que obedecer é com c e não com s.
Ela tá aqui do meu lado lendo meu texto, disse que é lindo o que eu
escrevi e escorreu uma lágrima do olho dela.
Será que ela tá triste porque eu demorei?
Vou entregar logo antes que ela chore mais.
Um beijo, pró, te amo! Quero tirar 10, viu? Ass: Joana
23. A nossa vida também é uma escola.
E você, o que aprendeu hoje?
24. Crie seu próprio livro ilustrado!
Utilize folhas de ofício;
Dobre ao meio;
Perfure com
ajuda de um adulto;
Deixe os furos no
meio das folhas;
Coloque fitas
entre os furos;
Faça um laço;
Use sua criatividade
para decorar!
25. Conte sua história!
Depois de fazer seu livrinho, responda às perguntas a seguir e crie sua
própria história, falando sobre sua família, escola e amigos(as).
1. Sua escola é longe da sua casa? Desenhe as pessoas e lugares
que você vê no caminho.
2. Você conhece algum trava-língua? Escreva e ensine para seus/suas
amigos(as).
3. Você já escreveu uma carta? Desenhe o(a) seu/sua melhor amigo(a)
e escreva uma cartinha para ele(a).
4. Desenhe a merenda que você mais gosta.
5. Qual a matéria que você mais gosta e a que menos gosta? Por quê?
6. Desenhe o(a) funcionário(a) mais legal da sua escola.
7. Qual a brincadeira que você mais gosta? Desenhe você e seus/suas
amigos(as) brincando e escreva como se brinca.
8. Escreva um texto falando sobre o que você aprendeu hoje e com quem.
Solte sua imaginação, escreva e desenhe sobre sua vida!
27. A contação de histórias é uma forma
de passar conteúdos didáticos e relacionar
temas interdisciplinares, estimulando o
desenvolvimento cognitivo e incentivando
a busca pelas memórias, a oralidade e o ato
performático de criar e interagir. O
ensinamento de valores, costumes e crenças
típicos de cada cultura também pode ser
transmitido através da contação, pois a
educação vai além do ato de ler e escrever:
é também a forma como enfrentamos as
demandas estabelecidas pela sociedade,
como a convivência com pessoas diferentes
e o trabalho em grupo.
A literatura infantil surge como uma
ferramenta imprescindível para a formação
do indivíduo, pois é possível despertar sua
sensibilidade e percepção através do
contato com outros mundos, pessoas e
circunstâncias. A família e educadores(as)
podem mediar esta relação mesmo antes da
criança saber ler, através de rodas de
leituras, pois assim ela poderá desenvolver
o hábito de ouvir e prestar atenção. Neste
momento, a entonação da voz, o gesto, a
interação e o encantamento são essenciais
para despertar a imaginação dos ouvintes.
A utilização desta técnica em sala de aula
enriquece o conteúdo, dinamiza a
explanação e fortalece a relação entre o(a)
educador(a) e os(as) educandos(as), além de
desenvolver a criatividade e o pensamento
crítico, abrindo caminhos para novas
aprendizagens e valorizando as vivências
dos(as) envolvidos(as).
A importância da contação de histórias
28. Sugestões de temas para aulas
Este livro pode ser utilizado em sala de aula para introduzir objetos de conhecimento de
vários componentes curriculares. Converse com os(as) educandos(as) sobre o que acharam
da história e relacione com os temas sugeridos abaixo.
Geografia: O relevo no cotidiano da criança;
Ciências: Estrutura da árvore (caule, raiz, folhas);
Explicar por que as copas das árvores possuem várias cores.
História: Pesquisar a história das brincadeiras populares;
Casas de farinha: como surgiram, para que servem,
ainda existem?
Português: Trabalhar o gênero de cartas;
Apresentar trava-línguas e parlendas;
Matemática: Divisão de dezenas; Números no cotidiano.
29. Jamile Menezes, natural de Valença-BA, é
arte-educadora, ilustradora e designer.
Gosta de desenhar desde a infância
e sempre quis ser artista e professora.
Sua família tem músicos e fotógrafos que
incentivam e valorizam os seus trabalhos
artísticos, por isso cursou Artes Visuais
na UFRB e fez uma especialização
em Arte Educação na UFBA. Interpreta
a Boneca Zazá, contando histórias e
brincando com crianças, para relembrar
essa fase tão mágica que foi sua infância
na zona rural, com seu pai, sua mãe, seus
dois irmãos e suas primas, divertindo-se
no caminho para a escola, assim como a
personagem Joana. Essa história foi escrita
inspirada em suas vivências, para mostrar
que criança não aprende só na escola,
mas com tudo e todos ao seu redor.
Contato:
jamile.artefoto@gmail.com
instagram.com/jammenezes
facebook.com/bonecazamilia
Sobre a autora e ilustradora
30. Joana é uma menina de 8 anos que mora na
zona rural com sua família. Sua escola é longe de
onde ela mora, mas o caminho é muito divertido.
Essa história foi escrita inspirada nas vivências
da infância da autora e ilustradora, para mostrar
que criança não aprende só na escola, mas com
tudo e todos ao seu redor.
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