SlideShare une entreprise Scribd logo
1  sur  109
Télécharger pour lire hors ligne
1.º Ano - II Semestre




FINANÇAS PÚBLICAS


        Unidade I



O FENÓMENO FINANCEIRO




  Instituto Superior Monitor
         Fevereiro 2010
Copyright
Este manual é propriedade do Instituto Superior Monitor (ISM), sendo que todos os direitos
para o seu uso, por estudantes e docentes, lhe estão reservados. É proibido fazer cópias ou
usar este material sem autorização prévia do ISM.




                                                                 Instituto Superior Monitor
                                                Avenida Guerra Popular No. 1148 1o Andar
                                                                                 Maputo
                                                                            Moçambique

                                               Tel. 21 300436 Cel. 82 3055795/84 7696894
                                                                      Fax: +258 21 323432
                                                          E-mail: monitor.ism@gmail.com
                                                             Website: www.monitor.co.mz
FINANÇAS PÚBLICAS



Índice


ACERCA DESTA UNIDADE I                                                                                                             3
    ESTRUTURA DA UNIDADE I....................................................................................... 3
    RESULTADOS DE APRENDIZAGEM.......................................................................... 5
    DURAÇÃO ....................................................................................................................... 5
    TÉCNICAS DE ESTUDO ................................................................................................ 5
    PRECISA DE AJUDA? .................................................................................................... 7
    TRABALHOS .................................................................................................................. 7
    AVALIAÇÕES ................................................................................................................. 7

UNIDADE I – FENÓMENO FINANCEIRO (FACTOS E NORMAS)                                                                                  9
    CAPÍTULO I - CONCEITO DE FINANÇAS PÚBLICAS ............................................. 9
        OBJECTIVOS ......................................................................................................... 9
        FINANÇAS PÚBLICAS E FINANÇAS PRIVADAS ........................................... 9
        ACEPÇOES DE «FINANÇAS PÚBLICAS» ....................................................... 10
        O FENÓMENO FINANCEIRO ............................................................................ 11
        A ECONOMIA DO FENOMENO FINANCEIRO (ECONOMIA PRIVADA,
        SOCIAL E PÚBLICA) .......................................................................................... 11
        A ACTIVIDADE FINANCEIRA ......................................................................... 18
        A OPTIMIZAÇÃO SOCIAL E SEUS CRITÉRIOS TEÓRICOS ........................ 21
        CAUSAS DE INCAPACIDADE DO MERCADO .............................................. 28
        A PROVISÃO PÚBLICA DE BENS ................................................................... 34
        A ACTIVIDADE FINANCEIRA E SEUS CRITERIOS FINALISTAS ............. 41
        EXERCÍCIOS PRÁTICOS I ................................................................................. 44
        CORRECÇÃO DE EXERCÍCIOS ........................................................................ 45
    CAPÍTULO II - FINANÇAS, DOUTRINAS E SISTEMAS ECONÓMICOS ............. 46
        2. 0 SISTEMA CAPITALISTA ............................................................................ 49
        3. OS REGIMES ECONÓMICOS E AS DOUTRINAS ...................................... 50
        4. O LIBERALISMO E AS FINANÇAS NEUTRAS .......................................... 52
        5. A TRANSIÇÃO PARA AS FINANÇAS INTERVENCIONISTAS................ 57
        6. O INTERVENCIONISMO FINANCEIRO E AS FINANCAS ACTIVAS ..... 60
        7. FINANÇAS PÚBLICAS E SISTEMAS COLECTIVISTAS ........................... 67
        EXERCÍCIOS PRÁTICOS ................................................................................... 71
        CORRECÇÃO DE EXERCÍCIOS ........................................................................ 72
    CAPÍTULO III - A ACTIVIDADE FINANCEIRA COMO FENOMENO POLÍTICO 73
        OBJECTIVOS: ...................................................................................................... 73
        ESTADO E ACTIVIDADE FINANCEIRA ......................................................... 73
        ESTADO E OUTRAS ENTIDADES SOCIAIS ................................................... 91
    CAPÍTULO IV -FACTOS E NORMAS NA ACTIVIDADE FINANCEIRA............... 93
        OBJECTIVOS ....................................................................................................... 93
        AS FINANÇAS PÚBLICAS E 0 DIREITO FINANCEIRO ................................ 93
        AUTONOMIA E NATUREZA DO DIREITO FINANCEIRO ........................... 95
        EXÉRCICIOS PRÁTICOS ................................................................................... 99
        CORRECÇÃO DOS EXERCÍCIOS ................................................................... 100
        SUGESTÕES DE LEITURA .............................................................................. 102
ii                                                                                                         Índice


        QUADRO SINÓPTICO ...................................................................................... 102
     AVALIAÇÃO DE FINANÇAS PÚBLICAS ............................................................... 104
FINANÇAS PÚBLICAS



ACERCA DESTA UNIDADE I

              Estas notas de ensino constituem a primeira unidade da disciplina
              de Finanças Públicas leccionada no primeiro semestre no Instituto
              Superior Monitor (ISM). É uma disciplina pertencente ao curso de
              Direito, servindo de ferramenta essencial para a compreensão e
              melhor abordagem das disciplinas tais como, Direito Fiscal,
              Finanças Públicas, Direito Comercial, Direito Bancário, Direito
              Financeiro, Direito Económico, Direito Internacional Económico.
              Como facilmente poderá se depreender, a Economia Política serve
              como disciplina vestibular, para o estudo das disciplinas acima
              referidas.

              Com efeito, o estudante dificilmente poderá entender a essência da
              obrigação dos cidadãos em pagar os impostos, a política do Estado
              na defesa do emprego, nas decisões do governo em agravar as taxas
              de poluição do meio ambiente, sem que tenhamos abordado a
              problemática da redistribuição de rendimentos, conceitos que serão
              tratados na disciplina de Economia Política.



ESTRUTURA DA UNIDADE I

              Presente unidade tem como tema central o fenomeno finaceiro esta
              dividada em quatro capítulos nomeadamente: o conceito de
              finanças públicos; finanças, doutrinas e sistemas; a actividade
              financeira como fenómeno político e os factos e normas da
              actividade financeira.
              Com estas matérias pretendemos dotar os nossos esttudantes de
              conhecimentos necessários para percebeer como é que a economia
              se encontra organizada e as formas que o Estado optou para
              ordenar, intervir e actuar no seio da economia de modo a evitar
              desequilíbrios;


              Recomendamos que leia atentamente as generalidades desta
              unidade antes de iniciar os seus estudos.


GENERALIDADE DO CURSO
              Caro Estudante

              Seja Bem-vindo(a) à Unidade 1- introdução à Economia Política
              do ISM!




                                                                           3
4                                                                              Índice


             Para ter sucesso nesta Unidade I, você precisa de estudar
             cuidadosamente o material apresentado nesta Unidade, os recursos
             auxiliares disponíveis e apresentar as suas dúvidas ao tutor.

             Esta é uma disciplina que apesar de nova em alguns aspectos,
             muitos aspectos, sendo pressupostos, o estudante deve trazer do
             ensino geral. Dos que não é preciso ter conhecimento anterior são
             os ligados com a ciência económica, entretanto, o domínio da
             história universal, geografia económica, e filosofia, disciplinas
             leccionadas no ensino geral, constituirá uma base para melhor
             compreender os conceitos dados na presente unidade, o contrário,
             constituindo um constrangimento.

             A dificuldade esperada que o estudante experimentar nesta Unidade
             poderá ser de natureza filosófica, onde certa terminologia se torna
             indigesta. É preciso compreender por outro lado que esta a
             introdução às finanças públicas versa essencialmente parte teórica
             destacando-se sobre ela o pensamento, concepções, doutrinas
             económicas.

RECURSOS
             Se você estiver interessado em aprender mais acerca desta matéria,
             nós providenciamos uma lista de recursos adicionais no fim desta
             unidade. Estes recursos incluem títulos bibliográficos e de artigos,
             websites da Internet e a biblioteca virtual do ISM.

SEUS COMENTÁRIOS
             Agradecíamos que após a conclusão desta unidade nos enviasse os
             seus comentários sobre os seguintes aspectos:

               Conteúdos e estrutura da unidade;

               Materiais de leitura e recursos da unidade;

               Trabalhos da unidade;

               Avaliações da unidade;

               Duração da unidade;

               Apoio ao estudante (tutores atribuídos, apoio técnico, etc.);

               Outros aspectos que achar pertinente.

             Os seus comentários ajudar-nos-ão a melhorar e reforçar esta
             unidade.




4
FINANÇAS PÚBLICAS


RESULTADOS DE APRENDIZAGEM

                      Ao concluir esta unidade você será capaz de:

                         Distinguir dentre várias concepções o objecto da Economia
                         Política;

                         Utilizar numa perspectiva histórica, a génese e evolução da
Resultados               conceito da Economia Política entanto que ciência diferentes das
                         outras ciências;

                         Demonstrar o domínio dos melhores métodos de investigação de
                         fenómenos económicos;

                         Delimitar o âmbito da ciência económica;

                         Argumentar situações económicas de forma clara e lógica




DURAÇÃO

                      Tempo para leitura da unidade: 10 horas

                      Tempo para trabalhos de pesquisa: 14 horas

                      Tempo para a realização de exercícios práticos: 2 horas
Duração da unidade:
                      Tempo para a realização de avaliação: 2 horas
     28 Horas




TÉCNICAS DE ESTUDO

                      Por você ser um estudante universitário as suas técnicas de
                      aprendizagem serão diferentes das que usava nos tempos da escola
                      secundária e na presença de um professor.

                      Neste curso você terá uma grande autonomia, isto é,
 Técnicas de Estudo   RESPONSABILIDADE. Acima de tudo, você fará uma gestão
                      responsável do seu tempo. Faça um programa de estudos realista e
                      cumpra-o rigorosamente. Escolha horas e locais tranquilos para os
                      seus estudos. Faça uso dos demais recursos referenciados na
                      unidade e mobilize a sua motivação profissional e/ou pessoal para


                                                                                    5
6                                                              Índice


    adequar as suas actividades de estudo a outras responsabilidades
    profissionais, sociais e pessoais. Partilhe as suas aprendizagens
    com os outros.

    Usufrua das várias formas de apoio disponíveis, mas
    fundamentalmente, você tomará controlo do seu ambiente de
    aprendizagem.

    Recomendamos que consulte alguns sites da Internet, em inglês,
    com informações importantes sobre a melhor forma de estudar de
    maneira autónoma:

      http://www.how-to-study.com/

      http://www.ucc.vt.edu/stdysk/stdyhlp.html

      http://www.howtostudy.org/resources.php

    Bons Estudos!




6
FINANÇAS PÚBLICAS


PRECISA DE AJUDA?

                Os materiais deste curso estão na página seguinte da Internet:

                Www.monitor.co.mz
      Ajuda     Você vai precisar de uma senha para poder ter acesso a estes
                materiais. No caso de ter problemas de acesso à página que tem
                materiais desta unidade, por favor contactar o Instituto Superior
                Monitor pelo e-mail monitor.ism@gmail.com.

                No caso de dúvidas sobre o material desta unidade, por favor
                contactar o seu tutor através do e-mail monitor.ism@gmail.com.
                Também poderá contactá-lo por telefone ou telemóvel cujos
                números são disponibilizados pelo Departamento de Apoio ao
                Estudante.




TRABALHOS

                Depois de estudar cada capítulo desta unidade o estudante deve
                resolver todos os exercícios de aplicação como forma de
                consolidação das matérias nela vertidas. Os exercícios de aplicação
                não seram submetidos ao Instituto Superior Monitor. O Instituto
                Superior Monitor fornece as soluções dos trabalhos de auto-
    Trabalhos   avaliação para lhe ajudar nos estudos. Mas Atenção Caro
                Estudante, você deve resolver os exercícios de auto-avaliação antes
                de consultar as soluções fornecidas.




AVALIAÇÕES

                Você deve fazer uma avaliação nesta unidade. A avaliação
                encontra-se no final da unidade. A avaliação deve ser
                submetida ao Instituto Superior Monitor até ao 28 de Março de
   Avaliações   2010. Você pode submeter a avaliação por e-mail, fax, entregar
                directamente na instituição ou usando outros meios de
                comunicação.

                O docente irá corrigir as avaliações e lhe atribuirá uma nota com
                base no seu desempenho. A média aritmética das avaliações de
                cada Unidade vai ditar a sua nota de frequência. Depois, você terá
                que fazer um exame presencial para poder ter a avaliação final da
                disciplina. São admitidos ao exame presencial, os estudantes que


                                                                                 7
8                                                              Índice


    tiverem uma nota de frequência igual ou superior a 10 valores.
    NÃO HÁ DISPENSAS. Para poder concluir a disciplina, os
    estudantes devem ter uma média final igual ou superior a 10
    valores e com uma classificação igual ou superior a 10 valores no
    exame presencial.




8
FINANÇAS PÚBLICAS



UNIDADE I – FENÓMENO FINANCEIRO (FACTOS E
NORMAS)


CAPÍTULO I - CONCEITO DE FINANÇAS
PÚBLICAS

               OBJECTIVOS

               Ao concluir este capitulo os estudantes terão o domínio sobre
               matéria referentes ao:
                  •   Ao conceito de Finanças Públicas;

                  •   Aos vários sentidos em que as Finanças Públicas podem ser
                      entendidas;

                  •   Fenómeno Financeiro, que representa o estado das relações
                      económicas entre as pessoas e instituições sociais, por um
                      lado e o Estado, do outro lado;

                  •   Entender o que é a economia privada;

                  •   O que é a economia social;

                  •   O que é a economia pública;

                  •   Terá também a capacidade de entender as causas de
                      incapacidade do mercado, a provisão pública de bens e os
                      princípios doutrinários e políticos da actividade financeira;




               FINANÇAS PÚBLICAS E FINANÇAS PRIVADAS
               Uma primeira aproximação ao conceito de finanças públicas exige
               a sua separação de outra noção com que anda muitas vezes
               confundido e de que e rigorosamente distinto: as finanças privadas.

               Enquanto por finanças privadas se entendem os aspectos
               tipicamente monetários do financiamento de uma economia ou de
               um agente económico, abrangendo os problemas da moeda e do
               crédito (ou, mais restritamente, os «mercados financeiros» onde se
               transaccionam activos representados por títulos a médio e a longo
               prazo), as finanças públicas designam a actividade económica de


                                                                              9
10   UNIDADE I – FENÓMENO FINANCEIRO (FACTOS E NORMAS)


                         um ente público tendente a afectar bens a satisfação de
                         necessidades que lhe estão confiadas.

                         Trata-se de uma mera similitude vocabular, com razões históricas,
                         que leva a utilização do mesmo termo para designar duas realidades
                         distintas. Preferimos qualificar de financeiro quanto diga respeito
                         as Finanças Públicas, e de financial o respeitante as finanças
                         privadas, incluídas na teoria económica da Moeda e do Crédito;
                         mas isto não é ainda do consenso.



                         ACEPÇOES DE «FINANÇAS PÚBLICAS»
                         A expressão finanças públicas pode ser utilizada em três sentidos
                         fundamentais:

                         (a) Sentido orgânico - Fala-se de finanças públicas para designar o
                         conjunto dos órgãos do Estado ou de outro ente público (incluindo
                         a parte respectiva da Administração Publica) a quem compete gerir
                         os recursos económicos destinados a satisfação de certas
                         necessidades sociais (p. ex. Ministério das Finanças).

                         (b) Sentido objectivo - Designa a actividade através da qual o
                         Estado ou outro ente público afecta bens económicos a satisfação
                         de certas necessidades sociais.

                         (c) Sentido subjectivo - Refere a disciplina cientifica que estuda os
                         princípios e regras que regem a actividade do Estado com o fim de
                         satisfazer as necessidades que lhe estão confiadas.

                         No segundo e no terceiro sentidos, tende-se modernamente a
                         designar por Economia Pública, quer esta forma de actividade
                         económica, quer o ramo da Economia que a estuda, sobretudo
                         quando o faz de uma perspectiva predominantemente dedutiva,
                         teórica ou analítica e em termos reais. Preferimos designar por
                         Finanças Públicas o estudo deste fenómeno, quando e feito numa
                         óptica de economia aplicada, fundamentalmente segundo métodos
                         indutivos e institucionais e em valores monetários (não reais)1




                         1
                          A família pode ter uma organização institucional, mas a sua
                         dimensão e forma exterior de actuação não se diferenciam das dos
                         indivíduos em sociedades como a nossa; por isso e aqui tomada
                         como instituição privada.


10
FINANÇAS PÚBLICAS


O FENÓMENO FINANCEIRO
Como aspecto da realidade e objecto científico das Finanças, há
que caracterizar, pois, o fenómeno financeiro. Ele representa, talvez
do modo mais significativo e expressivo, o estado das relações
económicas entre as pessoas e instituições sociais, por um lado, e o
Estado, do outro; como o seu estudo contem a visão mais concreta
e insofismável das tarefas e das funções que, com prioridade, o
poder público concretamente desenvolve numa sociedade, por
vezes bem diferente das proclamações políticas, das concepções
ideológicas e, até, de certas visões superficialmente científicas.
Poucos campos melhor do que este são um verdadeiro termómetro
das relações concretas entre o poder e a sociedade que o integra,
bem como das tarefas e funções que esta leva o poder a
desempenhar, e do modo como os grupos, estratos ou classes
sociais se situam perante o poder, beneficiando dos seus gastos ou
suportando o respectivo custo.



A ECONOMIA DO FENOMENO FINANCEIRO
(ECONOMIA PRIVADA, SOCIAL E PÚBLICA)
A actuação económica das pessoas, dos grupos e da sociedade pode
ser exercida de diversas formas.

 Em alguns casos, achamo-nos perante indivíduos, famílias ou
organizações de base contratual que, na produção, no consumo, na
repartição ou na circulação, actuam como unidades individuais ou
como organizações de mera base contratual, na satisfação das
respectivas necessidades, segundo critérios predominantemente
individuais.

Trata-se da economia privada, em regra contratual2

Outras vezes, deparamos com organizações que visam satisfazer
necessidades segundo uma lógica cooperativa ou colectiva,
recorrendo a disciplina institucional interna do grupo, mas sem a
possibilidade de recorrer a mecanismos coactivos externos. As
tradicionais formas de comportamento económico comunitário, as
novas modalidades de unidades cooperativas ou autogestionárias,
as instituições sociais não contratualistas constituem exemplos
desta economia comunitária, cooperativa ou colectiva (social, «hoc
sensu»).


2
 Não se esquece que nem tudo que e hoje publico será politico;
toma-se todavia o politico como forma matricial, dirigente e
predominante do público


                                                                11
12   UNIDADE I – FENÓMENO FINANCEIRO (FACTOS E NORMAS)


                         Enfim, as pessoas podem associar-se em organizações políticas, as
                         quais têm por fim o interesse geral de sujeitos indeterminados, indo
                         assim para além da simples satisfação de necessidades comuns
                         sociais. Para isso se socorrem de poderes de autoridade - no duplo
                         sentido da produção de preceitos sociais obrigatórios, mesmo para
                         quem não participou na respectiva elaboração, e da possibilidade de
                         recorrer, se necessário, a coacção por parte dos órgãos da
                         instituição. Temos então uma economia pública, que iremos estudar
                         primeiramente em referência ao seu sujeito actual mais típico e
                         importante: o Estado.
                            •   A economia privada baseia-se no livre comportamento dos
                                agentes económicos e em equilíbrios, parciais e gerais, por
                                eles livremente estabelecidos, de acordo com os seus
                                interesses próprios confrontados com transparência e
                                medidos por referenciais comuns - os preços formados em
                                mercado. Tem como instrumentos fundamentais os
                                contratos e como instituição básica de apropriação dos bens,
                                produtivos ou de consumo, a propriedade privada.

                            •   A economia social assenta na solidariedade, organizada em
                                grupos de diversa dimensione nível económico, na
                                liberdade de comportamento das pessoas e dos grupos, na
                                combinação da propriedade privada com a propriedade
                                social e comunitária, na cooperação organizada (mais
                                livremente ou com maior peso dos interesses sociais); ela
                                pode integrar instrumentos de racionalidade e solidariedade
                                orgânica diversificados, que combinam 0 individualismo
                                com o solidarismo, nos seus diversos matizes.

                         Por seu lado, a economia pública assenta, a partida, na existência
                         de uma solidariedade organizada e dotada de poder politico
                         portanto, da coacção social máxima - a escala da colectividade ou
                         de subsistemas do sistema social, numa lógica de direcção
                         económica mais ou menos planeada, com formas de apropriação
                         dos bens pela sociedade através dos seus órgãos políticos e juízos
                         colectivos de utilidade; estes impõem-se do centro (órgãos de
                         decisão politica) para a periferia (membros da sociedade), seja qual
                         for a forma de designação e o critério de funcionamento interno da
                         entidade pública considerada.

                         Até ao presente, não conhecemos sociedades - fora algumas
                         pequenas comunidades primitivas ou, pelo menos, atrasadas - que
                         concretizem a sua organização global segundo princípios
                         comunitários ou solidaristas: este apenas tem vincado em pequenas
                         comunidades ou sectores delimitados das grandes sociedades.




12
FINANÇAS PÚBLICAS


A economia privada e a economia pública até hoje dominantes
constituem dois princípios opostos de estruturação e funcionamento
da sociedade económica, que podem situar-se fundamentalmente
em dois planos distintos;

- O da definição do sistema económico, caracterizando assim,
consoante seja globalmente dominante um ou outro destes
princípios, diversos tipos de sistemas económicos;

O fenómeno financeiro - actos e normas

Adopção dos respectivos modelos ou critérios de comportamento,
dentro de um ou outro dos sistemas económicos, por sectores,
órgãos sociais ou agentes económicos.

Embora pudesse ser mais lógica a ordem inversa, vamos começar
por nos situar no plano de um sistema económico dominado pelos
princípios de economia privada: no plano sociocultural (filosofias e
ideologias individualistas, sistemas sociais e políticos parcialmente
descentralizados), no das instituições e instrumentos económicos
fundamentais (propriedade e iniciativa privada dominantes,
ajustamentos económicos pelo mercado e pelos princípios da
máxima utilidade individual, tomada em si ou reflectida nos
grupos) e no plano dos comportamentos sociais (motivação egoísta
predominante, dinamismo competitivo ou conflitual). São estes os
sistemas e as estruturas historicamente dominantes atem ao
presente, e é no seu modelo que se integra Moçambique, tal como
os países que nos são mais próximos.



PODER E A ECONOMIA: ORDENAÇÃO, INTERVENÇÃO
E ACTUAÇÃO ECONOMICAS

a) Noções prévias

Vejamos então quais os principais tipos de relações entre o poder
político - podem tomar como sua forma protótipos de organização
o Estado, sem prejuízo do que adiante se dirá - e a actividade
económica, entendida como o processo orgânico de satisfação de
necessidades humanas mediante" a afectação de bens materiais
raros a fins alternativos (individuais ou sociais; privados,
comunitários ou públicos).

Parece-nos que essa relação pode ser de três tipos principais: a
ordenação económica, a intervenção económica e a actuação
económica pública. Vejamo-las sucessivamente.




                                                                13
14   UNIDADE I – FENÓMENO FINANCEIRO (FACTOS E NORMAS)


                         b) A ordenação Económica

                         1. Cabe aos poderes públicos estabelecer os quadros gerais em que
                         toda a actividade económica tem de se desenvolver (por mais
                         liberal que seja a sua filosofia económica e Social): da constituição
                         económica e da legislação económica, as próprias directivas e
                         decisões concretas da administração económica... A máquina
                         político-administrativa, em larga parte, procede assim a definição
                         do enquadramento da vida económica, designadamente de natureza
                         jurídica e social; Assim estrutura a actividade económica e
                         condiciona a actuação dos sujeitos económicos.

                         Cumpre desde já acentuar que não e apenas no domínio jurídico
                         que esta forma de actuação do poder político sobre a actividade
                         económica se concretiza. Ela decorre também da modelação, no
                         domínio extra-jurídico, das diversas instituições sociais (hábitos,
                         formas de comportamento, grupos inorgânicos ou organizados de
                         forma não jurídica, etc.).

                         Tal forma de actuação constitui o que pode chamar-se domínio de
                         ordenar; ao da actividade económica (ou ordenação económica)3.

                          II. Um primeiro aspecto desta ordenação resulta naturalmente da
                         definição e execução de uma doutrina ou politico económico-social
                         seguida pelo Estado: abstencionista, liberal, socialista a, comunista,
                         etc. A doutrina económica do Estado explícita ou implícita,
                         constitui uma primeira forma de ordenação genérica da actividade
                         económica e social, a qual há-de conformar-se as suas actuações
                         políticas e as dos sujeitos privados.

                         III. As doutrinas e políticas económicas de índole geral podem
                         especificar-se, tanto em normas como numa prática jurídico-
                         política (com a qual estão, alias, interdependentes). Então
                         formulam-se princípios gerais, aos quais deve obedecer toda a vida
                         económico-social, e também a produção e normas jurídicas ou as
                         situações e relações jurídicas a ela pertinentes. Este conjunto de
                         disposições fundamentais, expressão concretizada de uma doutrina
                         ou filosofia social, que pode designar-se por constituição
                         económica4.



                         3
                           Sobre as noções de ordem económica: VITAL MOREIRA, A
                         ordem jurídica do capitalismo, 1973.
                         4
                           Note-se que doutrina (como ideologia e politica, decorrentes
                         dela) e constituição são realidades interferentes, mas não
                         hierarquizáveis: diversas constituições podem convergir numa
                         mesma doutrina; e diversas doutrinas podem executar-se a sombra
                         de uma constituição (veja-se o debate entre as interpretações
                         Liberais e as interpretações dirigistas da Constituição de 1933 nos


14
FINANÇAS PÚBLICAS


IV. 0 Estado pode ainda, ao abrigo da sua função ordenadora da
vida económica, definir normas gerais, que não demarcam Já os
quadros fundamentais de toda a vida económica, mas a eles se
subordinam, seja para toda a actividade económica, seja para certos
sectores, tipos de actividade ou de relações económico-sociais
gerais e permanentes antes referidos, regulando de forma directa,
por exemplo, um sector, um tipo ou uma área de actividade: será
legislação ou regulamentação económica. Ela pode abranger as
instituições económicas gerais nas áreas da produção, do consumo,
dos instrumentos reguladores - mercados e plano -, da circulação de
bens - moeda e crédito -, dos mercados de factores de produção, da
repartição do rendimento e das relações internacionais) e as
específicas, nomeadamente sectoriais (agricultura, industria,
comercio, outros serviços...).

De uma forma jurídica ou por via política, através da
Administração activa ou dos Tribunais, a administração e
jurisdição económica constituem ainda, em seus critérios
constantes, uma forma de ordenação jurídica (paredes-meias já com
a intervenção): prevalecerá a vinculação na função ordenadora, a
discricionariedade na intervenção. Por elas o Estado desempenha
uma função ordenadora da vida económica, definindo e executando
padrões e quadros mais ou menos concretos, no âmbito dos quais
tanto o seu próprio comportamento como o dos sujeitos
económicos vão livremente desenvolver-se. Condiciona-se e
ordena-se então o comportamento dos diversos sujeitos; mas não se
visa interferir directamente sobre ele.

c) A intervenção económica

I. Não se esgotam aqui a relação entre político e a actividade
económica. Um seu outro modelo e o que visa alterar
Concretamente o que seria a actividade livre e norma dos sujeitos
económicos. Assim, Suponhamos que o Estado considera
indesejável que se produzam mais tecidos de fibras sintéticas:
poderá evitar que abram mais fábricas, poderá baixar os preços dos
têxteis, levando algumas unidades a falência e outras a retraírem a
produção, podem restringir o crédito ao sector, poderá fixar quotas
de mercado ou limitar por contingentes a produção de cada fábrica
ou empresa, etc. Em tal caso, o Estado recorre ao seu poder para
modificar o comportamento de sujeitos económicos (embora não
altere os quadros gerais da actividade económica); isso pode
resultar de disposições directamente limitativas, como de restrições
financeiras, do agravamento de impostos, de simples movimentos
de forte persuasão ou coacção psicológica (particularmente usados



anos setenta; ou o debate entre as interpretações socializantes e as
liberalistas do texto constitucional de 1976).


                                                               15
16   UNIDADE I – FENÓMENO FINANCEIRO (FACTOS E NORMAS)


                         quando existem crises graves), ou de muitas outras formas
                         indirectas.

                         II. Este tipo de comportamento que se designará, em sentido
                         próprio, por intervenção económica do Estado a qual tem como
                         forma mais racionalizada a política económica. Ela pode ser directa
                         ou indirecta, e representa a relação mais flexível, diversificada e
                         variada entre o Estado e a actividade económica. O que a
                         caracteriza é que o Estado visa alterar o comportamento dos
                         produtores ou dos consumidores (em suma, dos sujeitos
                         económicos) que dispõem de uma certa margem de liberdade: a
                         intervenção estadual tenta modificar a forma natural como esses
                         agentes actuariam, de modo genérico (teremos então politicas
                         económicas) ou em termos casuísticos (por actuações
                         individualizadas). Fá-lo, porem, sem modificar os quadros gerais
                         da actividade económica, e sem tão-pouco tomar ele próprio
                         decisões relativas a utilização de bens e satisfação de necessidades
                         sociais ou estaduais, isto é, sem ser ele próprio sujeito económico).

                         d) A actuação económica do Estado

                         1. 0 Estado pode, porém, desenvolver ele próprio - como «forma»
                         política da sociedade - uma actividade de sujeito económico
                         colectivo ou social. Sabemos de sistemas sociais em que todas as
                         necessidades económicas, em sociedades primitivas ou
                         integralmente socialistas, são satisfeitas pela própria sociedade
                         política (que terá, para uns, necessidades próprias, como organismo
                         que e; que apenas «interpreta» necessidades individuais; ou que
                         actua num e noutro plano).

                         Em todos os tempos, contudo, zonas da actividade económica,
                         conexas com os fins e as funções do Estado, foram por este
                         exercidas; pois a prossecução de fins de segurança, justiça e bem-
                         estar implica a administração de diversos bens raros, a qual, de per
                         si, e actividade económica.

                         Em tais casos - de actuação económica do Estado - este dispõe de
                         bens económicos, cuja gestão e disposição lhe esta atribuída, para
                         os afectar a necessidades sociais que lhe cumpre satisfazer. Pela
                         disposição ou administração desses bens que ele actua
                         economicamente, fazendo também politica ou administração.

                         II. Todos sabemos que há serviços que o Estado e só ele podem
                         prestar numa sociedade evoluída: a administração da justiça, a
                         defesa e a segurança a interna, certas zonas de administração civil.
                         Para tanto, ele haverá de dispor de bens, de utilizar meios de
                         financiamento, de remunerar o trabalho e outros factores
                         produtivos...

                         Mas sabemos igualmente que há serviços que o Estado, por razões
                         diversas chamou a Se prestar (embora pudesse não fazer; e o faça


16
FINANÇAS PÚBLICAS


nuns países e não em outros): dos correios e telecomunicações, de
certas modalidades de crédito da rádio e televisão e certos países
(por vezes em concorrência com os particulares)...

 Também estes bens e serviços têm uma natureza económica bem
evidente. O Estado, ao produzi-los, e um produtor como outro
qualquer: quer seja monopolista, quer se integre num esquema
concorrencial; quer aja em regime de preços livres, quer se socorra
de preços dirigidos; tanto se tiver organizações de tipo empresarial,
como se sujeitar a critérios, as vezes pouco económicos, de gestão
dos serviços públicos com carácter estritamente político.

É fácil! Compreender a atribuição de carácter intrinsecamente
económico a produção deste tipo de bens (coisas como serviços)
pelo Estado; já será, contudo, mais difícil compreender O carácter
económico da polícia ou da defesa nacional, por exemplo. Contudo,
também eles constituem serviços, «pagos» pela colectividade, por
via dos impostos (ou das taxas); e ao presta-los, o Estado suporta
custos, formulando decisões acerca da afectação de bens
económicos raros a fins específicos de carácter social.

Nestas situações, que poderemos designar por actuação económica
em sentido próprio, o Estado age por si mesmo como sujeito ou
agente económico, formulando escolhas ou opções económicas no
interesse da comunidade (ou da sua maquina ou aparelho estadual).

e) Exemplos; ralações entre estas modalidades

 Como formas de ordenação, podem referir-se as disposições
constitucionais que se referem a actividade económica; a legislação
sobre os sectores institucionais de produção; a legislação sobre
sociedades comerciais...

 A situação de intervenção corresponde, por exemplo, a realização
de compras pelo Estado para facilitar o combate a depressão
económica; a constituição de empresas públicas com o fim de
promover o desenvolvimento económico; 0 tabelamento de preços,
no fito de lutar contra a inflação: a acção psicológica da persuasão
dos industriais para estimular o aparecimento de novas indústrias;

A aprovação de um plano económico-social pelo Parlamento e pelo
Executivo...

Na sua actuação económica, o Estado cobra impostos e realiza
despesas de edifícios públicos, de parques e de matas; tem acções e
obrigações de que e titular; contrai e reembolsa empréstimos;
vende o património; etc.

Os próprios exemplos demonstram o evidente carácter não
exclusivo desta tipologia. Nenhum destes tipos de comportamento
exclui, em concreto, o outro; são antes cumuláveis. Assim, a


                                                                17
18   UNIDADE I – FENÓMENO FINANCEIRO (FACTOS E NORMAS)


                         actuação do Estado pode ser uma forma de intervenção (mas
                         também pode não o ser); a ordenação da vida económica pode
                         assumir-se como mera forma de intervenção generalizada, e ate
                         pode ser tomada como meio de criação de bens...



                         A ACTIVIDADE FINANCEIRA
                         I. 0 Fenómeno financeiro é um tipo cientificamente definido de
                         fenómeno social. Em concreto, faz parte da vida social e pode ser
                         objecto de uma análise segundo a óptica própria das diversas
                         ciências sociais: do Direito, se for encarado na perspectiva dos
                         valores de justiça e' das normas que intentam defini-los; da
                         Economia, se encarado como forma de afecta ao de meios
                         objectivamente raros a fins a alternativos; a ciência Politica ou
                         Politologia, se for toma o como forma de exercício do poder (em
                         geral; ou politico em especial) da psicologia, se for encarado nos
                         aspectos de psicologia individual e social que envolva; da
                         Sociologia, se for concebido na sua essência pura e mais geral de
                         fenómeno social. Não pensamos, pois, que seja adequado distinguir
                         nele elementos - o fenómeno social e uno - nem destacar
                         fenómenos sociais que são financeiros e fenómenos sociais que o
                         não são.

                         II. Parece-nos antes que a actividade financeira corresponde a
                         utilização de meios económicos (meios objectivamente raros
                         susceptíveis de aplicações alternativas) por entidades públicas ou
                         pela própria comunidade, a fim de satisfazer necessidades comuns.
                         A análise destes conceitos que resultará a sua melhor
                         caracterização: onde tais caracteres se verifiquem, sempre haverá
                         finanças públicas.

                         III. Tomemos um exemplo. Imaginemos que há uma praga de
                         mosquitos, portadores de malária, numa colectividade, e que os
                         membros desta pretendem exterminar os insectos. Para isso, as
                         alternativas possíveis são as seguintes

                         (I) Não sair de casa para não ser atingido por nenhum mosquito.
                         Excepto se algum mosquito entrar em casa, a solução será
                         eficiente; tem porém o inconveniente de os habitantes da área não
                         poderem deslocar-se fora de casa. O custo directo desta alternativa
                         e quase nulo; mas ela tem o grande contra de impedir a actividade
                         normal das pessoas, envolvendo assim custos bem maiores.

                         (2) Ficando em casa, seria possível instalar condicionado, e assim
                         ter melhores condições de existência e trabalho. O custo seria mais
                         elevado e o mesmo inconveniente perdura.




18
FINANÇAS PÚBLICAS


(3) Pode-se sair de casa, usando cremes ou outros processos, mais
ou menos falíveis, de protecção contra os mosquitos. O incómodo
pode ser grande, e a eficácia da solução duvidosa, mas ela é barata
e permite as pessoas fazerem a sua vida fora de casa.

(4) Pode-se utilizar um nebulizador ou extintor no jardim da casa
de cada um, afastando um pouco mais os mosquitos infectados. A
eficácia e duvidosa e o custo mais elevado:

(5) Nenhuma destas soluções elimina o mal na origem: os
mosquitos continuarão a existir e a multiplicarem-se. A única
solução totalmente eficiente será a pulverização aérea dos seus
viveiros com pesticidas adequados: ela custará, por hipótese, (frete
do avião e produtos químicos).

A escolha entre estas diversas soluções técnicas - que não são
equivalentes, mas todas resolvem o problema minimamente -
depende das possibilidades orçamentais (constrangimento
orçamental) de cada pessoa e dos inconvenientes pessoais de cada
uma delas. Para a generalidade, a alternativa e seria desejável, mas
estaria acima das possibilidades orçamentais de cada um. As outras
quatro alternativas seriam escolhidas consoante o custo e os
orçamentos de cada um (que fixaria a parcela dos recursos afectada
a satisfação deste tipo de necessidades, em concorrência com
outras): os mais pobres teriam acesso apenas a alternativa; outros
disporiam de outras alternativas.

A acção individual apenas tem, em regra, acesso as quatro
primeiras soluções. Na verdade, a quinta solução, ainda que
estivesse ao alcance dos recursos económicos de algum particular
muito rico, sempre possibilitaria a «boleia» ou a «borla» de todos
os outros: estes tirariam o mesmo proveito que o financiador da
iniciativa, mas de graça, enquanto este a pagou por inteiro. Ou
então, para ela poderão associar-se os vizinhos, empreendendo uma
acção comum: mas quem garante que todos queiram contribuir,
admitindo que algum tome por si a iniciativa, de modo
parcialmente altruísta? A verdade e que, sem fazer nada, os
vizinhos que nada gastarem tiram o mesmo beneficio da extinção
dos mosquitos; mesmo ficando mal vistos, podem não gastar nada,
utilizando - por «boleia» ou «a borla» - os benefícios gerados pelas
acções dos outros. Pode suceder que os poucos que aceitem pagar
ou cooperar de outra forma, acabem por achar o custo tão elevado
que os levara a desistir por não poderem financiar a acção
necessária.

Sabendo como é difícil levar o «borlista» a pagar alguma coisa pelo
benefício que tira, o rico não estará disposto a custear sozinho um
benefício para todos; alguns poderão querer fazê-lo, mas só com a
garantia de que todos contribuirão. A não ser que o façam por
altruísmo (caridade, filantropia, vaidade, ambição social...) ou que
tenham forte interesse individual (apesar da aversão as «borlas»)


                                                               19
20   UNIDADE I – FENÓMENO FINANCEIRO (FACTOS E NORMAS)


                         em conseguir os benefícios individuais resultantes da solução 5... O
                         vizinho rico ou o pequeno grupo promotor normalmente proporão
                         ao conjunto dos vizinhos uma acção colectiva: se todos pagarem
                         uma parcela igual, a iniciativa far-se-á. Estão então sujeitos a
                         recusas e, ou assumem o encargo de preencher as faltas, ou não
                         haverá obra comum... Os indivíduos juntar-se-ão em grupo ou
                         clube - com fins temporários e permanentes - se o custo de se
                         associarem for inferior aos benefícios que tiram do «clube» C).

                         Da associação em «clube» podem mesmo advir economias de
                         escala ou a cobertura de outras utilidades imprevistas (sinergia). Ou
                         pode suceder que a acção colectiva seja oligárquica: apenas alguns
                         dos beneficiários - e não todos - se associarão para conseguir o
                         efeito social pretendido. Neste caso, o custo individual será
                         superior -- mas o benefício de cada um pode ainda ser maior do que
                         se não se empreendesse a iniciativa.

                         IV. A acção colectiva mais elaborada e a acção pública - a que e
                         empreendida por entidades públicas: entidades dotadas de poder de
                         autoridade, obrigadas a prossecução de fins gerais da colectividade
                         e representativas dos seus membros, com base institucional que não
                         e necessariamente a da voluntariedade de associação (embora possa
                         'sê-lo em associações publicas livres). Este conjunto de actividades
                         que constitui o cerne da economia pública (em sentido amplo,
                         abrangendo as actividades de ordenação, intervenção ou actuação
                         económica publica); ou, em sentido restrito, abrangendo apenas
                         esta ultima (ou tão-só o seu lado de obtenção de recursos - finanças
                         públicas estrito senso -, ou a sua expressão monetário-financial-
                         finanças publicas em sentido institucional).

                         A natureza das formas não publica de acção colectiva e diversa da
                         das formas públicas. Nas primeiras, o indivíduo põe abandonar o
                         grupo; nas segundas só pode deixa-lo se fizer sacrifícios pessoais
                         muito onerosos (deixa de ser sócio de um clube escrevendo uma
                         carta: mas só cessa de ser munícipe se deixar de residir no território
                         do concelho). Nas primeiras, o indivíduo participa na elaboração do
                         estatuto e tem acesso directo aos órgãos; nas segundas, aceita uma
                         constituição preestabelecida e põe não ter controlo dos órgãos
                         (autocracia), ou tem-no só de forma indirecta (democracia
                         indirecta). Nas primeiras não existe em princípio (com muitas
                         restrições históricas e actuais) o uso potencial da coacção para
                         impor as decisões tomadas e o cumprimento das normas (embora
                         possam existir sanções privadas judicialmente executórias); nas
                         segundas, todo o comportamento social é marcado pela
                         possibilidade de recurso a coacção para impor as decisões por via
                         de autoridade.

                         Podem a este respeito fazer-se várias perguntas. Porque são certas
                         actividades prosseguidas pela acção colectiva privada e outras pela
                         acção colectiva pública? Como se decide sobre a quantidade do



20
FINANÇAS PÚBLICAS


bem colectivo público a produzir e sobre a quantidade de recursos a
afectar-lhe? Como distribuir os custos da provisão de bens
colectivos entre os membros da colectividade? Como são tomadas
as decisões colectivas, a partir das preferências individuais? Como
são distribuídos os benefícios e os custos? Estes os problemas-
chave da decisão financeira - que estudaremos, primeiro, quanto ao
conteúdo, e depois na forma e nos órgãos.



A OPTIMIZAÇÃO              SOCIAL       E    SEUS     CRITÉRIOS
TEÓRICOS

a) Critérios gerais

I. Porque e que há necessidades que são satisfeitas pela
comodidade (ou pelo Estado), ao passo que outras o são pelas
pessoas e pelos grupos?

O problema central da economia pública prende-se com os critérios
de satisfação das necessidades dos indivíduos e da comunidade.
Numa economia baseada no principio da liberdade de
comportamentos descentralizados, que princípios e critérios
determinam ai as necessidades que são satisfeitas pelos indivíduos
e pela colectividade? Fundamentalmente, o mercado. Nele as
pessoas confrontam entre si as respectivas possibilidades e
necessidades: oferecem aquilo de que dispõem, procuram aquilo de
que necessitam e confrontam o valor relativo através da licitação
em público, mediante critérios que resultam na formação de
equilíbrios de mercado (preços e quantidades), de equilíbrios
internos do consumidor e do produtor, em relação a certos tipos de
bens, bem como nos equilíbrios por sectores ou da economia em
geral (equilíbrios parciais, equilíbrio económico geral).

Num sistema de economia de mercado a existência de bens
produzidos fora do mercado resulta daquilo a que pode chamar-se
incapacidade ou falha do mercado (market failure). Trata-se dos
bens que, ou não são produzidos, ou para o serem em condições
eficientes necessitam de uma actuação não movida pela lógica do
mercado.

II. O Estudo teórico dos critérios de provisão pública de bens parte,
como toda a teoria, de um certo número de pressupostos de base:

(a) Que nos encontramos numa sociedade politicamente organizada
- isto e, na qual existe o Estado (ou outras entidades dotadas de
poder politico);

(b) Que essa sociedade e constituída por indivíduos e grupos cujos
padrões culturais são essencialmente competitivos (isto e, livres e



                                                                21
22   UNIDADE I – FENÓMENO FINANCEIRO (FACTOS E NORMAS)


                         rivais, buscando a satisfação individual e a eficiência), e não
                         cooperativos, comunitários, solidários ou de outros tipos;

                         (c) Que, por isso, a atitude fundamental do Estado em relação a
                         provisão de bens disponíveis será passiva e não activa;

                         (isto e, tratar-se-á de uma sociedade e uma economia
                         descentralizada, cujas normas e instituições hão-de garantir a
                         apropriação privada dos bens, a liberdade individual e as decisões
                         descentralizadas (ao invés dos sistemas totalmente centralizados,
                         em que toda a actividade seria - ou tenderia a ser - pública,
                         integrando-se no publico o social, e no social o pessoal);

                         (d) Que nessa sociedade a afectação dos recursos se faz através dos
                         mercados livres - tendencialmente em concorrência pura e perfeita,
                         ou com formas de concorrência limitada -, e ainda que o mercado
                         assegura a melhor satisfação possível dos consumidores (equilíbrio
                         óptimo do produtor).

                         A melhor afectação dos recursos materiais raros susceptíveis de
                         aplicações alternativas (bens económicos, incluindo coisas,
                         realidades imateriais apropriáveis e serviços) resultará da liberdade
                         de motivações dos agentes e do confronto livre dos seus interesses
                         em mercado. Pressupõe-se ainda que os preços se fixem em níveis
                         tais que o ajustamento da oferta a procura e feito automaticamente
                         em cada momenta para todos os mercados, e que os agentes
                         económicos oferecem os factores de produção (trabalho, recursos
                         naturais, capital, factores imateriais) e obtêm assim um rendimento
                         aplicável no consumo dos bens finais produzidos ou na aquisição
                         de factores para novas produções futuras. Admitindo as leis
                         técnicas da produção, uma dada estrutura de repartição dos recursos
                         entre as pessoas e padrões de comportamento moderadamente,
                         egoístas e racionais, e possível demonstrar que do funcionamento
                         dos mercados resulta um conjunto de afectações de recursos - a
                         produção e ao consumo pelo menos tão satisfatório para todos (se
                         não mais) como qualquer outro conjunto de aplicações. Isto e,
                         demonstra-se que o mercado tende a optimizar a afectação dos
                         recursos - ou, o que e o mesmo, realiza a satisfação geral de todos e
                         cada um, com o melhor nível possível de utilidade, nas condições e
                         com os bens disponíveis (I).

                         III. Poderá dizer-se que esta teorização só e aplicável as economias
                         de mercado: mas não se esqueça que, se estas condições de algum
                         modo sintetizam a essência de capitalismo, delas também fluem as
                         regras do planeamento e a lógica colectiva de um socialismo
                         hedonista, inteiramente racional e industrial (I): o essencial da
                         teoria e mais a sociedade hedonista do que o capitalismo. A sua
                         estrutura pressupõe um sistema de economia de mercado - que não
                         pode confundir-se com um qualquer sistema livre, em que o Estado
                         se limita a mera garantia da ordem social e). Ora, este sistema tem,
                         como se sabe, diversas limitações:


22
FINANÇAS PÚBLICAS


(a) Desigualdade na distribuição da riqueza;

(b) instabilidade no conjunto de economia e em sectores
específicos;

(c) custo crescente dos serviços públicos;

(d) situações monopolísticas abundantes e crescentes;

(e) actividades económicas que por reflexo beneficiam ou
prejudicam outras (exterioridades: «externalidades»);

(f) provisão inadequada (insuficiente ou incorrecta) de bens
públicos (nomeadamente colectivos);

(g) ma distribuição dos recursos entre presente e futuro (3).

A afectação de recursos neste sistema e dominada pelo principio de
que os sujeitos não produzem nem obtêm por troca bens cujo custo
de produção (desutilidade da sua obtenção) seja superior a utilidade
que auferem. É possível demonstrar que a mais eficiente afectação
de recursos e, como regra, a que tendencialmente se situa no ponto
de igualdade entre o preço de cada bem e o seu custo marginal. A
fixação de preços afastados deste nível terá como consequência
que, se o preço for inferior ao custo marginal, isso maximizara o
benefício do consumidor - mas a consequência e que a procura
aumentará e fará subir os preços. Ao invés, se o preto for superior
ao custo marginal, isso tendera a maximizar o benefício do
produtor - mas a procura diminuirá e, sendo a oferta excessiva, o
preto tendera a descer. Esta simples regra que explica o
ajustamento das quantidades e dos valores, definindo o equilíbrio
do produtor, o do consumidor e os dos mercados dos vários bens, e
dai o equilíbrio económico geral5

b) A economia de bem-estar

1. A esta luz, a economia de bem-estar (com seus pressupostos de
individualismo, racionalismo e hedonismo) fornece a melhor base
de analise das situações em que o mercado não e capaz de
satisfazer o melhor possível os interesses de todos os membros de
uma comunidade. Ela explica teoricamente as regras para a



5
    O quadro teórico do raciocínio e o da economia neoclássica,
como se recordara do estudo da Economia; ele constitui 0 melhor
quadro de racionalidade nos sistemas de economia de mercado: cf.
O nosso artigo Neoclássica (escola), em Polis - Enciclopédia
Verbo da Sociedade e do Estado, vol. IV, S.V., 1986.




                                                                23
24   UNIDADE I – FENÓMENO FINANCEIRO (FACTOS E NORMAS)


                         formulação de juízos de valor (que nunca podem derivar
                         directamente e apenas de juízos de realidade: regra de Hume) sobre
                         situações globais e finais de economia. Não se trata de dizer que «e
                         melhor aumentar os impostos, porque...», ou que «estas despesas
                         deve subir, senão...»; trata-se de dizer que uma certa situação
                         global, para a colectividade ou para os seus membros - numa
                         concepção de equilíbrio que não e mecanicista nem moralista
                         (Rawls 6chamou-lhe de equilíbrio reflexivo e) - e, segundo critérios
                         de bem-estar, melhor do que aquela outra situação. Nesse sentido,
                         ao integrar fins, estas teorias chamar-se-ão normativas (ou melhor:
                         teleológicas), em contraste com as meras análises descritivas,
                         explicativas ou de «economia positiva».

                         II. A. C. PIGOU 7aplicou critérios de bem-estar ao estudo da
                         distribuição de recursos entre sector publico e sector privado -
                         como entre os sujeitos da economia em geral, partindo do principio
                         de que cada individuo recebe utilidades da utilização (consumo)
                         dos bens público, e que o pagamento de impostos para financiar
                         esses

                         Esses bens e uma desutilidade para os indivíduos (pois e medido,
                         em tem os de «custo de oportunidade», pelo consumo privado que
                         ele e obrigado a sacrificar para pagar o imposto). Para cada pessoa,
                         o ponto óptimo de oferta de bens públicos é o ponto em que a
                         utilidade marginal dos bens públicos e igual a hostilidade marginal
                         do imposto: se pagasse mais impostos, a sua utilidade marginal
                         implicava mais sacrifício de que o beneficio obtido dos bens
                         públicos; se pagasse menos impostos, então a utilidade do último
                         bem privado corresponderia a desutilidade marginal do bem
                         público que obtinha. Este princípio, aplicado - a todos os
                         indivíduos, regera a afectação óptima dos recursos individuais entre
                         bens privados e públicos: até ao equilíbrio imposto-bem público, há
                         interesse em pagar mais impostos; depois, em receber menos bens
                         públicos e não pagar mais impostos...

                         Esta concepção tem limitações. Toma a utilidade em termos
                         cardinais e não apenas ordinais. Admite que as apreciações
                         subjectivas são comparáveis. Não fornece nenhum mecanismo de
                         agregação dos óptimos individuais para determinar um óptimo
                         social. Ora, se a sociedade for tratada como se tratasse de um
                         indivíduo, a igualdade entre a utilidade social do total dos bens
                         públicos e, a desutilidade social de todos os impostos será o ponto
                         da sua maior utilidade social - mas pode ou não coincidir com o


                         6
                             J. RAWLS, A theory of Justice, 1971, § 4.
                         7
                           A. C. PIGOU, The economy of welfare (antes com o titulo Wealth
                         and Welfare), J.a ed., 1912; 4." ed., 1940; A study inpublicjinance,
                         I." ed., 1928; 3." ed., 1930.


24
FINANÇAS PÚBLICAS


ponto de maior utilidade (igualdade marginal individual) de cada
indivíduo. Pode haver equilíbrio na sociedade sem que haja
necessariamente equilíbrio individual.

Então, para PIGOU, a distribuição do sacrifício entre os indivíduos
assentaria em duas ideias: o máximo de bem-estar social resultaria
da igualdade entre todos, porque só então seriam iguais todas as
satisfações marginais de todos os indivíduos; mas tal igualdade não
pode existir, pois colocaria em risco a liberdade e tornaria
impossível a manutenção de níveis elevados de poupança, que são
essenciais para prolongar o bem-estar económico pelo crescimento
e pela estabilização das flutuações económicas e). A distribuição da
carga fiscal deve basear-se nos princípios de que os desiguais
devem ser tratados desigualmente e que a redução das
desigualdades aumenta o bem-estar geral: dai que o sacrifício fiscal
deva ser repartido de acordo com a capacidade de cada um para
pagar e que as despesas devam ser usadas pelo estado para
redistribuir o bem-estar de forma mais igualitária.

III. PIGOU forneceu as bases para a tentativa, algo ambiciosa, de
tentar definir os critérios de um óptimo social (máximo de bem-
estar social), precisando em que condições e que da perda de
utilidades para alguns membros da sociedade resultava uma
melhoria de bem-estar social do conjunto. Menos ambiciosamente,
iria construir-se (a partir da pesquisa de V. PARETO) uma
explicação para a mera definição de critérios de melhoria do bem-
estar (eficiência económica) em relação a situações anteriores,
como efeito de decisões económicas pontuais (óptimo relativo ou
óptimo de Pareto).

A definição de critérios de eficiência, analisando as situações da
economia a luz dos critérios de bem-estar, e o campo próprio da
economia de bem-estar. Para os clássicos, o bem-estar comum era a
mera soma das utilidades individuais: quanto maiores estas fossem,
maior seria o bem-estar. Na falta de um critério de medição comum
das utilidades e desutilidades ou de comparação intersubjectiva das
satisfações - inevitável escolho das concepções subjectivistas da
economia, V. PARETO8 e E. BARONE e) formularam uma



8
 Pela ordenação do bem-estar social Bergson-Samuelson. Cf. em
geral: PARETO, Manual d'Economie Politique, ·I909; A.
BERGSON, «A reformulation of certain aspects of welfare
economics», em Quarterly Journal of Economics, vol. 66 (1938),
pp. 366--384; P. SAMUELSON, Foundations of economic analysis,
1947, «Reaffirming the existence of «reasonable» Bergson-
Samuelson social welfare funcctionsf>, em Economic Journal,
1960, pp. 197-265; R. SUGDEN, The political economy of public
choice, 1981, cap. 3.


                                                               25
26   UNIDADE I – FENÓMENO FINANCEIRO (FACTOS E NORMAS)


                         concepção de bem-estar relativo, segundo a qual, numa situação
                         dada, a determinação do bem-estar assentaria nos seguintes
                         pressupostos:

                         - Cada pessoa é o melhor juiz possível do seu próprio bem-estar;

                         - O bem-estar social (Ug) e função apenas do bem-estar de cada um
                         dos membros da sociedade: Ug = f (U1,U2, U3)... Un);

                         - Se o bem-estar de uma pessoa (i) É melhor na situação x do que
                         na situação y, e se o bem-estar de todos os outros não é menor em
                         nenhuma das duas, então 0 bem-estar social e maior na situação x
                         do que na y.

                         Generalizando este critério, pode dizer-se que e «Pareto-efficient» -
                         relativamente eficiente em termos paretianos - qualquer melhoria
                         de bem-estar que não afecte a situação dos restantes membros da
                         sociedade; uma situação (que correctamente não pode dizer-se
                         «óptima») e eficiente quando não for possível/ nenhuma melhoria
                         na situação de qualquer dos membros sem prejudicar os restantes
                         C).

                         IV. As melhorias de bem-estar paretianas baseiam-se em dois
                         teoremas fundamentais, que enunciaremos apenas:

                         1.0 – Se: a) as famílias e empresas actuarem de forma
                         perfeitamente competitiva, tomando os preços como dados; b)
                         houver um conjunto completo de mercados; c) houver perfeita
                         informação: então um equilíbrio competitivo será eficiente em
                         termos paretianos.

                         2.° - Se: a) as famílias e as curvas de indiferença; a dos
                         consumidores e das empresas forem normais (convexas); b) houver
                         um conjunto completo de mercados; c) houver perfeita informação;
                         d) os impostos de soma fixa (isto e, aqueles que não podem sofrer
                         qualquer influencia do comportamento dos contribuintes) e as
                         transferências forem realizadas sem custos: então, qualquer
                         afectação de recursos os eficiente em termos paretianos pode ser
                         realizada em equilíbrio competitivo, com impostos e transferências
                         adequadas e).

                         Nestes termos, uma melhoria paretiana e qualquer transformação
                         que me/hora o bem-estar de pelo menos um individuo sem diminuir
                         o dos demais; e uma situação é eficiente (óptimo relativo ou óptimo
                         de Pareto) se não forem possível qualquer melhoria em termos
                         paretianos.




26
FINANÇAS PÚBLICAS


0 Estado tem para a teoria neo-clássica uma função própria de
utilidade ou de preferência, da qual pode deduzir-se uma função de
comportamento racional (função de reacção para a teoria dos
jogos); Pareto veio estabelecer que aquela função de preferência
colectiva se baseia exclusivamente nas funções de utilidade
individuais, dando assim uma solução sua ao problema das relações
entre o individual e o colectivo (problema da agregação).

É ainda possível definir as condições necessárias para um óptimo
de Pareto. Tomemos como conceito prévio o de taxa marginal de
substituição de um bem X por um bem Y, que e a quantidade de Y
que um consumidor tem de sacrificar para compensar o ganho de
uma utilidade (unidade marginal) de X, substituindo X por Y, de
modo a manter o mesmo nível de satisfação do conjunto dos dois
bens (o conceito e generalizável a n bens). As condições de Pareto
são: Iº a taxa marginal de um dado par de bens deve ser idêntica
para todos os consumidores que consomem esses bens: 2.° - a taxa
marginal de substituição de um dado par de factores de produção
deve ser a mesma para todos os bens em que esses factores são
empregues; 3." - a taxa marginal de substituição de um dado par de
bens para qualquer consumidor e a mesma que a taxa marginal de
transferência desses dois bens na produção (isto e, a quantidade de
um bem que e necessária para produzir uma unidade marginal de
outro bem). Em concorrência perfeita, estas três condições devem
verificar-se, existindo então um «óptimo de Pareto em 1.0 grau».

Fala-se, designadamente na elaboração da política económica, de
óptimos de segundo grau (second best): quando, por virtude de um
constrangimento, limitação ou dado de politica económica, não e
possível realizar uma das condições de Pareto, então a melhor
posição que pode atingir-se poderá determinar também a violação
de outra ou todas as condições: estas, ainda que possam ser
atingidas, podem deixar então de ser desejáveis9.



9
  Podem distinguir-se diversos critérios de aferição do bem-estar
igualitário (definindo condições mais restritivas, mas em termos
bem diversos das de Pigou), dos quais o mais generalizado e o do
maximin de Rawls, que define o nível óptimo, em cada situação,
pela melhor situação possível para o menos favorecido dos sujeitos
em confronto. Cf. RAWLS, A theory of Justice, 1972; R. NOZICK,
Anarchy, State and Utopia, 1974; J. BUCHANAN, The limits of
liberty, 1975; Para uma critica e mais bibliografia, SUGDEN, The
political economy of public choice, 1981. A teoria do bem-estar e
frequentemente omissa nos cursos de economia professados nas
Faculdades de Direito: por isso se remete a exposição feita em
MFP, I, 1974. Por outro lado, ela também o aspecto processual da
tomada de decisões, desembocando então num terreno próximo da
ciência politica: cf. inira § 4.°, p. 53.


                                                              27
28   UNIDADE I – FENÓMENO FINANCEIRO (FACTOS E NORMAS)


                         V. Com base nas concepções dos paretianos, tem sido possível
                         avançar mais, integrando na definição do bem-estar, em simples
                         termos de eficiência, a determinação das condições de justiça
                         social. Assim, sem abandonar os pressupostos individualistas da
                         analise de Pareto, e possível defender que 0 bem-estar depende, não
                         apenas das preferências reveladas por cada um dos membros da
                         sociedade, mas também da visão que ele tem das condições gerais
                         de bem-estar, em consequência de a posição social das pessoas e
                         dos grupos resultar como que de um novo contrato social, em que
                         as pessoas negoceiam a sua entrada na sociedade em condições de
                         desconhecimento concreto das condições sociais (véu de
                         ignorância: Rawls), mas pressupondo uma certa ordenação da
                         sociedade.

                         Em termos paretianos, e possível dizer que a situação w e melhor
                         do que x, e y melhor do que z; mas não e possível comparar as
                         restantes, o que significa que nenhuma solução e em absoluto a
                         melhor de todas. Admitindo critérios de comparação
                         intersubjectiva, que levam a projectar no bem-estar a concepção
                         que cada um tem da melhor distribuição - entendida esta como a
                         mais igualitária -, e possível então entender que w e melhor do que
                         x, que e melhor do que y, que e melhor do que z. Passa-se então a
                         considerar que não interessa apenas a afectação dos bens, mas
                         também a sua distribuição óptima (logo, igualitária), para medir 0
                         bem-estar C).



                         CAUSAS DE INCAPACIDADE DO MERCADO
                         a) Razão de ordem

                         A esta luz que podem pesquisar-se os casos em que o mercado não
                         e eficiente para criar a optimização em certas áreas. Importa, então,
                         ou prescindir da respectiva utilidade, ou buscar outras formas de
                         produzir os bens em causa. A primeira alternativa tomaria
                         impossível a vida em sociedade; pois renunciaria as normas
                         jurídicas, a defesa, a segurança, a ordem social bens sem os quais
                         todos os outros não poderiam ser produzidos. Antes de ver como
                         podem eles ser oferecidos, vejamos melhor quais as situações mais
                         típicas de incapacidade de mercado e observemos que, muito
                         provavelmente, as categorias mencionadas não se excluem,
                         podendo cumular-se, em algum caso concreto, características de
                         virias delas (').

                         b) Os bens colectivos

                         O primeiro caso é o dos bens colectivos (ou bens «puramente
                         públicos» ou «públicos por natureza»), que são aqueles em que,
                         para um determinado nível de existência ou provisão de bens, a


28
FINANÇAS PÚBLICAS


utilização por uma pessoa não prejudica minimamente a utilização
por qualquer outra: e 0 caso de um farol, da defesa nacional, do
serviço de patrulha costeira, do funcionamento geral dos órgãos de
soberania. Ao invés, os bens individuais - ou «puramente privados»
- se são consumidos por uma pessoa em determinada quantidade,
não podem ser consumidos por outra: o pão que A come não pode
ser comido por B.

Podem enunciar-se assim as características típicas dos bens
colectivos:

1. ° - Prestam, pela sua própria natureza, utilidades indivisíveis e
proporcionam satisfação passiva (independente da procura em
mercado: esta caracteriza a satisfação activa).

2.° - São bens não exclusivos, já que não é possível (em regra; pode
haver, com maior ou menor custo, exclusão ou limitação artificial)
privar alguém da sua utilização.

3. - São bens não emulativos: os utilizadores não entram em
concorrência para conseguir a sua utilização.

Por força deste conjunto de circunstâncias pode afirmar-se que os
bens colectivos nunca serão oferecidos em mercado por um
particular: só serão criados, sustentados e oferecidos por sujeitos
desinteressados e tendencialmente dotados de autoridade, que
definam e imputem as utilidades que eles prestam e possam cobrar
coactivamente o respectivo montante. Na verdade, se não for assim,
quem custeia a provisão do bem não pode impedir que qualquer
outro beneficie dele, e de graça (a «boleia», de «borla»: «free
rider». Só um benemérito ou alguém que possa excluir os outros do
acesso, ou forçar todos a pagar, já que todos podem beneficiar, o
poderão oferecer.

c) Os custos decrescentes e o efeito de monopólio

A produção dos bens é normalmente regida pela lei das proporções
definidas, segundo a qual existe um ponto óptimo nas combinações
de factores produtivos em que o custo de produção por unidade é o
mais baixo possível (exceptuados casos de melhoria por alteração
da própria combinação produtiva ou de melhor técnica e/ ou
produtividade, como as economias de escala). Até ao ponto óptimo,
os custos de produção são normalmente decrescentes: isto é, o
aumento de uma unidade de um factor de produção diminui o
respectivo custo (marginal e médio). Alcançado ele, entra-se na
fase dos custos crescentes, isto é, o custo da unidade marginal - e
portanto o custo médio de cada unidade - vai aumentando com a
adição de novas unidades do factor de produção.

 Existem, todavia, certos tipos de actividades produtivas em que as
coisas se não passam assim. Neles os custos diminuem sempre -


                                                               29
30   UNIDADE I – FENÓMENO FINANCEIRO (FACTOS E NORMAS)


                         uniformemente ou não, consoante a função de produção respectiva
                         -, tornando-se assim mais eficiente ter uma empresa a produzir 100
                         unidades do que 10 empresas produzindo 10 unidades. Assim
                         sendo, o número de empresas no sector tende a diminuir – porque a
                         empresa maior pode sempre oferecer os bens a custo inferiores aos
                         das restantes; as empresas tendem então a possuir um poder de
                         monopólio ou oligopólio, que pode levar a situação de mercado a
                         identificar-se com a própria situação de monopólio (de facto, se
                         resultar simplesmente da falta de acesso das demais; legal, se
                         resultar de obstáculos legais a entrada de outros competidores; ou
                         natural, se resultar de só a empresa que oferece dispor do bem
                         natural ou da tecnologia que condiciona a sua oferta). Havendo
                         vários produtores, as empresas menos eficientes ver-se-ão
                         obrigadas a descer o seu preço ate ao nível da mera cobertura do
                         custo médio de produção (e, a médio prazo, tenderão a retirar-se do
                         mercado por falta de poder competitivo, se o preço descer abaixo
                         do custo médio, ou menor poder financeiro, se as perdas se
                         prolongarem). Então, se houver poucos produtores concertados ou
                         um só produtor - a situação estável final tendera a ser esta -, os
                         preços tenderão a situar-se acima do nível normal do preço em
                         concorrência (a diferença é o que teoricamente se chama «renda do
                         monopolista»); e as empresas farão um sobre-lho, teoricamente
                         apenas limitado pela sua capacidade de produção e pelas condições
                         de elasticidade da procura. Ora, esse nível de produção é
                         ineficiente, no sentido de não corresponder aos critérios de
                         optimização geral da economia (que são definidos pela estrutura
                         concorrencial do mercado), pois limita anormalmente o consumo. E
                         em termos políticos, o prejuízo causado aos consumidores e a
                         posição tendencial de monopólio exprimem essa ineficiência,
                         concretizando-a em situações privadas que se não pautam pelas
                         regras normais do mercado.

                         Estas situações ilustram uma concreta incapacidade do mercado:
                         para restabelecer as regras do óptimo no mercado o Estado deve
                         intervir, ou chamando a si a actividade, para baixar os preços em
                         relação aos de um monopolista privado, ou limitando o preço por
                         intervenção administrativa (fazendo-o baixar tendencialmente ao
                         nível do custo marginal, definidor do equilíbrio em mercado
                         concorrencial)·.

                         d) As exterioridades e a actividade pública

                         A interdependência entre as pessoas em sociedade gera situações
                         difíceis de regular: na verdade, as decisões de um consumidor ou
                         de um produtor reflectem-se por vezes - positiva ou negativamente
                         sobre outras pessoas que com elas nada têm que ver: ora
                         proporcionando-lhes utilidades externas (benefícios resultantes de
                         comportamento alheio), ora impondo-lhes desutilidades externas
                         (custos resultantes de comportamento alheio). Se eu ouvir musica
                         muito alto em casa, tanto posso proporcionar aos vizinhos o



30
FINANÇAS PÚBLICAS


benefício de me ouvirem (se tiverem 0 mesmo gosto que eu...),
como impor-lhes o custo de renunciarem aos bens do silêncio e do
sossego. Os tais efeitos chamam exterioridades (externalidades).10

Estes efeitos externos da interdependência social são bem
diversificados. Eles assumem importância porque não podem
limitar-se a definição dos limites do direito de propriedade e da
liberdade individual, se não forem eles próprios objecto de uma
negociação entre particulares (caso em que se tornam bens
mercantis) e se não houver um processo legal e abstracto de regular
a produção e apropriação de certos efeitos externos (no caso
referido, pode haver direitos pessoais de intimidade a respeitar).
Seria impossível estabelecer uma regulamentação social tão
minuciosa que tentasse disciplinar todas as formas de efeito externo
- ela suprimiria, na prática, a própria liberdade e diversidade
humana.

Vejamos melhor.

Algumas actividades de consumo ou produção podem ter efeitos
positivos (proporcionarem utilidades) sobre pessoas diversas das
que as desenvolvem (benefícios externos); outras podem ter efeitos
negativos (imporem sacrifícios), traduzindo-se então em custos
externos e é claro que tanto podem afectar relações entre dois
agentes sociais - pessoas ou grupos - como podem envolver
múltiplas relações externas. Se a função de utilidade do senhor i for
Ui e se A, B, etc., representarem actividades de produção ou
consumo diversas, haverá uma exterioridade quando:

Ui X f (Ai, Bi, Aj)

Porque a utilidade de independe de actos seus. (Ai, Bi) de actos do
senhor j (Aj).

Estes fenómenos de interdependência, extremamente frequentes,
são fonte de desperdício para o seu produtor e criam bens mistos
(em parte próprios, em parte de utilidade partilhada com outrem,




10
   I) As exterioridades podern ainda ser tecnológicas (quando a
produção ou o consumo de um agente económico se ref1ectem na
produção ou no consumo de outro agente económico) ou
pecuniárias (quando um comportamento influencia os preços e,
por via destes, o bem-estar de outros produtores ou consumidores:
a subida dos preços de uma empresa sobe os custos das outras ou
altera o rendimento real dos consumidores): cf. BROWN e
JACKSON, Public sector economics, cap. 2, por urna sintese.




                                                                31
32   UNIDADE I – FENÓMENO FINANCEIRO (FACTOS E NORMAS)


                         determinado ou indeterminado); assim geram benefícios sociais ou
                         custos sociais.

                         Estes benefícios ou custos apenas redundam num problema de
                         incapacidade do mercado quando não São tornados como objecto
                         de negócio entre particulares, porque as pessoas envolvidas
                         entendem que tal negociação seria excessivamente custosa para os
                         intervenientes: os benefícios que resultariam de formar um
                         mercado não seriam equivalentes aos custos de o formar. Perante
                         esta situação, tanto pode suceder que a comunidade nada decida e
                         os produtores da exterioridade tenham de resignar a vê-la
                         aproveitada por outrem (um espectáculo que é observado de graça
                         pelos vizinhos) como que os seus pacientes tenham de a suportar (o
                         ruído de uma fábrica suportado pelos vizinhos). Ou pode suceder
                         que o Estado ou a comunidade as tentem regular, estabelecendo
                         regras gerais (é o caso das normas de Direito Civil em situações de
                         vizinhança, por exemplo), regulações específicas (intervenção
                         estadual) ou actuações estaduais (tributações do impositor do custo
                         externo ou do beneficiário do proveito externo, despesa
                         compensatória do paciente do custo extremo ou do produtor do
                         beneficio extremo). E porque deve o Estado ou a comunidade
                         intervir? Porque pode suceder que sem a sua intervenção se não
                         realizem as condições do óptimo social: se a fábrica que polui não
                         for tributada, em compensação do custo extremo da deterioração do
                         ambiente que ocasiona a colectividade, produzirá a um nível que
                         não é óptimo (produz demais, porque não contabiliza o custo social
                         da poluição). E assim por diante...

                         A comunidade, ou o Estado, podem pois resolver estas situações de
                         diversas formas: quando o fazem, não pela simples regulação de
                         interesses entre os intervenientes, mas pela socialização da
                         exterioridade (impondo custos compensadores do beneficio
                         apropriado ou apropriando proveitos gerados), então tem cabimento
                         a actividade financeira: financiando a educação de todos, que dá
                         proveitos a sociedade, e não só ao próprio; impondo contribuições
                         à empresa poluidora, que tira benefícios do custo que impõe a
                         comunidade (quem polui, paga). São as exterioridades fortes, que
                         tendem a tomar-se públicas.

                         e) Incerteza e risco na actividade económica

                         Não é apenas nas exterioridades puras que se geram caracteres não
                         mercantis indesejáveis (1). Também em situações de risco e
                         incerteza deparamos com casos deste tipo. Os riscos previsíveis da
                         vida podem ser objecto das transacções mais diversas. Com efeito,
                         quase não há contrato sem uma dose de risco (risco contratual, de
                         crédito, cobertura do risco: seguro), ou em que o risco é elemento
                         essencial (contratos aleatórios) ou importante (especulação
                         financeira). Em todos estes casos, o risco é integrado pelos
                         mecanismos do mercado. Todavia, há casos em que os riscos se



32
FINANÇAS PÚBLICAS


tomam tão elevados, ou tão desproporcionados com as
compensações ou os prémios pagos para segurar o risco, que não
serve o método normal dos comportamentos livres: apesar de haver
na população «arrisca dores» e «generosos do risco»; apesar de os
riscos poderem ser assumidos individual ou colectivamente,
reduzindo assim a probabilidade e o custo da compensação
(fenómenos de mutualidade, por exemplo); apesar de as
companhias de seguros poderem, com base no cálculo da
probabilidade de riscos estatisticamente aferidos, aceitar assumir,
em contrapartida de prémios de seguro, riscos objectivos (isto é,
previsíveis por critérios de cálculo de probabilidades; quer
assumindo os riscos na totalidade, quer partilhando-os com os
segurados, para aumentar a sua atitude de responsabilidade e
prevenção do risco)...

Há casos em que podem acorrer em massa à seguradora pessoas
cujas condições objectivas são tão más que, pela multiplicação dos
riscos, a forçam a elevar os prémios: então, os bons segurados
podem fugir da companhia, assumindo por si os riscos; isto pode
reduzir de tal maneira a procura que a companhia desistirá de
segurar esse risco. É o caso, por exemplo, do seguro de reforma
generalizado. Em outros casos, poderá haver uma incerteza, cuja
probabilidade de verificação não pode ser aleatoriamente prevista:
ela na será coberta pelas empresas seguradoras.

Sucede assim que as incertezas não cobertas pelo mercado; ou que
o mercado apenas cobre por prémios muito elevados os riscos mais
fortes para muitos membros da colectividade, que não podem ou
não querem pagar esses prémios (doença, invalidez, velhice)
cobrindo por prémios baixos os riscos menores. Existe aqui
claramente incapacidade do mercado: e então - para alem das
razoes distributivas e de justiça - a optimização só e possível se for
assumida a cobertura dos riscos por entidades estranhas ao mercado
(pense-se nas pensões de reforma da segurança social: quanto
maior e a necessidade, maior será o preço das seguradoras: e os
mais necessitados, que são os mais pobres, não poderão pagar esse
seguro).

Hipótese análoga poderá ser a de um empreendimento produtivo
socialmente útil, mas tão arriscado que nenhuma empresa ousa
enfrentar a sua elevada incerteza: é esta a razão por que o Estado
assume, só ou em associação, a iniciativa produtiva em muitas
empresas de rendibilidade extremamente aleatórias

f) Outras situações

Podem conceber-se outros tipos de incapacidade do mercado, Um
deles é a incapacidade macroeconómica. O equilíbrio económico
geral não é sempre alcançado pelo simples funcionamento dos
mercados em sociedades concretas; ainda que o fosse, não esta
provado que o equilíbrio económico realize sempre o óptimo


                                                                 33
34   UNIDADE I – FENÓMENO FINANCEIRO (FACTOS E NORMAS)


                         social. Então, a estabilidade (preços estáveis, emprego, equilíbrio
                         externo) resultará, como KEYNES demonstrou, de uma acção
                         sobre os agregados da economia, a qual só é possível através de
                         políticas globais: definem-se então condições para a estabilização
                         dos agregados globais, para a luta contra a desigualdade na
                         distribuição do rendimento, para a qualidade da vida, o
                         desenvolvimento ou a independência nacional (1). E então a
                         incapacidade do mercado - agora em termos globais - que se revela.
                         E a ela responde a política económico-social, produtora, ela própria
                         de exterioridades (comportamentos obrigatórios em beneficio
                         alheio) e de bens colectivos (alterações benéficas para todos na
                         estrutura e na conjuntura económica) como resultado da acção do
                         Estado. Um caso típico é o das políticas de redistribuição, que
                         visam objectivos inalcançáveis pelo mercado.

                         De natureza semelhante, mas com sentido e instrumentos opostos, e
                         a intervenção nas situações de doença ou morte dos requisitos
                         constitutivos do próprio mercado, que também determinam a sua
                         incapacidade, mas de formas que normalmente podem resolver-se
                         por acções de reposição dos condições de mercado. O caso das
                         coligações entre empresas para prejudicarem os consumidores, cuja
                         inclusão na incapacidade de mercado (como causa de poder
                         monopolista, em sentido amplo) tem dado origem a interessantes
                         aprofundamentos; ou da insuficiente informação dos consumidores,
                         por exemplo. Então, as deficiências do funcionamento do mercado
                         suscitam acções do Estado tendentes a recriar condições normais de
                         mercado, as quais tanto podem consistir em intervenções sobre o
                         comportamento dos sujeitos individuais (defesa da concorrência,
                         v.g.) como na sua actividade económica própria (finanças
                         públicas).



                         A PROVISÃO PÚBLICA DE BENS
                         a) Formas de suprir as incapacidades do mercado

                         1. As incapacidades do mercado obrigam pois, para haver níveis
                         aceitáveis de bem-estar social, a actuações correctivas e supletivas
                         de sujeitos económicos não dominados pela lógica do mercado.
                         Tomemos, por exemplo, o caso do farol, bem colectivo que nunca
                         poderá ser produzido para mercado (pondo agora de lado as
                         situações, menos claras, em que há «bens públicos impuros», cujo
                         uso não é necessariamente colectivo, porque a exclusão se torna
                         possível e a consequente imputação individual das satisfações
                         também: auto-estradas com portagem). A sua criação e
                         funcionamento é incompatível com as regras do mercado e, no
                         entanto, a necessidade do farol é sentida por todos os que fazem
                         navegação costeira. As utilidades que ele presta não podem ser
                         imputadas a um deterrninado sujeito económico que possa como tal


34
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro
Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro

Contenu connexe

Tendances

Financas publicas tr
Financas publicas trFinancas publicas tr
Financas publicas trEdna1977
 
DESPESA PUBLICA EM MOCAMBIQUE
DESPESA PUBLICA EM MOCAMBIQUEDESPESA PUBLICA EM MOCAMBIQUE
DESPESA PUBLICA EM MOCAMBIQUEFaudo Mussa
 
Lições de Finanças Públicas 2012/13 Prof. Doutor Rui Teixeira Santos
Lições de Finanças Públicas 2012/13 Prof. Doutor Rui Teixeira SantosLições de Finanças Públicas 2012/13 Prof. Doutor Rui Teixeira Santos
Lições de Finanças Públicas 2012/13 Prof. Doutor Rui Teixeira SantosA. Rui Teixeira Santos
 
Direito TributáRio E Sistema Fiscal Angolano
Direito TributáRio E Sistema Fiscal AngolanoDireito TributáRio E Sistema Fiscal Angolano
Direito TributáRio E Sistema Fiscal AngolanoNgouabi Salvador
 
Aulas De FinançAs PúBlicas I,Ii E Iii Capitulos
Aulas De FinançAs PúBlicas I,Ii E Iii CapitulosAulas De FinançAs PúBlicas I,Ii E Iii Capitulos
Aulas De FinançAs PúBlicas I,Ii E Iii CapitulosNgouabi Salvador
 
Economia aula 4 - introdução à macroeconomia
Economia   aula 4 - introdução à macroeconomiaEconomia   aula 4 - introdução à macroeconomia
Economia aula 4 - introdução à macroeconomiaFelipe Leo
 
Curso de Direito Financeiro e de Finanças Públicas para a Licenciatura da Dir...
Curso de Direito Financeiro e de Finanças Públicas para a Licenciatura da Dir...Curso de Direito Financeiro e de Finanças Públicas para a Licenciatura da Dir...
Curso de Direito Financeiro e de Finanças Públicas para a Licenciatura da Dir...A. Rui Teixeira Santos
 
Privatização das funções do Estado (Universidade de Coimbra 2013) Professor...
Privatização das funções do Estado   (Universidade de Coimbra 2013) Professor...Privatização das funções do Estado   (Universidade de Coimbra 2013) Professor...
Privatização das funções do Estado (Universidade de Coimbra 2013) Professor...A. Rui Teixeira Santos
 
Economia e Finanças Publicas. Qual o papel do Estado? Conferencia na AJPD do ...
Economia e Finanças Publicas. Qual o papel do Estado? Conferencia na AJPD do ...Economia e Finanças Publicas. Qual o papel do Estado? Conferencia na AJPD do ...
Economia e Finanças Publicas. Qual o papel do Estado? Conferencia na AJPD do ...A. Rui Teixeira Santos
 
Conceitos de receita públicas.
Conceitos de receita públicas.Conceitos de receita públicas.
Conceitos de receita públicas.Juliano Almeida
 
Curso de Finanças Publicas de Angola, Prof. Doutor Rui Teixeira Santos (ISCAD...
Curso de Finanças Publicas de Angola, Prof. Doutor Rui Teixeira Santos (ISCAD...Curso de Finanças Publicas de Angola, Prof. Doutor Rui Teixeira Santos (ISCAD...
Curso de Finanças Publicas de Angola, Prof. Doutor Rui Teixeira Santos (ISCAD...A. Rui Teixeira Santos
 
Sebenta contabilidade analitica i 2014 2015 (1)
Sebenta contabilidade analitica i  2014 2015 (1)Sebenta contabilidade analitica i  2014 2015 (1)
Sebenta contabilidade analitica i 2014 2015 (1)Brígida Oliveira
 
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO, APONTAMENTOS DAS AULAS DO PROF. DOUTOR RUI T...
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO, APONTAMENTOS DAS AULAS DO PROF. DOUTOR RUI T...INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO, APONTAMENTOS DAS AULAS DO PROF. DOUTOR RUI T...
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO, APONTAMENTOS DAS AULAS DO PROF. DOUTOR RUI T...A. Rui Teixeira Santos
 

Tendances (20)

Sistema fiscal em mocambique
Sistema fiscal em mocambiqueSistema fiscal em mocambique
Sistema fiscal em mocambique
 
Financas publicas tr
Financas publicas trFinancas publicas tr
Financas publicas tr
 
DESPESA PUBLICA EM MOCAMBIQUE
DESPESA PUBLICA EM MOCAMBIQUEDESPESA PUBLICA EM MOCAMBIQUE
DESPESA PUBLICA EM MOCAMBIQUE
 
Lições de Finanças Públicas 2012/13 Prof. Doutor Rui Teixeira Santos
Lições de Finanças Públicas 2012/13 Prof. Doutor Rui Teixeira SantosLições de Finanças Públicas 2012/13 Prof. Doutor Rui Teixeira Santos
Lições de Finanças Públicas 2012/13 Prof. Doutor Rui Teixeira Santos
 
Sistema financeiro Moçambicano
Sistema financeiro MoçambicanoSistema financeiro Moçambicano
Sistema financeiro Moçambicano
 
Direito TributáRio E Sistema Fiscal Angolano
Direito TributáRio E Sistema Fiscal AngolanoDireito TributáRio E Sistema Fiscal Angolano
Direito TributáRio E Sistema Fiscal Angolano
 
Aulas De FinançAs PúBlicas I,Ii E Iii Capitulos
Aulas De FinançAs PúBlicas I,Ii E Iii CapitulosAulas De FinançAs PúBlicas I,Ii E Iii Capitulos
Aulas De FinançAs PúBlicas I,Ii E Iii Capitulos
 
Apresentação direito fiscal
Apresentação direito fiscalApresentação direito fiscal
Apresentação direito fiscal
 
Economia aula 4 - introdução à macroeconomia
Economia   aula 4 - introdução à macroeconomiaEconomia   aula 4 - introdução à macroeconomia
Economia aula 4 - introdução à macroeconomia
 
Curso de Direito Financeiro e de Finanças Públicas para a Licenciatura da Dir...
Curso de Direito Financeiro e de Finanças Públicas para a Licenciatura da Dir...Curso de Direito Financeiro e de Finanças Públicas para a Licenciatura da Dir...
Curso de Direito Financeiro e de Finanças Públicas para a Licenciatura da Dir...
 
Privatização das funções do Estado (Universidade de Coimbra 2013) Professor...
Privatização das funções do Estado   (Universidade de Coimbra 2013) Professor...Privatização das funções do Estado   (Universidade de Coimbra 2013) Professor...
Privatização das funções do Estado (Universidade de Coimbra 2013) Professor...
 
Economia e Finanças Publicas. Qual o papel do Estado? Conferencia na AJPD do ...
Economia e Finanças Publicas. Qual o papel do Estado? Conferencia na AJPD do ...Economia e Finanças Publicas. Qual o papel do Estado? Conferencia na AJPD do ...
Economia e Finanças Publicas. Qual o papel do Estado? Conferencia na AJPD do ...
 
Pgc nirf
Pgc   nirfPgc   nirf
Pgc nirf
 
Conceitos de receita públicas.
Conceitos de receita públicas.Conceitos de receita públicas.
Conceitos de receita públicas.
 
PGC - NIRF
PGC - NIRFPGC - NIRF
PGC - NIRF
 
Curso de Finanças Publicas de Angola, Prof. Doutor Rui Teixeira Santos (ISCAD...
Curso de Finanças Publicas de Angola, Prof. Doutor Rui Teixeira Santos (ISCAD...Curso de Finanças Publicas de Angola, Prof. Doutor Rui Teixeira Santos (ISCAD...
Curso de Finanças Publicas de Angola, Prof. Doutor Rui Teixeira Santos (ISCAD...
 
Sebenta contabilidade analitica i 2014 2015 (1)
Sebenta contabilidade analitica i  2014 2015 (1)Sebenta contabilidade analitica i  2014 2015 (1)
Sebenta contabilidade analitica i 2014 2015 (1)
 
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO, APONTAMENTOS DAS AULAS DO PROF. DOUTOR RUI T...
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO, APONTAMENTOS DAS AULAS DO PROF. DOUTOR RUI T...INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO, APONTAMENTOS DAS AULAS DO PROF. DOUTOR RUI T...
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO, APONTAMENTOS DAS AULAS DO PROF. DOUTOR RUI T...
 
IRPS
IRPSIRPS
IRPS
 
RECEITAS CREDITÍCIAS
RECEITAS CREDITÍCIASRECEITAS CREDITÍCIAS
RECEITAS CREDITÍCIAS
 

Similaire à Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro

manual de apoio à pratica
manual de apoio à praticamanual de apoio à pratica
manual de apoio à praticaperpetuaparreira
 
Manual de Apoio à Prática
Manual de Apoio à PráticaManual de Apoio à Prática
Manual de Apoio à Práticaperpetuaparreira
 
Manual apoio
Manual apoioManual apoio
Manual apoiodaegrupo1
 
I006141 economia cursosprofissionais
I006141 economia cursosprofissionaisI006141 economia cursosprofissionais
I006141 economia cursosprofissionaisPaulinha Linha
 
O sistema financeiro na empresa moçambicana de seguros (emose) da matola
O sistema financeiro na empresa moçambicana de seguros (emose) da matolaO sistema financeiro na empresa moçambicana de seguros (emose) da matola
O sistema financeiro na empresa moçambicana de seguros (emose) da matolaUniversidade Pedagogica
 
EAD Pernambuco - Técnico em administração - Matemática financeira
EAD Pernambuco  - Técnico em administração - Matemática financeiraEAD Pernambuco  - Técnico em administração - Matemática financeira
EAD Pernambuco - Técnico em administração - Matemática financeiraUniversidade de Pernambuco
 
Livro introducao a economia florence
Livro introducao a economia florenceLivro introducao a economia florence
Livro introducao a economia florenceivanildanolasco1
 
contabilidade de instituições financeiras. Contabilidade
contabilidade de instituições financeiras. Contabilidadecontabilidade de instituições financeiras. Contabilidade
contabilidade de instituições financeiras. ContabilidadeMarcia Silva
 
Curso Sistema Financeiro Nacional p/ Concurso BRDE
Curso Sistema Financeiro Nacional p/ Concurso BRDECurso Sistema Financeiro Nacional p/ Concurso BRDE
Curso Sistema Financeiro Nacional p/ Concurso BRDEEstratégia Concursos
 
160523 enap didáticos gestão de convênios para concedentes
160523 enap didáticos   gestão de convênios para concedentes160523 enap didáticos   gestão de convênios para concedentes
160523 enap didáticos gestão de convênios para concedentesJosé Fagundes
 
Física. PROGRAMA-da decima classe de fisica.pdf
Física. PROGRAMA-da decima classe de fisica.pdfFísica. PROGRAMA-da decima classe de fisica.pdf
Física. PROGRAMA-da decima classe de fisica.pdfFernandoChiringo
 
Arte gestao financeira_cooperativa
Arte gestao financeira_cooperativaArte gestao financeira_cooperativa
Arte gestao financeira_cooperativaLaisa Campos
 

Similaire à Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro (20)

Unid 1
Unid 1Unid 1
Unid 1
 
2015_dis_dssgonçalves.pdf
2015_dis_dssgonçalves.pdf2015_dis_dssgonçalves.pdf
2015_dis_dssgonçalves.pdf
 
Manual Apoio NEE
Manual Apoio NEE Manual Apoio NEE
Manual Apoio NEE
 
Manual apoio
Manual apoioManual apoio
Manual apoio
 
Publ manual apoio_pratica
Publ manual apoio_praticaPubl manual apoio_pratica
Publ manual apoio_pratica
 
Manual
ManualManual
Manual
 
manual de apoio à pratica
manual de apoio à praticamanual de apoio à pratica
manual de apoio à pratica
 
Manual de Apoio à Prática
Manual de Apoio à PráticaManual de Apoio à Prática
Manual de Apoio à Prática
 
Manual apoio
Manual apoioManual apoio
Manual apoio
 
Manual apoio
Manual apoioManual apoio
Manual apoio
 
I006141 economia cursosprofissionais
I006141 economia cursosprofissionaisI006141 economia cursosprofissionais
I006141 economia cursosprofissionais
 
O sistema financeiro na empresa moçambicana de seguros (emose) da matola
O sistema financeiro na empresa moçambicana de seguros (emose) da matolaO sistema financeiro na empresa moçambicana de seguros (emose) da matola
O sistema financeiro na empresa moçambicana de seguros (emose) da matola
 
EAD Pernambuco - Técnico em administração - Matemática financeira
EAD Pernambuco  - Técnico em administração - Matemática financeiraEAD Pernambuco  - Técnico em administração - Matemática financeira
EAD Pernambuco - Técnico em administração - Matemática financeira
 
Livro introducao a economia florence
Livro introducao a economia florenceLivro introducao a economia florence
Livro introducao a economia florence
 
contabilidade de instituições financeiras. Contabilidade
contabilidade de instituições financeiras. Contabilidadecontabilidade de instituições financeiras. Contabilidade
contabilidade de instituições financeiras. Contabilidade
 
Curso Sistema Financeiro Nacional p/ Concurso BRDE
Curso Sistema Financeiro Nacional p/ Concurso BRDECurso Sistema Financeiro Nacional p/ Concurso BRDE
Curso Sistema Financeiro Nacional p/ Concurso BRDE
 
160523 enap didáticos gestão de convênios para concedentes
160523 enap didáticos   gestão de convênios para concedentes160523 enap didáticos   gestão de convênios para concedentes
160523 enap didáticos gestão de convênios para concedentes
 
Física. PROGRAMA-da decima classe de fisica.pdf
Física. PROGRAMA-da decima classe de fisica.pdfFísica. PROGRAMA-da decima classe de fisica.pdf
Física. PROGRAMA-da decima classe de fisica.pdf
 
Arte gestao financeira_cooperativa
Arte gestao financeira_cooperativaArte gestao financeira_cooperativa
Arte gestao financeira_cooperativa
 
Tcc
Tcc Tcc
Tcc
 

Finanças Públicas: O Fenômeno Financeiro

  • 1. 1.º Ano - II Semestre FINANÇAS PÚBLICAS Unidade I O FENÓMENO FINANCEIRO Instituto Superior Monitor Fevereiro 2010
  • 2.
  • 3. Copyright Este manual é propriedade do Instituto Superior Monitor (ISM), sendo que todos os direitos para o seu uso, por estudantes e docentes, lhe estão reservados. É proibido fazer cópias ou usar este material sem autorização prévia do ISM. Instituto Superior Monitor Avenida Guerra Popular No. 1148 1o Andar Maputo Moçambique Tel. 21 300436 Cel. 82 3055795/84 7696894 Fax: +258 21 323432 E-mail: monitor.ism@gmail.com Website: www.monitor.co.mz
  • 4.
  • 5. FINANÇAS PÚBLICAS Índice ACERCA DESTA UNIDADE I 3 ESTRUTURA DA UNIDADE I....................................................................................... 3 RESULTADOS DE APRENDIZAGEM.......................................................................... 5 DURAÇÃO ....................................................................................................................... 5 TÉCNICAS DE ESTUDO ................................................................................................ 5 PRECISA DE AJUDA? .................................................................................................... 7 TRABALHOS .................................................................................................................. 7 AVALIAÇÕES ................................................................................................................. 7 UNIDADE I – FENÓMENO FINANCEIRO (FACTOS E NORMAS) 9 CAPÍTULO I - CONCEITO DE FINANÇAS PÚBLICAS ............................................. 9 OBJECTIVOS ......................................................................................................... 9 FINANÇAS PÚBLICAS E FINANÇAS PRIVADAS ........................................... 9 ACEPÇOES DE «FINANÇAS PÚBLICAS» ....................................................... 10 O FENÓMENO FINANCEIRO ............................................................................ 11 A ECONOMIA DO FENOMENO FINANCEIRO (ECONOMIA PRIVADA, SOCIAL E PÚBLICA) .......................................................................................... 11 A ACTIVIDADE FINANCEIRA ......................................................................... 18 A OPTIMIZAÇÃO SOCIAL E SEUS CRITÉRIOS TEÓRICOS ........................ 21 CAUSAS DE INCAPACIDADE DO MERCADO .............................................. 28 A PROVISÃO PÚBLICA DE BENS ................................................................... 34 A ACTIVIDADE FINANCEIRA E SEUS CRITERIOS FINALISTAS ............. 41 EXERCÍCIOS PRÁTICOS I ................................................................................. 44 CORRECÇÃO DE EXERCÍCIOS ........................................................................ 45 CAPÍTULO II - FINANÇAS, DOUTRINAS E SISTEMAS ECONÓMICOS ............. 46 2. 0 SISTEMA CAPITALISTA ............................................................................ 49 3. OS REGIMES ECONÓMICOS E AS DOUTRINAS ...................................... 50 4. O LIBERALISMO E AS FINANÇAS NEUTRAS .......................................... 52 5. A TRANSIÇÃO PARA AS FINANÇAS INTERVENCIONISTAS................ 57 6. O INTERVENCIONISMO FINANCEIRO E AS FINANCAS ACTIVAS ..... 60 7. FINANÇAS PÚBLICAS E SISTEMAS COLECTIVISTAS ........................... 67 EXERCÍCIOS PRÁTICOS ................................................................................... 71 CORRECÇÃO DE EXERCÍCIOS ........................................................................ 72 CAPÍTULO III - A ACTIVIDADE FINANCEIRA COMO FENOMENO POLÍTICO 73 OBJECTIVOS: ...................................................................................................... 73 ESTADO E ACTIVIDADE FINANCEIRA ......................................................... 73 ESTADO E OUTRAS ENTIDADES SOCIAIS ................................................... 91 CAPÍTULO IV -FACTOS E NORMAS NA ACTIVIDADE FINANCEIRA............... 93 OBJECTIVOS ....................................................................................................... 93 AS FINANÇAS PÚBLICAS E 0 DIREITO FINANCEIRO ................................ 93 AUTONOMIA E NATUREZA DO DIREITO FINANCEIRO ........................... 95 EXÉRCICIOS PRÁTICOS ................................................................................... 99 CORRECÇÃO DOS EXERCÍCIOS ................................................................... 100 SUGESTÕES DE LEITURA .............................................................................. 102
  • 6. ii Índice QUADRO SINÓPTICO ...................................................................................... 102 AVALIAÇÃO DE FINANÇAS PÚBLICAS ............................................................... 104
  • 7. FINANÇAS PÚBLICAS ACERCA DESTA UNIDADE I Estas notas de ensino constituem a primeira unidade da disciplina de Finanças Públicas leccionada no primeiro semestre no Instituto Superior Monitor (ISM). É uma disciplina pertencente ao curso de Direito, servindo de ferramenta essencial para a compreensão e melhor abordagem das disciplinas tais como, Direito Fiscal, Finanças Públicas, Direito Comercial, Direito Bancário, Direito Financeiro, Direito Económico, Direito Internacional Económico. Como facilmente poderá se depreender, a Economia Política serve como disciplina vestibular, para o estudo das disciplinas acima referidas. Com efeito, o estudante dificilmente poderá entender a essência da obrigação dos cidadãos em pagar os impostos, a política do Estado na defesa do emprego, nas decisões do governo em agravar as taxas de poluição do meio ambiente, sem que tenhamos abordado a problemática da redistribuição de rendimentos, conceitos que serão tratados na disciplina de Economia Política. ESTRUTURA DA UNIDADE I Presente unidade tem como tema central o fenomeno finaceiro esta dividada em quatro capítulos nomeadamente: o conceito de finanças públicos; finanças, doutrinas e sistemas; a actividade financeira como fenómeno político e os factos e normas da actividade financeira. Com estas matérias pretendemos dotar os nossos esttudantes de conhecimentos necessários para percebeer como é que a economia se encontra organizada e as formas que o Estado optou para ordenar, intervir e actuar no seio da economia de modo a evitar desequilíbrios; Recomendamos que leia atentamente as generalidades desta unidade antes de iniciar os seus estudos. GENERALIDADE DO CURSO Caro Estudante Seja Bem-vindo(a) à Unidade 1- introdução à Economia Política do ISM! 3
  • 8. 4 Índice Para ter sucesso nesta Unidade I, você precisa de estudar cuidadosamente o material apresentado nesta Unidade, os recursos auxiliares disponíveis e apresentar as suas dúvidas ao tutor. Esta é uma disciplina que apesar de nova em alguns aspectos, muitos aspectos, sendo pressupostos, o estudante deve trazer do ensino geral. Dos que não é preciso ter conhecimento anterior são os ligados com a ciência económica, entretanto, o domínio da história universal, geografia económica, e filosofia, disciplinas leccionadas no ensino geral, constituirá uma base para melhor compreender os conceitos dados na presente unidade, o contrário, constituindo um constrangimento. A dificuldade esperada que o estudante experimentar nesta Unidade poderá ser de natureza filosófica, onde certa terminologia se torna indigesta. É preciso compreender por outro lado que esta a introdução às finanças públicas versa essencialmente parte teórica destacando-se sobre ela o pensamento, concepções, doutrinas económicas. RECURSOS Se você estiver interessado em aprender mais acerca desta matéria, nós providenciamos uma lista de recursos adicionais no fim desta unidade. Estes recursos incluem títulos bibliográficos e de artigos, websites da Internet e a biblioteca virtual do ISM. SEUS COMENTÁRIOS Agradecíamos que após a conclusão desta unidade nos enviasse os seus comentários sobre os seguintes aspectos: Conteúdos e estrutura da unidade; Materiais de leitura e recursos da unidade; Trabalhos da unidade; Avaliações da unidade; Duração da unidade; Apoio ao estudante (tutores atribuídos, apoio técnico, etc.); Outros aspectos que achar pertinente. Os seus comentários ajudar-nos-ão a melhorar e reforçar esta unidade. 4
  • 9. FINANÇAS PÚBLICAS RESULTADOS DE APRENDIZAGEM Ao concluir esta unidade você será capaz de: Distinguir dentre várias concepções o objecto da Economia Política; Utilizar numa perspectiva histórica, a génese e evolução da Resultados conceito da Economia Política entanto que ciência diferentes das outras ciências; Demonstrar o domínio dos melhores métodos de investigação de fenómenos económicos; Delimitar o âmbito da ciência económica; Argumentar situações económicas de forma clara e lógica DURAÇÃO Tempo para leitura da unidade: 10 horas Tempo para trabalhos de pesquisa: 14 horas Tempo para a realização de exercícios práticos: 2 horas Duração da unidade: Tempo para a realização de avaliação: 2 horas 28 Horas TÉCNICAS DE ESTUDO Por você ser um estudante universitário as suas técnicas de aprendizagem serão diferentes das que usava nos tempos da escola secundária e na presença de um professor. Neste curso você terá uma grande autonomia, isto é, Técnicas de Estudo RESPONSABILIDADE. Acima de tudo, você fará uma gestão responsável do seu tempo. Faça um programa de estudos realista e cumpra-o rigorosamente. Escolha horas e locais tranquilos para os seus estudos. Faça uso dos demais recursos referenciados na unidade e mobilize a sua motivação profissional e/ou pessoal para 5
  • 10. 6 Índice adequar as suas actividades de estudo a outras responsabilidades profissionais, sociais e pessoais. Partilhe as suas aprendizagens com os outros. Usufrua das várias formas de apoio disponíveis, mas fundamentalmente, você tomará controlo do seu ambiente de aprendizagem. Recomendamos que consulte alguns sites da Internet, em inglês, com informações importantes sobre a melhor forma de estudar de maneira autónoma: http://www.how-to-study.com/ http://www.ucc.vt.edu/stdysk/stdyhlp.html http://www.howtostudy.org/resources.php Bons Estudos! 6
  • 11. FINANÇAS PÚBLICAS PRECISA DE AJUDA? Os materiais deste curso estão na página seguinte da Internet: Www.monitor.co.mz Ajuda Você vai precisar de uma senha para poder ter acesso a estes materiais. No caso de ter problemas de acesso à página que tem materiais desta unidade, por favor contactar o Instituto Superior Monitor pelo e-mail monitor.ism@gmail.com. No caso de dúvidas sobre o material desta unidade, por favor contactar o seu tutor através do e-mail monitor.ism@gmail.com. Também poderá contactá-lo por telefone ou telemóvel cujos números são disponibilizados pelo Departamento de Apoio ao Estudante. TRABALHOS Depois de estudar cada capítulo desta unidade o estudante deve resolver todos os exercícios de aplicação como forma de consolidação das matérias nela vertidas. Os exercícios de aplicação não seram submetidos ao Instituto Superior Monitor. O Instituto Superior Monitor fornece as soluções dos trabalhos de auto- Trabalhos avaliação para lhe ajudar nos estudos. Mas Atenção Caro Estudante, você deve resolver os exercícios de auto-avaliação antes de consultar as soluções fornecidas. AVALIAÇÕES Você deve fazer uma avaliação nesta unidade. A avaliação encontra-se no final da unidade. A avaliação deve ser submetida ao Instituto Superior Monitor até ao 28 de Março de Avaliações 2010. Você pode submeter a avaliação por e-mail, fax, entregar directamente na instituição ou usando outros meios de comunicação. O docente irá corrigir as avaliações e lhe atribuirá uma nota com base no seu desempenho. A média aritmética das avaliações de cada Unidade vai ditar a sua nota de frequência. Depois, você terá que fazer um exame presencial para poder ter a avaliação final da disciplina. São admitidos ao exame presencial, os estudantes que 7
  • 12. 8 Índice tiverem uma nota de frequência igual ou superior a 10 valores. NÃO HÁ DISPENSAS. Para poder concluir a disciplina, os estudantes devem ter uma média final igual ou superior a 10 valores e com uma classificação igual ou superior a 10 valores no exame presencial. 8
  • 13. FINANÇAS PÚBLICAS UNIDADE I – FENÓMENO FINANCEIRO (FACTOS E NORMAS) CAPÍTULO I - CONCEITO DE FINANÇAS PÚBLICAS OBJECTIVOS Ao concluir este capitulo os estudantes terão o domínio sobre matéria referentes ao: • Ao conceito de Finanças Públicas; • Aos vários sentidos em que as Finanças Públicas podem ser entendidas; • Fenómeno Financeiro, que representa o estado das relações económicas entre as pessoas e instituições sociais, por um lado e o Estado, do outro lado; • Entender o que é a economia privada; • O que é a economia social; • O que é a economia pública; • Terá também a capacidade de entender as causas de incapacidade do mercado, a provisão pública de bens e os princípios doutrinários e políticos da actividade financeira; FINANÇAS PÚBLICAS E FINANÇAS PRIVADAS Uma primeira aproximação ao conceito de finanças públicas exige a sua separação de outra noção com que anda muitas vezes confundido e de que e rigorosamente distinto: as finanças privadas. Enquanto por finanças privadas se entendem os aspectos tipicamente monetários do financiamento de uma economia ou de um agente económico, abrangendo os problemas da moeda e do crédito (ou, mais restritamente, os «mercados financeiros» onde se transaccionam activos representados por títulos a médio e a longo prazo), as finanças públicas designam a actividade económica de 9
  • 14. 10 UNIDADE I – FENÓMENO FINANCEIRO (FACTOS E NORMAS) um ente público tendente a afectar bens a satisfação de necessidades que lhe estão confiadas. Trata-se de uma mera similitude vocabular, com razões históricas, que leva a utilização do mesmo termo para designar duas realidades distintas. Preferimos qualificar de financeiro quanto diga respeito as Finanças Públicas, e de financial o respeitante as finanças privadas, incluídas na teoria económica da Moeda e do Crédito; mas isto não é ainda do consenso. ACEPÇOES DE «FINANÇAS PÚBLICAS» A expressão finanças públicas pode ser utilizada em três sentidos fundamentais: (a) Sentido orgânico - Fala-se de finanças públicas para designar o conjunto dos órgãos do Estado ou de outro ente público (incluindo a parte respectiva da Administração Publica) a quem compete gerir os recursos económicos destinados a satisfação de certas necessidades sociais (p. ex. Ministério das Finanças). (b) Sentido objectivo - Designa a actividade através da qual o Estado ou outro ente público afecta bens económicos a satisfação de certas necessidades sociais. (c) Sentido subjectivo - Refere a disciplina cientifica que estuda os princípios e regras que regem a actividade do Estado com o fim de satisfazer as necessidades que lhe estão confiadas. No segundo e no terceiro sentidos, tende-se modernamente a designar por Economia Pública, quer esta forma de actividade económica, quer o ramo da Economia que a estuda, sobretudo quando o faz de uma perspectiva predominantemente dedutiva, teórica ou analítica e em termos reais. Preferimos designar por Finanças Públicas o estudo deste fenómeno, quando e feito numa óptica de economia aplicada, fundamentalmente segundo métodos indutivos e institucionais e em valores monetários (não reais)1 1 A família pode ter uma organização institucional, mas a sua dimensão e forma exterior de actuação não se diferenciam das dos indivíduos em sociedades como a nossa; por isso e aqui tomada como instituição privada. 10
  • 15. FINANÇAS PÚBLICAS O FENÓMENO FINANCEIRO Como aspecto da realidade e objecto científico das Finanças, há que caracterizar, pois, o fenómeno financeiro. Ele representa, talvez do modo mais significativo e expressivo, o estado das relações económicas entre as pessoas e instituições sociais, por um lado, e o Estado, do outro; como o seu estudo contem a visão mais concreta e insofismável das tarefas e das funções que, com prioridade, o poder público concretamente desenvolve numa sociedade, por vezes bem diferente das proclamações políticas, das concepções ideológicas e, até, de certas visões superficialmente científicas. Poucos campos melhor do que este são um verdadeiro termómetro das relações concretas entre o poder e a sociedade que o integra, bem como das tarefas e funções que esta leva o poder a desempenhar, e do modo como os grupos, estratos ou classes sociais se situam perante o poder, beneficiando dos seus gastos ou suportando o respectivo custo. A ECONOMIA DO FENOMENO FINANCEIRO (ECONOMIA PRIVADA, SOCIAL E PÚBLICA) A actuação económica das pessoas, dos grupos e da sociedade pode ser exercida de diversas formas. Em alguns casos, achamo-nos perante indivíduos, famílias ou organizações de base contratual que, na produção, no consumo, na repartição ou na circulação, actuam como unidades individuais ou como organizações de mera base contratual, na satisfação das respectivas necessidades, segundo critérios predominantemente individuais. Trata-se da economia privada, em regra contratual2 Outras vezes, deparamos com organizações que visam satisfazer necessidades segundo uma lógica cooperativa ou colectiva, recorrendo a disciplina institucional interna do grupo, mas sem a possibilidade de recorrer a mecanismos coactivos externos. As tradicionais formas de comportamento económico comunitário, as novas modalidades de unidades cooperativas ou autogestionárias, as instituições sociais não contratualistas constituem exemplos desta economia comunitária, cooperativa ou colectiva (social, «hoc sensu»). 2 Não se esquece que nem tudo que e hoje publico será politico; toma-se todavia o politico como forma matricial, dirigente e predominante do público 11
  • 16. 12 UNIDADE I – FENÓMENO FINANCEIRO (FACTOS E NORMAS) Enfim, as pessoas podem associar-se em organizações políticas, as quais têm por fim o interesse geral de sujeitos indeterminados, indo assim para além da simples satisfação de necessidades comuns sociais. Para isso se socorrem de poderes de autoridade - no duplo sentido da produção de preceitos sociais obrigatórios, mesmo para quem não participou na respectiva elaboração, e da possibilidade de recorrer, se necessário, a coacção por parte dos órgãos da instituição. Temos então uma economia pública, que iremos estudar primeiramente em referência ao seu sujeito actual mais típico e importante: o Estado. • A economia privada baseia-se no livre comportamento dos agentes económicos e em equilíbrios, parciais e gerais, por eles livremente estabelecidos, de acordo com os seus interesses próprios confrontados com transparência e medidos por referenciais comuns - os preços formados em mercado. Tem como instrumentos fundamentais os contratos e como instituição básica de apropriação dos bens, produtivos ou de consumo, a propriedade privada. • A economia social assenta na solidariedade, organizada em grupos de diversa dimensione nível económico, na liberdade de comportamento das pessoas e dos grupos, na combinação da propriedade privada com a propriedade social e comunitária, na cooperação organizada (mais livremente ou com maior peso dos interesses sociais); ela pode integrar instrumentos de racionalidade e solidariedade orgânica diversificados, que combinam 0 individualismo com o solidarismo, nos seus diversos matizes. Por seu lado, a economia pública assenta, a partida, na existência de uma solidariedade organizada e dotada de poder politico portanto, da coacção social máxima - a escala da colectividade ou de subsistemas do sistema social, numa lógica de direcção económica mais ou menos planeada, com formas de apropriação dos bens pela sociedade através dos seus órgãos políticos e juízos colectivos de utilidade; estes impõem-se do centro (órgãos de decisão politica) para a periferia (membros da sociedade), seja qual for a forma de designação e o critério de funcionamento interno da entidade pública considerada. Até ao presente, não conhecemos sociedades - fora algumas pequenas comunidades primitivas ou, pelo menos, atrasadas - que concretizem a sua organização global segundo princípios comunitários ou solidaristas: este apenas tem vincado em pequenas comunidades ou sectores delimitados das grandes sociedades. 12
  • 17. FINANÇAS PÚBLICAS A economia privada e a economia pública até hoje dominantes constituem dois princípios opostos de estruturação e funcionamento da sociedade económica, que podem situar-se fundamentalmente em dois planos distintos; - O da definição do sistema económico, caracterizando assim, consoante seja globalmente dominante um ou outro destes princípios, diversos tipos de sistemas económicos; O fenómeno financeiro - actos e normas Adopção dos respectivos modelos ou critérios de comportamento, dentro de um ou outro dos sistemas económicos, por sectores, órgãos sociais ou agentes económicos. Embora pudesse ser mais lógica a ordem inversa, vamos começar por nos situar no plano de um sistema económico dominado pelos princípios de economia privada: no plano sociocultural (filosofias e ideologias individualistas, sistemas sociais e políticos parcialmente descentralizados), no das instituições e instrumentos económicos fundamentais (propriedade e iniciativa privada dominantes, ajustamentos económicos pelo mercado e pelos princípios da máxima utilidade individual, tomada em si ou reflectida nos grupos) e no plano dos comportamentos sociais (motivação egoísta predominante, dinamismo competitivo ou conflitual). São estes os sistemas e as estruturas historicamente dominantes atem ao presente, e é no seu modelo que se integra Moçambique, tal como os países que nos são mais próximos. PODER E A ECONOMIA: ORDENAÇÃO, INTERVENÇÃO E ACTUAÇÃO ECONOMICAS a) Noções prévias Vejamos então quais os principais tipos de relações entre o poder político - podem tomar como sua forma protótipos de organização o Estado, sem prejuízo do que adiante se dirá - e a actividade económica, entendida como o processo orgânico de satisfação de necessidades humanas mediante" a afectação de bens materiais raros a fins alternativos (individuais ou sociais; privados, comunitários ou públicos). Parece-nos que essa relação pode ser de três tipos principais: a ordenação económica, a intervenção económica e a actuação económica pública. Vejamo-las sucessivamente. 13
  • 18. 14 UNIDADE I – FENÓMENO FINANCEIRO (FACTOS E NORMAS) b) A ordenação Económica 1. Cabe aos poderes públicos estabelecer os quadros gerais em que toda a actividade económica tem de se desenvolver (por mais liberal que seja a sua filosofia económica e Social): da constituição económica e da legislação económica, as próprias directivas e decisões concretas da administração económica... A máquina político-administrativa, em larga parte, procede assim a definição do enquadramento da vida económica, designadamente de natureza jurídica e social; Assim estrutura a actividade económica e condiciona a actuação dos sujeitos económicos. Cumpre desde já acentuar que não e apenas no domínio jurídico que esta forma de actuação do poder político sobre a actividade económica se concretiza. Ela decorre também da modelação, no domínio extra-jurídico, das diversas instituições sociais (hábitos, formas de comportamento, grupos inorgânicos ou organizados de forma não jurídica, etc.). Tal forma de actuação constitui o que pode chamar-se domínio de ordenar; ao da actividade económica (ou ordenação económica)3. II. Um primeiro aspecto desta ordenação resulta naturalmente da definição e execução de uma doutrina ou politico económico-social seguida pelo Estado: abstencionista, liberal, socialista a, comunista, etc. A doutrina económica do Estado explícita ou implícita, constitui uma primeira forma de ordenação genérica da actividade económica e social, a qual há-de conformar-se as suas actuações políticas e as dos sujeitos privados. III. As doutrinas e políticas económicas de índole geral podem especificar-se, tanto em normas como numa prática jurídico- política (com a qual estão, alias, interdependentes). Então formulam-se princípios gerais, aos quais deve obedecer toda a vida económico-social, e também a produção e normas jurídicas ou as situações e relações jurídicas a ela pertinentes. Este conjunto de disposições fundamentais, expressão concretizada de uma doutrina ou filosofia social, que pode designar-se por constituição económica4. 3 Sobre as noções de ordem económica: VITAL MOREIRA, A ordem jurídica do capitalismo, 1973. 4 Note-se que doutrina (como ideologia e politica, decorrentes dela) e constituição são realidades interferentes, mas não hierarquizáveis: diversas constituições podem convergir numa mesma doutrina; e diversas doutrinas podem executar-se a sombra de uma constituição (veja-se o debate entre as interpretações Liberais e as interpretações dirigistas da Constituição de 1933 nos 14
  • 19. FINANÇAS PÚBLICAS IV. 0 Estado pode ainda, ao abrigo da sua função ordenadora da vida económica, definir normas gerais, que não demarcam Já os quadros fundamentais de toda a vida económica, mas a eles se subordinam, seja para toda a actividade económica, seja para certos sectores, tipos de actividade ou de relações económico-sociais gerais e permanentes antes referidos, regulando de forma directa, por exemplo, um sector, um tipo ou uma área de actividade: será legislação ou regulamentação económica. Ela pode abranger as instituições económicas gerais nas áreas da produção, do consumo, dos instrumentos reguladores - mercados e plano -, da circulação de bens - moeda e crédito -, dos mercados de factores de produção, da repartição do rendimento e das relações internacionais) e as específicas, nomeadamente sectoriais (agricultura, industria, comercio, outros serviços...). De uma forma jurídica ou por via política, através da Administração activa ou dos Tribunais, a administração e jurisdição económica constituem ainda, em seus critérios constantes, uma forma de ordenação jurídica (paredes-meias já com a intervenção): prevalecerá a vinculação na função ordenadora, a discricionariedade na intervenção. Por elas o Estado desempenha uma função ordenadora da vida económica, definindo e executando padrões e quadros mais ou menos concretos, no âmbito dos quais tanto o seu próprio comportamento como o dos sujeitos económicos vão livremente desenvolver-se. Condiciona-se e ordena-se então o comportamento dos diversos sujeitos; mas não se visa interferir directamente sobre ele. c) A intervenção económica I. Não se esgotam aqui a relação entre político e a actividade económica. Um seu outro modelo e o que visa alterar Concretamente o que seria a actividade livre e norma dos sujeitos económicos. Assim, Suponhamos que o Estado considera indesejável que se produzam mais tecidos de fibras sintéticas: poderá evitar que abram mais fábricas, poderá baixar os preços dos têxteis, levando algumas unidades a falência e outras a retraírem a produção, podem restringir o crédito ao sector, poderá fixar quotas de mercado ou limitar por contingentes a produção de cada fábrica ou empresa, etc. Em tal caso, o Estado recorre ao seu poder para modificar o comportamento de sujeitos económicos (embora não altere os quadros gerais da actividade económica); isso pode resultar de disposições directamente limitativas, como de restrições financeiras, do agravamento de impostos, de simples movimentos de forte persuasão ou coacção psicológica (particularmente usados anos setenta; ou o debate entre as interpretações socializantes e as liberalistas do texto constitucional de 1976). 15
  • 20. 16 UNIDADE I – FENÓMENO FINANCEIRO (FACTOS E NORMAS) quando existem crises graves), ou de muitas outras formas indirectas. II. Este tipo de comportamento que se designará, em sentido próprio, por intervenção económica do Estado a qual tem como forma mais racionalizada a política económica. Ela pode ser directa ou indirecta, e representa a relação mais flexível, diversificada e variada entre o Estado e a actividade económica. O que a caracteriza é que o Estado visa alterar o comportamento dos produtores ou dos consumidores (em suma, dos sujeitos económicos) que dispõem de uma certa margem de liberdade: a intervenção estadual tenta modificar a forma natural como esses agentes actuariam, de modo genérico (teremos então politicas económicas) ou em termos casuísticos (por actuações individualizadas). Fá-lo, porem, sem modificar os quadros gerais da actividade económica, e sem tão-pouco tomar ele próprio decisões relativas a utilização de bens e satisfação de necessidades sociais ou estaduais, isto é, sem ser ele próprio sujeito económico). d) A actuação económica do Estado 1. 0 Estado pode, porém, desenvolver ele próprio - como «forma» política da sociedade - uma actividade de sujeito económico colectivo ou social. Sabemos de sistemas sociais em que todas as necessidades económicas, em sociedades primitivas ou integralmente socialistas, são satisfeitas pela própria sociedade política (que terá, para uns, necessidades próprias, como organismo que e; que apenas «interpreta» necessidades individuais; ou que actua num e noutro plano). Em todos os tempos, contudo, zonas da actividade económica, conexas com os fins e as funções do Estado, foram por este exercidas; pois a prossecução de fins de segurança, justiça e bem- estar implica a administração de diversos bens raros, a qual, de per si, e actividade económica. Em tais casos - de actuação económica do Estado - este dispõe de bens económicos, cuja gestão e disposição lhe esta atribuída, para os afectar a necessidades sociais que lhe cumpre satisfazer. Pela disposição ou administração desses bens que ele actua economicamente, fazendo também politica ou administração. II. Todos sabemos que há serviços que o Estado e só ele podem prestar numa sociedade evoluída: a administração da justiça, a defesa e a segurança a interna, certas zonas de administração civil. Para tanto, ele haverá de dispor de bens, de utilizar meios de financiamento, de remunerar o trabalho e outros factores produtivos... Mas sabemos igualmente que há serviços que o Estado, por razões diversas chamou a Se prestar (embora pudesse não fazer; e o faça 16
  • 21. FINANÇAS PÚBLICAS nuns países e não em outros): dos correios e telecomunicações, de certas modalidades de crédito da rádio e televisão e certos países (por vezes em concorrência com os particulares)... Também estes bens e serviços têm uma natureza económica bem evidente. O Estado, ao produzi-los, e um produtor como outro qualquer: quer seja monopolista, quer se integre num esquema concorrencial; quer aja em regime de preços livres, quer se socorra de preços dirigidos; tanto se tiver organizações de tipo empresarial, como se sujeitar a critérios, as vezes pouco económicos, de gestão dos serviços públicos com carácter estritamente político. É fácil! Compreender a atribuição de carácter intrinsecamente económico a produção deste tipo de bens (coisas como serviços) pelo Estado; já será, contudo, mais difícil compreender O carácter económico da polícia ou da defesa nacional, por exemplo. Contudo, também eles constituem serviços, «pagos» pela colectividade, por via dos impostos (ou das taxas); e ao presta-los, o Estado suporta custos, formulando decisões acerca da afectação de bens económicos raros a fins específicos de carácter social. Nestas situações, que poderemos designar por actuação económica em sentido próprio, o Estado age por si mesmo como sujeito ou agente económico, formulando escolhas ou opções económicas no interesse da comunidade (ou da sua maquina ou aparelho estadual). e) Exemplos; ralações entre estas modalidades Como formas de ordenação, podem referir-se as disposições constitucionais que se referem a actividade económica; a legislação sobre os sectores institucionais de produção; a legislação sobre sociedades comerciais... A situação de intervenção corresponde, por exemplo, a realização de compras pelo Estado para facilitar o combate a depressão económica; a constituição de empresas públicas com o fim de promover o desenvolvimento económico; 0 tabelamento de preços, no fito de lutar contra a inflação: a acção psicológica da persuasão dos industriais para estimular o aparecimento de novas indústrias; A aprovação de um plano económico-social pelo Parlamento e pelo Executivo... Na sua actuação económica, o Estado cobra impostos e realiza despesas de edifícios públicos, de parques e de matas; tem acções e obrigações de que e titular; contrai e reembolsa empréstimos; vende o património; etc. Os próprios exemplos demonstram o evidente carácter não exclusivo desta tipologia. Nenhum destes tipos de comportamento exclui, em concreto, o outro; são antes cumuláveis. Assim, a 17
  • 22. 18 UNIDADE I – FENÓMENO FINANCEIRO (FACTOS E NORMAS) actuação do Estado pode ser uma forma de intervenção (mas também pode não o ser); a ordenação da vida económica pode assumir-se como mera forma de intervenção generalizada, e ate pode ser tomada como meio de criação de bens... A ACTIVIDADE FINANCEIRA I. 0 Fenómeno financeiro é um tipo cientificamente definido de fenómeno social. Em concreto, faz parte da vida social e pode ser objecto de uma análise segundo a óptica própria das diversas ciências sociais: do Direito, se for encarado na perspectiva dos valores de justiça e' das normas que intentam defini-los; da Economia, se encarado como forma de afecta ao de meios objectivamente raros a fins a alternativos; a ciência Politica ou Politologia, se for toma o como forma de exercício do poder (em geral; ou politico em especial) da psicologia, se for encarado nos aspectos de psicologia individual e social que envolva; da Sociologia, se for concebido na sua essência pura e mais geral de fenómeno social. Não pensamos, pois, que seja adequado distinguir nele elementos - o fenómeno social e uno - nem destacar fenómenos sociais que são financeiros e fenómenos sociais que o não são. II. Parece-nos antes que a actividade financeira corresponde a utilização de meios económicos (meios objectivamente raros susceptíveis de aplicações alternativas) por entidades públicas ou pela própria comunidade, a fim de satisfazer necessidades comuns. A análise destes conceitos que resultará a sua melhor caracterização: onde tais caracteres se verifiquem, sempre haverá finanças públicas. III. Tomemos um exemplo. Imaginemos que há uma praga de mosquitos, portadores de malária, numa colectividade, e que os membros desta pretendem exterminar os insectos. Para isso, as alternativas possíveis são as seguintes (I) Não sair de casa para não ser atingido por nenhum mosquito. Excepto se algum mosquito entrar em casa, a solução será eficiente; tem porém o inconveniente de os habitantes da área não poderem deslocar-se fora de casa. O custo directo desta alternativa e quase nulo; mas ela tem o grande contra de impedir a actividade normal das pessoas, envolvendo assim custos bem maiores. (2) Ficando em casa, seria possível instalar condicionado, e assim ter melhores condições de existência e trabalho. O custo seria mais elevado e o mesmo inconveniente perdura. 18
  • 23. FINANÇAS PÚBLICAS (3) Pode-se sair de casa, usando cremes ou outros processos, mais ou menos falíveis, de protecção contra os mosquitos. O incómodo pode ser grande, e a eficácia da solução duvidosa, mas ela é barata e permite as pessoas fazerem a sua vida fora de casa. (4) Pode-se utilizar um nebulizador ou extintor no jardim da casa de cada um, afastando um pouco mais os mosquitos infectados. A eficácia e duvidosa e o custo mais elevado: (5) Nenhuma destas soluções elimina o mal na origem: os mosquitos continuarão a existir e a multiplicarem-se. A única solução totalmente eficiente será a pulverização aérea dos seus viveiros com pesticidas adequados: ela custará, por hipótese, (frete do avião e produtos químicos). A escolha entre estas diversas soluções técnicas - que não são equivalentes, mas todas resolvem o problema minimamente - depende das possibilidades orçamentais (constrangimento orçamental) de cada pessoa e dos inconvenientes pessoais de cada uma delas. Para a generalidade, a alternativa e seria desejável, mas estaria acima das possibilidades orçamentais de cada um. As outras quatro alternativas seriam escolhidas consoante o custo e os orçamentos de cada um (que fixaria a parcela dos recursos afectada a satisfação deste tipo de necessidades, em concorrência com outras): os mais pobres teriam acesso apenas a alternativa; outros disporiam de outras alternativas. A acção individual apenas tem, em regra, acesso as quatro primeiras soluções. Na verdade, a quinta solução, ainda que estivesse ao alcance dos recursos económicos de algum particular muito rico, sempre possibilitaria a «boleia» ou a «borla» de todos os outros: estes tirariam o mesmo proveito que o financiador da iniciativa, mas de graça, enquanto este a pagou por inteiro. Ou então, para ela poderão associar-se os vizinhos, empreendendo uma acção comum: mas quem garante que todos queiram contribuir, admitindo que algum tome por si a iniciativa, de modo parcialmente altruísta? A verdade e que, sem fazer nada, os vizinhos que nada gastarem tiram o mesmo beneficio da extinção dos mosquitos; mesmo ficando mal vistos, podem não gastar nada, utilizando - por «boleia» ou «a borla» - os benefícios gerados pelas acções dos outros. Pode suceder que os poucos que aceitem pagar ou cooperar de outra forma, acabem por achar o custo tão elevado que os levara a desistir por não poderem financiar a acção necessária. Sabendo como é difícil levar o «borlista» a pagar alguma coisa pelo benefício que tira, o rico não estará disposto a custear sozinho um benefício para todos; alguns poderão querer fazê-lo, mas só com a garantia de que todos contribuirão. A não ser que o façam por altruísmo (caridade, filantropia, vaidade, ambição social...) ou que tenham forte interesse individual (apesar da aversão as «borlas») 19
  • 24. 20 UNIDADE I – FENÓMENO FINANCEIRO (FACTOS E NORMAS) em conseguir os benefícios individuais resultantes da solução 5... O vizinho rico ou o pequeno grupo promotor normalmente proporão ao conjunto dos vizinhos uma acção colectiva: se todos pagarem uma parcela igual, a iniciativa far-se-á. Estão então sujeitos a recusas e, ou assumem o encargo de preencher as faltas, ou não haverá obra comum... Os indivíduos juntar-se-ão em grupo ou clube - com fins temporários e permanentes - se o custo de se associarem for inferior aos benefícios que tiram do «clube» C). Da associação em «clube» podem mesmo advir economias de escala ou a cobertura de outras utilidades imprevistas (sinergia). Ou pode suceder que a acção colectiva seja oligárquica: apenas alguns dos beneficiários - e não todos - se associarão para conseguir o efeito social pretendido. Neste caso, o custo individual será superior -- mas o benefício de cada um pode ainda ser maior do que se não se empreendesse a iniciativa. IV. A acção colectiva mais elaborada e a acção pública - a que e empreendida por entidades públicas: entidades dotadas de poder de autoridade, obrigadas a prossecução de fins gerais da colectividade e representativas dos seus membros, com base institucional que não e necessariamente a da voluntariedade de associação (embora possa 'sê-lo em associações publicas livres). Este conjunto de actividades que constitui o cerne da economia pública (em sentido amplo, abrangendo as actividades de ordenação, intervenção ou actuação económica publica); ou, em sentido restrito, abrangendo apenas esta ultima (ou tão-só o seu lado de obtenção de recursos - finanças públicas estrito senso -, ou a sua expressão monetário-financial- finanças publicas em sentido institucional). A natureza das formas não publica de acção colectiva e diversa da das formas públicas. Nas primeiras, o indivíduo põe abandonar o grupo; nas segundas só pode deixa-lo se fizer sacrifícios pessoais muito onerosos (deixa de ser sócio de um clube escrevendo uma carta: mas só cessa de ser munícipe se deixar de residir no território do concelho). Nas primeiras, o indivíduo participa na elaboração do estatuto e tem acesso directo aos órgãos; nas segundas, aceita uma constituição preestabelecida e põe não ter controlo dos órgãos (autocracia), ou tem-no só de forma indirecta (democracia indirecta). Nas primeiras não existe em princípio (com muitas restrições históricas e actuais) o uso potencial da coacção para impor as decisões tomadas e o cumprimento das normas (embora possam existir sanções privadas judicialmente executórias); nas segundas, todo o comportamento social é marcado pela possibilidade de recurso a coacção para impor as decisões por via de autoridade. Podem a este respeito fazer-se várias perguntas. Porque são certas actividades prosseguidas pela acção colectiva privada e outras pela acção colectiva pública? Como se decide sobre a quantidade do 20
  • 25. FINANÇAS PÚBLICAS bem colectivo público a produzir e sobre a quantidade de recursos a afectar-lhe? Como distribuir os custos da provisão de bens colectivos entre os membros da colectividade? Como são tomadas as decisões colectivas, a partir das preferências individuais? Como são distribuídos os benefícios e os custos? Estes os problemas- chave da decisão financeira - que estudaremos, primeiro, quanto ao conteúdo, e depois na forma e nos órgãos. A OPTIMIZAÇÃO SOCIAL E SEUS CRITÉRIOS TEÓRICOS a) Critérios gerais I. Porque e que há necessidades que são satisfeitas pela comodidade (ou pelo Estado), ao passo que outras o são pelas pessoas e pelos grupos? O problema central da economia pública prende-se com os critérios de satisfação das necessidades dos indivíduos e da comunidade. Numa economia baseada no principio da liberdade de comportamentos descentralizados, que princípios e critérios determinam ai as necessidades que são satisfeitas pelos indivíduos e pela colectividade? Fundamentalmente, o mercado. Nele as pessoas confrontam entre si as respectivas possibilidades e necessidades: oferecem aquilo de que dispõem, procuram aquilo de que necessitam e confrontam o valor relativo através da licitação em público, mediante critérios que resultam na formação de equilíbrios de mercado (preços e quantidades), de equilíbrios internos do consumidor e do produtor, em relação a certos tipos de bens, bem como nos equilíbrios por sectores ou da economia em geral (equilíbrios parciais, equilíbrio económico geral). Num sistema de economia de mercado a existência de bens produzidos fora do mercado resulta daquilo a que pode chamar-se incapacidade ou falha do mercado (market failure). Trata-se dos bens que, ou não são produzidos, ou para o serem em condições eficientes necessitam de uma actuação não movida pela lógica do mercado. II. O Estudo teórico dos critérios de provisão pública de bens parte, como toda a teoria, de um certo número de pressupostos de base: (a) Que nos encontramos numa sociedade politicamente organizada - isto e, na qual existe o Estado (ou outras entidades dotadas de poder politico); (b) Que essa sociedade e constituída por indivíduos e grupos cujos padrões culturais são essencialmente competitivos (isto e, livres e 21
  • 26. 22 UNIDADE I – FENÓMENO FINANCEIRO (FACTOS E NORMAS) rivais, buscando a satisfação individual e a eficiência), e não cooperativos, comunitários, solidários ou de outros tipos; (c) Que, por isso, a atitude fundamental do Estado em relação a provisão de bens disponíveis será passiva e não activa; (isto e, tratar-se-á de uma sociedade e uma economia descentralizada, cujas normas e instituições hão-de garantir a apropriação privada dos bens, a liberdade individual e as decisões descentralizadas (ao invés dos sistemas totalmente centralizados, em que toda a actividade seria - ou tenderia a ser - pública, integrando-se no publico o social, e no social o pessoal); (d) Que nessa sociedade a afectação dos recursos se faz através dos mercados livres - tendencialmente em concorrência pura e perfeita, ou com formas de concorrência limitada -, e ainda que o mercado assegura a melhor satisfação possível dos consumidores (equilíbrio óptimo do produtor). A melhor afectação dos recursos materiais raros susceptíveis de aplicações alternativas (bens económicos, incluindo coisas, realidades imateriais apropriáveis e serviços) resultará da liberdade de motivações dos agentes e do confronto livre dos seus interesses em mercado. Pressupõe-se ainda que os preços se fixem em níveis tais que o ajustamento da oferta a procura e feito automaticamente em cada momenta para todos os mercados, e que os agentes económicos oferecem os factores de produção (trabalho, recursos naturais, capital, factores imateriais) e obtêm assim um rendimento aplicável no consumo dos bens finais produzidos ou na aquisição de factores para novas produções futuras. Admitindo as leis técnicas da produção, uma dada estrutura de repartição dos recursos entre as pessoas e padrões de comportamento moderadamente, egoístas e racionais, e possível demonstrar que do funcionamento dos mercados resulta um conjunto de afectações de recursos - a produção e ao consumo pelo menos tão satisfatório para todos (se não mais) como qualquer outro conjunto de aplicações. Isto e, demonstra-se que o mercado tende a optimizar a afectação dos recursos - ou, o que e o mesmo, realiza a satisfação geral de todos e cada um, com o melhor nível possível de utilidade, nas condições e com os bens disponíveis (I). III. Poderá dizer-se que esta teorização só e aplicável as economias de mercado: mas não se esqueça que, se estas condições de algum modo sintetizam a essência de capitalismo, delas também fluem as regras do planeamento e a lógica colectiva de um socialismo hedonista, inteiramente racional e industrial (I): o essencial da teoria e mais a sociedade hedonista do que o capitalismo. A sua estrutura pressupõe um sistema de economia de mercado - que não pode confundir-se com um qualquer sistema livre, em que o Estado se limita a mera garantia da ordem social e). Ora, este sistema tem, como se sabe, diversas limitações: 22
  • 27. FINANÇAS PÚBLICAS (a) Desigualdade na distribuição da riqueza; (b) instabilidade no conjunto de economia e em sectores específicos; (c) custo crescente dos serviços públicos; (d) situações monopolísticas abundantes e crescentes; (e) actividades económicas que por reflexo beneficiam ou prejudicam outras (exterioridades: «externalidades»); (f) provisão inadequada (insuficiente ou incorrecta) de bens públicos (nomeadamente colectivos); (g) ma distribuição dos recursos entre presente e futuro (3). A afectação de recursos neste sistema e dominada pelo principio de que os sujeitos não produzem nem obtêm por troca bens cujo custo de produção (desutilidade da sua obtenção) seja superior a utilidade que auferem. É possível demonstrar que a mais eficiente afectação de recursos e, como regra, a que tendencialmente se situa no ponto de igualdade entre o preço de cada bem e o seu custo marginal. A fixação de preços afastados deste nível terá como consequência que, se o preço for inferior ao custo marginal, isso maximizara o benefício do consumidor - mas a consequência e que a procura aumentará e fará subir os preços. Ao invés, se o preto for superior ao custo marginal, isso tendera a maximizar o benefício do produtor - mas a procura diminuirá e, sendo a oferta excessiva, o preto tendera a descer. Esta simples regra que explica o ajustamento das quantidades e dos valores, definindo o equilíbrio do produtor, o do consumidor e os dos mercados dos vários bens, e dai o equilíbrio económico geral5 b) A economia de bem-estar 1. A esta luz, a economia de bem-estar (com seus pressupostos de individualismo, racionalismo e hedonismo) fornece a melhor base de analise das situações em que o mercado não e capaz de satisfazer o melhor possível os interesses de todos os membros de uma comunidade. Ela explica teoricamente as regras para a 5 O quadro teórico do raciocínio e o da economia neoclássica, como se recordara do estudo da Economia; ele constitui 0 melhor quadro de racionalidade nos sistemas de economia de mercado: cf. O nosso artigo Neoclássica (escola), em Polis - Enciclopédia Verbo da Sociedade e do Estado, vol. IV, S.V., 1986. 23
  • 28. 24 UNIDADE I – FENÓMENO FINANCEIRO (FACTOS E NORMAS) formulação de juízos de valor (que nunca podem derivar directamente e apenas de juízos de realidade: regra de Hume) sobre situações globais e finais de economia. Não se trata de dizer que «e melhor aumentar os impostos, porque...», ou que «estas despesas deve subir, senão...»; trata-se de dizer que uma certa situação global, para a colectividade ou para os seus membros - numa concepção de equilíbrio que não e mecanicista nem moralista (Rawls 6chamou-lhe de equilíbrio reflexivo e) - e, segundo critérios de bem-estar, melhor do que aquela outra situação. Nesse sentido, ao integrar fins, estas teorias chamar-se-ão normativas (ou melhor: teleológicas), em contraste com as meras análises descritivas, explicativas ou de «economia positiva». II. A. C. PIGOU 7aplicou critérios de bem-estar ao estudo da distribuição de recursos entre sector publico e sector privado - como entre os sujeitos da economia em geral, partindo do principio de que cada individuo recebe utilidades da utilização (consumo) dos bens público, e que o pagamento de impostos para financiar esses Esses bens e uma desutilidade para os indivíduos (pois e medido, em tem os de «custo de oportunidade», pelo consumo privado que ele e obrigado a sacrificar para pagar o imposto). Para cada pessoa, o ponto óptimo de oferta de bens públicos é o ponto em que a utilidade marginal dos bens públicos e igual a hostilidade marginal do imposto: se pagasse mais impostos, a sua utilidade marginal implicava mais sacrifício de que o beneficio obtido dos bens públicos; se pagasse menos impostos, então a utilidade do último bem privado corresponderia a desutilidade marginal do bem público que obtinha. Este princípio, aplicado - a todos os indivíduos, regera a afectação óptima dos recursos individuais entre bens privados e públicos: até ao equilíbrio imposto-bem público, há interesse em pagar mais impostos; depois, em receber menos bens públicos e não pagar mais impostos... Esta concepção tem limitações. Toma a utilidade em termos cardinais e não apenas ordinais. Admite que as apreciações subjectivas são comparáveis. Não fornece nenhum mecanismo de agregação dos óptimos individuais para determinar um óptimo social. Ora, se a sociedade for tratada como se tratasse de um indivíduo, a igualdade entre a utilidade social do total dos bens públicos e, a desutilidade social de todos os impostos será o ponto da sua maior utilidade social - mas pode ou não coincidir com o 6 J. RAWLS, A theory of Justice, 1971, § 4. 7 A. C. PIGOU, The economy of welfare (antes com o titulo Wealth and Welfare), J.a ed., 1912; 4." ed., 1940; A study inpublicjinance, I." ed., 1928; 3." ed., 1930. 24
  • 29. FINANÇAS PÚBLICAS ponto de maior utilidade (igualdade marginal individual) de cada indivíduo. Pode haver equilíbrio na sociedade sem que haja necessariamente equilíbrio individual. Então, para PIGOU, a distribuição do sacrifício entre os indivíduos assentaria em duas ideias: o máximo de bem-estar social resultaria da igualdade entre todos, porque só então seriam iguais todas as satisfações marginais de todos os indivíduos; mas tal igualdade não pode existir, pois colocaria em risco a liberdade e tornaria impossível a manutenção de níveis elevados de poupança, que são essenciais para prolongar o bem-estar económico pelo crescimento e pela estabilização das flutuações económicas e). A distribuição da carga fiscal deve basear-se nos princípios de que os desiguais devem ser tratados desigualmente e que a redução das desigualdades aumenta o bem-estar geral: dai que o sacrifício fiscal deva ser repartido de acordo com a capacidade de cada um para pagar e que as despesas devam ser usadas pelo estado para redistribuir o bem-estar de forma mais igualitária. III. PIGOU forneceu as bases para a tentativa, algo ambiciosa, de tentar definir os critérios de um óptimo social (máximo de bem- estar social), precisando em que condições e que da perda de utilidades para alguns membros da sociedade resultava uma melhoria de bem-estar social do conjunto. Menos ambiciosamente, iria construir-se (a partir da pesquisa de V. PARETO) uma explicação para a mera definição de critérios de melhoria do bem- estar (eficiência económica) em relação a situações anteriores, como efeito de decisões económicas pontuais (óptimo relativo ou óptimo de Pareto). A definição de critérios de eficiência, analisando as situações da economia a luz dos critérios de bem-estar, e o campo próprio da economia de bem-estar. Para os clássicos, o bem-estar comum era a mera soma das utilidades individuais: quanto maiores estas fossem, maior seria o bem-estar. Na falta de um critério de medição comum das utilidades e desutilidades ou de comparação intersubjectiva das satisfações - inevitável escolho das concepções subjectivistas da economia, V. PARETO8 e E. BARONE e) formularam uma 8 Pela ordenação do bem-estar social Bergson-Samuelson. Cf. em geral: PARETO, Manual d'Economie Politique, ·I909; A. BERGSON, «A reformulation of certain aspects of welfare economics», em Quarterly Journal of Economics, vol. 66 (1938), pp. 366--384; P. SAMUELSON, Foundations of economic analysis, 1947, «Reaffirming the existence of «reasonable» Bergson- Samuelson social welfare funcctionsf>, em Economic Journal, 1960, pp. 197-265; R. SUGDEN, The political economy of public choice, 1981, cap. 3. 25
  • 30. 26 UNIDADE I – FENÓMENO FINANCEIRO (FACTOS E NORMAS) concepção de bem-estar relativo, segundo a qual, numa situação dada, a determinação do bem-estar assentaria nos seguintes pressupostos: - Cada pessoa é o melhor juiz possível do seu próprio bem-estar; - O bem-estar social (Ug) e função apenas do bem-estar de cada um dos membros da sociedade: Ug = f (U1,U2, U3)... Un); - Se o bem-estar de uma pessoa (i) É melhor na situação x do que na situação y, e se o bem-estar de todos os outros não é menor em nenhuma das duas, então 0 bem-estar social e maior na situação x do que na y. Generalizando este critério, pode dizer-se que e «Pareto-efficient» - relativamente eficiente em termos paretianos - qualquer melhoria de bem-estar que não afecte a situação dos restantes membros da sociedade; uma situação (que correctamente não pode dizer-se «óptima») e eficiente quando não for possível/ nenhuma melhoria na situação de qualquer dos membros sem prejudicar os restantes C). IV. As melhorias de bem-estar paretianas baseiam-se em dois teoremas fundamentais, que enunciaremos apenas: 1.0 – Se: a) as famílias e empresas actuarem de forma perfeitamente competitiva, tomando os preços como dados; b) houver um conjunto completo de mercados; c) houver perfeita informação: então um equilíbrio competitivo será eficiente em termos paretianos. 2.° - Se: a) as famílias e as curvas de indiferença; a dos consumidores e das empresas forem normais (convexas); b) houver um conjunto completo de mercados; c) houver perfeita informação; d) os impostos de soma fixa (isto e, aqueles que não podem sofrer qualquer influencia do comportamento dos contribuintes) e as transferências forem realizadas sem custos: então, qualquer afectação de recursos os eficiente em termos paretianos pode ser realizada em equilíbrio competitivo, com impostos e transferências adequadas e). Nestes termos, uma melhoria paretiana e qualquer transformação que me/hora o bem-estar de pelo menos um individuo sem diminuir o dos demais; e uma situação é eficiente (óptimo relativo ou óptimo de Pareto) se não forem possível qualquer melhoria em termos paretianos. 26
  • 31. FINANÇAS PÚBLICAS 0 Estado tem para a teoria neo-clássica uma função própria de utilidade ou de preferência, da qual pode deduzir-se uma função de comportamento racional (função de reacção para a teoria dos jogos); Pareto veio estabelecer que aquela função de preferência colectiva se baseia exclusivamente nas funções de utilidade individuais, dando assim uma solução sua ao problema das relações entre o individual e o colectivo (problema da agregação). É ainda possível definir as condições necessárias para um óptimo de Pareto. Tomemos como conceito prévio o de taxa marginal de substituição de um bem X por um bem Y, que e a quantidade de Y que um consumidor tem de sacrificar para compensar o ganho de uma utilidade (unidade marginal) de X, substituindo X por Y, de modo a manter o mesmo nível de satisfação do conjunto dos dois bens (o conceito e generalizável a n bens). As condições de Pareto são: Iº a taxa marginal de um dado par de bens deve ser idêntica para todos os consumidores que consomem esses bens: 2.° - a taxa marginal de substituição de um dado par de factores de produção deve ser a mesma para todos os bens em que esses factores são empregues; 3." - a taxa marginal de substituição de um dado par de bens para qualquer consumidor e a mesma que a taxa marginal de transferência desses dois bens na produção (isto e, a quantidade de um bem que e necessária para produzir uma unidade marginal de outro bem). Em concorrência perfeita, estas três condições devem verificar-se, existindo então um «óptimo de Pareto em 1.0 grau». Fala-se, designadamente na elaboração da política económica, de óptimos de segundo grau (second best): quando, por virtude de um constrangimento, limitação ou dado de politica económica, não e possível realizar uma das condições de Pareto, então a melhor posição que pode atingir-se poderá determinar também a violação de outra ou todas as condições: estas, ainda que possam ser atingidas, podem deixar então de ser desejáveis9. 9 Podem distinguir-se diversos critérios de aferição do bem-estar igualitário (definindo condições mais restritivas, mas em termos bem diversos das de Pigou), dos quais o mais generalizado e o do maximin de Rawls, que define o nível óptimo, em cada situação, pela melhor situação possível para o menos favorecido dos sujeitos em confronto. Cf. RAWLS, A theory of Justice, 1972; R. NOZICK, Anarchy, State and Utopia, 1974; J. BUCHANAN, The limits of liberty, 1975; Para uma critica e mais bibliografia, SUGDEN, The political economy of public choice, 1981. A teoria do bem-estar e frequentemente omissa nos cursos de economia professados nas Faculdades de Direito: por isso se remete a exposição feita em MFP, I, 1974. Por outro lado, ela também o aspecto processual da tomada de decisões, desembocando então num terreno próximo da ciência politica: cf. inira § 4.°, p. 53. 27
  • 32. 28 UNIDADE I – FENÓMENO FINANCEIRO (FACTOS E NORMAS) V. Com base nas concepções dos paretianos, tem sido possível avançar mais, integrando na definição do bem-estar, em simples termos de eficiência, a determinação das condições de justiça social. Assim, sem abandonar os pressupostos individualistas da analise de Pareto, e possível defender que 0 bem-estar depende, não apenas das preferências reveladas por cada um dos membros da sociedade, mas também da visão que ele tem das condições gerais de bem-estar, em consequência de a posição social das pessoas e dos grupos resultar como que de um novo contrato social, em que as pessoas negoceiam a sua entrada na sociedade em condições de desconhecimento concreto das condições sociais (véu de ignorância: Rawls), mas pressupondo uma certa ordenação da sociedade. Em termos paretianos, e possível dizer que a situação w e melhor do que x, e y melhor do que z; mas não e possível comparar as restantes, o que significa que nenhuma solução e em absoluto a melhor de todas. Admitindo critérios de comparação intersubjectiva, que levam a projectar no bem-estar a concepção que cada um tem da melhor distribuição - entendida esta como a mais igualitária -, e possível então entender que w e melhor do que x, que e melhor do que y, que e melhor do que z. Passa-se então a considerar que não interessa apenas a afectação dos bens, mas também a sua distribuição óptima (logo, igualitária), para medir 0 bem-estar C). CAUSAS DE INCAPACIDADE DO MERCADO a) Razão de ordem A esta luz que podem pesquisar-se os casos em que o mercado não e eficiente para criar a optimização em certas áreas. Importa, então, ou prescindir da respectiva utilidade, ou buscar outras formas de produzir os bens em causa. A primeira alternativa tomaria impossível a vida em sociedade; pois renunciaria as normas jurídicas, a defesa, a segurança, a ordem social bens sem os quais todos os outros não poderiam ser produzidos. Antes de ver como podem eles ser oferecidos, vejamos melhor quais as situações mais típicas de incapacidade de mercado e observemos que, muito provavelmente, as categorias mencionadas não se excluem, podendo cumular-se, em algum caso concreto, características de virias delas ('). b) Os bens colectivos O primeiro caso é o dos bens colectivos (ou bens «puramente públicos» ou «públicos por natureza»), que são aqueles em que, para um determinado nível de existência ou provisão de bens, a 28
  • 33. FINANÇAS PÚBLICAS utilização por uma pessoa não prejudica minimamente a utilização por qualquer outra: e 0 caso de um farol, da defesa nacional, do serviço de patrulha costeira, do funcionamento geral dos órgãos de soberania. Ao invés, os bens individuais - ou «puramente privados» - se são consumidos por uma pessoa em determinada quantidade, não podem ser consumidos por outra: o pão que A come não pode ser comido por B. Podem enunciar-se assim as características típicas dos bens colectivos: 1. ° - Prestam, pela sua própria natureza, utilidades indivisíveis e proporcionam satisfação passiva (independente da procura em mercado: esta caracteriza a satisfação activa). 2.° - São bens não exclusivos, já que não é possível (em regra; pode haver, com maior ou menor custo, exclusão ou limitação artificial) privar alguém da sua utilização. 3. - São bens não emulativos: os utilizadores não entram em concorrência para conseguir a sua utilização. Por força deste conjunto de circunstâncias pode afirmar-se que os bens colectivos nunca serão oferecidos em mercado por um particular: só serão criados, sustentados e oferecidos por sujeitos desinteressados e tendencialmente dotados de autoridade, que definam e imputem as utilidades que eles prestam e possam cobrar coactivamente o respectivo montante. Na verdade, se não for assim, quem custeia a provisão do bem não pode impedir que qualquer outro beneficie dele, e de graça (a «boleia», de «borla»: «free rider». Só um benemérito ou alguém que possa excluir os outros do acesso, ou forçar todos a pagar, já que todos podem beneficiar, o poderão oferecer. c) Os custos decrescentes e o efeito de monopólio A produção dos bens é normalmente regida pela lei das proporções definidas, segundo a qual existe um ponto óptimo nas combinações de factores produtivos em que o custo de produção por unidade é o mais baixo possível (exceptuados casos de melhoria por alteração da própria combinação produtiva ou de melhor técnica e/ ou produtividade, como as economias de escala). Até ao ponto óptimo, os custos de produção são normalmente decrescentes: isto é, o aumento de uma unidade de um factor de produção diminui o respectivo custo (marginal e médio). Alcançado ele, entra-se na fase dos custos crescentes, isto é, o custo da unidade marginal - e portanto o custo médio de cada unidade - vai aumentando com a adição de novas unidades do factor de produção. Existem, todavia, certos tipos de actividades produtivas em que as coisas se não passam assim. Neles os custos diminuem sempre - 29
  • 34. 30 UNIDADE I – FENÓMENO FINANCEIRO (FACTOS E NORMAS) uniformemente ou não, consoante a função de produção respectiva -, tornando-se assim mais eficiente ter uma empresa a produzir 100 unidades do que 10 empresas produzindo 10 unidades. Assim sendo, o número de empresas no sector tende a diminuir – porque a empresa maior pode sempre oferecer os bens a custo inferiores aos das restantes; as empresas tendem então a possuir um poder de monopólio ou oligopólio, que pode levar a situação de mercado a identificar-se com a própria situação de monopólio (de facto, se resultar simplesmente da falta de acesso das demais; legal, se resultar de obstáculos legais a entrada de outros competidores; ou natural, se resultar de só a empresa que oferece dispor do bem natural ou da tecnologia que condiciona a sua oferta). Havendo vários produtores, as empresas menos eficientes ver-se-ão obrigadas a descer o seu preço ate ao nível da mera cobertura do custo médio de produção (e, a médio prazo, tenderão a retirar-se do mercado por falta de poder competitivo, se o preço descer abaixo do custo médio, ou menor poder financeiro, se as perdas se prolongarem). Então, se houver poucos produtores concertados ou um só produtor - a situação estável final tendera a ser esta -, os preços tenderão a situar-se acima do nível normal do preço em concorrência (a diferença é o que teoricamente se chama «renda do monopolista»); e as empresas farão um sobre-lho, teoricamente apenas limitado pela sua capacidade de produção e pelas condições de elasticidade da procura. Ora, esse nível de produção é ineficiente, no sentido de não corresponder aos critérios de optimização geral da economia (que são definidos pela estrutura concorrencial do mercado), pois limita anormalmente o consumo. E em termos políticos, o prejuízo causado aos consumidores e a posição tendencial de monopólio exprimem essa ineficiência, concretizando-a em situações privadas que se não pautam pelas regras normais do mercado. Estas situações ilustram uma concreta incapacidade do mercado: para restabelecer as regras do óptimo no mercado o Estado deve intervir, ou chamando a si a actividade, para baixar os preços em relação aos de um monopolista privado, ou limitando o preço por intervenção administrativa (fazendo-o baixar tendencialmente ao nível do custo marginal, definidor do equilíbrio em mercado concorrencial)·. d) As exterioridades e a actividade pública A interdependência entre as pessoas em sociedade gera situações difíceis de regular: na verdade, as decisões de um consumidor ou de um produtor reflectem-se por vezes - positiva ou negativamente sobre outras pessoas que com elas nada têm que ver: ora proporcionando-lhes utilidades externas (benefícios resultantes de comportamento alheio), ora impondo-lhes desutilidades externas (custos resultantes de comportamento alheio). Se eu ouvir musica muito alto em casa, tanto posso proporcionar aos vizinhos o 30
  • 35. FINANÇAS PÚBLICAS benefício de me ouvirem (se tiverem 0 mesmo gosto que eu...), como impor-lhes o custo de renunciarem aos bens do silêncio e do sossego. Os tais efeitos chamam exterioridades (externalidades).10 Estes efeitos externos da interdependência social são bem diversificados. Eles assumem importância porque não podem limitar-se a definição dos limites do direito de propriedade e da liberdade individual, se não forem eles próprios objecto de uma negociação entre particulares (caso em que se tornam bens mercantis) e se não houver um processo legal e abstracto de regular a produção e apropriação de certos efeitos externos (no caso referido, pode haver direitos pessoais de intimidade a respeitar). Seria impossível estabelecer uma regulamentação social tão minuciosa que tentasse disciplinar todas as formas de efeito externo - ela suprimiria, na prática, a própria liberdade e diversidade humana. Vejamos melhor. Algumas actividades de consumo ou produção podem ter efeitos positivos (proporcionarem utilidades) sobre pessoas diversas das que as desenvolvem (benefícios externos); outras podem ter efeitos negativos (imporem sacrifícios), traduzindo-se então em custos externos e é claro que tanto podem afectar relações entre dois agentes sociais - pessoas ou grupos - como podem envolver múltiplas relações externas. Se a função de utilidade do senhor i for Ui e se A, B, etc., representarem actividades de produção ou consumo diversas, haverá uma exterioridade quando: Ui X f (Ai, Bi, Aj) Porque a utilidade de independe de actos seus. (Ai, Bi) de actos do senhor j (Aj). Estes fenómenos de interdependência, extremamente frequentes, são fonte de desperdício para o seu produtor e criam bens mistos (em parte próprios, em parte de utilidade partilhada com outrem, 10 I) As exterioridades podern ainda ser tecnológicas (quando a produção ou o consumo de um agente económico se ref1ectem na produção ou no consumo de outro agente económico) ou pecuniárias (quando um comportamento influencia os preços e, por via destes, o bem-estar de outros produtores ou consumidores: a subida dos preços de uma empresa sobe os custos das outras ou altera o rendimento real dos consumidores): cf. BROWN e JACKSON, Public sector economics, cap. 2, por urna sintese. 31
  • 36. 32 UNIDADE I – FENÓMENO FINANCEIRO (FACTOS E NORMAS) determinado ou indeterminado); assim geram benefícios sociais ou custos sociais. Estes benefícios ou custos apenas redundam num problema de incapacidade do mercado quando não São tornados como objecto de negócio entre particulares, porque as pessoas envolvidas entendem que tal negociação seria excessivamente custosa para os intervenientes: os benefícios que resultariam de formar um mercado não seriam equivalentes aos custos de o formar. Perante esta situação, tanto pode suceder que a comunidade nada decida e os produtores da exterioridade tenham de resignar a vê-la aproveitada por outrem (um espectáculo que é observado de graça pelos vizinhos) como que os seus pacientes tenham de a suportar (o ruído de uma fábrica suportado pelos vizinhos). Ou pode suceder que o Estado ou a comunidade as tentem regular, estabelecendo regras gerais (é o caso das normas de Direito Civil em situações de vizinhança, por exemplo), regulações específicas (intervenção estadual) ou actuações estaduais (tributações do impositor do custo externo ou do beneficiário do proveito externo, despesa compensatória do paciente do custo extremo ou do produtor do beneficio extremo). E porque deve o Estado ou a comunidade intervir? Porque pode suceder que sem a sua intervenção se não realizem as condições do óptimo social: se a fábrica que polui não for tributada, em compensação do custo extremo da deterioração do ambiente que ocasiona a colectividade, produzirá a um nível que não é óptimo (produz demais, porque não contabiliza o custo social da poluição). E assim por diante... A comunidade, ou o Estado, podem pois resolver estas situações de diversas formas: quando o fazem, não pela simples regulação de interesses entre os intervenientes, mas pela socialização da exterioridade (impondo custos compensadores do beneficio apropriado ou apropriando proveitos gerados), então tem cabimento a actividade financeira: financiando a educação de todos, que dá proveitos a sociedade, e não só ao próprio; impondo contribuições à empresa poluidora, que tira benefícios do custo que impõe a comunidade (quem polui, paga). São as exterioridades fortes, que tendem a tomar-se públicas. e) Incerteza e risco na actividade económica Não é apenas nas exterioridades puras que se geram caracteres não mercantis indesejáveis (1). Também em situações de risco e incerteza deparamos com casos deste tipo. Os riscos previsíveis da vida podem ser objecto das transacções mais diversas. Com efeito, quase não há contrato sem uma dose de risco (risco contratual, de crédito, cobertura do risco: seguro), ou em que o risco é elemento essencial (contratos aleatórios) ou importante (especulação financeira). Em todos estes casos, o risco é integrado pelos mecanismos do mercado. Todavia, há casos em que os riscos se 32
  • 37. FINANÇAS PÚBLICAS tomam tão elevados, ou tão desproporcionados com as compensações ou os prémios pagos para segurar o risco, que não serve o método normal dos comportamentos livres: apesar de haver na população «arrisca dores» e «generosos do risco»; apesar de os riscos poderem ser assumidos individual ou colectivamente, reduzindo assim a probabilidade e o custo da compensação (fenómenos de mutualidade, por exemplo); apesar de as companhias de seguros poderem, com base no cálculo da probabilidade de riscos estatisticamente aferidos, aceitar assumir, em contrapartida de prémios de seguro, riscos objectivos (isto é, previsíveis por critérios de cálculo de probabilidades; quer assumindo os riscos na totalidade, quer partilhando-os com os segurados, para aumentar a sua atitude de responsabilidade e prevenção do risco)... Há casos em que podem acorrer em massa à seguradora pessoas cujas condições objectivas são tão más que, pela multiplicação dos riscos, a forçam a elevar os prémios: então, os bons segurados podem fugir da companhia, assumindo por si os riscos; isto pode reduzir de tal maneira a procura que a companhia desistirá de segurar esse risco. É o caso, por exemplo, do seguro de reforma generalizado. Em outros casos, poderá haver uma incerteza, cuja probabilidade de verificação não pode ser aleatoriamente prevista: ela na será coberta pelas empresas seguradoras. Sucede assim que as incertezas não cobertas pelo mercado; ou que o mercado apenas cobre por prémios muito elevados os riscos mais fortes para muitos membros da colectividade, que não podem ou não querem pagar esses prémios (doença, invalidez, velhice) cobrindo por prémios baixos os riscos menores. Existe aqui claramente incapacidade do mercado: e então - para alem das razoes distributivas e de justiça - a optimização só e possível se for assumida a cobertura dos riscos por entidades estranhas ao mercado (pense-se nas pensões de reforma da segurança social: quanto maior e a necessidade, maior será o preço das seguradoras: e os mais necessitados, que são os mais pobres, não poderão pagar esse seguro). Hipótese análoga poderá ser a de um empreendimento produtivo socialmente útil, mas tão arriscado que nenhuma empresa ousa enfrentar a sua elevada incerteza: é esta a razão por que o Estado assume, só ou em associação, a iniciativa produtiva em muitas empresas de rendibilidade extremamente aleatórias f) Outras situações Podem conceber-se outros tipos de incapacidade do mercado, Um deles é a incapacidade macroeconómica. O equilíbrio económico geral não é sempre alcançado pelo simples funcionamento dos mercados em sociedades concretas; ainda que o fosse, não esta provado que o equilíbrio económico realize sempre o óptimo 33
  • 38. 34 UNIDADE I – FENÓMENO FINANCEIRO (FACTOS E NORMAS) social. Então, a estabilidade (preços estáveis, emprego, equilíbrio externo) resultará, como KEYNES demonstrou, de uma acção sobre os agregados da economia, a qual só é possível através de políticas globais: definem-se então condições para a estabilização dos agregados globais, para a luta contra a desigualdade na distribuição do rendimento, para a qualidade da vida, o desenvolvimento ou a independência nacional (1). E então a incapacidade do mercado - agora em termos globais - que se revela. E a ela responde a política económico-social, produtora, ela própria de exterioridades (comportamentos obrigatórios em beneficio alheio) e de bens colectivos (alterações benéficas para todos na estrutura e na conjuntura económica) como resultado da acção do Estado. Um caso típico é o das políticas de redistribuição, que visam objectivos inalcançáveis pelo mercado. De natureza semelhante, mas com sentido e instrumentos opostos, e a intervenção nas situações de doença ou morte dos requisitos constitutivos do próprio mercado, que também determinam a sua incapacidade, mas de formas que normalmente podem resolver-se por acções de reposição dos condições de mercado. O caso das coligações entre empresas para prejudicarem os consumidores, cuja inclusão na incapacidade de mercado (como causa de poder monopolista, em sentido amplo) tem dado origem a interessantes aprofundamentos; ou da insuficiente informação dos consumidores, por exemplo. Então, as deficiências do funcionamento do mercado suscitam acções do Estado tendentes a recriar condições normais de mercado, as quais tanto podem consistir em intervenções sobre o comportamento dos sujeitos individuais (defesa da concorrência, v.g.) como na sua actividade económica própria (finanças públicas). A PROVISÃO PÚBLICA DE BENS a) Formas de suprir as incapacidades do mercado 1. As incapacidades do mercado obrigam pois, para haver níveis aceitáveis de bem-estar social, a actuações correctivas e supletivas de sujeitos económicos não dominados pela lógica do mercado. Tomemos, por exemplo, o caso do farol, bem colectivo que nunca poderá ser produzido para mercado (pondo agora de lado as situações, menos claras, em que há «bens públicos impuros», cujo uso não é necessariamente colectivo, porque a exclusão se torna possível e a consequente imputação individual das satisfações também: auto-estradas com portagem). A sua criação e funcionamento é incompatível com as regras do mercado e, no entanto, a necessidade do farol é sentida por todos os que fazem navegação costeira. As utilidades que ele presta não podem ser imputadas a um deterrninado sujeito económico que possa como tal 34