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Irlanda: ajustamento e crescimento
Esta série de três artigos tem por objetivo examinar o efeito de uma mudança de
percepção da trajetória econômica sobre os mercados, funcionando como exemplos
potenciais para o caso brasileiro hoje. Os outros artigos examinarão os casos do EUA
nos anos 1990 e Brasil nos anos 1960 após a implementação do PAEG (Plano de
Ação Econômica do Governo) em 1964.
Por mais de dois séculos, a Irlanda foi um dos países mais pobres da Europa. Nos
últimos 16 anos, tudo mudou com a Irlanda tendo um PIB per capita bem acima da
média dos principais países da União Européia. A figura 1 ilustra a trajetória do PIB
per capita da Irlanda e de algumas importantes economias nos últimos 80 anos.
                                    PIB per Capita - PPP
                1

           32000



                                                    EUA
           16000

                                                                      Irlanda
            8000                          UK
                                               Alem.


            4000



            2000
                          30        40    50   60      70   80    90        00

Durante os anos 50, a política econômica dos sucessivos governos foi calcada no
protecionismo, com forte intervencionismo do governo na esfera econômica. Uma
conseqüência destas políticas foi uma forte emigração, com a população sendo
reduzida em 5% ao longo da década (figura 2).

                                    População
           2
        Mil hab.
         4000

         3800

         3600

         3400


         3200


         3000


         2800
                50   55        60    65   70   75      80   85   90    95        00




Nos anos 1960, o governo começou a abandonar políticas protecionistas e iniciou a
implantação de uma estratégia de crescimento baseada nas exportações. Cortes
unilaterais de tarifas em 1964 e 1965 e o comprometimento, dentro de um acordo com
a Inglaterra de reduções anuais de 10% nas tarifas, tornaram a Irlanda mais atraente
para investimentos estrangeiros.
Como apresentado na figura 1, o crescimento reagiu de forma significativa. Enquanto
nos anos 1950 a média anual de crescimento do PIB per capita foi de 1.7%, entre
1960 e 1972 ela subiu para 3.9%.
No entanto, durante esse período, o resto da Europa também apresentou crescimento
elevado, sendo que as mudanças introduzidas tão somente permitiram que a Irlanda
participasse desse “progresso coletivo”, mantendo relativamente constante sua
posição na distribuição de renda da região.
No início dos anos 1970, a Irlanda continuou a avançar na liberalização do comércio e
em 1973 aderiu à comunidade Econômica Européia. No entanto, o período 1973 a
1986 é marcado pela adoção de políticas keynesianas para compensar os choques
negativos dos aumentos do preço do petróleo em 1973 e 1979. Ainda que um bom
número de países tenha adotado políticas compensatórias, as políticas expansionistas
adotadas na Irlanda acabaram debilitando fortemente a situação fiscal do país. Entre
1977 e 1981, por exemplo, todas as categorias de dispêndio aumentaram: os salários
aumentaram pelo efeito dos acordos nacionais; o emprego no setor público foi
incrementado na tentativa de reduzir o desemprego e um programa ambicioso de
expansão na infra-estrutura pública aumentou o dispêndio de capital. A inflação neste
momento atingiu 20%.
Em 1986, a relação dívida pública/PIB atingiu 116%, e o déficit nominal 7% do PIB. Os
altos níveis de dívida, pagamento de juros e gastos públicos tornaram a situação das
contas públicas insustentável. Neste momento, Charles Haughey é eleito primeiro-
ministro. Curiosamente, quando primeiro-ministro entre 1979-1982, o mesmo Charles
Haughey havia sido responsável pelas políticas que geraram a crise fiscal, e na
campanha em 1986 o seu partido advogava uma plataforma populista contrária ao
corte dos gastos públicos. O paralelo com o discurso eleitoral do PT é forte. No caso
da Irlanda, assim como no Brasil, foi a urgência da situação fiscal, e não uma
mudança ideológica, que causou a mudança de política econômica. Nas palavras de
Haughey: “As políticas que adotamos – cortes abrangentes de gastos, inclusive a
redução de 10.000 postos de trabalho no setor público – são ditadas exclusivamente
pelas realidades fiscais e econômicas, não sendo adotadas por qualquer razão
ideológica ou motivação política”.
Após reduzir gastos em 1987, o orçamento de 1988 previa o maior corte de gastos em
30 anos. As despesas correntes do governo foram reduzidas em 3% enquanto os
gastos na conta capital foram cortados em 16%. O financiamento inflacionário não era
uma alternativa, haja visto que a inflação havia sido reduzida para 4.6% em 1986.
As reduções de despesas públicas debelaram a crise. Como mostram as figuras 3 e 4,
o déficit nominal foi drasticamente reduzido (já em 1987 a Irlanda logrou obter um
superávit primário) até se tornar um superávit a partir de 1998. (Curiosamente, em
entrevista recente, o ministro Palocci deixou “escapar” que visa um superávit nominal
a partir de 2007!). A relação dívida/PIB foi inicialmente reduzida, estabilizada e, a partir
de 1994, cai monotonicamente.
Saldo Nominal/PIB                                 Dívida/PIB
          %      3                                        %      4

           4                                          120
           3
                                                      100
           2

           1
                                                          80
           0

           -1
                                                          60
           -2

           -3                                             40
           -4
           -5                                             20
                1988 1990 1992 1994 1996 1998 2000 2002        1988 1990 1992 1994 1996 1998 2000 2002


Apesar da redução dos gastos públicos ter sido implementada para debelar a crise
fiscal, e não como uma tentativa de construir um estado economicamente mais liberal,
nos anos que se seguiram, com a redução do tamanho e papel do governo na
economia, foi exatamente isto que se obteve.
Algumas restrições e comprometimentos, especialmente o fato de a Irlanda participar
da União Européia e ter assinado o Tratado de Maastritch, tornaram o ajuste crível e
de natureza permanente, afastando risco da volta do aumento de gastos, déficits e,
eventualmente, uma maior inflação. (Esse mecanismo, no caso brasileiro, seria a
renovação de um acordo com o FMI).
O nível de tributação na Irlanda era historicamente elevado. Sobre a pessoa física a
maior alíquota em 1975 chegava a 80%. Tanto a tributação sobre pessoas físicas
quanto jurídicas foi gradativamente reduzida. A redução foi mais dramática nos anos
1990. Em 2000, a alíquota máxima para pessoas físicas caiu para 46% (e a alíquota
padrão para 24%), caindo ainda mais em 2001 para 44% e 22%, respectivamente.
Para pessoas jurídicas a redução de impostos também foi significativa, com a alíquota
padrão caindo para 40% em 1996, 24% em 2000 e, em 2003 com o cancelamento de
uma alíquota especial de 10% para empresas manufatureiras e empresas envolvidas
com serviços comercializáveis internacionalmente, a alíquota padrão unificada foi
reduzida de 24% para 12.5%.
Além disso, a liberação do comércio internacional, iniciada nos anos 1960, continuou
com a tarifa média de importações sendo reduzida de 7.5% em 1985 para 6.9% em
1999.
Como conseqüência das sucessivas reduções de impostos, que teve como resultado
aumentar as liberdades econômicas e elevar significativamente o crescimento
econômico, a Irlanda hoje tem uma das menores cargas tributárias da União Européia,
perdendo somente para Luxemburgo. A figura 5 mostra que a taxa de crescimento
aumentou exatamente quando o índice de liberdades econômicas, no qual a
participação do estado na economia, regulamentação e tributação têm peso
significativo, foi para níveis elevados nos anos 1990. Em outros indicadores do
desenvolvimento social, como por exemplo, o Índice de Desenvolvimento Humano e
Índice de Competitividade, a Irlanda também se situa entre os primeiros colocados.
Índice de Liberdades Econômicas e Crescimento
         5

         9.0                                                                      12

         8.5                                                                      10

         8.0                                                                      8

         7.5                                                                      6

         7.0                                                                      4

         6.5                                                                      2

         6.0                                                                      0

         5.5                                                                      -2
            1970       1975        1980    1985      1990       1995     2000


Como veremos em todos os artigos da série, uma modificação da percepção sobre a
trajetória econômica tem um efeito significativo sobre o comportamento dos mercados,
especialmente da bolsa que, em essência, funciona como um termômetro das
expectativas.
A figura 6 mostra o comportamento do índice da bolsa irlandesa, indicando que a partir
de 1992, momento em que ficou claro para os participantes do mercado que as
transformações em curso seriam mantidas e aprofundadas, resultando, em ultima
instância, na eliminação dos déficits e redução da divida, a bolsa entrou em trajetória
de alta, multiplicando por um fator de 6 em oito anos, depois recuando com a
desaceleração da economia americana com a qual a Irlanda guarda laços estreitos. O
mesmo não havia acontecido quando da alta das bolsas americanas nos anos 1980,
refletindo uma situação econômica interna em deterioração.


                           Irlanda: Índice da Bolsa
               6
         Pts
      8000



      4000



      2000



      1000



        500
               86     88      90     92     94      96     98      00     02




João Marcus Marinho Nunes – 8 de novembro de 2003

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Irlanda Ajuste E Crescimento

  • 1. Irlanda: ajustamento e crescimento Esta série de três artigos tem por objetivo examinar o efeito de uma mudança de percepção da trajetória econômica sobre os mercados, funcionando como exemplos potenciais para o caso brasileiro hoje. Os outros artigos examinarão os casos do EUA nos anos 1990 e Brasil nos anos 1960 após a implementação do PAEG (Plano de Ação Econômica do Governo) em 1964. Por mais de dois séculos, a Irlanda foi um dos países mais pobres da Europa. Nos últimos 16 anos, tudo mudou com a Irlanda tendo um PIB per capita bem acima da média dos principais países da União Européia. A figura 1 ilustra a trajetória do PIB per capita da Irlanda e de algumas importantes economias nos últimos 80 anos. PIB per Capita - PPP 1 32000 EUA 16000 Irlanda 8000 UK Alem. 4000 2000 30 40 50 60 70 80 90 00 Durante os anos 50, a política econômica dos sucessivos governos foi calcada no protecionismo, com forte intervencionismo do governo na esfera econômica. Uma conseqüência destas políticas foi uma forte emigração, com a população sendo reduzida em 5% ao longo da década (figura 2). População 2 Mil hab. 4000 3800 3600 3400 3200 3000 2800 50 55 60 65 70 75 80 85 90 95 00 Nos anos 1960, o governo começou a abandonar políticas protecionistas e iniciou a implantação de uma estratégia de crescimento baseada nas exportações. Cortes unilaterais de tarifas em 1964 e 1965 e o comprometimento, dentro de um acordo com a Inglaterra de reduções anuais de 10% nas tarifas, tornaram a Irlanda mais atraente para investimentos estrangeiros.
  • 2. Como apresentado na figura 1, o crescimento reagiu de forma significativa. Enquanto nos anos 1950 a média anual de crescimento do PIB per capita foi de 1.7%, entre 1960 e 1972 ela subiu para 3.9%. No entanto, durante esse período, o resto da Europa também apresentou crescimento elevado, sendo que as mudanças introduzidas tão somente permitiram que a Irlanda participasse desse “progresso coletivo”, mantendo relativamente constante sua posição na distribuição de renda da região. No início dos anos 1970, a Irlanda continuou a avançar na liberalização do comércio e em 1973 aderiu à comunidade Econômica Européia. No entanto, o período 1973 a 1986 é marcado pela adoção de políticas keynesianas para compensar os choques negativos dos aumentos do preço do petróleo em 1973 e 1979. Ainda que um bom número de países tenha adotado políticas compensatórias, as políticas expansionistas adotadas na Irlanda acabaram debilitando fortemente a situação fiscal do país. Entre 1977 e 1981, por exemplo, todas as categorias de dispêndio aumentaram: os salários aumentaram pelo efeito dos acordos nacionais; o emprego no setor público foi incrementado na tentativa de reduzir o desemprego e um programa ambicioso de expansão na infra-estrutura pública aumentou o dispêndio de capital. A inflação neste momento atingiu 20%. Em 1986, a relação dívida pública/PIB atingiu 116%, e o déficit nominal 7% do PIB. Os altos níveis de dívida, pagamento de juros e gastos públicos tornaram a situação das contas públicas insustentável. Neste momento, Charles Haughey é eleito primeiro- ministro. Curiosamente, quando primeiro-ministro entre 1979-1982, o mesmo Charles Haughey havia sido responsável pelas políticas que geraram a crise fiscal, e na campanha em 1986 o seu partido advogava uma plataforma populista contrária ao corte dos gastos públicos. O paralelo com o discurso eleitoral do PT é forte. No caso da Irlanda, assim como no Brasil, foi a urgência da situação fiscal, e não uma mudança ideológica, que causou a mudança de política econômica. Nas palavras de Haughey: “As políticas que adotamos – cortes abrangentes de gastos, inclusive a redução de 10.000 postos de trabalho no setor público – são ditadas exclusivamente pelas realidades fiscais e econômicas, não sendo adotadas por qualquer razão ideológica ou motivação política”. Após reduzir gastos em 1987, o orçamento de 1988 previa o maior corte de gastos em 30 anos. As despesas correntes do governo foram reduzidas em 3% enquanto os gastos na conta capital foram cortados em 16%. O financiamento inflacionário não era uma alternativa, haja visto que a inflação havia sido reduzida para 4.6% em 1986. As reduções de despesas públicas debelaram a crise. Como mostram as figuras 3 e 4, o déficit nominal foi drasticamente reduzido (já em 1987 a Irlanda logrou obter um superávit primário) até se tornar um superávit a partir de 1998. (Curiosamente, em entrevista recente, o ministro Palocci deixou “escapar” que visa um superávit nominal a partir de 2007!). A relação dívida/PIB foi inicialmente reduzida, estabilizada e, a partir de 1994, cai monotonicamente.
  • 3. Saldo Nominal/PIB Dívida/PIB % 3 % 4 4 120 3 100 2 1 80 0 -1 60 -2 -3 40 -4 -5 20 1988 1990 1992 1994 1996 1998 2000 2002 1988 1990 1992 1994 1996 1998 2000 2002 Apesar da redução dos gastos públicos ter sido implementada para debelar a crise fiscal, e não como uma tentativa de construir um estado economicamente mais liberal, nos anos que se seguiram, com a redução do tamanho e papel do governo na economia, foi exatamente isto que se obteve. Algumas restrições e comprometimentos, especialmente o fato de a Irlanda participar da União Européia e ter assinado o Tratado de Maastritch, tornaram o ajuste crível e de natureza permanente, afastando risco da volta do aumento de gastos, déficits e, eventualmente, uma maior inflação. (Esse mecanismo, no caso brasileiro, seria a renovação de um acordo com o FMI). O nível de tributação na Irlanda era historicamente elevado. Sobre a pessoa física a maior alíquota em 1975 chegava a 80%. Tanto a tributação sobre pessoas físicas quanto jurídicas foi gradativamente reduzida. A redução foi mais dramática nos anos 1990. Em 2000, a alíquota máxima para pessoas físicas caiu para 46% (e a alíquota padrão para 24%), caindo ainda mais em 2001 para 44% e 22%, respectivamente. Para pessoas jurídicas a redução de impostos também foi significativa, com a alíquota padrão caindo para 40% em 1996, 24% em 2000 e, em 2003 com o cancelamento de uma alíquota especial de 10% para empresas manufatureiras e empresas envolvidas com serviços comercializáveis internacionalmente, a alíquota padrão unificada foi reduzida de 24% para 12.5%. Além disso, a liberação do comércio internacional, iniciada nos anos 1960, continuou com a tarifa média de importações sendo reduzida de 7.5% em 1985 para 6.9% em 1999. Como conseqüência das sucessivas reduções de impostos, que teve como resultado aumentar as liberdades econômicas e elevar significativamente o crescimento econômico, a Irlanda hoje tem uma das menores cargas tributárias da União Européia, perdendo somente para Luxemburgo. A figura 5 mostra que a taxa de crescimento aumentou exatamente quando o índice de liberdades econômicas, no qual a participação do estado na economia, regulamentação e tributação têm peso significativo, foi para níveis elevados nos anos 1990. Em outros indicadores do desenvolvimento social, como por exemplo, o Índice de Desenvolvimento Humano e Índice de Competitividade, a Irlanda também se situa entre os primeiros colocados.
  • 4. Índice de Liberdades Econômicas e Crescimento 5 9.0 12 8.5 10 8.0 8 7.5 6 7.0 4 6.5 2 6.0 0 5.5 -2 1970 1975 1980 1985 1990 1995 2000 Como veremos em todos os artigos da série, uma modificação da percepção sobre a trajetória econômica tem um efeito significativo sobre o comportamento dos mercados, especialmente da bolsa que, em essência, funciona como um termômetro das expectativas. A figura 6 mostra o comportamento do índice da bolsa irlandesa, indicando que a partir de 1992, momento em que ficou claro para os participantes do mercado que as transformações em curso seriam mantidas e aprofundadas, resultando, em ultima instância, na eliminação dos déficits e redução da divida, a bolsa entrou em trajetória de alta, multiplicando por um fator de 6 em oito anos, depois recuando com a desaceleração da economia americana com a qual a Irlanda guarda laços estreitos. O mesmo não havia acontecido quando da alta das bolsas americanas nos anos 1980, refletindo uma situação econômica interna em deterioração. Irlanda: Índice da Bolsa 6 Pts 8000 4000 2000 1000 500 86 88 90 92 94 96 98 00 02 João Marcus Marinho Nunes – 8 de novembro de 2003