O documento analisa a eficácia de prisões e assassinatos seletivos de líderes do Hamas em acabar com o terrorismo palestino. Apesar de Israel ter eliminado vários líderes importantes do Hamas, sua popularidade e capacidade de ataque continuaram a crescer com o tempo. Estudos mostram que tais ações não levaram a uma redução sustentada de ataques terroristas. O Hamas permanece como uma ameaça significativa à segurança de Israel, demonstrando que a força militar sozinha não pode derrotar o terrorismo.
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Fracasso e esperança (parte 2)
04/08/2014 Escrito por Marcel Beer Kremnitzer Sem categoria
Na primeira parte do artigo, foi comprovada a ineficácia das operações militares
israelenses para encerrar, definitivamente, a resistência terrorista palestina. O
enfrentamento do Hamas e de outros grupos trouxe vitórias para Israel; no entanto,
pontuais e de curto prazo. Essa descoberta não surpreende, já que a pesquisa da RAND
previu as escassas chances, considerando o histórico desde 1968, de um grupo terrorista
cessar suas atividades como resultado direto de uma guerra. Análises (1, 2, 3) indicam que
o Hamas deve sair fortalecido da atual operação, como já havia sido previsto. Nesta
segunda parte, será analisada a eficácia de prisões e mortes de lideres do Hamas, por meio
de ações especificas e sem engajamento militar extenso. Importante ressaltar que a
pesquisa da RAND aborda somente o fim definitivo e incondicional do terrorismo,
desconsiderando pausas temporárias, tréguas ou atentados pontualmente evitados.
O primeiro inimigo israelense eliminado por “assassinato seletivo”, em 1956, foi Mustafa
Hafez, Diretor de Inteligência egípcio na Faixa de Gaza. Desde então, o número de pessoas
(palestinas ou nacionais de outros Estados) mortas por Israel, usando esse método, é
maior que 200. A Organização Não-Governamental israelense B’Tselem estima que, entre o
início da Segunda Intifada (29/set/2000) e o fim de 2010, 239 combatentes palestinos
foram mortos por sikul memukad (“prevenção focalizada”), que é a expressão utilizada em
Israel para fazer referencia a esta prática. No que tange a prisões, a última estatística
oficial (Maio de 2014) apontava 6366 palestinos nas prisões israelenses, sendo 5053 por
questões criminais e de segurança e os demais 1313 por presença ilegal no país.
Israel foi, em geral, bem-sucedido quando buscou matar os personagens do Hamas. Entre
as vitimas fatais de renome, destacamos: Yahya Ayyash (principal desenvolvedor de
bombas e foguetes); Salah Shehadeh (chefe do braço armado); Ismail Abu Shanab (oficial
de alto escalão, considerado pragmático e moderado); Ahmed Yassin (fundador e líder
espiritual); Abdel Aziz al-Rantisi (fundador e chefe do braço político); Adnan al-Ghoul (líder
do braço armado e criador do foguete Qassam); Nizar Rayan (clérigo fundamentalista);
Said Seyam (Ministro do Interior); e Issa al-Batran (líder do braço armado e fabricante de
bombas e foguetes). Houve, entretanto, um famoso caso de retumbante fracasso. A
tentativa de envenenar Khaled Meshaal na Jordânia, em 1997, por ordem do então
primeiro-ministro Bibi Netanyahu, resultou em dupla crise diplomática com o Rei Hussein
e o presidente estadunidense Bill Clinton. Bibi forneceu o antídoto para o veneno e foi
pessoalmente à Jordânia, desculpar-se perante o Rei. Meshaal sobreviveu e foi alçado,
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entre os palestinos, à categoria heroica de “mártir vivo”.
O Hamas é um movimento islâmico popular, que recruta a maioria de seus membros de
famílias pobres. No intuito de agradar seus apoiadores, mantém uma estrutura de
filantropia e caridade, especialmente para a população de Gaza. A pesquisa da RAND, na
página 39, explica:
A maioria dos grupos terroristas (…) precisa de uma base de apoio, a qual
forneça suporte material, como dinheiro, esconderijos e recrutas. Eles também
precisam de um ambiente hospitaleiro para sobreviver.
Nesse sentido, é importante analisar se e como os assassinatos seletivos e prisões de
líderes do movimento alteraram a evolução do apoio oferecido pela população.
A primeira
eliminação sofrida pelo Hamas, em janeiro de 1996, foi Ayyash, “O Engenheiro”. Analisando
o gráfico, nota-se que exatamente nessa época o grupo observou forte declínio em sua
popularidade, entre setembro de 1995 (16,6%) e março de 1996 (5,8%). No entanto, são os
eventos anteriores e posteriores ao sikul memukad de Ayyash que explicam a piora na
imagem do Hamas. Em julho e agosto de 1995, o Hamas executou dois atentados suicidas,
matando onze israelenses. Em setembro, foi assinado o acordo de Taba entre Israel e OLP,
no curso das negociações de paz de Oslo. Pesquisas de opinião apontavam que o acordo
de Taba era apoiado por 72,1% do público palestino e que 85% votariam, nas eleições, em
candidatos que apoiassem o processo de paz. Os atentados do Hamas foram vistos, por
uma população momentaneamente moderada, como prejudiciais a esse processo, o que
explica a perda de apoio observada.
Os assassinatos seletivos e prisões seguintes não influenciaram negativamente a imagem
do grupo fundamentalista perante os palestinos. A Segunda Intifada, entre setembro de
2000 e fevereiro de 2005, foi o cenário da execução de dezenas de membros do Hamas,
especialmente dos grandes líderes citados acima. Ademais, entre janeiro de 2001 e janeiro
de 2006, o número de prisioneiros palestinos em Israel aumentou 467%. Apesar disso,
desde meados de 1996 pelos 10 anos seguintes, a popularidade do Hamas cresceu
solidamente, atingindo 37,7% em março de 2006. A queda observada na sequência não foi
motivada por prisão ou sikul memukad de membros, mas sim pelo confronto com o grupo
rival Fatah e, na tendência que segue até hoje, pela má percepção da administração desse
território.
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Outro aspecto a ser analisado é o operacional, ou seja, quão prejudicada fica a capacidade
de ataque do Hamas após seus líderes serem presos ou mortos. Trabalho publicado em
2006 pelo College of William and Mary analisou o número de atentados terroristas, e as
vítimas resultantes, antes e após os assassinatos de Salah Shehade e Sheik Ahmed Yassin.
O insucesso israelense está assim descrito:
a questão é (…) se a morte de Shehade contribuiu para a redução de ataques
terroristas contra israelenses; a estatística não gera essa conclusão. A estatística
mostra que (…) o número de israelenses mortos cresceu, assim como a
quantidade de ataques.
falando da execução de Yassin:
terrorismo não foi evitado, já que os ataques aumentaram em número. (…)
Ademais, se um dos objetivos de eliminar líderes espirituais é acabar com a
motivação de uma organização terrorista, então esse método foi um claro
fracasso, tendo em vista que a motivação permaneceu alta.
200 mil palestinos no
funeral do Sheik Ahmed
Yassin em Gaza
Outro estudo, publicado pelo Strategic Studies Institute do Exército dos EUA em dezembro
de 2008, é mais abrangente, pois elenca os assassinatos seletivos entre as diversos
métodos israelenses no combate ao terrorismo palestino. Ainda que associe-se a prática
de sikul memukad a diversas outras (fora do foco da pesquisa da RAND), e ainda que
conceda-se vitórias momentâneas ao contraterrorismo israelense, o longo prazo é
inexorável:
Israel atingiu vitórias significativas em sua guerra contra os palestinos, ao fazer
uso de assassinatos seletivos de lideranças; boicotes; cortes de eletricidade;
ataques e detenções preemptivas; e punições a famílias, parentes, bairros (etc.)
de militantes. Sua lógica contraterrorista baseia-se em reduzir a capacidade
organizacional dos insurgentes. (…) No entanto, um advogado da causa admitiu
que Israel não havia “vencido o ímpeto de resistência” [dos palestinos]. Essa