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Tanta palavra,
Tanto trabalho,
Tanto diagnostico
Avassalador,
Tanta cultura
Entre a dor e a cura,
Tanta procura
Pelo fim da dor,
Tanta rotina,
Tanto medicamento,
Tanto equipamento
De alto valor,
E nada disso,
Aparentemente,
É suficiente
Pra garantir um cuidador...
É necessário
Mais do que técnica,
Mais do que máquina
Ou do que titulo
De Doutor...
A tecnologia
Não acaba com a tristeza,
O antibiótico
Não trata o sofredor...
É necessário
Revirar o dicionário
Para encontrar
Uma fonte de calor
Que afaste o medo
E faça companhia
Sem se importar
Com nome, idade ou cor...
É assim o amor...
É ele o que nos basta.
Sem ele tudo é fraco
E enganador.
Experimente algum dia
Não ter nada,
Além de um simples olhar
Confortador,
Além de um aperto de mão
Ou de um sorriso,
Além de um gesto
Doce e apoiador...
Experimente nesse dia
Não ter nada,
E esse dia será
Revelador
Porque não será preciso
Mais que nada
Se, tendo nada,
Você tiver amor...
Porque a vida sem amor
É uma vida esvaziada
Mas que pode ser transformada
Pelo amor...
Amor que é tudo de bom,
Que a tudo agrada,
Amor essencial,
Profundo amor...
05
Esta é uma obra de domínio publico.
Seu conteúdo pode ser reproduzido, compartilhado, modificado completamente ou em parte sem necessidade
de autorização ou citação dos créditos autorais.
É também permitido copiar, mostrar, baixar, distribuir, reproduzir, republicar ou retransmitir qualquer
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qualquer trabalho derivado com base nessas imagens, textos ou documentos sem o consentimento do autor,
sendo recomendado, entretanto, que se evite sua comercialização.
Uma cópia digital para livre download está disponivel no site www.alemdauti.com.br
A poesia sopra onde quer. Tentar aprisioná-la é priva-la de sua liberdade.
Simples assim:
A palavra, depois de escrita, não tem dono,
Se fica guardada, não tem serventia,
Guardar a palavra é condená-la ao abandono,
Guardar a palavra é subtrair-lhe a poesia...
A palavra, se guardada, é um Rei sem trono,
É um Pedro Alvares Cabral sem a Bahia.
Mas uma vez espalhada, perde o sono,
Disseminada, cai na folia...
Compartilhar a palavra é um mandamento
Que permite à palavra o livramento
E que tempera a palavra com alegria...
Compartilhar a palavra, incondicionalmente,
É permitir-lhe a liberdade inconsequente,
É entregar-lhe a sua carta de alforria...
07
Edição comemorativa do
II Encontro de Pais e Cuidadores de Bebês Prematuros
Campos dos Goytacazes
15 e 16 de maio de 2014
Dedicatória
Aos meus pais, que também foram pais prematuros,
Aos pais e aos bebês prematuros do mundo inteiro,
Aos seus familiares,
Aos cuidadores que dedicam seu aprendizado e seu dia a dia à nobre tarefa de amenizar dores,
À equipe de profissionais da Unidade Neonatal do Hospital dos Plantadores de Cana de Campos
pelo zelo e pela retidão com que conduz sua trajetória diária e pela forma carinhosa com que
me recebeu no meu retorno à essa casa,
Aos amigos Lívia, Henrique e Aymee,
À amiga Sidianara Ofrante Nogueira,
Estes poemas
E nosso carinho.
Luís Tavares.
As mãos da amiga e as mãos de Deus
Era fevereiro de 2014 quando a amiga querida partiu apressadamente e foi viver numa das várias
moradas do Pai que está nos Céus.
Não houve tempo para as despedidas que desejaríamos ter oferecido à ela.
Partiu apressadamente.
Encontramos nos nossos arquivos essa única imagem que guardamos dela.
Com uma de suas mãos, ela toca com firmeza e docilidade a cabecinha do pequeno bebê, alma apressada,
oferecendo a ele proteção e apoio, enquanto com a outra empresta limites aos seus movimentos,
acalmando sua agitação e mostrando, em silencio, a percepção de sua companhia para que ele não se
sinta tão sozinho ali na Unidade Neonatal distante de seu lar.
Fevereiro de 2014.
Apressadamente a amiga nos deixou, e como recordação desse convívio de trabalho em comum,
guardamos tão somente essa fotografia que não mostra seu rosto nem seu sorriso, mas traduz o que de
mais significativo ela distribuiu por aqui entre nós: apoio, proteção, acolhimento e companhia.
A poesia arrisca acreditar que a amiga gentil terá sido recebida pelas mãos do Criador, uma delas
colocada com firmeza e suavidade sobre sua cabeça esgotada pela luta de seus últimos meses entre nós,
como sinal de proteção e apoio, e a outra lhe trazendo um abraço gentil como dá quem oferece companhia
para a caminhada que segue para além da vida como a conhecemos e como nos acostumamos a entender.
Fevereiro de 2014.
Amiga gentil.
Leva no seu coração nossa saudade.
Não nos solte de suas mãos generosas.
Não nos deixe sem sua proteção firme, sem sua companhia sincera.
Estamos orando e torcendo sempre por você
Porque desde então
Sidianara Ofrante Nogueira
Nos campos do Senhor
Passou a significar
Nome de anjo...
Com carinho.
Luis Tavares.
13
Os poemas para almas apressadas
Esta coletânea de versos e rimas é dedicada ao universo dos bebês que nasceram antes do tempo que era
para ser, apressadamente.
“Almas apressadas” é uma expressão que ouvi pela primeira vez em conversa com o colega obstetra
Ricardo Herbert Jhones em 2010, durante o XI Encontro de Aleitamento Materno em Santos,
SP.
Estas pequenas alminhas apressadas, capazes de mobilizar um sem-número de iniciativas durante sua
passagem pela Unidade Neonatal e em muitos casos durante toda a sua vida, são aqui lembradas na
sua dor, na sua força, nos seus clamores, na sua integralidade, seus pais, seus cuidadores e até mesmo
nas horas tristes e irreversíveis de sua partida.
São versos, alguns inéditos, outros já publicados nos blogs www.quasepoesia.blogspot.com e
www.alemdauti.com.br, e no volume “Uma Declaração Universal de Direitos para o Bebê
Prematuro”, de 2011, e pela primeira vez reunidos num único volume para homenagear nossos pequenos
grandes irmãozinhos e suas famílias.
São fragmentos de carinho e afeto pelo que aprendemos diariamente sobre sua infinita grandeza.
Decidimos oferecer a cada poema uma nota de rodapé a fim de que o leitor menos familiarizado com o
tema da prematuridade possa perceber o significado das poesias para além das rimas e entender a
combinação do universo poético com a realidade clinica da rotina de uma Unidade Neonatal.
Que Deus esteja com cada um de nós a cada dia em nossa caminhada.
Luís Tavares
15
A decisão está tomada, e as rodas mal azeitadas da maca guincham pelo corredor estreito, driblando macas,
cadeiras, enfermeiras e passantes. Para ela o mundo repentinamente se transforma em tetos mofados e
luminárias sujas, que passam diante de sua face pálida como um filme antigo. Os olhos sequer se mexem.
Fixos no alto, apenas aguardam a entrada no centro cirúrgico para voltarem a piscar.
O cheiro das limpezas, o brilho ofuscante de mil luzes, o som dos metais tilintando nas mesas e as rodas que
param de guinchar lhe anunciam a chegada à sala de operações. Com esforço ajusta seu corpo cansado na
mesa cirúrgica, auxiliada por pessoas sem nome, sem fala e sem rosto. Pendurado no braço o manguito; na
dobra descorada do cotovelo a fina agulha penetra, por onde escoa um líquido cristalino. No teto a roda
luminosa se acende, e pode ver seus múltiplos rostos aflitos refletidos nos anteparos das lâmpadas.
Mantém-se em silêncio devocional, como se qualquer som quebrasse uma norma da qual não saberia a razão.
Apenas obedece maquinalmente as ordens que lhe são dirigidas. “Vire-se para este lado”, diz um senhor
mascarado de voz grossa, enquanto a enfermeira aperta seu queixo contra o peito desnudo. “Não respire. Se
você ficar bem quietinha termino bem rápido”. Sente um choque elétrico a lhe percorrer a coluna e retesa o
corpo em resposta, mas em seguida percebe as sensações paulatinamente desaparecendo. Dividida ao meio,
seu corpo de baixo para e dorme; o corpo de cima silencia e espera. E reza.
Depois as higienes, os panos, as frases desconexas que lhe chegam aos ouvidos. Palavras cruzam a sala
sem que delas se capte o sentido. Apenas o medo, como um código secreto compartilhado, percorre as almas
da sala.
Então o silêncio. Por alguns instantes todos estão imóveis. Nada se ouve. Finalmente a lâmina grave fere
a carne, abre o espaço, penetra. Depois disso, apenas o “bip” das máquinas quebra a monotonia sonora.
Pequenos estalidos se seguem. Dos presentes, nenhum som, sequer uma expressão. A luz intensa cega, o
tempo fica estanque. As camadas da carne rubra vão sendo abertas, uma após a outra, até que a nave uterina,
com sua cor rosada e brilhante, aparece diante do brilho ofuscante do foco de luz. Ali dorme nosso herói,
mas será preciso acordá-lo.
Um, dois, três cortes precisos da navalha fria. O amnionauta, encerrado em seu mundo de sonhos, nem
percebe que seus devaneios de sons e luzes tênues serão interrompidos pelo nosso chamado. Um último corte
e chegamos no interior da diminuta esfera. Pela translucência das camadas, que envolvem o universo ínfimo
do pequeno ser, podemos ver que ainda dorme. Com um golpe derradeiro e definitivo, rompemos a bolsa, e os
panos verdes que cobrem a nudez se escurecem com o líquido amniótico que escorre sem pudor.
É o tempo de nascer.
Introdução
Dois ou três movimentos e a cabeça salta para fora da ferida. “Desculpe, amigo. Não era seu tempo, mas
foi preciso lhe resgatar”. Seu corpo miúdo escorrega para a sala e para o mundo, deixando como rastro o
frágil fio que o liga à placenta. As mãos enluvadas suportam o corpo esquálido que, de tão frágil, mal pesa.
Ao invés da pele uma fina camada transparente róseo-violácea. Ao invés de cabelo, uma tênue penugem
que mal lhe cobre a cabeça. Mal saído do claustro materno ele abre os braços e por um instante parece
procurar algo. Ou alguém. Sua expressão é de dor e angústia, a mais antiga de nossas emoções. “O que faço
aqui? Porque interromperam meu sono?” pergunta-se. Seus dedos finos e azulados abrem-se e procuram
agarrar a luva ensanguentada. Ele contrai seu corpo minúsculo, estende mais uma vez os braços enquanto
aguardamos ansiosos os primeiros sons. Sofre, pela primeira vez, a dor do excesso de espaço. “Onde está
minha mãe, que me envolvia e acalentava desde quando minhas primeiras células se dividiram? Onde está
aquela que tocava com doçura cada pedaço do meu corpo? Abro os braços e só o que agarro é o espaço, o
nada. Estou só.”
Abre a pequenina boca e quando esperamos um grito escutamos apenas um tímido e fino sibilo. Um
lamento. A sala novamente se enche de silêncios. Cordões são cortados, amarra das almas desfeita. Os
panos verdes o envolvem num triste celofane. Um sibilo a mais e ele é levado para distante dos nossos
olhos.
Os corpos se separam em salas contíguas, mas a mulher cortada ainda jaz à nossa frente. Temos trabalho a
fazer e o mais difícil de todos é suturar a alma dilacerada de uma mãe. Corroída pela culpa e pela angústia,
olha para a porta que recém se fecha. Seus ouvidos se agrandam para escutar mais um sinal, por menor que
seja, do pedaço de si mesma que há pouco se foi. Fecha os olhos e reza em silêncio. Chora pela separação,
pelo medo de perder, pela tristeza de ver seu filho sofrer. Imaginariamente abre seus braços e o abraça, junto
ao colo. Traz o rostinho amarrotado e lívido para perto do seu e sussurra em seus pensamentos “Mamãe
está aqui. Não vamos nos separar. Sei o quanto precisas de mim e também sei o quanto é preciso que eu
esteja ao seu lado. Não se desespere, mamãe está aqui”.
E nós, ao seu lado, apenas nos calamos e testemunhamos sua dor.
Na sala ao lado, outra batalha se trava. Consternados perguntamos àquele pequenino que se posta à nossa
frente: “Por que agora? Por que tão cedo? Qual a pressa em chegar a um mundo de expiações e
sofrimentos?”.
Sua resposta é apenas o choro fino, o lamento de uma alma apressada.
Dr. Ricardo Herbert Jhones (Médico obstetra, Porto Alegre, RS)
Quanta felicidade! Que honra! Recebi o convite para participar do livro Poemas para
Almas apressadas. Falar de mim, da minha filha, agora que a dor.... passou?
Parecia...
Mas ela estava ali, tão exposta, a cada linha, a cada frase.
Às vezes foi preciso uma pausa. Parar, respirar, deixar a lágrima correr para seguir em
frente.
Foi preciso voltar ao tempo, sentir o cheiro, o gosto, ouvir o som, perceber o coração e alma
serem dilacerados dia a dia durante os 232 dias passados na UTI Neonatal.
Foi preciso olhar em volta, lembrar que nesse exato momento tem outras mães passando pelo
mesmo momento que um dia estive. Lembrar do quanto eu procurei por outros depoimentos,
outras histórias, o quanto cada uma delas fortalecia a minha esperança.
E por isso voltei e revivi cada momento. Com o distanciamento da lembrança e o medo que
vira e mexe teima em aparecer. Às vezes aparece num espirro. Mas parece ser apenas um
estalo para que ele grite dentro do peito, como todos os gritos que foram abafados desde o
momento que soube que teria em meus braços uma alma apressada.
Dessas que não espera a hora, a preparação, não espera a notícia se espalhar. Apenas chega
sua hora. E ela chega.
Chega para mudar a rotina, a vida, a concepção de mundo, de tempo e de espaço. Que chega
para falar de mamadeira em gotas, de peso em gramas, de respiração em saturação.
E chega para falar de amor. Um amor que transborda, que transcende, que exagera. Uma
alma apressada, como se não pudesse mais esperar para amar.
Ressignificando
Lívia Ressiguier *
*Lívia aceitou o convite para colaborar com este trabalho, todo feito inspirado na sua história valorosa de mãe de .UTI
A dor*
Por que é que você chega sempre assim, estabanada,
Desinibida, desarrumada,
Causando tanta desorganização?
Por que é que é sempre tão sem paciência,
Por que se comporta com tanta displicência,
Por que é que age com tanta desatenção?
Por que é que é sempre assim tão turbulenta,
Por que é que chega sempre com tormenta,
Como o Katrina?
Por conta de que tanta adrenalina?
E se eu cuidasse de você, dor,
Com o mesmo cuidado de quem cuida de um amor?
E se tratasse você com mais respeito?
E se eu me preparasse
Pra toda vez que você chegasse
Encontrasse tudo pronto, do seu jeito?
E se eu arrumasse tudo com carinho,
Tudo do seu jeitinho?
Você ficaria contente?
Você se comportaria de um modo diferente?
Então, minha amiga dor, combinamos assim:
Eu cuido de você, você cuida de mim,
E a gente não se descuida nem se maltrata...
Eu me preparo pra sua chegada,
Você se aproxima bem mais arrumada,
E a gente não se machuca nem se mata...
Quem sabe um dia a gente não se entende,
Você me compreende?
Será que está bom assim dessa maneira?
Nós temos um acordo, companheira?
*Ador não necessariamente tem que ser acompanhada de sofrimento.Autilização de mecanismos simples e não medicamentosos
pode proteger com muita eficiência a carga exagerada de estímulos nocivos muitas vezes presentes na Unidade Neonatal.
21
A Lei de Deus*
O prematuro que não consegue respirar,
A gestante que dá à luz na entrada do Hospital,
Os níveis de bilirrubina que insistem em não baixar,
A imagem sugestiva de hemorragia intracerebral,
A sepsis que continua a se agravar,
A insuficiência cardíaca resistente ao digitálico,
O cateterismo que não para de sangrar,
O prematuro que não acha vaga numa Neonatal,
E a Lei de Deus, sem defeitos, sem rasuras,
Vai se cumprindo entre dores e amarguras,
Entre lamentos, lágrimas e feridas,
E embora às vezes nos confundindo,
Segue, intocada e pura, se cumprindo,
Dando outro significado às despedidas...
UTI
*ALei de Deus não tem tradução simultânea.
Muitas vezes vai ser preciso esperar muito tempo, muitas vezes, muitas gerações até, para que seus
significados sejam compreendidos com clareza pelo coração do homem, mesmo o que crê.
23
A mãe e o filho*
A mãe e o filho, a dura realidade:
A dor, a saudade, o medo, a impotência...
A distância machucando a maternidade,
A maternidade alimentando a sobrevivência.
A mãe e o filho, e entre os dois, a tempestade,
E a UTI Neonatal toda feita de ciência.
A mãe e a sua dor maior que a humanidade...
O filho e a sua dor banhada em obediência...
A mãe e o filho, almas despedaçadas,
Vidas que era pra estarem juntas, separadas,
Como se estivessem condenadas ao escuro...
Que Deus ilumine e proteja seus caminhos,
Para que não se sintam assim, sozinhos,
A mãe prematura e seu filho prematuro...
*A maternidade prematura
gera um desalinho tão
grande para o coração
materno quanto a clinica do
nascimento prematuro gera
para o bebê recém-nascido.
Perceber a maternidade em
seu significado ampliado é
considerar para sempre mãe
e filho inseparavelmente.
25
Às mães de UTI*
Mães delicadas, maravilhosas,
Mães prematuras do meu coração,
Mães dedicadas, mães cuidadosas,
Mães que se alimentam de vida e paixão...
Mães que são como o perfume das rosas
Tocando a nossa emoção...
Mães privilegiadas, mães dadivosas,
Mães de um sorriso que não tem explicação...
Que Deus esteja sempre do seu lado,
Mantendo esses corações iluminados,
Que ensinam o que é o amor à Terra inteira...
Muito obrigado por tudo, mães queridas,
Que tocam com seu amor as nossas vidas
E com sua força tão verdadeira...
12
*As mães de UTI, em relação à todas as outras mães da humanidade, possuem o mesmíssimo amor,
com uma característica entretanto que o diferencia: um amor posto à prova, despedaçado fibra por
fibra, um amor vivenciado de paixão e dilacerado ao extremo. Um amor que permanece leve,
presente e incansável ainda assim...
27
A mãe prematura*
A mãe prematura do bebe prematuro,
Nascida antes do que era para ser,
Como quem antecipa o seu futuro,
Como quem torna-se sem perceber...
A mãe prematura do bebe prematuro,
E a luta por seu bebê sobreviver...
Às vezes tudo é tão sombrio e escuro,
Tudo tão frio, tão sem amanhecer...
A longa dor de quem aguarda a cura,
Como quem, sem saber o que, procura,
E assim, nessa procura, se desfaz...
Segura nas mãos de Deus, mãe prematura...
Segura nas mãos de Deus, que te segura...
Segura nas mãos de Deus, e segue em paz...
*A mãe prematura não é a mãe adolescente
nem é a mãe de primeira viagem. Não é a
mãe quarentona. Não é a mãe cesariada. A
mãe prematura é chamada assim por ter se
tornado mãe, em qualquer idade e com
qualquer histórico, antes do tempo esperado
para completar sua maternidade. Cada
nascimento prematuro de um bebê é também
o nascimento de uma maternidade prematura
tão dolorosa quanto e tão necessitada de
cuidado quanto seu filho.
29
Amamentando*
A mãe prematura e a hora tão sonhada
De trazer seu bebê ao seio para mamar...
Custou, mas finalmente ela parece preparada...
Custou, mas finalmente chegou o dia de tentar...
O bebê prematuro, após longa caminhada,
Parece estar pronto para o tempo de gostar
Do colo da mãe, da hora da mamada,
Da vida que parece começar a melhorar...
E entre espasmos musculares e descargas
Neuro-hormonais, o leite, em gotas vagas,
Começa a surgir da mama, e vai brotando...
O bebê prematuro, a mãe prematura,
E seu momento imaculado de ternura...
É coisa de Deus esses dois se amamentando...
*Vencer longas etapas de uma preparação
que para o restante da humanidade é quase
fisiológica requer o cumprimento, pela mãe e
pelo filho, de um longo caminho que desagua,
quando bem apoiado e conduzido, num
oceano de possibilidades enternecedoras.
31
A tempestade*
Às vezes ela tem nomes estranhos,
Palavras de difícil compreensão:
CPAP,
Surfactante,
Fototerapia,
Incubadora,
Resíduo,
Saturação...
Às vezes tem efeitos complicados,
Síndromes raras,
Malformação,
A tempestade,
Mas pode chamar de apneia,
Abalos,
Arritmia,
Convulsão...
*Tempestade é certamente o substantivo mais representativo do que acontece com o coração da mãe, do
filho e da família prematura por ocasião de seu nascimento. Tempestade que guarda entre seus
significados, sentidos que muitas vezes só conseguem ser traduzidos após sua bonança. 33
Às vezes chega cheia de segredos,
Palavras de incompreensível tradução:
Prognósticos,
Sequelas,
Resistências,
Intolerâncias,
Dificuldades de sucção...
A tempestade...
Às vezes tem sinônimos tão próprios:
Incubadora,
Venopunção,
Gavagem,
PICC,
Cateterismo,
Tomografias,
Bombas de infusão..
A tempestade...
Começa às vezes como chuva fina,
Garoa leve,
E aumentando,
Até que então
A chuva vai se fazendo mais intensa,
E vai crescendo, causando aflição,
E chega com a força devastadora
De uma cachoeira,
De uma inundação,
E desarruma,
Fere,
Desconcerta,
Machuca,
E provoca
Grande confusão...
34
A tempestade,
Como um apocalipse,
A tempestade,
Estranha condição,
Que chega como quem vai destruir tudo,
Que chega causando devastação...
A tempestade...
Que chega
Desarticulando
A família inteira
Sem piedade,
Sem pausas,
Sem perdão:
A mãe,
O filho,
O pai,
O tio,
A tia,
O avô,
A avó,
A madrinha,
A sogra,
O irmão...
A tempestade...
Estremecedora...
Como se fosse o estrondo de um trovão...
Que afeta a fé do crente,
A paz do justo,
A crença do que crê
Na salvação,
A tempestade como se fosse um tiro,
A tempestade,
Como uma infecção...
35
Até que um dia ela acalma,
Cedo ou tarde,
Reduzindo sua força
Como quem pede perdão,
Até que um dia
Ela se cansa
E dorme,
E perde sua capacidade de agressão,
E esvaziada,
Como quem se cansa,
E já sem vontade,
Como quem perde a paixão,
A tempestade
Que parecia eterna,
Se afasta,
Cede,
E já não dói mais não...
É nessa hora
Que a Lei de Deus
Costuma se revelar
Com perfeição,
E toca o coração enfraquecido,
Suturando os retalhos
Desse coração,
Lavando as dores,
Enxugando as lágrimas,
Descansando o cansaço
E a exaustão,
A Lei de Deus
Depois da tempestade,
Trazendo bonança
E reconstrução...
E o que era frágil
Torna-se firme,
E o que era medo,
Consolação,
O que era morte
Torna-se vida,
O que era fuga
Torna-se prontidão,
E o que era quase incompreensível
Dores sem causas,
Causas sem razão,
A Lei de Deus torna fé inabalável,
E força indestrutível,
Sublimação,
E nasce assim,
Depois da tempestade
De nome estranho,
De estranha compreensão,
Dessa tempestade que desorganiza,
Provocando grande desarrumação,
E nasce assim, desse momento em diante,
Uma nova mãe,
E um novo filho, e então,
Uma nova família
Realimentada,
Uma fé renovada...
Reconstrução...
36
E tudo então
Ganha um significado:
A dor,
O medo,
A separação,
As palavras angustiantes,
Como tomografia,
As palavras dolorosas,
Como dissecção,
E os sentimentos,
Como a ansiedade,
A insegurança,
A saudade,
A incerteza,
A desolação...
E tudo então,
Desde ai, ganha um sentido,
E a tempestade
Cumpre assim sua função,
E é nessa hora que se compreende
Que Deus manteve sempre a Sua mão
Estendida,
Protegendo,
Alimentando,
Nada aconteceu
Sem Sua permissão,
Nenhuma dor,
Nenhum choro,
Nem lamento,
Nenhuma piora,
Nenhuma recuperação,
A Lei de Deus,
O Grande Regimento,
A Lei de Deus,
A grande explicação...
Por isso
A poesia
Compreende
A tempestade
Como um instrumento,
A tempestade
Como uma lição,
A tempestade
Como um chamamento,
A tempestade
Como uma ressignificação.
37
Canção do exilio*
Minha terra tem carinhos
Em que eu gosto de deitar.
As vozes que aqui me tocam
Não me tocam como lá.
Minha terra tem mais gosto,
Mais ternura, mais sabores,
De um silencio com mais vida
Carregadinha de amores.
Em cismar, sozinho, à noite,
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem cantigas
Delicadas de ninar...
Minha terra tem delicias
Que tais não encontro eu cá.
Em cismar -sozinho, à noite-
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem carinhos
Em que eu posso descansar.
Não permita Deus que eu custe
A retornar para o meu lar,
E desfrutar dos primores
Que não encontro por cá;
Para escutar as cantigas
Da minha mãe me ninar...
*O poema clássico de Gonçalves Dias tem o mesmo nome: “Canção do exilio”.Aqui é relido sob o olhar não de um exilado
de sua terra natal, mas sob a ótica de um bebê nascido prematuramente e vivendo em terras estranhas e distantes da sua
terra materna natal, entre monitores e incubadoras e um universo inteiro de acrílico e metal, como uma condenação
inapelável e sem culpa.
39
Canção para te fazer sonhar*
Descansa, anjo... Eu cuido do teu sono...
Repousa tranquilo teu coração,
Dorme suave. Nada lá fora
Pode te ameaçar o sono agora,
Descansa, fica leve, sai do chão...
Descansa, anjo, que eu te protejo
Dos olhos da bruxa, do bicho papão,
Descansa que eu te cuido com desvelo,
Descansa, já não há mais pesadelo,
Descansa, eu te dou minha proteção...
Eu cuido pra que nada te aconteça,
Nada apareça de ruim que te incomode:
Nenhum barulho, nenhum ruído,
Nenhuma coisa má, nenhum perigo,
Nada te assuste, nada te acorde...
Dorme tranquilo. Deixa que eu te cuido:
Nem muito frio, nem muito calor,
Nenhum barulho ou conversa exagerada,
Dorme, eu me entendo com a madrugada,
Dorme, eu me entendo com o Criador...
E nem que para isso eu me desdobre
E até me esqueça eu mesmo de dormir,
E passe a noite te vigiando,
E passe a noite inteira te cuidando,
E a noite passe sem eu sentir...
Por isso descansa, eu cuido do resto:
Da dor, do desconforto, do cansaço...
Nada te preocupa mais... Descansa...
Dorme teu sono, pequena criança,
E o que for preciso deixa que eu faço:
*AUnidade Neonatal é um local extremamente propicio para a semeadura de delicadezas de UTI, dadas
suas características extremamente centradas na tecnologia e nas rotinas pré-estabelecidas. É um
terreno fértil para a boa pega de apoios e carinhos tão essenciais à vidinha do pequeno bebê ali presente,
de acordo com as normas que se conhece genericamente pela alcunha de “atenção humanizada”. Pelo
menos é assim que pensa a poesia. 41
Apago as luzes, reinvento a noite,
E mudo algumas coisas de lugar
Trocando turbilhão por calmaria,
E transformando dor em poesia
Só pra te ver descansar...
E fico imaginando coisas boas
Pra te esperar despertar:
Um toque suave, gentil e apropriado,
Uns truques para a dor sair do teu lado,
E algumas musicas para cantar...
Descansa, eu te preparo essa alegria:
Silencio, ninho, sono, enrolamento,
O colo materno juntinho o tempo inteiro,
Dengo, carinho, um xodozinho, um cheiro,
E um mundo inteiro de acolhimento...
Por isso guarda a calma delicada,
Nada de mal vai te acontecer...
Eu dou um susto na bruxa malvada,
Dorme tranquilo, anjo, porque nada
Eu vou deixar mais te fazer sofrer...
Descansa, anjo, eu cuido de tudo,
Descansa, anjo, pode deixar,
Descansa que eu te cuido com carinho,
Descansa e guarda bem esse versinho
Que eu preparei pra te fazer sonhar.
42
Canguruzinho*
Meu canguruzinho,
Acolhido pelo conforto do seu ninho,
Sereno,
Silencioso
E sossegado...
Tão bom saber
Que você não está sozinho,
Tão bom perceber você
Bem acompanhado,
Porque, meu canguruzinho,
Nenhum outro cantinho
É mais gostoso e mais delicado
Do que esse seu cantinho,
Meninozinho,
E nem cantinho nenhum
Mais abençoado...
Cantinho feito de amor
E de calor,
Banhado a leite materno,
Cantinho delicadamente planejado...
Cantinho único,
Meu canguruzinho,
Que é para ser vivido,
Curtido
E perpetuado...
*Desde o final dos anos 70, a
Colômbia, através da iniciativa dos
pediatras Edgar Rey e Hector
Martinez, o Método Mãe Canguru
tem o mérito inquestionável de ter
trazido a mãe de volta para o
cuidado do seu filho e de
desmistificar e reformular de certa
forma o mito de que fora da UTI
não há salvação, redimindo dois
séculos de uma neonatologia
separatista e tecnocrática, mudando
o paradigma do cuidado neonatal
no mundo inteiro desde então. O
Método Mãe Canguru e seus três
pilares: o amor, o calor e o leite
materno.
43
Quem vê você assim
Pequenininho,
Adormecido em seu ninho
E sossegado,
Não faz ideia do tamanho da sua história,
Não imagina o que você tem suportado,
Quase nem é capaz,
Meu companheiro,
De enxergar o tamanho verdadeiro
Da sua trajetória
E do peso que você carrega,
Resignado,
Do útero materno
Ao nascimento,
Do nascimento até esse colinho,
Meu canguruzinho,
Esse colinho que é seu sustento,
Esse sustento
Que é seu caminho...
Esse caminho
Que é seu legado...
Meu pedacinho de gente,
Meu gigante,
Seu exemplo é impressionante
E comovente,
Justo por isso
Absolutamente contagiante,
Meu super-herói diferente...
Meu pequenino grande viajante,
Meu sempre bastante amiguinho,
Meu bom companheirinho, e o mais
constante,
E o mais desconcertante,
Meu canguruzinho...
44
*Faz menos de dez anos que os
trabalhos da Dra. Paula Meier vêm
divulgando as vantagens do uso de
algumas gotas de colostro da mãe
prematura já nas primeiras horas de
vida, aplicadas por ela mesma,
apoiada e orientada pela equipe da
Unidade, na boquinha de seu filhinho
de muito baixo peso, mesmo quando
em condições clinicas e respiratórias
graves, favorecendo a sua
estimulação imunológica e devolvendo
à mãe o seu maior poder que é a
prerrogativa de cuidar de sua própria
cria de um modo sem comparativos e
fazendo por seu bebê o que ninguém
mais conseguiria fazer por ele. E é a
isso que ela, a mãe prematura, chama
de carinho.
Não precisa de muita coisa. Quase nada.
Somente a mãe do bebê pode fazer.
Uma gotinha de colostro suavemente aplicada,
Uma gotinha na boca. Que poder.
Não precisa de muita coisa. Uma mãe dedicada
E uma equipe profissional que permite acontecer.
Uma gota. Um prematurinho. Uma equipe
entusiasmada.
E a vida, naquela gota, mandando ver...
É a mãe prematura cuidando da sua cria,
Oferecendo sua gota colostral de energia,
Estimulando a imunidade de seu prematurinho...
Alguns médicos descrevem isso como Colostroterapia,
Alguns outros aproveitam para escrever poesia,
Mas a mãe prematura chama isso de carinho...
Colostroterapia*
Ensina-me a compreender tuas vontades
E a entender o que dizes com o olhar,
Ensina-me a valorizar tuas verdades
E a perceber tua forma de falar,
A descobrir tuas singularidades,
E a responder quando tua voz chamar,
A respeitar tuas dificuldades,
Ensina-me a aprender a te ajudar...
E um dia, quando eu compreender teus gestos,
E souber diferenciar os teus protestos
Das tuas necessidades de aproximação,
Então, exatamente nesse dia,
Será como descobrir tua poesia,
Será como desvendar teu coração...
*Durante os dias de UTI os bebês prematuros, bem
como todos os outros, prematuros ou não, emitem
sinais de comunicação com o mundo à sua volta, muitos
deles já catalogados e conhecidos dos estudiosos do
tema, sinais que traduzem seus desejos de interação
com o mundo à sua volta ou retraimento, do tipo “quero
ficar na minha”. Cabe ao cuidador conhecer esses
códigos e decidir-se por respeita-los da mesma forma
como faz questão de ser respeitado em sua vida.
Simples assim.
Comunicação*
47
Constatação*
Quando a gente vê um bebe sozinho,
O que é que exatamente a gente vê?
A gente vê um pedaço,
Uma parte,
Uma fração...
Porque um bebe sozinho não existe,
O que existe
É um bebe
E a sua mãe.
Essa é talvez a única verdade,
Tudo o mais, em verdade, é distração...
*”Um bebê sozinho não existe. O que existe é: um bebê e sua mãe”. Essa é talvez a frase mais citada do
médico pediatra e psicanalista inglês Donald Winnicott, e faz o profissional que lida com a prematuridade
entender que nenhuma linha de cuidado deve incluir um sem levar em conta o outro. O vinculo entre mãe
e filho é uma verdade sagrada e inviolável.
Versos livres sobre uma verdade Winnicottiana
49
Desabafo*
Eu não preciso da sua mão exagerada,
Da sua rotina não contingente
Que trata de mim como se eu não fosse nada
Ou como se eu não estivesse na sua frente,
Que larga minha vida desorganizada,
Que ignora meu choro de forma displicente
Como se não enxergasse minha alma apertada,
Como se eu não fosse gente...
Eu não preciso da sua rotina
Que me reduz à necessidade ou não de dopamina,
Ou como se eu não tivesse sentimento nem vontade...
Eu não preciso da sua negligencia,
Desumanidade travestida de ciência,
Como se eu não pertencesse à humanidade...
*A poesia dá voz a um sem-número de bebês que recebem,
em todo planeta, intervenções baseadas num cuidado
voltado para o modelo tecnocrático que despercebe sua
integralidade e reduz sua vida a dados registrados no
prontuário, longe do que significa sua própria vida. Este
desabafo é um lamento de dor.
51
Abancado à minha escrivaninha em Campos dos Goytacazes,
No meu apartamento próximo ao centro,
De supetão senti um friúme por dentro.
Fiquei trêmulo, muito comovido,
Com o computador palerma olhando pra mim.
Não vê que me lembrei
Que lá na Unidade Neonatal, meu Deus,
Não tão longe daqui,
Na solidão da sua prematuridade,
Um menino pequenino e magro,
Quase sem cabelo cobrindo-lhe os olhos,
Depois de mamar no peito de sua mãezinha,
Faz pouco se deitou na incubadora, e está dormindo...
E esse prematuro é brasileiro que nem eu.
Descobrimento*
*Este poema é releitura de um poema de
mesmo nome do poeta paulista Mário de
Andrade. O texto original, repleto de “supetões”
e “friúmes”, faz referencia ao brasileiro
seringueiro nortista. Aqui neste outro, a poesia
descobre subitamente que o pequeno bebê
prematuro, deitado na incubadora distante,
sozinho, é, como o seringueiro de Mário,
brasileiro como nós, seus leitores. Que esse
descobrimento possa nutrir sementes de
civismo e respeito, e que essas sementes
sejam revertidas em frutos de cuidado e
acolhimento com dignidade e gentileza.
53
Aqui estamos,
De longe viemos...
Um longo e cansativo itinerário...
Foram inúmeras as vezes que choramos,
Foram inúmeras as dores que sofremos,
E, no entanto,
Tudo parece ter sido
Absolutamente necessário
Para que chegássemos até aqui:
As lágrimas, a aflição, o desespero,
As noites intermináveis sem dormir,
Os descaminhos sem sol por que passamos,
E as fraquezas de quase desistir...
Tudo absolutamente necessário
Para que acabássemos por descobrir
Tantas lições de vida, acolhimento,
Amparo, apoio, sustentação,
Solidariedade abrandando o sofrimento,
Perseverança alimentando o coração...
Tudo absolutamente necessário...
Itinerário*
*Este poema de 2008 foi escrito para uma comemoração de Natal com mães de uma UTI de minha cidade.
Reflete em suas rimas o longo e doloroso mecanismo de resiliência por que passam as famílias prematuras
que com todo seu desalinho, veem nascerem mães e bebês mais fortes, mais leves e mais intocados em seu
vinculo, sua história e seu amor.
55
E imaginar que imaginávamos o contrário
Quando a nossa vida cuidou de desabar,
E tudo em volta, de repente, sem sentido...
Quando faltou o chão, de repente, de pisar...
Foram dias inteiros tentando descobrir,
E noites sem dormir nem acordar...
Um sofrimento diário,
E, no entanto,
Parece que absolutamente necessário
Para que mobilizássemos nossas energias
Por dias e dias e dias e dias,
E muitas vezes
Até por meses,
Entre tomografias e ultrassonografias,
Entre hipoglicemias e hiperglicemias,
E anemias e arritmias
E outros tantos sinônimos de dor...
Fomos bordando assim nosso calvário,
E hoje,
Parece que tudo
Foi absolutamente necessário,
E nada absolutamente sem valor...
Porque a fraqueza nos fez fortalecidos,
A dor nos desenhou mais resistentes,
As ameaças tornaram-nos mais vivos
E tanta angustia, mais persistentes...
Fortalecemo-nos dos afetos dos queridos:
Esposo, esposa, pais, irmãos, parentes,
Luzes para que não quedássemos perdidos,
Sustento para que não tombássemos descrentes...
E a dor que nos fez tantas vezes tão sozinhos,
Atormentando nossos caminhos,
Fazendo nosso coração passar tão mal,
Foi a mesma dor, condição transformadora,
Que com sua força renovadora
Nos trouxe aqui, a esse dia especial...
E a mesma dor que nos fez tão diminuídos,
Foi a dor que nos tornou fortalecidos,
E nos mostrou o caminho de saída,
E a mesma dor que tentou-nos derrotados,
Foi a dor que nos trouxe hoje, renovados,
Valorizando mais que nunca a própria vida...
E a vida, como uma dádiva sagrada,
É o bem maior que em sua caminhada
Os nossos filhos vão preservando...
Vão resistindo, heróis, a tempestades,
Saindo ilesos de calamidades,
Vão escapando, vão se salvando...
E a vida, como uma graça alcançada
Por cada um deles nessa jornada,
É o bem maior que cada um vai conquistando,
Vestidos de esperanças e vontades,
Superando, como heróis, dificuldades...
É a dor que em paz vai se transformando...
56
Aqui estamos.
Foi como se o coração parasse o calendário
E o tempo desistisse de passar,
E, no entanto,
Tudo parece ter sido absolutamente necessário
Para que chegássemos
A essa hora,
E hoje, a esse dia,
Completa e inteiramente renovados,
Dispostos como nunca a continuar...
Crescemos.
Com a dor que enfrentamos, amadurecemos,
Amadurecidos, aprendemos a compartilhar
A nossa dor com a dor de toda gente,
E foi isso que nos fez seguir em frente
E nos deu força pra perseverar...
Crescemos.
A dor que um dia nos fez sentir pequenos,
Foi a mesma que nos ensinou a caminhar...
Uma lição de se aprender diariamente...
Uma lição de durar eternamente...
Um aprendizado que se chama amar...
57
Mães que nunca fracassaram,
Mães que nunca permitiram,
Mães que nunca despertaram,
Mães que nunca desistiram,
Mães que nunca engravidaram,
Mães que quase conseguiram,
Mães que por ter tanto medo nem tentaram,
Mães que por falta de medo nem sentiram,
Mães que partiram na hora do parto,
Mães que tornaram-se mães sem saber,
Mães que forjaram-se mães por contrato,
Mães que não precisaram de filhos para ser,
Mães que não souberam escapar,
Mães que não puderam conhecer,
Mães que se tornaram saudades de chorar,
Mães que se transformaram em imagens de não ter,
Mães que se foram para outra vida,
Mães que jamais retornaram para o lar,
Mães que sentem ate hoje a dor comprida,
Mães que continuam a esperar,
Mães que não fizeram força para ser,
Mães que fizeram questão de evitar,
Mães que não foram, por isso o sofrer,
Mães que não foram para se poupar,
Que Deus as proteja, ilumine e suporte,
E afaste delas todo mal e iniquidade,
Que Deus as acompanhe além da morte,
E as guarde em luz por toda a eternidade,
Mães. Porque não há outro caminho.
Mães. Porque não há maior lição.
Nada que substitua o seu carinho,
Que se compare ao seu coração.
Mães. Porque não há outra saída.
Mães. Igualando nobres e plebeus.
Mães. Nada tão forte em nossa vida.
Mães. Nada mais próximo de Deus.
Mães*
* Escrito na madrugada do Dia das Mães de
2003 durante o plantão na UTI Neo do HPC,
Campos, RJ, em pleno livro de plantão.
Dedicado às mães do mundo inteiro.
Que Deus te proteja,
Mamiferozinho,
Das mamadeiras,
Das chucas e dos bicos
Oferecidos a ti sem nenhuma razão,
E acorde os médicos,
E as fonos,
E os enfermeiros,
Para a necessidade
De sua proteção...
Que te afaste chupetas,
Mamiferozinhos,
Fazendo da mama da mamãe
A grande opção,
E que te distancie
Dos bicos ortodônticos
E dos siliconados,
Sem exceção...
Que Deus te permita,
Mamiferozinho,
O leite materno
Pra tua satisfação,
E nas dificuldades,
Meu amiguinho,
Que o leite humano
Do Banco de Leite
Seja lembrado
E não te falte não...
Mamiferozinho*
*As controvérsias e as discordâncias e a falta de um consenso em relação aos caminhos a serem seguidos para favorecer a
amamentação de bebês prematuros torna essa caminhada ainda nos dias de hoje sujeita a muitas dificuldades e opiniões
divergentes.Ainda assim a possibilidade de amamentação é real e possível. Somos mamiferozinhos desde o ventre.
61
Que a gota de colostro,
Mamiferozinho,
Seja sua dose
De proteção,
Que seja a gota de teu sustento,
Que seja teu alimento
E salvação...
Que seja escrita assim dessa maneira
A história da tua recuperação:
Amor,
Calor,
Leite materno,
Vida,
Apego,
Afeto,
Crescimento são...
Que Deus te permita,
Mamiferozinho,
A busca,
A grande boca,
A pega,
A sucção,
A língua canolada
E protraída,
A vida
Em minuciosa exatidão...
E que tu cresças, mamiferozinho,
Orgulhoso dessa nobre condição,
Amamentado
E cuidado com carinho,
Semente boa
Da próxima geração...
Que Deus te guarde,
Mamiferozinho,
Que te guie
E não te solte
Da Sua mão,
Que esteja sempre contigo,
Mamiferozinho,
Meu doce
E pequenininho
E grande irmão...
62
Porque desde a barriga da mãe o bebe
Escuta,
Reage,
Entende,
Se assusta,
Se agrada,
Pede,
Adormece,
Sente vontade,
Sente saudade,
Se alegra,
Se agita,
Porque desde a barriga da mãe o bebe
É um ser humano completo.
Por conta disso, que seja
Dignamente tratado...
Por conta disso, que seja
Respeitado...
Por conta disso, cuidador,
Cuidado...
Nascimento*
63
*Relatos maternos das experiências de interação com seus bebês desde a barriga mostram que a
memória e o comportamento deste recém nascido não começa na hora do parto.Avida é plena e cheia de
sentidos já desde antes do nascimento. Por conta disso, cuidador, cuidado...
Não é para ser um momento estressante,
Não é para o bebê gritar, assustado,
O banho deve ser um momento relaxante,
Um cuidado aplicado com cuidado.
Não é para ser um procedimento apavorante,
Que deixa o bebê que o recebe, agitado,
Chorando, irritado, respiração ofegante,
Um bebê limpinho, mas um bebê esgotado.
O banho deve ser como o carinho:
Sempre chegar bem devagarinho,
E, de tão bom, fazer o bebê dormir...
O banho bom que cuida relaxando,
Que nem precisa ser todo dia, só de vez em quando,
Como um recreio, para o bebê se divertir...
O banho*
65
*A hora do banho nas Unidades Neonatais deveria, mas nem sempre é, uma hora relaxante, e não tão somente o
cumprimento de uma rotina que estressa mais que ajuda. Atualmente a adoção do chamado “banho humanizado” vem
ajudando profissionais a conduzir esta técnica com respeito ao bebê prematuro, que é um cérebro em desenvolvimento,
facilitando a assimilação desse momento pelo bebê e colaborando com a saúde e não com a doença.
Parece que está de férias, relaxando,
Parece que se esquece um pouco da exaustão,
O bebê na redinha, o bebê descansando,
O bebezinho, como se fosse verão,
Parece que gosta, parece que está sonhando,
Parece que se nem se importa com a solidão,
É bom relaxar assim de vez em quando,
Faz bem para o corpo, faz bem para o coração,
Porque o bebê, quando passa um tempo na rede,
É como um beduíno quando mata sua sede,
É como um astronauta quando põe seus pés no chão,
É como passar um fim de semana na Bahia,
É como ouvir Jobim, é como ler poesia,
É como ser o dono da varinha de condão...
O bebê na redinha*
*Tem-se espalhado por inúmeras Unidades Neonatais Brasil afora a pratica do uso de uma redinha comum, colocada
dentro da incubadora, para acolher o bebê prematurinho com objetivo de oferecer a ele melhor posicionamento, conforto,
organização e repouso, combatendo o stress e favorecendo as intervenções favoráveis à sua recuperação. É assim, na
redinha, que ele descansa como se fosse verão...
67
Silencio,
Trabalho,
Rotina,
Dedicação,
O cuidador cuidadoso,
Um operário...
Onde seu cérebro?
Onde seu coração?
Sensores,
Balanços,
Ajustes,
Medicação,
O cuidador preparado,
Cuidadoso...
Quando é que é técnica?
Quando é que é dedicação?
Gavagens,
Agulhas,
Pesagens,
Aspiração,
O cuidador,
Concentrado e habilidoso...
Onde é que termina o operário?
Onde é que começa o irmão?
O cuidador*
*Poeminha dedicado aos profissionais do mundo inteiro que se dedicam ao cuidado com os bebês prematurinhos nos
longos, exaustivos e intermináveis plantões das Unidades Neonatais. Uma dedicatória especial vai para a Equipe da
Unidade Neonatal do Hospital dos Plantadores de Cana de Campos, rica em bombas infusoras de carinho e dedicação...
69
Não era tão próximo,
Pele na pele,
Não pegava no colo,
Não dava de mamar,
Não aquecia,
Não embalava,
Mas encantava
Porque era um olhar
Silencioso,
Quase imperceptível,
Não era nada
Que fosse capaz de falar...
Era feito de éter,
Era invisível,
Mas era insubstituível,
Porque era um olhar...
Que não tocava,
Que não aquecia,
Que não se podia
Pegar,
Mas que era único
E feito de ternura...
Merecia uma poesia
Aquele olhar...
E ainda que ninguém
Desconfiasse,
E ainda que ninguém ousasse
Imaginar,
Era perfeito
Como um encantamento,
Embora não passasse
De um olhar
O olhar*
*Ao registrar algumas imagens para este trabalho, detive-me a observar o olhar destes pais e concluir pela sua natureza única e
insubstituível. A consistência impalpável desses olhares paternos em direção ao filho numa incubadora ultrapassa os limites
possíveis da poesia, transformando-se em matéria da língua dos anjos...
I
Habituado desde a infância,
(Que já vai longe em seu pensamento)
Aos jogos de bola
E às brincadeiras de pipa,
Aos teco-tecos nas bolas de gude
E aos passeios de carrinho de mão,
O menino,
Abandonando a infância,
Cresceu,
Enamorou-se,
E tornou-se pai...
II
Mas como nos jogos de bola
E nas brincadeiras de pipa
E de botão,
Na vida que chamamos vida de verdade
O inesperado também nos surpreende
E causa sustos e apreensão.
O menino que tornou-se homem
Que enamorado transformou-se em pai,
Tornou-se pai de um menino
Prematuro...
Risco de vida...
Internação...
O pai canguru*
*Esta história tem já uns cinco anos
de vida. Resolvi conta-la em versos
livres temperada com carinhos
poéticos, como tentando uma elegia
ao cuidado paternal mais
transbordante de maternidade de
que já tive noticia nesses meus
trinta anos de trabalho com essas
famílias...
73
III
Foram dias inteiros sem dormir direito:
Ansiedade, incerteza e aflição...
Quarenta dias se passaram
Entre idas e vindas ao Hospital.
A curta licença do trabalho
Roubou suas possibilidades de contato diário
com seu filho,
Que, apesar de infrequentes,
Permaneceram verdadeiras,
Constantes
E intensas...
IV
Nesses quarenta dias de hospital
A mamãe ganhou um apelido
Por ter adotado o hábito de trazer o pequeno
filho
Junto ao peito,
Transfundindo-lhe amor,
Calor,
E leite materno,
E assim aprendeu um verbo
Bem tipico
Do dicionário dos anjos:
Canguruzar.
V
Numa tarde de domingo
O papai foi convidado
A colocar o bebê sobre o peito
Mantendo-o colado junto a seu coração...
E ainda que desabituado a maternagens
E a choros de bebê,
Naquele instante o pai chorou como um deles
Quando experimentou seu momento
De pai canguru.
(E pai canguru,
Antes que me perguntem,
Também é verbete do dicionário dos anjos).
VI
Quanto tempo permaneceu ele ali
Maternando,
Aquecendo,
Trocando carinho
E olhando pros olhos do filho
Da forma que só os pais cangurus conseguem fazer?
Quanto tempo durou aquela cena de paternidade maternal?
Minutos?
Algumas horas?
Quem sabe?
Durou, sim,
O tempo certo para tornar-se inesquecível,
O tempo certo para saber-se incomparável,
O tempo certo para comprovar-se inconfundível,
O tempo certo para perceber-se inexplicável...
74
VII
Na manhã seguinte,
Logo à sua chegada ao Hospital,
Uma surpresa
(Porque na vida,
Como nas brincadeiras de bola de gude,
A gente sempre se surpreende)
Seu bebê,
Seu filhinho,
Estava de alta...
VIII
Alegria.
Só alegria.
Chegando em casa,
Conta-se que o pai contou pra toda gente,
Gabando-se todo,
E feliz da vida,
Que foi do seu colo
Que o filho recebeu
O amor, o calor e a energia paterna
Que faltavam para a sua alta...
IX
A mãe?
A mãe canguru?
O que achou disso após quase quarenta dias
junto ao filho?
A mãe simplesmente sorriu.
Porque não é todo dia,
Nem com toda gente,
Que se é possível
Dividir maternidade
De forma tão sincera e verdadeira...
X
E pai e mãe,
Desde ai,
Canguruzaram-se felizes para sempre,
E cheios de amor
E palavras de luz,
Nunca mais esqueceram seus dias
De pais cangurus...
75
Papai do Céu, toma conta das mães de ,
Cuida de aliviar seu sofrimento,
Faz com que elas nunca desistam de sorrir,
E traz para elas alivio e alento...
Papai do Céu, não as permita nunca desistir,
Faz da sua fé seu alimento,
Prepara seus corações para o que há de vir,
Envolve-as com ternura e acolhimento,
UTI E abençoa suas vidas, Pai amado,
Que é uma só com a do filho internado,
Esperando a cura, esperando a volta ao lar...
Cuida das mães de , mães preciosas,
Cuida das mães de , mães dolorosas,
Tão precisadas de seu cuidar...
UTI
UTI
Oração pelas mães de UTI*
*O nascimento de um bebê prematuro transfere para esse bebê o foco das atenções dos serviços de saúde por uma questão
lógica e inadiável: é necessário salvar sua vida. A mãe prematura deixa, portanto, após o nascimento de seu filho, de ser a
prioridade do cuidado, mas nesse não sendo, torna-se, ainda que não se perceba necessariamente isso, carente de apoio e de
atenção muitas vezes lhes negada por um sistema que não a enxerga como necessitada de suas ações. Esse poema é uma
suplica ao nosso Pai que está nos Céus por essas mães dolorosas e extremadas que muitas vezes nós, profissionais
transformamos em mães invisíveis pela nossa cegueira tecnocrática...
77
Papai do Céu,
Cuida dos meus cuidadores com cuidado
Para que eles não me faltem com a atenção,
Eu tenho sofrido, Papai do Céu, um bocado,
Nesses meus dias de internação:
Noites inteiras tenho passado acordado,
Dias inteiros mergulhados em solidão,
Tudo em minha volta parece exagerado:
A luz, a dor, o som, a movimentação...
Cuida dos meus cuidadores nesses dias
De condutas técnicas, de rotinas frias,
Que os lápis de cor não conseguem colorir...
Cuida com cuidado dos meus cuidadores,
Para que as dores por detrás das minhas dores
Possam também ir deixando de existir...
Oração pelos meus cuidadores*
*O cuidado com quem cuida deve ser tratado com respeito e determinação. As longas e exaustivas horas de trabalho nas
Unidades Neonatais são muitas vezes causa de distúrbios de saúde para os profissionais da área: stress, hipertensão,
distensões emocionais, etc... O cuidado com quem cuida, por conta disso, não é menos importante que o cuidado com o bebê ou
com a sua família. A humanidade, isso sim, precisa se proteger a si mesma, uma vez que essa proteção é a garantia da
preservação saudável da espécie humana em nosso planeta.
79
Uns nascem
Com vinte e poucas semanas,
Às vezes um pouco mais,
Outros pesando
Seiscentas gramas,
Às vezes um pouco menos,
Desafiando tudo que estudamos,
Contrariando tudo que sabemos,
Subvertendo tudo que planejamos,
Necessitando de tudo quanto conhecemos,
São eles,
Os prematuros extremos,
Tão delicados,
Tão sozinhos,
Tão pequenos,
Que muitas vezes nós nos assustamos
Quando os vemos
Assim,
Entre tubos,
E fios,
E acrílicos
E drenos,
E até muitas vezes nem acreditamos,
E outras tantas
Nos surpreendemos,
E aprendemos
Que esses prematuros extremos
De quem cuidamos,
Tão frágeis,
Tão difíceis,
Tão serenos,
São muito mais fortes do que imaginamos,
E fazem muito mais
Do que nós fazemos...
Os prematuros extremos*
*Nascidos com menos de 28 semanas de gestação, pesando
menos de 1000 gramas, os prematuros extremos já nascem sob o
signo do desafio e da superação. Desafio que começa com a
necessidade de vaga numa UTI Neonatal. E transporte adequado
até lá. Desafio que continua quando da necessidade de um
ambiente e uma manipulação respeitosa, quando da resolução
de distúrbios clínicos sempre extremos e graves, de uma
recuperação lenta e difícil, e de um prognóstico impreciso e
necessitado de cuidado e acompanhamento muitas vezes para
toda a vida. Por isso e por tudo quanto não percebemos é que
esses irmãos pequenos fazem muito mais do que fazemos e
podem muito mais do que podemos. Os prematuros extremos.
81
Jesus, toma conta,
E ameniza as penas
Das mães prematuras extremas
E de seus filhos,
Moços pequenos,
Tão frágeis,
Tão dóceis,
Tão menos,
Que nós nos habituamos
Tão perto de nós
Que quase sentimos
Como se tivéssemos sido nós
Que os trouxemos,
Por quem, às vezes, baixinho, choramos
Quando dizemos:
Jesus toma conta
De nossos irmãozinhos
Miudinhos,
Que nos acostumamos a chamar
Como aprendemos,
Jesus toma conta
Dos prematuros extremos...
82
Pequena demais para o colo,
Imensa para o coração,
Rostinho delicado,
Pele fina,
Repara o tamaninho da sua mão...
Pequena demais para a foto,
Imensa para a emoção...
Pelinhos espalhados pelo corpo,
Dedinhos do tamaninho de um grão,
Pequena demais para a incubadora,
Imensa na sua força de superação:
Tubos,
Acessos,
Fototerapia,
E uma grande quantidade de medicação...
Miudinha,
Mas é como fosse um gigante,
Aparentemente toda frágil...
Só que não...
Porque é pequena demais para os registros
antropométricos,
E, no entanto,
Tão imensa,
Que quase não permite
Tradução...
Poeminha para Anna Clara* 83
*No álbum de Anna, sua mãe escreveu assim: “saúde e muita paz para essa pequenina para colocar nos braços, mas
muito grande para preencher nossos corações”. Alexsandra estava certa desde aquele dia. E seguem assim nossos
dias cercados de pequenas delicadezas capazes de transbordar nosso coração para sempre.
Quem cuida das mães de UTI
Que esperam por seus filhos, assustadas?
Quem toma-lhes as mãos, frágeis e tremulas?
Quem seca-lhes as lágrimas sentidas?
Quem abranda-lhes as feições apavoradas,
E as suas noites de sono mal dormidas,
E os seus dias inteiros, pensativas,
E as suas horas inteiras, angustiadas?
Quem cuida das mães de UTI
Que oram por suas crianças internadas?
Quem descobre seus medos escondidos?
Quem compreende suas culpas descabidas?
Quem dá voz às suas vozes paralisadas?
E os seus corações que mal se aguentam,
Quem ouve, quem entende, quantos tentam?
Quem dá colo a sua dor desfigurada?
Quem cuida das mães de ?*UTI
*Este poema foi lido pela primeira vez numa Mesa Redonda sobre Amamentação de Prematuros durante o XII Encontro
Nacional de Aleitamento Materno em Fortaleza no ano de 2012. Foi uma leitura emocionada, declamada em voz alta por
todos os presentes enquanto os versos eram projetados um a um na tela. Um dia inesquecível para meu coração e para
muitos presentes naquela sala lotada. Aqui reproduzido, faz papel de um clamor pelo fim da invisibilidade da mãe de UTI e
pela adoção de sua dor e de seu desacerto pela Unidade, ampliando o cuidado do bebê para que esse cuidado possa chegar
até sua mãe e cuidadora até o fim de seus dias.
Quem cuida das mães de UTI
Que sabem pensar em seus filhos e em mais nada?
Quem oferece-lhes repouso e abrigo?
Quem dá-lhes um pouco de paz e de agua fresca?
Quem torna suas esperanças renovadas?
Quem mostra-lhes que há luz por entre os sustos?
Quem observa essa suavidade dos seus rostos?
Quem doa seu tempo a essas mães despedaçadas?
Quem cuida das mães de UTI
Que decoram de seus filhos suas risadas?
Que caminham lento por entre monitores,
Que esbarram em incubadoras, distraídas,
Que aprendem palavras estranhas, pouco usadas,
Que tocam seus bebes em berços aquecidos,
Que enxergam detalhes quase despercebidos,
Que cultivam felicidades adiadas?
Quem cuida das mães de UTI
Que vivem pros seus filhos, agoniadas?
Quem explica sua força contagiante
Capaz de faze-las sorrir, mesmo se tristes,
Esperançando as horas arrasadas?
Quem cuida das mães de UTI, mães silenciosas,
Quem cuida das mães de UTI, mães preciosas,
Quem cuida das mães de UTI, mães extremadas?
86
*O direito à vida, à dignidade de tratamento, ao respeito e a integralidade social deve ser defendido e
inserido no plano de cuidados para com o recém-nascido. Todas as garantias da Lei devem ser estendidas
às almas apressadas que por definição quase axiomática são legítimos representantes da espécie
humana com todas as suas letras. Defender essa certeza é função de cada um de nós que gastamos
preciosas horas de nossos dias de trabalho ao seu lado. Que esse seja seu direito inalienável. Que essa
seja nossa defesa sem fim.
87
Reconhecimento*
E onde quer que estejas, pequenino,
E sob qualquer condição,
E ainda que seja incerto o teu destino
E a tua recuperação,
E ainda que a tua história, meu menino,
Pareça um ponto de interrogação,
Tudo tão tênue e frágil, nebuloso e fino,
Tudo tão quase sem explicação,
Ainda assim, que em todos os lugares
Teus cuidadores te estendam seus olhares
Como quem se ajoelha diante de um Rei,
E gentilmente, como a mão quando abençoa,
Que te reconheçam, menino, como pessoa
Diante da Grande Lei...
*Este foi o primeiro poema que escrevi dedicado ao universo prematuro. Data de novembro de 2003,
quando o pequeno João Geraldo, nascido com 1200 gramas e após ter chegado a pesar menos de um
quilo, atingia 1350 gramas. Tão pouco, e quanta diferença fazem essas 150 graminhas. Este soneto ilustra
a lenta progressão (e tão dramática) do ganho de peso de um bebezinho pretermo. A cada releitura que
faço dele, confirmo em meu coração seus versos decisivos: “E a cada grama, um Everest inteiro, como
quem cruza a fronteira, como quem chega em primeiro”. João Gabriel que o diga.
89
Trinta graminhas*
Mil trezentos e vinte, mil trezentos e cinquenta,
Trinta graminhas essenciais,
A progressão, que é vagarosa e lenta,
Trinta graminhas a mais,
Sessenta, setenta, oitenta, e então noventa,
Tão pouco e tanta diferença faz,
Como se fosse a medalha de quem tenta...
Trinta graminhas fundamentais...
E a cada grama, um Everest inteiro,
Como quem cruza a fronteira, como quem chega em primeiro,
Como quem ganha a sua carta de alforria...
Trinta graminhas de felicidade...
Trinta graminhas tentando a liberdade...
Trinta graminhas a mais a cada dia...
*AOrganização Mundial de Saúde calcula em treze milhões o numero anual de nascimentos prematuros no
mundo.Amaior parte deles na África e na Ásia onde as condições de assistência ao pré-natal são precárias
e as de atendimento aos bebês de risco extremamente difíceis.As taxas de nascimento prematuro no Brasil
vem crescendo a cada ano, já havendo algumas regiões atingido níveis de 12% dos nascimentos do total de
nascidos vivos. A crise social da prematuridade no planeta é um alerta grave à preservação integral da
espécie humana que necessita cuidar melhor de seus filhos aonde quer que estejam...
91
Treze Milhões*
Somos treze milhões de almas apressadas,
Nascidas antes do tempo que era para ser,
Treze milhões de alguma forma condenadas,
Um numero que não para de crescer,
Somos treze milhões de almas deportadas
Para um cárcere de onde não se vê o sol nascer,
Longe dos braços das nossas mães, desconsoladas,
Com medo do que nos possa acontecer...
Treze milhões de almas aprisionadas
Em casas de acrílico, padronizadas,
Sozinhas, cansadas de tanto sofrer...
Somos treze milhões de almas cansadas,
Precisando demais ser abraçadas,
Treze milhões querendo tanto viver...
*O grande poeta itabirano Carlos Drummond deAndrade nos brindou com os versos de “CançãoAmiga”, mais tarde musicada por
Milton Nascimento. Aqui, a releitura deste poema inspira versos de ternura que são dedicados por um poeta imaginário aos
homens do mundo, silenciosamente, como quem deseja acordar a desatenção dos homens e permanecer crianças as crianças do
mundo inteiro...
Uma canção amiga*
Eu preparo uma canção silenciosa
De um silencio que quase cause inquietação,
Escrita sem palavra, inútil e dispendiosa,
Num idioma de pura percepção,
Eu preparo uma canção minuciosa,
Quase inaudível, mas sem desatenção,
Composta de arquitetura cuidadosa,
Delicadamente elaborada... Uma canção
Que faça acordar os homens poderosos
Para o poder dos gestos silenciosos
E para a força das palavras mansas...
Uma canção que se espalhe aos quatro ventos,
Que faça acordar os homens desatentos,
E adormecer as crianças...
93
*Este poema traz um significado inteiramente baseado na Declaração Universal dos Direitos do Homem: somos todos iguais,
somos o mesmo homem, sofremos a mesma dor, amamos a mesma vida, queremos nascer, viver, crescer e encontrar felicidades
em nossos longos dias. Não deveríamos dividir a humanidade entre aqueles a quem são garantidas as tecnologias de cuidado
mais modernas e aqueles outros que perdem a vida sem receber o socorro mínimo de um oxigênio ou de uma fonte de calor. Dias
melhores, sonha a poesia, haverão de surgir entre os corações dos homens.
Universalidade*
É como se cada um deles fosse o único,
E cada outro fosse o mesmo um,
E não houvesse nenhum mais além.
E como se cada um deles fosse o outro,
E por não haver, por isso, mais nenhum
Além daquele um que já são todos,
Fica assim como se fossem inseparáveis,
E também, por conta disso, indivisíveis,
E o que for permitido a este um, que seja
Distribuído igualitariamente,
Sem diferenças, sem distinção...
Porque é como se cada um deles fosse o próximo...
E o direito de um deles fosse o mesmo
De todos os outros, sem discriminação...
95
Somos, segundo a Organização Mundial de Saúde,
mais de treze milhões que surgem a cada ano.
Isso é alguma coisa perto de dez por cento de todos os
bebês nascidos vivos no planeta.
Desses treze milhões, um milhão de nós não consegue
sobreviver e morre por condições inadequadas de
atendimento.
A maioria de nós chega ao mundo pelos países de
economia frágil: Ásia e África.
São nesses países também que a maior parte de nós
não sobrevive.
Aqui no Brasil temos crescido em número de
nascimentos a cada ano.
Formamos um pequeno país dentro de um grande país.
Um pequeno país de exilados de suas famílias,
confinados a casas de acrílico e a um ambiente
exageradamente tratador.
Ao lado das aminas salvadoras, recebemos
excessivos som, luz, dor, manipulação, falta de sono e
privação do amor, do calor e do leite materno...
Sabemos que esse exilio cruel é decretado em nome
de nossa cura
E temos consciência de que o esforço das equipes de
saúde para garantir nossa sobrevivência tem sido
surpreendente e essencial.
Tem sido cada vez mais aceitável a certeza de que,
passados os dias de UTI, retornaremos para o colo de nossas
mães e para o seio de nossas familias, sobrevivendo aos
presságios de morte certa e às previsões mais pessimistas...
Somos imensamente gratos à ciencia que tem nos
permitido estar aqui, salvos do caos gerado por um
nascimento fora de época, antes do que era para ser...
Mas hoje queremos, nesse manifesto, juntar nossos
frágeis corações e nossa delicada saúde em um esforço ultra-
humano e dizer para o mundo que nos cuida, nos cataloga,
nos cochraneia e nos transforma em dissertações de
mestrado, teses de doutorado, artigos, livros, entrevistas,
reportagens, poemas e imagens pelo mundo afora:
Exigimos respeito.
Nossas mães, enfraquecidas, na maior parte das
vezes não tem recebido permissão para estar em nossa
companhia pelo tempo inteiro de que ambos precisamos.
Muitas das Unidades Neonatais para onde somos
deportados não tem sequer espaço físico ou pessoal
escalado para recebê-las e cuidar delas.
Chamam esses lugares de UTIs Neonatais como se
nós, recém-nascidos, fossemos independentes de nossas
mães, e como se nossas vidas não precisassem da vida e da
presença delas para crescer com harmonia e integraldade.
E sequer destinam recursos para garantir vagas para
muitos de nós nessas UTIs. Muitas mortes ocorrem por
Manifesto prematuro
socorro insuficiente. Por condição técnica inadequada. Por
pessoal sobrecarregado por plantões desumanamente
superlotados de tarefas graves. Somos assim, por esse
descaso oficial, tratados como supérfluo, como sobra.
Sobreviver é lucro, não essencial. Como se a vitória de
alguns de nós, alcançada em grandes centros
adequadamente equipados, não pudesse, por conta disso,
dessa disparidade de condições, ser estendida a todas as
Unidades do mundo. E como se não fosse possível existir
Unidades suficientes no mundo para cuidar de todos nós.
Somos a sobra. E assim, muitos de nós nascemos
decretados à morte por simples negligência do restante da
humanidade. E olha que a história deve grandes passos de
sua caminhada a homens que um dia nasceram prematuros
como nós, mas que o cuidado materno preservou para a vida:
Albert Einstein, Isaac Newton, Pablo Picasso, Charles Darwin,
Vitor Hugo... Se a humanidade sem eles seria tão mais triste,
por que não investimos numa humanidade com todos nós,
com uma humanidade inteira?
Respeito.
Inadmissível perceber que as pessoas falam tão alto
nas Unidades Neonatais como se essas Unidades fossem a
casa delas, e não a nossa.
Como se cuidar de nosso cérebro em desenvolvimento
(foi assim que aprendemos com a tia Raquel Tamez*) não
tivesse a haver com falar baixo e causar menos barulho e
menos dano, perturbar menos nosso sono, impedir menos
nosso repouso...
Nossos cuidadores precisam respeitar nossa dor e
trabalhar para não causá-la a cada agulhada entre as
intermináveis coletas de exames muitas vezes protocolares,
que atendem, muitas vezes, mais às necessidades deles que
as nossas.
Aluz nas UTIs não precisava ser tão forte nem ser forte
o tempo inteiro. Todos sabem que precisamos de um pouco
de penumbra a fim de preservar nosso sono, como seres
humanos que somos. A ciência não já determinou que é no
sono que o nosso cérebro se reorganiza e registra
aprendizados e cria sua memória? Se já inventaram a luz de
cortesia para os ônibus, por que não utilizam esse benefício
simples e barato em nosso favor?
As equipes que cuidam da gente precisam saber como
conversar conosco, mas para isso precisam entender as
coisas que dizemos com nossas mãos, com nossos olhos,
com nossa boca, com nossas perninhas, com nossos
dedinhos, com nossos pés... Precisam entender quando
dizemos: estou querendo ficar sozinho ou quando
chamamos: fica aqui comigo. Precisam aprender quando
cansamos. Precisam entender quando dizemos: você não
acha que está exagerando? Precisam nos proteger do
cansaço, da fadiga, da exaustão...
Somos impedidos do contato com o seio materno sob
alegações que graças a Deus muitos serviços já provaram
serem descabidas. Muitos de nós somos afastados da
primeira experiência com o seio materno até que
completemos trinta e quatro semanas ou alcancemos mil e
oitocentos ou dois mil gramas. Abandonam nossa boca.
Nossa possibilidade de sucção é negligenciada. Mas não se
acanham de nos oferecer através de sondas, gazes, tubos e
outras geringonças um sem-numero de experiências orais
negativas e desestabilizadoras... Felizmente muitos de nós ja
temos contato com a mama da mamãe (que é mamãe porque
nos oferece a mama, não é mesmo?) com pesos próximos a
mil e duzentos gramas e é ai que aprendemos a sugar para
que possamos, depois dai aprender a mamar...
Exigmos respeito.
Ter nossas vidas salvas mesmo sob condições de
muito empenho e dedicação não pode ser o argumento para
nos transformar em reféns silenciosos de um tratamento que
não cuida de observar nossa individualidade, de nos
reaproximar de nossa mãe, de nossa família, de nos tratar de
modo contingente e ajustado...
Ah...
É por conta disso que exigimos respeito.
Há pouco mais de trinta anos na Colombia os tios
Hector Martinez** e Edgar Rey** mostraram ao mundo como
é importante estarmos perto de nossas mães e como seu
calor, seu amor e o leite de seu peito são essenciais pra nosso
crescimento saudável.
98
Há pouco mais de três décadas alimentamos, treze
milhões a cada ano no mundo, a esperança de permanecer
vivos fazendo nossos cuidadores nos enxergarem para além
da bioquímica e cuidar de nós para além da farmacologia.
Exigimos respeito.
Somos bebês que nasceram antes da hora do que era
pra ser.
Não somos outra espécie de gente. Somos humanos.
Temos direitos inalienáveis e inegociáveis que são trocados e
esmagados a cada entubação ou a cada necessidade de
medicalização ou de coleta de dados laboratoriais.
Exigimos respeito.
Um respeito que é nosso por direito.
Um respeito universal.
Um respeito que faz parte da Lei de Deus.
Continuaremos atentos e clamando para que a
humanidade que escapou do pesadelo que nos acompanha
muitas vezes pelo resto de nossas existências, em nome de
nossa integridade, tenha piedade de nós.
Assina, com carinho,
Um bebê nascido prematuramente, livre e igual a todos
os outros bebês do planeta em dignidade e direitos, dotado de
razão e consciência, possuidor de vida anterior ao
nascimento, bem como memória, aprendizado, emoção e
capacidade de resposta e interação com o mundo em sua
volta, e inquestionavelmente digno de ser, em todos os
lugares e sem qualquer distinção, reconhecido como pessoa
diante da Lei.
* RaquelTamez é Enfermeira e autora do livro uma obra clássica que fundamenta os cuidados da assistência neonatal
nos cuidados voltados para o desenvolvimento do bebê e respeitosos para com sua integridade biologica e emocional.
** Hector Martinez e Edgar Rey, colombianos, criadores da Metodologia Mae Canguru desde 1979 que mudou radicalmente os paradigmas do cuidado
neonatal no mundo inteiro.
Enfermagem na UTI Neonatal,
Natural de Campos dos Goytacazes.
Médico graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro em 1984.
Plantonista da Unidade Neonatal do Hospital dos Plantadores de Cana de Campos, RJ.
Autor de “Uma Declaração Universal de Direitos para o Bebê prematuro” (2009) e de sua
“Edição Comentada” (2011).
Co-autor, ao lado do Professor Marcus Renato de Carvalho do livro “Amamentação – Bases
Cientificas” pela Editora GEN.
Editor do blog alemdauti.com.br
Editor do blog quasepoesia.blogspot.com
Autor do documentário (youtube.com) que desfila as experiências de vinte mães
de entre tristezas imensas e alegrias intocadas.
Autor dos videopoemas S (youtube.com) e
(youtube.com), que têm sido usados em Cursos de Amamentação pelo
Brasil afora desde sua publicação.
Tricolor, mas nem por isso um sofredor. Leitor atento dos versos de Chico Buarque, Drummond,
Augusto dos Anjos e Castro Alves.
Ou seja:
Um nada diante da grandeza infinita do Universo do Criador, e um admirador silencioso do grande
trabalho de Deus.
OS DIAS DE UTI
UTI
OMOS MAMIFEROS SOMOS
MAMIFEROZINHOS
O Autor
Poemas e Manifesto Prematuro - Luís Alberto Mussa Tavares
Fotografias do autor manipuladas digitalmente por Lívia Ressiguier,
exceto:
Colostroterapia - Google
O bebê na redinha - Google
O banho - Google
O cuidador - Lívia Ressiguier (Fotografia feita durante
o tratamento de sua filha Aymme, nos dias de
Agradecimento especial ao amigo Fernando Luiz
Textos
Imagens
Introdução - Ricardo Jhones
Ressignificando - Lívia Ressiguier
UTI)
Créditos
Poema
Declaração de Domínio Público
Dedicatória
As mãos da amiga e as mãos de Deus
Os poemas para almas apressadas.
Introdução - Ricardo Jhones
A dor
A Lei de Deus
A mãe e o filho
Às mães de
A mãe prematura
Amamentando
A tempestade
Canção do exílio
Canção para te fazer sonhar
Canguruzinho
Colostroterapia
Comunicação
Constatação
Desabafo
Descobrimento
Itinerário
Mães
Mamiferozinho
Nascimento
O banho
O bebê na redinha
O cuidador
O olhar
O pai canguru
Oração pelas mães de
Oração pelos meus cuidadores
Os prematuros extremos
Poeminha para Anna Clara
Quem cuida das mães de ?
Reconhecimento
Trinta Graminhas
Treze Milhões
Uma canção amiga
Universalidade
Manifesto prematuro
O Autor
Créditos
Ressignificando - Livia Ressiguier
UTI
UTI
UTI
05
07
11
13
15
17
19
21
23
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POEMAS para ALMAS APRESSADAS - livro

  • 1.
  • 2. Tanta palavra, Tanto trabalho, Tanto diagnostico Avassalador, Tanta cultura Entre a dor e a cura, Tanta procura Pelo fim da dor, Tanta rotina, Tanto medicamento, Tanto equipamento De alto valor, E nada disso, Aparentemente, É suficiente Pra garantir um cuidador... É necessário Mais do que técnica, Mais do que máquina Ou do que titulo De Doutor... A tecnologia Não acaba com a tristeza, O antibiótico Não trata o sofredor... É necessário Revirar o dicionário Para encontrar Uma fonte de calor Que afaste o medo E faça companhia Sem se importar Com nome, idade ou cor... É assim o amor... É ele o que nos basta. Sem ele tudo é fraco E enganador. Experimente algum dia Não ter nada, Além de um simples olhar Confortador, Além de um aperto de mão Ou de um sorriso, Além de um gesto Doce e apoiador... Experimente nesse dia Não ter nada, E esse dia será Revelador Porque não será preciso Mais que nada Se, tendo nada, Você tiver amor... Porque a vida sem amor É uma vida esvaziada Mas que pode ser transformada Pelo amor... Amor que é tudo de bom, Que a tudo agrada, Amor essencial, Profundo amor... 05
  • 3. Esta é uma obra de domínio publico. Seu conteúdo pode ser reproduzido, compartilhado, modificado completamente ou em parte sem necessidade de autorização ou citação dos créditos autorais. É também permitido copiar, mostrar, baixar, distribuir, reproduzir, republicar ou retransmitir qualquer informação, texto ou ilustração deste volume, em qualquer meio eletrônico ou fisico, bem como criar qualquer trabalho derivado com base nessas imagens, textos ou documentos sem o consentimento do autor, sendo recomendado, entretanto, que se evite sua comercialização. Uma cópia digital para livre download está disponivel no site www.alemdauti.com.br A poesia sopra onde quer. Tentar aprisioná-la é priva-la de sua liberdade. Simples assim: A palavra, depois de escrita, não tem dono, Se fica guardada, não tem serventia, Guardar a palavra é condená-la ao abandono, Guardar a palavra é subtrair-lhe a poesia... A palavra, se guardada, é um Rei sem trono, É um Pedro Alvares Cabral sem a Bahia. Mas uma vez espalhada, perde o sono, Disseminada, cai na folia... Compartilhar a palavra é um mandamento Que permite à palavra o livramento E que tempera a palavra com alegria... Compartilhar a palavra, incondicionalmente, É permitir-lhe a liberdade inconsequente, É entregar-lhe a sua carta de alforria... 07
  • 4.
  • 5. Edição comemorativa do II Encontro de Pais e Cuidadores de Bebês Prematuros Campos dos Goytacazes 15 e 16 de maio de 2014
  • 6. Dedicatória Aos meus pais, que também foram pais prematuros, Aos pais e aos bebês prematuros do mundo inteiro, Aos seus familiares, Aos cuidadores que dedicam seu aprendizado e seu dia a dia à nobre tarefa de amenizar dores, À equipe de profissionais da Unidade Neonatal do Hospital dos Plantadores de Cana de Campos pelo zelo e pela retidão com que conduz sua trajetória diária e pela forma carinhosa com que me recebeu no meu retorno à essa casa, Aos amigos Lívia, Henrique e Aymee, À amiga Sidianara Ofrante Nogueira, Estes poemas E nosso carinho. Luís Tavares.
  • 7. As mãos da amiga e as mãos de Deus Era fevereiro de 2014 quando a amiga querida partiu apressadamente e foi viver numa das várias moradas do Pai que está nos Céus. Não houve tempo para as despedidas que desejaríamos ter oferecido à ela. Partiu apressadamente. Encontramos nos nossos arquivos essa única imagem que guardamos dela. Com uma de suas mãos, ela toca com firmeza e docilidade a cabecinha do pequeno bebê, alma apressada, oferecendo a ele proteção e apoio, enquanto com a outra empresta limites aos seus movimentos, acalmando sua agitação e mostrando, em silencio, a percepção de sua companhia para que ele não se sinta tão sozinho ali na Unidade Neonatal distante de seu lar. Fevereiro de 2014. Apressadamente a amiga nos deixou, e como recordação desse convívio de trabalho em comum, guardamos tão somente essa fotografia que não mostra seu rosto nem seu sorriso, mas traduz o que de mais significativo ela distribuiu por aqui entre nós: apoio, proteção, acolhimento e companhia. A poesia arrisca acreditar que a amiga gentil terá sido recebida pelas mãos do Criador, uma delas colocada com firmeza e suavidade sobre sua cabeça esgotada pela luta de seus últimos meses entre nós, como sinal de proteção e apoio, e a outra lhe trazendo um abraço gentil como dá quem oferece companhia para a caminhada que segue para além da vida como a conhecemos e como nos acostumamos a entender. Fevereiro de 2014. Amiga gentil. Leva no seu coração nossa saudade. Não nos solte de suas mãos generosas. Não nos deixe sem sua proteção firme, sem sua companhia sincera. Estamos orando e torcendo sempre por você Porque desde então Sidianara Ofrante Nogueira Nos campos do Senhor Passou a significar Nome de anjo... Com carinho. Luis Tavares. 13
  • 8. Os poemas para almas apressadas Esta coletânea de versos e rimas é dedicada ao universo dos bebês que nasceram antes do tempo que era para ser, apressadamente. “Almas apressadas” é uma expressão que ouvi pela primeira vez em conversa com o colega obstetra Ricardo Herbert Jhones em 2010, durante o XI Encontro de Aleitamento Materno em Santos, SP. Estas pequenas alminhas apressadas, capazes de mobilizar um sem-número de iniciativas durante sua passagem pela Unidade Neonatal e em muitos casos durante toda a sua vida, são aqui lembradas na sua dor, na sua força, nos seus clamores, na sua integralidade, seus pais, seus cuidadores e até mesmo nas horas tristes e irreversíveis de sua partida. São versos, alguns inéditos, outros já publicados nos blogs www.quasepoesia.blogspot.com e www.alemdauti.com.br, e no volume “Uma Declaração Universal de Direitos para o Bebê Prematuro”, de 2011, e pela primeira vez reunidos num único volume para homenagear nossos pequenos grandes irmãozinhos e suas famílias. São fragmentos de carinho e afeto pelo que aprendemos diariamente sobre sua infinita grandeza. Decidimos oferecer a cada poema uma nota de rodapé a fim de que o leitor menos familiarizado com o tema da prematuridade possa perceber o significado das poesias para além das rimas e entender a combinação do universo poético com a realidade clinica da rotina de uma Unidade Neonatal. Que Deus esteja com cada um de nós a cada dia em nossa caminhada. Luís Tavares 15
  • 9. A decisão está tomada, e as rodas mal azeitadas da maca guincham pelo corredor estreito, driblando macas, cadeiras, enfermeiras e passantes. Para ela o mundo repentinamente se transforma em tetos mofados e luminárias sujas, que passam diante de sua face pálida como um filme antigo. Os olhos sequer se mexem. Fixos no alto, apenas aguardam a entrada no centro cirúrgico para voltarem a piscar. O cheiro das limpezas, o brilho ofuscante de mil luzes, o som dos metais tilintando nas mesas e as rodas que param de guinchar lhe anunciam a chegada à sala de operações. Com esforço ajusta seu corpo cansado na mesa cirúrgica, auxiliada por pessoas sem nome, sem fala e sem rosto. Pendurado no braço o manguito; na dobra descorada do cotovelo a fina agulha penetra, por onde escoa um líquido cristalino. No teto a roda luminosa se acende, e pode ver seus múltiplos rostos aflitos refletidos nos anteparos das lâmpadas. Mantém-se em silêncio devocional, como se qualquer som quebrasse uma norma da qual não saberia a razão. Apenas obedece maquinalmente as ordens que lhe são dirigidas. “Vire-se para este lado”, diz um senhor mascarado de voz grossa, enquanto a enfermeira aperta seu queixo contra o peito desnudo. “Não respire. Se você ficar bem quietinha termino bem rápido”. Sente um choque elétrico a lhe percorrer a coluna e retesa o corpo em resposta, mas em seguida percebe as sensações paulatinamente desaparecendo. Dividida ao meio, seu corpo de baixo para e dorme; o corpo de cima silencia e espera. E reza. Depois as higienes, os panos, as frases desconexas que lhe chegam aos ouvidos. Palavras cruzam a sala sem que delas se capte o sentido. Apenas o medo, como um código secreto compartilhado, percorre as almas da sala. Então o silêncio. Por alguns instantes todos estão imóveis. Nada se ouve. Finalmente a lâmina grave fere a carne, abre o espaço, penetra. Depois disso, apenas o “bip” das máquinas quebra a monotonia sonora. Pequenos estalidos se seguem. Dos presentes, nenhum som, sequer uma expressão. A luz intensa cega, o tempo fica estanque. As camadas da carne rubra vão sendo abertas, uma após a outra, até que a nave uterina, com sua cor rosada e brilhante, aparece diante do brilho ofuscante do foco de luz. Ali dorme nosso herói, mas será preciso acordá-lo. Um, dois, três cortes precisos da navalha fria. O amnionauta, encerrado em seu mundo de sonhos, nem percebe que seus devaneios de sons e luzes tênues serão interrompidos pelo nosso chamado. Um último corte e chegamos no interior da diminuta esfera. Pela translucência das camadas, que envolvem o universo ínfimo do pequeno ser, podemos ver que ainda dorme. Com um golpe derradeiro e definitivo, rompemos a bolsa, e os panos verdes que cobrem a nudez se escurecem com o líquido amniótico que escorre sem pudor. É o tempo de nascer. Introdução
  • 10. Dois ou três movimentos e a cabeça salta para fora da ferida. “Desculpe, amigo. Não era seu tempo, mas foi preciso lhe resgatar”. Seu corpo miúdo escorrega para a sala e para o mundo, deixando como rastro o frágil fio que o liga à placenta. As mãos enluvadas suportam o corpo esquálido que, de tão frágil, mal pesa. Ao invés da pele uma fina camada transparente róseo-violácea. Ao invés de cabelo, uma tênue penugem que mal lhe cobre a cabeça. Mal saído do claustro materno ele abre os braços e por um instante parece procurar algo. Ou alguém. Sua expressão é de dor e angústia, a mais antiga de nossas emoções. “O que faço aqui? Porque interromperam meu sono?” pergunta-se. Seus dedos finos e azulados abrem-se e procuram agarrar a luva ensanguentada. Ele contrai seu corpo minúsculo, estende mais uma vez os braços enquanto aguardamos ansiosos os primeiros sons. Sofre, pela primeira vez, a dor do excesso de espaço. “Onde está minha mãe, que me envolvia e acalentava desde quando minhas primeiras células se dividiram? Onde está aquela que tocava com doçura cada pedaço do meu corpo? Abro os braços e só o que agarro é o espaço, o nada. Estou só.” Abre a pequenina boca e quando esperamos um grito escutamos apenas um tímido e fino sibilo. Um lamento. A sala novamente se enche de silêncios. Cordões são cortados, amarra das almas desfeita. Os panos verdes o envolvem num triste celofane. Um sibilo a mais e ele é levado para distante dos nossos olhos. Os corpos se separam em salas contíguas, mas a mulher cortada ainda jaz à nossa frente. Temos trabalho a fazer e o mais difícil de todos é suturar a alma dilacerada de uma mãe. Corroída pela culpa e pela angústia, olha para a porta que recém se fecha. Seus ouvidos se agrandam para escutar mais um sinal, por menor que seja, do pedaço de si mesma que há pouco se foi. Fecha os olhos e reza em silêncio. Chora pela separação, pelo medo de perder, pela tristeza de ver seu filho sofrer. Imaginariamente abre seus braços e o abraça, junto ao colo. Traz o rostinho amarrotado e lívido para perto do seu e sussurra em seus pensamentos “Mamãe está aqui. Não vamos nos separar. Sei o quanto precisas de mim e também sei o quanto é preciso que eu esteja ao seu lado. Não se desespere, mamãe está aqui”. E nós, ao seu lado, apenas nos calamos e testemunhamos sua dor. Na sala ao lado, outra batalha se trava. Consternados perguntamos àquele pequenino que se posta à nossa frente: “Por que agora? Por que tão cedo? Qual a pressa em chegar a um mundo de expiações e sofrimentos?”. Sua resposta é apenas o choro fino, o lamento de uma alma apressada. Dr. Ricardo Herbert Jhones (Médico obstetra, Porto Alegre, RS)
  • 11. Quanta felicidade! Que honra! Recebi o convite para participar do livro Poemas para Almas apressadas. Falar de mim, da minha filha, agora que a dor.... passou? Parecia... Mas ela estava ali, tão exposta, a cada linha, a cada frase. Às vezes foi preciso uma pausa. Parar, respirar, deixar a lágrima correr para seguir em frente. Foi preciso voltar ao tempo, sentir o cheiro, o gosto, ouvir o som, perceber o coração e alma serem dilacerados dia a dia durante os 232 dias passados na UTI Neonatal. Foi preciso olhar em volta, lembrar que nesse exato momento tem outras mães passando pelo mesmo momento que um dia estive. Lembrar do quanto eu procurei por outros depoimentos, outras histórias, o quanto cada uma delas fortalecia a minha esperança. E por isso voltei e revivi cada momento. Com o distanciamento da lembrança e o medo que vira e mexe teima em aparecer. Às vezes aparece num espirro. Mas parece ser apenas um estalo para que ele grite dentro do peito, como todos os gritos que foram abafados desde o momento que soube que teria em meus braços uma alma apressada. Dessas que não espera a hora, a preparação, não espera a notícia se espalhar. Apenas chega sua hora. E ela chega. Chega para mudar a rotina, a vida, a concepção de mundo, de tempo e de espaço. Que chega para falar de mamadeira em gotas, de peso em gramas, de respiração em saturação. E chega para falar de amor. Um amor que transborda, que transcende, que exagera. Uma alma apressada, como se não pudesse mais esperar para amar. Ressignificando Lívia Ressiguier * *Lívia aceitou o convite para colaborar com este trabalho, todo feito inspirado na sua história valorosa de mãe de .UTI
  • 12.
  • 13. A dor* Por que é que você chega sempre assim, estabanada, Desinibida, desarrumada, Causando tanta desorganização? Por que é que é sempre tão sem paciência, Por que se comporta com tanta displicência, Por que é que age com tanta desatenção? Por que é que é sempre assim tão turbulenta, Por que é que chega sempre com tormenta, Como o Katrina? Por conta de que tanta adrenalina? E se eu cuidasse de você, dor, Com o mesmo cuidado de quem cuida de um amor? E se tratasse você com mais respeito? E se eu me preparasse Pra toda vez que você chegasse Encontrasse tudo pronto, do seu jeito? E se eu arrumasse tudo com carinho, Tudo do seu jeitinho? Você ficaria contente? Você se comportaria de um modo diferente? Então, minha amiga dor, combinamos assim: Eu cuido de você, você cuida de mim, E a gente não se descuida nem se maltrata... Eu me preparo pra sua chegada, Você se aproxima bem mais arrumada, E a gente não se machuca nem se mata... Quem sabe um dia a gente não se entende, Você me compreende? Será que está bom assim dessa maneira? Nós temos um acordo, companheira? *Ador não necessariamente tem que ser acompanhada de sofrimento.Autilização de mecanismos simples e não medicamentosos pode proteger com muita eficiência a carga exagerada de estímulos nocivos muitas vezes presentes na Unidade Neonatal. 21
  • 14. A Lei de Deus* O prematuro que não consegue respirar, A gestante que dá à luz na entrada do Hospital, Os níveis de bilirrubina que insistem em não baixar, A imagem sugestiva de hemorragia intracerebral, A sepsis que continua a se agravar, A insuficiência cardíaca resistente ao digitálico, O cateterismo que não para de sangrar, O prematuro que não acha vaga numa Neonatal, E a Lei de Deus, sem defeitos, sem rasuras, Vai se cumprindo entre dores e amarguras, Entre lamentos, lágrimas e feridas, E embora às vezes nos confundindo, Segue, intocada e pura, se cumprindo, Dando outro significado às despedidas... UTI *ALei de Deus não tem tradução simultânea. Muitas vezes vai ser preciso esperar muito tempo, muitas vezes, muitas gerações até, para que seus significados sejam compreendidos com clareza pelo coração do homem, mesmo o que crê. 23
  • 15. A mãe e o filho* A mãe e o filho, a dura realidade: A dor, a saudade, o medo, a impotência... A distância machucando a maternidade, A maternidade alimentando a sobrevivência. A mãe e o filho, e entre os dois, a tempestade, E a UTI Neonatal toda feita de ciência. A mãe e a sua dor maior que a humanidade... O filho e a sua dor banhada em obediência... A mãe e o filho, almas despedaçadas, Vidas que era pra estarem juntas, separadas, Como se estivessem condenadas ao escuro... Que Deus ilumine e proteja seus caminhos, Para que não se sintam assim, sozinhos, A mãe prematura e seu filho prematuro... *A maternidade prematura gera um desalinho tão grande para o coração materno quanto a clinica do nascimento prematuro gera para o bebê recém-nascido. Perceber a maternidade em seu significado ampliado é considerar para sempre mãe e filho inseparavelmente. 25
  • 16. Às mães de UTI* Mães delicadas, maravilhosas, Mães prematuras do meu coração, Mães dedicadas, mães cuidadosas, Mães que se alimentam de vida e paixão... Mães que são como o perfume das rosas Tocando a nossa emoção... Mães privilegiadas, mães dadivosas, Mães de um sorriso que não tem explicação... Que Deus esteja sempre do seu lado, Mantendo esses corações iluminados, Que ensinam o que é o amor à Terra inteira... Muito obrigado por tudo, mães queridas, Que tocam com seu amor as nossas vidas E com sua força tão verdadeira... 12 *As mães de UTI, em relação à todas as outras mães da humanidade, possuem o mesmíssimo amor, com uma característica entretanto que o diferencia: um amor posto à prova, despedaçado fibra por fibra, um amor vivenciado de paixão e dilacerado ao extremo. Um amor que permanece leve, presente e incansável ainda assim... 27
  • 17. A mãe prematura* A mãe prematura do bebe prematuro, Nascida antes do que era para ser, Como quem antecipa o seu futuro, Como quem torna-se sem perceber... A mãe prematura do bebe prematuro, E a luta por seu bebê sobreviver... Às vezes tudo é tão sombrio e escuro, Tudo tão frio, tão sem amanhecer... A longa dor de quem aguarda a cura, Como quem, sem saber o que, procura, E assim, nessa procura, se desfaz... Segura nas mãos de Deus, mãe prematura... Segura nas mãos de Deus, que te segura... Segura nas mãos de Deus, e segue em paz... *A mãe prematura não é a mãe adolescente nem é a mãe de primeira viagem. Não é a mãe quarentona. Não é a mãe cesariada. A mãe prematura é chamada assim por ter se tornado mãe, em qualquer idade e com qualquer histórico, antes do tempo esperado para completar sua maternidade. Cada nascimento prematuro de um bebê é também o nascimento de uma maternidade prematura tão dolorosa quanto e tão necessitada de cuidado quanto seu filho. 29
  • 18. Amamentando* A mãe prematura e a hora tão sonhada De trazer seu bebê ao seio para mamar... Custou, mas finalmente ela parece preparada... Custou, mas finalmente chegou o dia de tentar... O bebê prematuro, após longa caminhada, Parece estar pronto para o tempo de gostar Do colo da mãe, da hora da mamada, Da vida que parece começar a melhorar... E entre espasmos musculares e descargas Neuro-hormonais, o leite, em gotas vagas, Começa a surgir da mama, e vai brotando... O bebê prematuro, a mãe prematura, E seu momento imaculado de ternura... É coisa de Deus esses dois se amamentando... *Vencer longas etapas de uma preparação que para o restante da humanidade é quase fisiológica requer o cumprimento, pela mãe e pelo filho, de um longo caminho que desagua, quando bem apoiado e conduzido, num oceano de possibilidades enternecedoras. 31
  • 19. A tempestade* Às vezes ela tem nomes estranhos, Palavras de difícil compreensão: CPAP, Surfactante, Fototerapia, Incubadora, Resíduo, Saturação... Às vezes tem efeitos complicados, Síndromes raras, Malformação, A tempestade, Mas pode chamar de apneia, Abalos, Arritmia, Convulsão... *Tempestade é certamente o substantivo mais representativo do que acontece com o coração da mãe, do filho e da família prematura por ocasião de seu nascimento. Tempestade que guarda entre seus significados, sentidos que muitas vezes só conseguem ser traduzidos após sua bonança. 33
  • 20. Às vezes chega cheia de segredos, Palavras de incompreensível tradução: Prognósticos, Sequelas, Resistências, Intolerâncias, Dificuldades de sucção... A tempestade... Às vezes tem sinônimos tão próprios: Incubadora, Venopunção, Gavagem, PICC, Cateterismo, Tomografias, Bombas de infusão.. A tempestade... Começa às vezes como chuva fina, Garoa leve, E aumentando, Até que então A chuva vai se fazendo mais intensa, E vai crescendo, causando aflição, E chega com a força devastadora De uma cachoeira, De uma inundação, E desarruma, Fere, Desconcerta, Machuca, E provoca Grande confusão... 34
  • 21. A tempestade, Como um apocalipse, A tempestade, Estranha condição, Que chega como quem vai destruir tudo, Que chega causando devastação... A tempestade... Que chega Desarticulando A família inteira Sem piedade, Sem pausas, Sem perdão: A mãe, O filho, O pai, O tio, A tia, O avô, A avó, A madrinha, A sogra, O irmão... A tempestade... Estremecedora... Como se fosse o estrondo de um trovão... Que afeta a fé do crente, A paz do justo, A crença do que crê Na salvação, A tempestade como se fosse um tiro, A tempestade, Como uma infecção... 35
  • 22. Até que um dia ela acalma, Cedo ou tarde, Reduzindo sua força Como quem pede perdão, Até que um dia Ela se cansa E dorme, E perde sua capacidade de agressão, E esvaziada, Como quem se cansa, E já sem vontade, Como quem perde a paixão, A tempestade Que parecia eterna, Se afasta, Cede, E já não dói mais não... É nessa hora Que a Lei de Deus Costuma se revelar Com perfeição, E toca o coração enfraquecido, Suturando os retalhos Desse coração, Lavando as dores, Enxugando as lágrimas, Descansando o cansaço E a exaustão, A Lei de Deus Depois da tempestade, Trazendo bonança E reconstrução... E o que era frágil Torna-se firme, E o que era medo, Consolação, O que era morte Torna-se vida, O que era fuga Torna-se prontidão, E o que era quase incompreensível Dores sem causas, Causas sem razão, A Lei de Deus torna fé inabalável, E força indestrutível, Sublimação, E nasce assim, Depois da tempestade De nome estranho, De estranha compreensão, Dessa tempestade que desorganiza, Provocando grande desarrumação, E nasce assim, desse momento em diante, Uma nova mãe, E um novo filho, e então, Uma nova família Realimentada, Uma fé renovada... Reconstrução... 36
  • 23. E tudo então Ganha um significado: A dor, O medo, A separação, As palavras angustiantes, Como tomografia, As palavras dolorosas, Como dissecção, E os sentimentos, Como a ansiedade, A insegurança, A saudade, A incerteza, A desolação... E tudo então, Desde ai, ganha um sentido, E a tempestade Cumpre assim sua função, E é nessa hora que se compreende Que Deus manteve sempre a Sua mão Estendida, Protegendo, Alimentando, Nada aconteceu Sem Sua permissão, Nenhuma dor, Nenhum choro, Nem lamento, Nenhuma piora, Nenhuma recuperação, A Lei de Deus, O Grande Regimento, A Lei de Deus, A grande explicação... Por isso A poesia Compreende A tempestade Como um instrumento, A tempestade Como uma lição, A tempestade Como um chamamento, A tempestade Como uma ressignificação. 37
  • 24.
  • 25. Canção do exilio* Minha terra tem carinhos Em que eu gosto de deitar. As vozes que aqui me tocam Não me tocam como lá. Minha terra tem mais gosto, Mais ternura, mais sabores, De um silencio com mais vida Carregadinha de amores. Em cismar, sozinho, à noite, Mais prazer encontro eu lá; Minha terra tem cantigas Delicadas de ninar... Minha terra tem delicias Que tais não encontro eu cá. Em cismar -sozinho, à noite- Mais prazer encontro eu lá; Minha terra tem carinhos Em que eu posso descansar. Não permita Deus que eu custe A retornar para o meu lar, E desfrutar dos primores Que não encontro por cá; Para escutar as cantigas Da minha mãe me ninar... *O poema clássico de Gonçalves Dias tem o mesmo nome: “Canção do exilio”.Aqui é relido sob o olhar não de um exilado de sua terra natal, mas sob a ótica de um bebê nascido prematuramente e vivendo em terras estranhas e distantes da sua terra materna natal, entre monitores e incubadoras e um universo inteiro de acrílico e metal, como uma condenação inapelável e sem culpa. 39
  • 26. Canção para te fazer sonhar* Descansa, anjo... Eu cuido do teu sono... Repousa tranquilo teu coração, Dorme suave. Nada lá fora Pode te ameaçar o sono agora, Descansa, fica leve, sai do chão... Descansa, anjo, que eu te protejo Dos olhos da bruxa, do bicho papão, Descansa que eu te cuido com desvelo, Descansa, já não há mais pesadelo, Descansa, eu te dou minha proteção... Eu cuido pra que nada te aconteça, Nada apareça de ruim que te incomode: Nenhum barulho, nenhum ruído, Nenhuma coisa má, nenhum perigo, Nada te assuste, nada te acorde... Dorme tranquilo. Deixa que eu te cuido: Nem muito frio, nem muito calor, Nenhum barulho ou conversa exagerada, Dorme, eu me entendo com a madrugada, Dorme, eu me entendo com o Criador... E nem que para isso eu me desdobre E até me esqueça eu mesmo de dormir, E passe a noite te vigiando, E passe a noite inteira te cuidando, E a noite passe sem eu sentir... Por isso descansa, eu cuido do resto: Da dor, do desconforto, do cansaço... Nada te preocupa mais... Descansa... Dorme teu sono, pequena criança, E o que for preciso deixa que eu faço: *AUnidade Neonatal é um local extremamente propicio para a semeadura de delicadezas de UTI, dadas suas características extremamente centradas na tecnologia e nas rotinas pré-estabelecidas. É um terreno fértil para a boa pega de apoios e carinhos tão essenciais à vidinha do pequeno bebê ali presente, de acordo com as normas que se conhece genericamente pela alcunha de “atenção humanizada”. Pelo menos é assim que pensa a poesia. 41
  • 27. Apago as luzes, reinvento a noite, E mudo algumas coisas de lugar Trocando turbilhão por calmaria, E transformando dor em poesia Só pra te ver descansar... E fico imaginando coisas boas Pra te esperar despertar: Um toque suave, gentil e apropriado, Uns truques para a dor sair do teu lado, E algumas musicas para cantar... Descansa, eu te preparo essa alegria: Silencio, ninho, sono, enrolamento, O colo materno juntinho o tempo inteiro, Dengo, carinho, um xodozinho, um cheiro, E um mundo inteiro de acolhimento... Por isso guarda a calma delicada, Nada de mal vai te acontecer... Eu dou um susto na bruxa malvada, Dorme tranquilo, anjo, porque nada Eu vou deixar mais te fazer sofrer... Descansa, anjo, eu cuido de tudo, Descansa, anjo, pode deixar, Descansa que eu te cuido com carinho, Descansa e guarda bem esse versinho Que eu preparei pra te fazer sonhar. 42
  • 28. Canguruzinho* Meu canguruzinho, Acolhido pelo conforto do seu ninho, Sereno, Silencioso E sossegado... Tão bom saber Que você não está sozinho, Tão bom perceber você Bem acompanhado, Porque, meu canguruzinho, Nenhum outro cantinho É mais gostoso e mais delicado Do que esse seu cantinho, Meninozinho, E nem cantinho nenhum Mais abençoado... Cantinho feito de amor E de calor, Banhado a leite materno, Cantinho delicadamente planejado... Cantinho único, Meu canguruzinho, Que é para ser vivido, Curtido E perpetuado... *Desde o final dos anos 70, a Colômbia, através da iniciativa dos pediatras Edgar Rey e Hector Martinez, o Método Mãe Canguru tem o mérito inquestionável de ter trazido a mãe de volta para o cuidado do seu filho e de desmistificar e reformular de certa forma o mito de que fora da UTI não há salvação, redimindo dois séculos de uma neonatologia separatista e tecnocrática, mudando o paradigma do cuidado neonatal no mundo inteiro desde então. O Método Mãe Canguru e seus três pilares: o amor, o calor e o leite materno. 43
  • 29. Quem vê você assim Pequenininho, Adormecido em seu ninho E sossegado, Não faz ideia do tamanho da sua história, Não imagina o que você tem suportado, Quase nem é capaz, Meu companheiro, De enxergar o tamanho verdadeiro Da sua trajetória E do peso que você carrega, Resignado, Do útero materno Ao nascimento, Do nascimento até esse colinho, Meu canguruzinho, Esse colinho que é seu sustento, Esse sustento Que é seu caminho... Esse caminho Que é seu legado... Meu pedacinho de gente, Meu gigante, Seu exemplo é impressionante E comovente, Justo por isso Absolutamente contagiante, Meu super-herói diferente... Meu pequenino grande viajante, Meu sempre bastante amiguinho, Meu bom companheirinho, e o mais constante, E o mais desconcertante, Meu canguruzinho... 44
  • 30. *Faz menos de dez anos que os trabalhos da Dra. Paula Meier vêm divulgando as vantagens do uso de algumas gotas de colostro da mãe prematura já nas primeiras horas de vida, aplicadas por ela mesma, apoiada e orientada pela equipe da Unidade, na boquinha de seu filhinho de muito baixo peso, mesmo quando em condições clinicas e respiratórias graves, favorecendo a sua estimulação imunológica e devolvendo à mãe o seu maior poder que é a prerrogativa de cuidar de sua própria cria de um modo sem comparativos e fazendo por seu bebê o que ninguém mais conseguiria fazer por ele. E é a isso que ela, a mãe prematura, chama de carinho. Não precisa de muita coisa. Quase nada. Somente a mãe do bebê pode fazer. Uma gotinha de colostro suavemente aplicada, Uma gotinha na boca. Que poder. Não precisa de muita coisa. Uma mãe dedicada E uma equipe profissional que permite acontecer. Uma gota. Um prematurinho. Uma equipe entusiasmada. E a vida, naquela gota, mandando ver... É a mãe prematura cuidando da sua cria, Oferecendo sua gota colostral de energia, Estimulando a imunidade de seu prematurinho... Alguns médicos descrevem isso como Colostroterapia, Alguns outros aproveitam para escrever poesia, Mas a mãe prematura chama isso de carinho... Colostroterapia*
  • 31. Ensina-me a compreender tuas vontades E a entender o que dizes com o olhar, Ensina-me a valorizar tuas verdades E a perceber tua forma de falar, A descobrir tuas singularidades, E a responder quando tua voz chamar, A respeitar tuas dificuldades, Ensina-me a aprender a te ajudar... E um dia, quando eu compreender teus gestos, E souber diferenciar os teus protestos Das tuas necessidades de aproximação, Então, exatamente nesse dia, Será como descobrir tua poesia, Será como desvendar teu coração... *Durante os dias de UTI os bebês prematuros, bem como todos os outros, prematuros ou não, emitem sinais de comunicação com o mundo à sua volta, muitos deles já catalogados e conhecidos dos estudiosos do tema, sinais que traduzem seus desejos de interação com o mundo à sua volta ou retraimento, do tipo “quero ficar na minha”. Cabe ao cuidador conhecer esses códigos e decidir-se por respeita-los da mesma forma como faz questão de ser respeitado em sua vida. Simples assim. Comunicação* 47
  • 32. Constatação* Quando a gente vê um bebe sozinho, O que é que exatamente a gente vê? A gente vê um pedaço, Uma parte, Uma fração... Porque um bebe sozinho não existe, O que existe É um bebe E a sua mãe. Essa é talvez a única verdade, Tudo o mais, em verdade, é distração... *”Um bebê sozinho não existe. O que existe é: um bebê e sua mãe”. Essa é talvez a frase mais citada do médico pediatra e psicanalista inglês Donald Winnicott, e faz o profissional que lida com a prematuridade entender que nenhuma linha de cuidado deve incluir um sem levar em conta o outro. O vinculo entre mãe e filho é uma verdade sagrada e inviolável. Versos livres sobre uma verdade Winnicottiana 49
  • 33. Desabafo* Eu não preciso da sua mão exagerada, Da sua rotina não contingente Que trata de mim como se eu não fosse nada Ou como se eu não estivesse na sua frente, Que larga minha vida desorganizada, Que ignora meu choro de forma displicente Como se não enxergasse minha alma apertada, Como se eu não fosse gente... Eu não preciso da sua rotina Que me reduz à necessidade ou não de dopamina, Ou como se eu não tivesse sentimento nem vontade... Eu não preciso da sua negligencia, Desumanidade travestida de ciência, Como se eu não pertencesse à humanidade... *A poesia dá voz a um sem-número de bebês que recebem, em todo planeta, intervenções baseadas num cuidado voltado para o modelo tecnocrático que despercebe sua integralidade e reduz sua vida a dados registrados no prontuário, longe do que significa sua própria vida. Este desabafo é um lamento de dor. 51
  • 34.
  • 35. Abancado à minha escrivaninha em Campos dos Goytacazes, No meu apartamento próximo ao centro, De supetão senti um friúme por dentro. Fiquei trêmulo, muito comovido, Com o computador palerma olhando pra mim. Não vê que me lembrei Que lá na Unidade Neonatal, meu Deus, Não tão longe daqui, Na solidão da sua prematuridade, Um menino pequenino e magro, Quase sem cabelo cobrindo-lhe os olhos, Depois de mamar no peito de sua mãezinha, Faz pouco se deitou na incubadora, e está dormindo... E esse prematuro é brasileiro que nem eu. Descobrimento* *Este poema é releitura de um poema de mesmo nome do poeta paulista Mário de Andrade. O texto original, repleto de “supetões” e “friúmes”, faz referencia ao brasileiro seringueiro nortista. Aqui neste outro, a poesia descobre subitamente que o pequeno bebê prematuro, deitado na incubadora distante, sozinho, é, como o seringueiro de Mário, brasileiro como nós, seus leitores. Que esse descobrimento possa nutrir sementes de civismo e respeito, e que essas sementes sejam revertidas em frutos de cuidado e acolhimento com dignidade e gentileza. 53
  • 36. Aqui estamos, De longe viemos... Um longo e cansativo itinerário... Foram inúmeras as vezes que choramos, Foram inúmeras as dores que sofremos, E, no entanto, Tudo parece ter sido Absolutamente necessário Para que chegássemos até aqui: As lágrimas, a aflição, o desespero, As noites intermináveis sem dormir, Os descaminhos sem sol por que passamos, E as fraquezas de quase desistir... Tudo absolutamente necessário Para que acabássemos por descobrir Tantas lições de vida, acolhimento, Amparo, apoio, sustentação, Solidariedade abrandando o sofrimento, Perseverança alimentando o coração... Tudo absolutamente necessário... Itinerário* *Este poema de 2008 foi escrito para uma comemoração de Natal com mães de uma UTI de minha cidade. Reflete em suas rimas o longo e doloroso mecanismo de resiliência por que passam as famílias prematuras que com todo seu desalinho, veem nascerem mães e bebês mais fortes, mais leves e mais intocados em seu vinculo, sua história e seu amor. 55
  • 37. E imaginar que imaginávamos o contrário Quando a nossa vida cuidou de desabar, E tudo em volta, de repente, sem sentido... Quando faltou o chão, de repente, de pisar... Foram dias inteiros tentando descobrir, E noites sem dormir nem acordar... Um sofrimento diário, E, no entanto, Parece que absolutamente necessário Para que mobilizássemos nossas energias Por dias e dias e dias e dias, E muitas vezes Até por meses, Entre tomografias e ultrassonografias, Entre hipoglicemias e hiperglicemias, E anemias e arritmias E outros tantos sinônimos de dor... Fomos bordando assim nosso calvário, E hoje, Parece que tudo Foi absolutamente necessário, E nada absolutamente sem valor... Porque a fraqueza nos fez fortalecidos, A dor nos desenhou mais resistentes, As ameaças tornaram-nos mais vivos E tanta angustia, mais persistentes... Fortalecemo-nos dos afetos dos queridos: Esposo, esposa, pais, irmãos, parentes, Luzes para que não quedássemos perdidos, Sustento para que não tombássemos descrentes... E a dor que nos fez tantas vezes tão sozinhos, Atormentando nossos caminhos, Fazendo nosso coração passar tão mal, Foi a mesma dor, condição transformadora, Que com sua força renovadora Nos trouxe aqui, a esse dia especial... E a mesma dor que nos fez tão diminuídos, Foi a dor que nos tornou fortalecidos, E nos mostrou o caminho de saída, E a mesma dor que tentou-nos derrotados, Foi a dor que nos trouxe hoje, renovados, Valorizando mais que nunca a própria vida... E a vida, como uma dádiva sagrada, É o bem maior que em sua caminhada Os nossos filhos vão preservando... Vão resistindo, heróis, a tempestades, Saindo ilesos de calamidades, Vão escapando, vão se salvando... E a vida, como uma graça alcançada Por cada um deles nessa jornada, É o bem maior que cada um vai conquistando, Vestidos de esperanças e vontades, Superando, como heróis, dificuldades... É a dor que em paz vai se transformando... 56
  • 38. Aqui estamos. Foi como se o coração parasse o calendário E o tempo desistisse de passar, E, no entanto, Tudo parece ter sido absolutamente necessário Para que chegássemos A essa hora, E hoje, a esse dia, Completa e inteiramente renovados, Dispostos como nunca a continuar... Crescemos. Com a dor que enfrentamos, amadurecemos, Amadurecidos, aprendemos a compartilhar A nossa dor com a dor de toda gente, E foi isso que nos fez seguir em frente E nos deu força pra perseverar... Crescemos. A dor que um dia nos fez sentir pequenos, Foi a mesma que nos ensinou a caminhar... Uma lição de se aprender diariamente... Uma lição de durar eternamente... Um aprendizado que se chama amar... 57
  • 39.
  • 40. Mães que nunca fracassaram, Mães que nunca permitiram, Mães que nunca despertaram, Mães que nunca desistiram, Mães que nunca engravidaram, Mães que quase conseguiram, Mães que por ter tanto medo nem tentaram, Mães que por falta de medo nem sentiram, Mães que partiram na hora do parto, Mães que tornaram-se mães sem saber, Mães que forjaram-se mães por contrato, Mães que não precisaram de filhos para ser, Mães que não souberam escapar, Mães que não puderam conhecer, Mães que se tornaram saudades de chorar, Mães que se transformaram em imagens de não ter, Mães que se foram para outra vida, Mães que jamais retornaram para o lar, Mães que sentem ate hoje a dor comprida, Mães que continuam a esperar, Mães que não fizeram força para ser, Mães que fizeram questão de evitar, Mães que não foram, por isso o sofrer, Mães que não foram para se poupar, Que Deus as proteja, ilumine e suporte, E afaste delas todo mal e iniquidade, Que Deus as acompanhe além da morte, E as guarde em luz por toda a eternidade, Mães. Porque não há outro caminho. Mães. Porque não há maior lição. Nada que substitua o seu carinho, Que se compare ao seu coração. Mães. Porque não há outra saída. Mães. Igualando nobres e plebeus. Mães. Nada tão forte em nossa vida. Mães. Nada mais próximo de Deus. Mães* * Escrito na madrugada do Dia das Mães de 2003 durante o plantão na UTI Neo do HPC, Campos, RJ, em pleno livro de plantão. Dedicado às mães do mundo inteiro.
  • 41. Que Deus te proteja, Mamiferozinho, Das mamadeiras, Das chucas e dos bicos Oferecidos a ti sem nenhuma razão, E acorde os médicos, E as fonos, E os enfermeiros, Para a necessidade De sua proteção... Que te afaste chupetas, Mamiferozinhos, Fazendo da mama da mamãe A grande opção, E que te distancie Dos bicos ortodônticos E dos siliconados, Sem exceção... Que Deus te permita, Mamiferozinho, O leite materno Pra tua satisfação, E nas dificuldades, Meu amiguinho, Que o leite humano Do Banco de Leite Seja lembrado E não te falte não... Mamiferozinho* *As controvérsias e as discordâncias e a falta de um consenso em relação aos caminhos a serem seguidos para favorecer a amamentação de bebês prematuros torna essa caminhada ainda nos dias de hoje sujeita a muitas dificuldades e opiniões divergentes.Ainda assim a possibilidade de amamentação é real e possível. Somos mamiferozinhos desde o ventre. 61
  • 42. Que a gota de colostro, Mamiferozinho, Seja sua dose De proteção, Que seja a gota de teu sustento, Que seja teu alimento E salvação... Que seja escrita assim dessa maneira A história da tua recuperação: Amor, Calor, Leite materno, Vida, Apego, Afeto, Crescimento são... Que Deus te permita, Mamiferozinho, A busca, A grande boca, A pega, A sucção, A língua canolada E protraída, A vida Em minuciosa exatidão... E que tu cresças, mamiferozinho, Orgulhoso dessa nobre condição, Amamentado E cuidado com carinho, Semente boa Da próxima geração... Que Deus te guarde, Mamiferozinho, Que te guie E não te solte Da Sua mão, Que esteja sempre contigo, Mamiferozinho, Meu doce E pequenininho E grande irmão... 62
  • 43. Porque desde a barriga da mãe o bebe Escuta, Reage, Entende, Se assusta, Se agrada, Pede, Adormece, Sente vontade, Sente saudade, Se alegra, Se agita, Porque desde a barriga da mãe o bebe É um ser humano completo. Por conta disso, que seja Dignamente tratado... Por conta disso, que seja Respeitado... Por conta disso, cuidador, Cuidado... Nascimento* 63 *Relatos maternos das experiências de interação com seus bebês desde a barriga mostram que a memória e o comportamento deste recém nascido não começa na hora do parto.Avida é plena e cheia de sentidos já desde antes do nascimento. Por conta disso, cuidador, cuidado...
  • 44. Não é para ser um momento estressante, Não é para o bebê gritar, assustado, O banho deve ser um momento relaxante, Um cuidado aplicado com cuidado. Não é para ser um procedimento apavorante, Que deixa o bebê que o recebe, agitado, Chorando, irritado, respiração ofegante, Um bebê limpinho, mas um bebê esgotado. O banho deve ser como o carinho: Sempre chegar bem devagarinho, E, de tão bom, fazer o bebê dormir... O banho bom que cuida relaxando, Que nem precisa ser todo dia, só de vez em quando, Como um recreio, para o bebê se divertir... O banho* 65 *A hora do banho nas Unidades Neonatais deveria, mas nem sempre é, uma hora relaxante, e não tão somente o cumprimento de uma rotina que estressa mais que ajuda. Atualmente a adoção do chamado “banho humanizado” vem ajudando profissionais a conduzir esta técnica com respeito ao bebê prematuro, que é um cérebro em desenvolvimento, facilitando a assimilação desse momento pelo bebê e colaborando com a saúde e não com a doença.
  • 45. Parece que está de férias, relaxando, Parece que se esquece um pouco da exaustão, O bebê na redinha, o bebê descansando, O bebezinho, como se fosse verão, Parece que gosta, parece que está sonhando, Parece que se nem se importa com a solidão, É bom relaxar assim de vez em quando, Faz bem para o corpo, faz bem para o coração, Porque o bebê, quando passa um tempo na rede, É como um beduíno quando mata sua sede, É como um astronauta quando põe seus pés no chão, É como passar um fim de semana na Bahia, É como ouvir Jobim, é como ler poesia, É como ser o dono da varinha de condão... O bebê na redinha* *Tem-se espalhado por inúmeras Unidades Neonatais Brasil afora a pratica do uso de uma redinha comum, colocada dentro da incubadora, para acolher o bebê prematurinho com objetivo de oferecer a ele melhor posicionamento, conforto, organização e repouso, combatendo o stress e favorecendo as intervenções favoráveis à sua recuperação. É assim, na redinha, que ele descansa como se fosse verão... 67
  • 46. Silencio, Trabalho, Rotina, Dedicação, O cuidador cuidadoso, Um operário... Onde seu cérebro? Onde seu coração? Sensores, Balanços, Ajustes, Medicação, O cuidador preparado, Cuidadoso... Quando é que é técnica? Quando é que é dedicação? Gavagens, Agulhas, Pesagens, Aspiração, O cuidador, Concentrado e habilidoso... Onde é que termina o operário? Onde é que começa o irmão? O cuidador* *Poeminha dedicado aos profissionais do mundo inteiro que se dedicam ao cuidado com os bebês prematurinhos nos longos, exaustivos e intermináveis plantões das Unidades Neonatais. Uma dedicatória especial vai para a Equipe da Unidade Neonatal do Hospital dos Plantadores de Cana de Campos, rica em bombas infusoras de carinho e dedicação... 69
  • 47. Não era tão próximo, Pele na pele, Não pegava no colo, Não dava de mamar, Não aquecia, Não embalava, Mas encantava Porque era um olhar Silencioso, Quase imperceptível, Não era nada Que fosse capaz de falar... Era feito de éter, Era invisível, Mas era insubstituível, Porque era um olhar... Que não tocava, Que não aquecia, Que não se podia Pegar, Mas que era único E feito de ternura... Merecia uma poesia Aquele olhar... E ainda que ninguém Desconfiasse, E ainda que ninguém ousasse Imaginar, Era perfeito Como um encantamento, Embora não passasse De um olhar O olhar* *Ao registrar algumas imagens para este trabalho, detive-me a observar o olhar destes pais e concluir pela sua natureza única e insubstituível. A consistência impalpável desses olhares paternos em direção ao filho numa incubadora ultrapassa os limites possíveis da poesia, transformando-se em matéria da língua dos anjos...
  • 48. I Habituado desde a infância, (Que já vai longe em seu pensamento) Aos jogos de bola E às brincadeiras de pipa, Aos teco-tecos nas bolas de gude E aos passeios de carrinho de mão, O menino, Abandonando a infância, Cresceu, Enamorou-se, E tornou-se pai... II Mas como nos jogos de bola E nas brincadeiras de pipa E de botão, Na vida que chamamos vida de verdade O inesperado também nos surpreende E causa sustos e apreensão. O menino que tornou-se homem Que enamorado transformou-se em pai, Tornou-se pai de um menino Prematuro... Risco de vida... Internação... O pai canguru* *Esta história tem já uns cinco anos de vida. Resolvi conta-la em versos livres temperada com carinhos poéticos, como tentando uma elegia ao cuidado paternal mais transbordante de maternidade de que já tive noticia nesses meus trinta anos de trabalho com essas famílias... 73
  • 49. III Foram dias inteiros sem dormir direito: Ansiedade, incerteza e aflição... Quarenta dias se passaram Entre idas e vindas ao Hospital. A curta licença do trabalho Roubou suas possibilidades de contato diário com seu filho, Que, apesar de infrequentes, Permaneceram verdadeiras, Constantes E intensas... IV Nesses quarenta dias de hospital A mamãe ganhou um apelido Por ter adotado o hábito de trazer o pequeno filho Junto ao peito, Transfundindo-lhe amor, Calor, E leite materno, E assim aprendeu um verbo Bem tipico Do dicionário dos anjos: Canguruzar. V Numa tarde de domingo O papai foi convidado A colocar o bebê sobre o peito Mantendo-o colado junto a seu coração... E ainda que desabituado a maternagens E a choros de bebê, Naquele instante o pai chorou como um deles Quando experimentou seu momento De pai canguru. (E pai canguru, Antes que me perguntem, Também é verbete do dicionário dos anjos). VI Quanto tempo permaneceu ele ali Maternando, Aquecendo, Trocando carinho E olhando pros olhos do filho Da forma que só os pais cangurus conseguem fazer? Quanto tempo durou aquela cena de paternidade maternal? Minutos? Algumas horas? Quem sabe? Durou, sim, O tempo certo para tornar-se inesquecível, O tempo certo para saber-se incomparável, O tempo certo para comprovar-se inconfundível, O tempo certo para perceber-se inexplicável... 74
  • 50. VII Na manhã seguinte, Logo à sua chegada ao Hospital, Uma surpresa (Porque na vida, Como nas brincadeiras de bola de gude, A gente sempre se surpreende) Seu bebê, Seu filhinho, Estava de alta... VIII Alegria. Só alegria. Chegando em casa, Conta-se que o pai contou pra toda gente, Gabando-se todo, E feliz da vida, Que foi do seu colo Que o filho recebeu O amor, o calor e a energia paterna Que faltavam para a sua alta... IX A mãe? A mãe canguru? O que achou disso após quase quarenta dias junto ao filho? A mãe simplesmente sorriu. Porque não é todo dia, Nem com toda gente, Que se é possível Dividir maternidade De forma tão sincera e verdadeira... X E pai e mãe, Desde ai, Canguruzaram-se felizes para sempre, E cheios de amor E palavras de luz, Nunca mais esqueceram seus dias De pais cangurus... 75
  • 51.
  • 52. Papai do Céu, toma conta das mães de , Cuida de aliviar seu sofrimento, Faz com que elas nunca desistam de sorrir, E traz para elas alivio e alento... Papai do Céu, não as permita nunca desistir, Faz da sua fé seu alimento, Prepara seus corações para o que há de vir, Envolve-as com ternura e acolhimento, UTI E abençoa suas vidas, Pai amado, Que é uma só com a do filho internado, Esperando a cura, esperando a volta ao lar... Cuida das mães de , mães preciosas, Cuida das mães de , mães dolorosas, Tão precisadas de seu cuidar... UTI UTI Oração pelas mães de UTI* *O nascimento de um bebê prematuro transfere para esse bebê o foco das atenções dos serviços de saúde por uma questão lógica e inadiável: é necessário salvar sua vida. A mãe prematura deixa, portanto, após o nascimento de seu filho, de ser a prioridade do cuidado, mas nesse não sendo, torna-se, ainda que não se perceba necessariamente isso, carente de apoio e de atenção muitas vezes lhes negada por um sistema que não a enxerga como necessitada de suas ações. Esse poema é uma suplica ao nosso Pai que está nos Céus por essas mães dolorosas e extremadas que muitas vezes nós, profissionais transformamos em mães invisíveis pela nossa cegueira tecnocrática... 77
  • 53. Papai do Céu, Cuida dos meus cuidadores com cuidado Para que eles não me faltem com a atenção, Eu tenho sofrido, Papai do Céu, um bocado, Nesses meus dias de internação: Noites inteiras tenho passado acordado, Dias inteiros mergulhados em solidão, Tudo em minha volta parece exagerado: A luz, a dor, o som, a movimentação... Cuida dos meus cuidadores nesses dias De condutas técnicas, de rotinas frias, Que os lápis de cor não conseguem colorir... Cuida com cuidado dos meus cuidadores, Para que as dores por detrás das minhas dores Possam também ir deixando de existir... Oração pelos meus cuidadores* *O cuidado com quem cuida deve ser tratado com respeito e determinação. As longas e exaustivas horas de trabalho nas Unidades Neonatais são muitas vezes causa de distúrbios de saúde para os profissionais da área: stress, hipertensão, distensões emocionais, etc... O cuidado com quem cuida, por conta disso, não é menos importante que o cuidado com o bebê ou com a sua família. A humanidade, isso sim, precisa se proteger a si mesma, uma vez que essa proteção é a garantia da preservação saudável da espécie humana em nosso planeta. 79
  • 54. Uns nascem Com vinte e poucas semanas, Às vezes um pouco mais, Outros pesando Seiscentas gramas, Às vezes um pouco menos, Desafiando tudo que estudamos, Contrariando tudo que sabemos, Subvertendo tudo que planejamos, Necessitando de tudo quanto conhecemos, São eles, Os prematuros extremos, Tão delicados, Tão sozinhos, Tão pequenos, Que muitas vezes nós nos assustamos Quando os vemos Assim, Entre tubos, E fios, E acrílicos E drenos, E até muitas vezes nem acreditamos, E outras tantas Nos surpreendemos, E aprendemos Que esses prematuros extremos De quem cuidamos, Tão frágeis, Tão difíceis, Tão serenos, São muito mais fortes do que imaginamos, E fazem muito mais Do que nós fazemos... Os prematuros extremos* *Nascidos com menos de 28 semanas de gestação, pesando menos de 1000 gramas, os prematuros extremos já nascem sob o signo do desafio e da superação. Desafio que começa com a necessidade de vaga numa UTI Neonatal. E transporte adequado até lá. Desafio que continua quando da necessidade de um ambiente e uma manipulação respeitosa, quando da resolução de distúrbios clínicos sempre extremos e graves, de uma recuperação lenta e difícil, e de um prognóstico impreciso e necessitado de cuidado e acompanhamento muitas vezes para toda a vida. Por isso e por tudo quanto não percebemos é que esses irmãos pequenos fazem muito mais do que fazemos e podem muito mais do que podemos. Os prematuros extremos. 81
  • 55. Jesus, toma conta, E ameniza as penas Das mães prematuras extremas E de seus filhos, Moços pequenos, Tão frágeis, Tão dóceis, Tão menos, Que nós nos habituamos Tão perto de nós Que quase sentimos Como se tivéssemos sido nós Que os trouxemos, Por quem, às vezes, baixinho, choramos Quando dizemos: Jesus toma conta De nossos irmãozinhos Miudinhos, Que nos acostumamos a chamar Como aprendemos, Jesus toma conta Dos prematuros extremos... 82
  • 56. Pequena demais para o colo, Imensa para o coração, Rostinho delicado, Pele fina, Repara o tamaninho da sua mão... Pequena demais para a foto, Imensa para a emoção... Pelinhos espalhados pelo corpo, Dedinhos do tamaninho de um grão, Pequena demais para a incubadora, Imensa na sua força de superação: Tubos, Acessos, Fototerapia, E uma grande quantidade de medicação... Miudinha, Mas é como fosse um gigante, Aparentemente toda frágil... Só que não... Porque é pequena demais para os registros antropométricos, E, no entanto, Tão imensa, Que quase não permite Tradução... Poeminha para Anna Clara* 83 *No álbum de Anna, sua mãe escreveu assim: “saúde e muita paz para essa pequenina para colocar nos braços, mas muito grande para preencher nossos corações”. Alexsandra estava certa desde aquele dia. E seguem assim nossos dias cercados de pequenas delicadezas capazes de transbordar nosso coração para sempre.
  • 57. Quem cuida das mães de UTI Que esperam por seus filhos, assustadas? Quem toma-lhes as mãos, frágeis e tremulas? Quem seca-lhes as lágrimas sentidas? Quem abranda-lhes as feições apavoradas, E as suas noites de sono mal dormidas, E os seus dias inteiros, pensativas, E as suas horas inteiras, angustiadas? Quem cuida das mães de UTI Que oram por suas crianças internadas? Quem descobre seus medos escondidos? Quem compreende suas culpas descabidas? Quem dá voz às suas vozes paralisadas? E os seus corações que mal se aguentam, Quem ouve, quem entende, quantos tentam? Quem dá colo a sua dor desfigurada? Quem cuida das mães de ?*UTI *Este poema foi lido pela primeira vez numa Mesa Redonda sobre Amamentação de Prematuros durante o XII Encontro Nacional de Aleitamento Materno em Fortaleza no ano de 2012. Foi uma leitura emocionada, declamada em voz alta por todos os presentes enquanto os versos eram projetados um a um na tela. Um dia inesquecível para meu coração e para muitos presentes naquela sala lotada. Aqui reproduzido, faz papel de um clamor pelo fim da invisibilidade da mãe de UTI e pela adoção de sua dor e de seu desacerto pela Unidade, ampliando o cuidado do bebê para que esse cuidado possa chegar até sua mãe e cuidadora até o fim de seus dias.
  • 58. Quem cuida das mães de UTI Que sabem pensar em seus filhos e em mais nada? Quem oferece-lhes repouso e abrigo? Quem dá-lhes um pouco de paz e de agua fresca? Quem torna suas esperanças renovadas? Quem mostra-lhes que há luz por entre os sustos? Quem observa essa suavidade dos seus rostos? Quem doa seu tempo a essas mães despedaçadas? Quem cuida das mães de UTI Que decoram de seus filhos suas risadas? Que caminham lento por entre monitores, Que esbarram em incubadoras, distraídas, Que aprendem palavras estranhas, pouco usadas, Que tocam seus bebes em berços aquecidos, Que enxergam detalhes quase despercebidos, Que cultivam felicidades adiadas? Quem cuida das mães de UTI Que vivem pros seus filhos, agoniadas? Quem explica sua força contagiante Capaz de faze-las sorrir, mesmo se tristes, Esperançando as horas arrasadas? Quem cuida das mães de UTI, mães silenciosas, Quem cuida das mães de UTI, mães preciosas, Quem cuida das mães de UTI, mães extremadas? 86
  • 59. *O direito à vida, à dignidade de tratamento, ao respeito e a integralidade social deve ser defendido e inserido no plano de cuidados para com o recém-nascido. Todas as garantias da Lei devem ser estendidas às almas apressadas que por definição quase axiomática são legítimos representantes da espécie humana com todas as suas letras. Defender essa certeza é função de cada um de nós que gastamos preciosas horas de nossos dias de trabalho ao seu lado. Que esse seja seu direito inalienável. Que essa seja nossa defesa sem fim. 87 Reconhecimento* E onde quer que estejas, pequenino, E sob qualquer condição, E ainda que seja incerto o teu destino E a tua recuperação, E ainda que a tua história, meu menino, Pareça um ponto de interrogação, Tudo tão tênue e frágil, nebuloso e fino, Tudo tão quase sem explicação, Ainda assim, que em todos os lugares Teus cuidadores te estendam seus olhares Como quem se ajoelha diante de um Rei, E gentilmente, como a mão quando abençoa, Que te reconheçam, menino, como pessoa Diante da Grande Lei...
  • 60. *Este foi o primeiro poema que escrevi dedicado ao universo prematuro. Data de novembro de 2003, quando o pequeno João Geraldo, nascido com 1200 gramas e após ter chegado a pesar menos de um quilo, atingia 1350 gramas. Tão pouco, e quanta diferença fazem essas 150 graminhas. Este soneto ilustra a lenta progressão (e tão dramática) do ganho de peso de um bebezinho pretermo. A cada releitura que faço dele, confirmo em meu coração seus versos decisivos: “E a cada grama, um Everest inteiro, como quem cruza a fronteira, como quem chega em primeiro”. João Gabriel que o diga. 89 Trinta graminhas* Mil trezentos e vinte, mil trezentos e cinquenta, Trinta graminhas essenciais, A progressão, que é vagarosa e lenta, Trinta graminhas a mais, Sessenta, setenta, oitenta, e então noventa, Tão pouco e tanta diferença faz, Como se fosse a medalha de quem tenta... Trinta graminhas fundamentais... E a cada grama, um Everest inteiro, Como quem cruza a fronteira, como quem chega em primeiro, Como quem ganha a sua carta de alforria... Trinta graminhas de felicidade... Trinta graminhas tentando a liberdade... Trinta graminhas a mais a cada dia...
  • 61. *AOrganização Mundial de Saúde calcula em treze milhões o numero anual de nascimentos prematuros no mundo.Amaior parte deles na África e na Ásia onde as condições de assistência ao pré-natal são precárias e as de atendimento aos bebês de risco extremamente difíceis.As taxas de nascimento prematuro no Brasil vem crescendo a cada ano, já havendo algumas regiões atingido níveis de 12% dos nascimentos do total de nascidos vivos. A crise social da prematuridade no planeta é um alerta grave à preservação integral da espécie humana que necessita cuidar melhor de seus filhos aonde quer que estejam... 91 Treze Milhões* Somos treze milhões de almas apressadas, Nascidas antes do tempo que era para ser, Treze milhões de alguma forma condenadas, Um numero que não para de crescer, Somos treze milhões de almas deportadas Para um cárcere de onde não se vê o sol nascer, Longe dos braços das nossas mães, desconsoladas, Com medo do que nos possa acontecer... Treze milhões de almas aprisionadas Em casas de acrílico, padronizadas, Sozinhas, cansadas de tanto sofrer... Somos treze milhões de almas cansadas, Precisando demais ser abraçadas, Treze milhões querendo tanto viver...
  • 62. *O grande poeta itabirano Carlos Drummond deAndrade nos brindou com os versos de “CançãoAmiga”, mais tarde musicada por Milton Nascimento. Aqui, a releitura deste poema inspira versos de ternura que são dedicados por um poeta imaginário aos homens do mundo, silenciosamente, como quem deseja acordar a desatenção dos homens e permanecer crianças as crianças do mundo inteiro... Uma canção amiga* Eu preparo uma canção silenciosa De um silencio que quase cause inquietação, Escrita sem palavra, inútil e dispendiosa, Num idioma de pura percepção, Eu preparo uma canção minuciosa, Quase inaudível, mas sem desatenção, Composta de arquitetura cuidadosa, Delicadamente elaborada... Uma canção Que faça acordar os homens poderosos Para o poder dos gestos silenciosos E para a força das palavras mansas... Uma canção que se espalhe aos quatro ventos, Que faça acordar os homens desatentos, E adormecer as crianças... 93
  • 63. *Este poema traz um significado inteiramente baseado na Declaração Universal dos Direitos do Homem: somos todos iguais, somos o mesmo homem, sofremos a mesma dor, amamos a mesma vida, queremos nascer, viver, crescer e encontrar felicidades em nossos longos dias. Não deveríamos dividir a humanidade entre aqueles a quem são garantidas as tecnologias de cuidado mais modernas e aqueles outros que perdem a vida sem receber o socorro mínimo de um oxigênio ou de uma fonte de calor. Dias melhores, sonha a poesia, haverão de surgir entre os corações dos homens. Universalidade* É como se cada um deles fosse o único, E cada outro fosse o mesmo um, E não houvesse nenhum mais além. E como se cada um deles fosse o outro, E por não haver, por isso, mais nenhum Além daquele um que já são todos, Fica assim como se fossem inseparáveis, E também, por conta disso, indivisíveis, E o que for permitido a este um, que seja Distribuído igualitariamente, Sem diferenças, sem distinção... Porque é como se cada um deles fosse o próximo... E o direito de um deles fosse o mesmo De todos os outros, sem discriminação... 95
  • 64. Somos, segundo a Organização Mundial de Saúde, mais de treze milhões que surgem a cada ano. Isso é alguma coisa perto de dez por cento de todos os bebês nascidos vivos no planeta. Desses treze milhões, um milhão de nós não consegue sobreviver e morre por condições inadequadas de atendimento. A maioria de nós chega ao mundo pelos países de economia frágil: Ásia e África. São nesses países também que a maior parte de nós não sobrevive. Aqui no Brasil temos crescido em número de nascimentos a cada ano. Formamos um pequeno país dentro de um grande país. Um pequeno país de exilados de suas famílias, confinados a casas de acrílico e a um ambiente exageradamente tratador. Ao lado das aminas salvadoras, recebemos excessivos som, luz, dor, manipulação, falta de sono e privação do amor, do calor e do leite materno... Sabemos que esse exilio cruel é decretado em nome de nossa cura E temos consciência de que o esforço das equipes de saúde para garantir nossa sobrevivência tem sido surpreendente e essencial. Tem sido cada vez mais aceitável a certeza de que, passados os dias de UTI, retornaremos para o colo de nossas mães e para o seio de nossas familias, sobrevivendo aos presságios de morte certa e às previsões mais pessimistas... Somos imensamente gratos à ciencia que tem nos permitido estar aqui, salvos do caos gerado por um nascimento fora de época, antes do que era para ser... Mas hoje queremos, nesse manifesto, juntar nossos frágeis corações e nossa delicada saúde em um esforço ultra- humano e dizer para o mundo que nos cuida, nos cataloga, nos cochraneia e nos transforma em dissertações de mestrado, teses de doutorado, artigos, livros, entrevistas, reportagens, poemas e imagens pelo mundo afora: Exigimos respeito. Nossas mães, enfraquecidas, na maior parte das vezes não tem recebido permissão para estar em nossa companhia pelo tempo inteiro de que ambos precisamos. Muitas das Unidades Neonatais para onde somos deportados não tem sequer espaço físico ou pessoal escalado para recebê-las e cuidar delas. Chamam esses lugares de UTIs Neonatais como se nós, recém-nascidos, fossemos independentes de nossas mães, e como se nossas vidas não precisassem da vida e da presença delas para crescer com harmonia e integraldade. E sequer destinam recursos para garantir vagas para muitos de nós nessas UTIs. Muitas mortes ocorrem por Manifesto prematuro socorro insuficiente. Por condição técnica inadequada. Por pessoal sobrecarregado por plantões desumanamente superlotados de tarefas graves. Somos assim, por esse descaso oficial, tratados como supérfluo, como sobra. Sobreviver é lucro, não essencial. Como se a vitória de alguns de nós, alcançada em grandes centros adequadamente equipados, não pudesse, por conta disso, dessa disparidade de condições, ser estendida a todas as Unidades do mundo. E como se não fosse possível existir Unidades suficientes no mundo para cuidar de todos nós. Somos a sobra. E assim, muitos de nós nascemos decretados à morte por simples negligência do restante da humanidade. E olha que a história deve grandes passos de sua caminhada a homens que um dia nasceram prematuros como nós, mas que o cuidado materno preservou para a vida: Albert Einstein, Isaac Newton, Pablo Picasso, Charles Darwin, Vitor Hugo... Se a humanidade sem eles seria tão mais triste, por que não investimos numa humanidade com todos nós, com uma humanidade inteira? Respeito. Inadmissível perceber que as pessoas falam tão alto nas Unidades Neonatais como se essas Unidades fossem a casa delas, e não a nossa. Como se cuidar de nosso cérebro em desenvolvimento (foi assim que aprendemos com a tia Raquel Tamez*) não tivesse a haver com falar baixo e causar menos barulho e menos dano, perturbar menos nosso sono, impedir menos nosso repouso... Nossos cuidadores precisam respeitar nossa dor e trabalhar para não causá-la a cada agulhada entre as intermináveis coletas de exames muitas vezes protocolares, que atendem, muitas vezes, mais às necessidades deles que as nossas. Aluz nas UTIs não precisava ser tão forte nem ser forte o tempo inteiro. Todos sabem que precisamos de um pouco de penumbra a fim de preservar nosso sono, como seres humanos que somos. A ciência não já determinou que é no sono que o nosso cérebro se reorganiza e registra aprendizados e cria sua memória? Se já inventaram a luz de cortesia para os ônibus, por que não utilizam esse benefício simples e barato em nosso favor? As equipes que cuidam da gente precisam saber como conversar conosco, mas para isso precisam entender as coisas que dizemos com nossas mãos, com nossos olhos, com nossa boca, com nossas perninhas, com nossos dedinhos, com nossos pés... Precisam entender quando dizemos: estou querendo ficar sozinho ou quando chamamos: fica aqui comigo. Precisam aprender quando cansamos. Precisam entender quando dizemos: você não acha que está exagerando? Precisam nos proteger do cansaço, da fadiga, da exaustão...
  • 65. Somos impedidos do contato com o seio materno sob alegações que graças a Deus muitos serviços já provaram serem descabidas. Muitos de nós somos afastados da primeira experiência com o seio materno até que completemos trinta e quatro semanas ou alcancemos mil e oitocentos ou dois mil gramas. Abandonam nossa boca. Nossa possibilidade de sucção é negligenciada. Mas não se acanham de nos oferecer através de sondas, gazes, tubos e outras geringonças um sem-numero de experiências orais negativas e desestabilizadoras... Felizmente muitos de nós ja temos contato com a mama da mamãe (que é mamãe porque nos oferece a mama, não é mesmo?) com pesos próximos a mil e duzentos gramas e é ai que aprendemos a sugar para que possamos, depois dai aprender a mamar... Exigmos respeito. Ter nossas vidas salvas mesmo sob condições de muito empenho e dedicação não pode ser o argumento para nos transformar em reféns silenciosos de um tratamento que não cuida de observar nossa individualidade, de nos reaproximar de nossa mãe, de nossa família, de nos tratar de modo contingente e ajustado... Ah... É por conta disso que exigimos respeito. Há pouco mais de trinta anos na Colombia os tios Hector Martinez** e Edgar Rey** mostraram ao mundo como é importante estarmos perto de nossas mães e como seu calor, seu amor e o leite de seu peito são essenciais pra nosso crescimento saudável. 98 Há pouco mais de três décadas alimentamos, treze milhões a cada ano no mundo, a esperança de permanecer vivos fazendo nossos cuidadores nos enxergarem para além da bioquímica e cuidar de nós para além da farmacologia. Exigimos respeito. Somos bebês que nasceram antes da hora do que era pra ser. Não somos outra espécie de gente. Somos humanos. Temos direitos inalienáveis e inegociáveis que são trocados e esmagados a cada entubação ou a cada necessidade de medicalização ou de coleta de dados laboratoriais. Exigimos respeito. Um respeito que é nosso por direito. Um respeito universal. Um respeito que faz parte da Lei de Deus. Continuaremos atentos e clamando para que a humanidade que escapou do pesadelo que nos acompanha muitas vezes pelo resto de nossas existências, em nome de nossa integridade, tenha piedade de nós. Assina, com carinho, Um bebê nascido prematuramente, livre e igual a todos os outros bebês do planeta em dignidade e direitos, dotado de razão e consciência, possuidor de vida anterior ao nascimento, bem como memória, aprendizado, emoção e capacidade de resposta e interação com o mundo em sua volta, e inquestionavelmente digno de ser, em todos os lugares e sem qualquer distinção, reconhecido como pessoa diante da Lei. * RaquelTamez é Enfermeira e autora do livro uma obra clássica que fundamenta os cuidados da assistência neonatal nos cuidados voltados para o desenvolvimento do bebê e respeitosos para com sua integridade biologica e emocional. ** Hector Martinez e Edgar Rey, colombianos, criadores da Metodologia Mae Canguru desde 1979 que mudou radicalmente os paradigmas do cuidado neonatal no mundo inteiro. Enfermagem na UTI Neonatal,
  • 66. Natural de Campos dos Goytacazes. Médico graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro em 1984. Plantonista da Unidade Neonatal do Hospital dos Plantadores de Cana de Campos, RJ. Autor de “Uma Declaração Universal de Direitos para o Bebê prematuro” (2009) e de sua “Edição Comentada” (2011). Co-autor, ao lado do Professor Marcus Renato de Carvalho do livro “Amamentação – Bases Cientificas” pela Editora GEN. Editor do blog alemdauti.com.br Editor do blog quasepoesia.blogspot.com Autor do documentário (youtube.com) que desfila as experiências de vinte mães de entre tristezas imensas e alegrias intocadas. Autor dos videopoemas S (youtube.com) e (youtube.com), que têm sido usados em Cursos de Amamentação pelo Brasil afora desde sua publicação. Tricolor, mas nem por isso um sofredor. Leitor atento dos versos de Chico Buarque, Drummond, Augusto dos Anjos e Castro Alves. Ou seja: Um nada diante da grandeza infinita do Universo do Criador, e um admirador silencioso do grande trabalho de Deus. OS DIAS DE UTI UTI OMOS MAMIFEROS SOMOS MAMIFEROZINHOS O Autor
  • 67.
  • 68. Poemas e Manifesto Prematuro - Luís Alberto Mussa Tavares Fotografias do autor manipuladas digitalmente por Lívia Ressiguier, exceto: Colostroterapia - Google O bebê na redinha - Google O banho - Google O cuidador - Lívia Ressiguier (Fotografia feita durante o tratamento de sua filha Aymme, nos dias de Agradecimento especial ao amigo Fernando Luiz Textos Imagens Introdução - Ricardo Jhones Ressignificando - Lívia Ressiguier UTI) Créditos
  • 69. Poema Declaração de Domínio Público Dedicatória As mãos da amiga e as mãos de Deus Os poemas para almas apressadas. Introdução - Ricardo Jhones A dor A Lei de Deus A mãe e o filho Às mães de A mãe prematura Amamentando A tempestade Canção do exílio Canção para te fazer sonhar Canguruzinho Colostroterapia Comunicação Constatação Desabafo Descobrimento Itinerário Mães Mamiferozinho Nascimento O banho O bebê na redinha O cuidador O olhar O pai canguru Oração pelas mães de Oração pelos meus cuidadores Os prematuros extremos Poeminha para Anna Clara Quem cuida das mães de ? Reconhecimento Trinta Graminhas Treze Milhões Uma canção amiga Universalidade Manifesto prematuro O Autor Créditos Ressignificando - Livia Ressiguier UTI UTI UTI 05 07 11 13 15 17 19 21 23 25 27 29 31 33 39 41 43 45 47 49 51 53 55 59 61 63 65 67 69 71 73 77 79 81 83 85 87 89 91 93 95 97 99 101 Índice