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ASSOCIAÇÃO SUL-RIO-GRANDENSE DE
   PESQUISADORES EM HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO




      HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO




                             NÚMERO 19
                             Abril – 2006




Disponível em: http//fae.ufpel.edu.br/asphe              SEMESTRAL
 História da Educação Pelotas n. 19           p. 1-310   Abril 2006
HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO
                                         ASPHE
                         Presidente: Maria Helena Câmara Bastos
                            Vice-Presidente: Maria Stephanou
                            Secretário: Claudemir de Quadros

Conselho Editorial Nacional                       Conselho Editorial Internacional
Dra. Denice Cattani (USP)                         Dr. Alain Choppin
Dr. Dermeval Saviani (UNICAMP)                    (INRP, França)
Dr. Elomar Antonio Callegaro Tambara (UFPel)      Dr. Antonio Castillo Gómez
Dr. Jorge Luiz da Cunha (UFSM)                    (Univer. de Alcalá – Espanha)
Dr. José Gonçalves Gondra (UERJ)                  Dr. Luís Miguel Carvalho
Dr. Luciano Mendes de Faria Filho (UFMG)          (Univer. Técnica de Lisboa)
Dr. Lúcio Kreutz (UNISINOS)                       Dr. Rogério Fernandes
Dr. Maria Teresa Santos Cunha (UDESC)             (Univer. de Lisboa)
Dra. Maria Helena Bastos (PUCRS)
Dra. Marta Maria de Araújo (UFRGN)

Comissão Executiva
Prof. Dr. Elomar Antonio Callegaro Tambara
Profa. Dra. Eliane Teresinha Peres

Consultores Ad-hoc
Dra Giana Lange do Amaral
Dr. José Fernando Kielling
Dr. Jorge Luis da Cunha
Dra. Beatriz Daudt Fischer

Editoração eletrônica e arte final da capa
Flávia Guidotti
flaviaguidotti@hotmail.com

Imagem da capa
Johannes Verneer. Mulher em Azul - 1662. Rijksmuseum, Amsterdã.

História da Educação
Número avulso: R$ 15,00
Single Number: U$ 10,00 (postage included).

História da Educação / ASPHE (Associação Sul-Rio-Grandense de
Pesquisadores em História da Educação) FaE/UFPel. n. 19 (Abril
2006) - Pelotas: ASPHE - Semestral.
ISSN 1414-3518
v. 1 n. 1 Abril, 1997

1. História da Educação - periódico I. ASPHE/FaE/UFPel

                                                         CDD: 370-5
Sumário


Apresentação ............................................................................................ 5
Um exemplo de pesquisa sobre a história de uma disciplina escolar:
a História ensinada no século XVI
   Annie Bruter; Tradução de Maria Helena Camara Bastos ...................... 7
Igreja, religião e ensino elementar antes das leis de laicização
européias: um reexame crítico de suas relações
   Pierre Caspard; Tradução de Maria Helena Camara Bastos................. 23
Escola de Engenharia de Porto Alegre (1896-1934): hegemonia
política na construção da universidade
   Marília Costa Morosini; Maria Estela Dal Pai Franco ......................... 39
Educação, Religião e República: repercussões dos debates entre
Católicos e Republicanos no Triângulo Mineiro-MG (1892-1931)
  Carlos Henrique de Carvalho; Wenceslau Gonçalves Neto ................... 59
Leituras de anarquistas brasileiros na primeira década do século XX
   Dagoberto Buim Arena........................................................................ 89
Caubóis e Caipiras. Os land grant colleges e a Escola Superior de
Agricultura de Viçosa
  Maria das Graças M. Ribeiro ............................................................ 105
A fotografia e a pesquisa em História da Educação: elementos para a
construção de uma metodologia
   Elisa dos Santos Vanti ....................................................................... 121
O conceito "Exclusão" na literatura educacional brasileira: os
primeiros 25 an os (1974-1999)
   Avelino da Rosa Oliveira ................................................................... 131
Resenha ................................................................................................ 161
Alfabetto: Autobiografia Escolar de Frei Betto
   Gilse H. M. Fortes............................................................................. 163
Parte II.................................................................................................. 167
Apresentação ........................................................................................ 169
A disciplina História da Educação na formação de professores:
desafios contemporâneos
   Clarice Nunes ................................................................................... 173
A Disciplina História da Educação no Curso de Pedagogia da
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (1942-2002)
  Maria Helena Camara Bastos; Fernanda de Bastani Busnello;
  Elizandra Ambrosio Lemos ................................................................ 181
Aspectos da trajetória da disciplina História da Educação no curso de
Pedagogia do Centro Universitário Franciscano de Santa Maria:
temas clássicos e ordem cronológica
   Claudemir de Quadros ...................................................................... 213
A disciplina de História da Educação na Faculdade e no Centro
Universitário La Salle
  Miguel Alfredo Orth .......................................................................... 229
O Ensino de História da Educação na UNIJUI
  Anna Rosa Fontella Santiago............................................................. 243
A História da Educação no curso de pedagogia da Universidade de
Passo Fundo: aportes na história recente em busca de novas
perspectivas
   Rosimar Serena Siqueira Esquinsani .................................................. 253
Historia da Educação e a formação do professor na UNISINOS
   Flávia Obino Corrêa Werle; Berenice Corsetti ................................... 263
Apontamentos sobre a disciplina História da Educação na
Universidade da Região da Campanha – URCAMP (1959-2001)
  Regina Quintanilha Azevedo; Clarisse Ismério; Marilene Vaz
  Silveira ............................................................................................. 275
O ensino de História da Educação na História da Faculdade de
Educação da UFRGS: primeiras aproximações
  Maria Stephanou............................................................................... 293
História da Educação no Curso de Pedagogia da Universidade
Federal de Pelotas
   Elomar Tambara ............................................................................... 301
Orientações aos colaboradores............................................................... 309



4
Apresentação


           Este número da revista “História da Educação” reveste-se de um
significado especial pois representa uma homenagem à Associação Sul-Rio-
Grandense de História da Educação no momento em que a mesma completa
10 anos de existência. Esta associação é a mantenedora deste periódico, e
com denodo e muito sacrifício tem conseguido manter seu alto padrão de
qualidade, atestado, fundamentalmente pela qualidade dos artigos nela
publicados.
           Neste número mais uma vez, temos o prazer de apresentar
trabalhos de investigadores caracterizados como de excelência tanto em
nível nacional como internacional. De modo que somos gratos a todos que
colaboraram com seus textos para este número e esperamos ter suas
contribuições em outras edições desta revista.
           Neste número, em substituição ao tradicional “documento’ que
publicamos em todos os números anteriores estamos publicando um dossiê
sobre o ensino de história da educação nos cursos de pedagogia no Rio
Grande do Sul. Estes trabalhos foram, em sua maioria, apresentados no XI
Encontro Sul-Rio Grandense de Pesquisadores em História da Educação
realizado na Unisinos em S. Leopoldo.
           Temos a convicção que a leitura desta revista será de muito
proveito a nossos associados, assinantes e ao público interessado em
história da educação.


                                                               A comissão executiva




        História da Educação, ASPHE/FaE/UFPel, Pelotas, n. 19, p. 5, abr. 2006
                      Disponível em: http//fae.ufpel.edu.br/asphe
.
Um exemplo de pesquisa sobre a história de uma
    disciplina escolar: a História ensinada no século XVII1
                                  Annie Bruter
                     Tradução de Maria Helena Camara Bastos


Resumo

Partindo de uma breve análise das condições, nas quais se estabeleceram as visões
(divergentes) do surgimento da disciplina escolar « história », em curso hoje na historiografia
francesa, este artigo propõe-se recolocar a questão na longa duração, remontando os colégios
de humanidades do Antigo Regime, mostrando que a própria noção de «disciplina escolar »
não é pertinente para descrever seu ensino, analisando certas transformações (sócio-políticas,
técnicas, culturais...) que conduziram a constituição da história como matéria autônoma de
ensino para as elites no fim do século XVII.
Palavras-chave: História; Ensino; Século XVII.



Resumée

Partant d’une brève analyse des conditions dans lesquelles se sont mises en place les visions
(divergentes) de l’apparition de la discipline scolaire « histoire » qui ont cours aujourd’hui dans
l’historiographie française, cet article se propose de replacer la question dans la longue durée
en remontant aux collèges d’humanités de l’Ancien Régime et en montrant que la notion même
de « discipline scolaire » n’est pas pertinente pour décrire leur enseignement, puis en survolant
certaines des transformations (socio-politiques, techniques, culturelles…) qui ont abouti à la
constitution de l’histoire en matière autonome d’enseignement pour les élites à la fin du XVIIe
siècle.
Mots-clés: Histoire; enseignement; XVIIe siècle.




1
 Título em francês: “Un exemple de recherche sur l’histoire d’une discipline scolaire: l’histoire
enseignee au XVIIe siècle”. Especialmente escrito para ser publicado no Brasil.

          História da Educação, ASPHE/FaE/UFPel, Pelotas, n. 19, p. 7-21, abr. 2006
                          Disponível em: http//fae.ufpel.edu.br/asphe
A idéia de que os conhecimentos de qualquer ordem que nós
dispomos são o resultado de uma construção humana - não o fruto de uma
revelação ou de uma reminiscência - é atualmente amplamente admitida,
pelo menos entre os pesquisadores que produzem esses conhecimentos; a
idéia de que as disciplinas escolares pelas quais esses conhecimentos
chegam às jovens gerações são também o produto de um trabalho coletivo,
de um conjunto de atores do sistema educativo, que tem dificuldade em
conquistar o direito de cidadão na França. Freqüentemente, vistos como
cópias das ciências eruditas mais ou menos simplificadas para serem usados
pelos alunos, as disciplinas escolares não foram por muito tempo
apreendidas pelos historiadores do ensino senão de maneira teleológica, em
função das teorias científicas e das concepções pedagógicas que eram as da
sua época. É principalmente o caso dos historiadores que tiveram uma
grande influência na França no início da IIIª República - época de
importantes reformas no ensino em todos os níveis (primário, secundário e
superior), como de Gabriel Compayré2 e de Émile Durkheim3: tratava-se
bem mais de dar uma genealogia à nova pedagogia que desejavam
implantar do que restituir seu sentido original às práticas de ensino do
passado, das quais desejavam precisamente se descartar. Ora, a seus
trabalhos a história do ensino por muito tempo permaneceu tributária na
França no século XX.
           O ensino da história encontrava-se em uma posição
absolutamente especial como objeto historiográfico: por ser considerado
instrumento essencial de formação patriótica e cívica na pedagogia dessa
época, só podia voltar-se ao seu passado celebrando sua própria instauração,
rejeitando nas trevas do atraso mental as instituições de ensino que não lhe
atribuíram o lugar de destaque que devia, segundo ele, ser o seu. No âmbito
da rivalidade entre ensino laico e ensino confessional - que marcou
profundamente, como já sabemos, a vida política e científica do início da
IIIª República -, a questão histórica a ser resolvida era, portanto, saber se o
ensino da história tinha nascido nos colégios do Antigo Regime -
essencialmente controlados pela Igreja4 - ou nos estabelecimentos

2
  Gabriel Compayré, Histoire critique des doctrines de l’éducation en France depuis le XVIe
siècle, Paris, Hachette, 1879, 2 vol. in-8°.
3
  Émile Durkheim, L’Évolution pédagogique en France (avec une introduction de M.
Halbwachs), Paris, Presses universitaires de France, 1938, 2e éd. 1969, 403 p. (curso sobre
história do ensino na França proferido por Durkheim na Sorbonne em 1904-1905 e reprisado
nos anos seguintes até a guerra).
4
  É a tese defendida pelos historiadores das grandes ordens dedicadas ao ensino Oratorianos ou
Companhia de Jesus: Paul Lallemand, Histoire de l’éducation dans l’ancien Oratoire de
France, 1888, réimp. Genève, Slatkine – Megariotis Reprints, 1976, 474 p.; François de
Dainville, La Naissance de l’humanisme moderne, 1940, réimp. Genève, Slatkine Reprints,

8
originários da Revolução Francesa (escolas centrais, liceus). Semelhante
questão, sobre a qual muito se escreveu, não podia chegar a nenhuma
conclusão. Os materiais disponíveis são de fato interpretados de diversas
maneiras: se definirmos o ensino de história que se tem provando que a
história está presente, e mesmo superabundante, nos colégios do Antigo
Regime, se definirmos essa disciplina como conjunto de conteúdos, eles
demonstram ao contrário, que ela não existia se tivermos uma concepção
administrativa da disciplina escolar como entidade regida por disposições
regulamentares (um programa, exames, horários, etc.). Um outro fator de
incerteza para a interpretação da documentação: durante muito tempo,
houve a falta de atenção às especificidades dos colégios do Antigo Regime,
como se esses fossem, conforme a uma norma geral, semelhante àquela que,
pouco a pouco, se impôs nos estabelecimentos públicos do século XIX.
Enquanto em alguns colégios, justapunham-se uma estrutura propriamente
escolar; isto é, um conjunto de classes que correspondiam às normas de um
plano de estudos, e um pensionato que funciona de maneira bem mais
flexível, vindo de encontro aos desejos das famílias; completando-se, assim,
a formação dada nas classes através de ensinos especiais5. Ora, no quadro
desses ensinos, de certa forma particulares, se desenvolveu uma pedagogia
da história prenúncios da de hoje.
            Na história do ensino na França, portanto, a renovação da
problemática que aconteceu no fim do século XX – outra época de
perturbações profundas do sistema educativo francês – transformou os
termos da questão de duas maneiras diferentes. De uma lado, foi colocado o
problema do papel social desempenhado pelos estabelecimentos escolares
(seguindo o exemplo da sociologia crítica da educação, que se desenvolve
nos anos 1960), diversos estudos revelaram a coexistência, por muito tempo
ocultada, de diferentes tipos de educação em certos estabelecimentos do
Antigo Regime, em particular nos que reuniam um colégio de prestígio e
um pensionato aristocrático6 - como La Flèche e Louis-le-Grand no que diz
respeito aos estabelecimentos jesuíticos, Juilly e Vendôme para os que eram


1969, XX-390 p.; du même, « L’enseignement de l’histoire et de la géographie et le “Ratio
studiorum” » (1954), art. repris dans François de Dainville (Marie-Madeleine Compère éd.),
L’Éducation des jésuites, Paris, Les Éditions de Minuit, rééd. 1991, pp. 427 – 454
5
 Mark Motley, Becoming a French Aristocrat. The Education of the Court Nobility, 1580 –
1715, Princeton, Princeton University Press, 1990, X – 241 p.
6
  Duas sínteses sobre esse tema: Marie-Madeleine Compère, Du Collège au lycée (1500 –
1850). Généalogie de l’enseignement secondaire français, Paris, Gallimard/Julliard, 1985, coll.
« Archives », 286 p.; Dominique Julia, Huguette Bertrand, Serge Bonin, Alexandra Laclau,
Atlas de la Révolution française. 2. L’enseignement, 1760 – 1815, Paris, Editions de l’Ecole
des Hautes Etudes en Sciences Sociales, 1987, 105 p.

                                                                                             9
mantidos pelos oratorianos. Por outro lado, alguns trabalhos levantaram o
problema da historicidade das próprias disciplinas. Redefinindo-as como
produções coletivas das instituições de ensino (e não mais como reflexo
simplificado de conhecimentos), André Chervel pode assim mostrar, em um
artigo pioneiro7, que a própria noção de disciplina escolar é uma noção
recente, que apareceu precisamente ao mesmo tempo em que as reformas de
ensino que foram implementadas na virada do século XIX-XX. Essa
reformulação permitiu relançar a questão da história do ensino histórico em
novos termos e perguntar não somente em que momento apareceu um
ensino de história semelhante ao de hoje, mas também em que consistiam a
história e seu ensino antes desse momento.
            Essa questão foi objeto de uma pesquisa empreendida, em
primeiro lugar, no contexto de uma tese de didática da história8, retomada
em uma jornada de estudos sobre o ensino das humanidades clássicas,
organizada por André Chervel e Marie-Madeleine Compère no Service
d’histoire de l’éducation do INRP 9 -esse estudo resultou em uma obra sobre
a história ensinada no século XVII10. Embasada em materiais diversos,
compreende tanto os planos de estudos em vigor e os exemplos de “lições-
modelos” propostos aos professores na época, quanto tratados sobre a
educação e os resumos de história utilizados para fins pedagógicos
(condição atestada por testemunhos da época e a confusão seguidamente
feita entre os resumos do Antigo Regime e os “manuais” de hoje era de
natureza a deturpar a interpretação do material documental). O campo
geográfico abarcado é a França, não por desinteresse pela comparação nesse
domínio, mas porque as fontes mais facilmente acessíveis, no contexto de
uma pesquisa necessariamente limitada no tempo, são as fontes francesas.
            Sem retroceder ao aspecto historiográfico da questão, tentaremos
resumir aqui os principais resultados dessa pesquisa, centrando-nos em dois
pontos: o caráter “não-disciplinar” do ensino dos colégios do Antigo
Regime e a maneira pela qual a história era ali tratada; a evolução dos
“usos” da história no século XVII e, conseqüentemente, o aparecimento de

7
   André Chervel, « L’histoire des disciplines scolaires: réflexions sur un domaine de
recherche », Histoire de l’éducation n° 38, Paris, INRP, mai 1988, pp. 59 – 119; repris in
André Chervel, La Culture scolaire, Paris, Belin, 1998, pp. 9 – 56.
8
 Annie Bruter, Les Paradigmes pédagogiques. Recherches sur l’enseignement de l’histoire au
XVIIe siècle (1600 – 1680), Université Paris VII, décembre 1993, 426 p.
9
  Uma parte das comunicações apresentadas durante essa jornada foram publicadas no número
temático Les Humanités classiques, Histoire de l’éducation n° 74, Paris, INRP, mai 1997, 253
p.
10
  Annie Bruter, L’Histoire enseignée au Grand Siècle. Naissance d’une pédagogie, Paris,
Belin, 1997, 237 p.

10
novas práticas de ensino dessa matéria. Em síntese, se tentará construir um
ensaio para contribuir a uma reflexão sobre o processo de longa duração –
ou seja, a constituição de um campo de saber em disciplina escolar.


A História em um ensino “não-disciplinar”

           A própria natureza do material documental legado pelas práticas
escolares do século XVII – planos de estudos, lições-modelos e obras
pedagógicas – e a impossibilidade de interpretá-lo através das categorias
regulamentares pelas quais definimos hoje a disciplina escolar (horários,
programas, etc.) orientou a pesquisa em uma primeira etapa: antes de
qualquer tentativa de apreensão do lugar da história propriamente dita, no
ensino dos colégios, é preciso esclarecer os princípios e os fins desse
ensino, que não havia nenhum motivo a priori de supor idênticos aos de
hoje.
           Se o século XVII (ao menos na primeira metade) é realmente
uma época de vigoroso crescimento escolar, que viu a expansão dos
colégios humanistas iniciada no século precedente11, a demanda educativa a
qual atendiam essas instituições se distinguia em diversos pontos das de
hoje. Retomando a si a ambição integradora, a da retórica antiga12, os
estudos humanistas pretendiam conciliar em uma mesma visão três
finalidades que nos acostumamos a separar claramente: uma finalidade
prática de domínio da linguagem, uma finalidade cognitiva de aquisição de
conhecimentos, uma finalidade religiosa de acesso à ciência e à virtude. São
esses três objetivos que encontramos simultaneamente presentes no
programa de estudos, inteiramente constituído de textos vindos da
Antigüidade, como nos procedimentos de ensino: tratava-se, antes de mais
nada, de levar os alunos a exprimirem-se através de inúmeros exercícios,
orais ou escritos. Esse treinamento intensivo, fundado no estudo de textos-
modelos propostos à imitação, visava assegurar o domínio das línguas
antigas (ou, em todo caso, do latim; a voga do grego no século XVI não
continuou no século seguinte) ao mesmo tempo em que assegurava o das
técnicas – retórica e filologia – que tornavam os alunos eloqüentes e
capazes de ascender ao saber: esse era, de fato, criado como corpus textual,
seja ele profano, textos antigos, ou de livros sagrados. Atendendo ao mesmo
tempo às necessidades da Igreja da Contra-reforma, que procurava formar

11
     Cf. Marie-Madeleine Compère, Du Collège au lycée…, op. cit.
12
  Sobre essa questão, ver Marc Fumaroli, L’Âge de l’éloquence. Rhétorique et « res literaria »
de la Renaissance au seuil de l’époque classique, Genève, Droz, 1980, 882 p.

                                                                                          11
pregadores, e às necessidades dos príncipes para os quais se recrutava o
aparelho administrativo, necessitando de homens aptos a manejar a
linguagem. Esse programa de estudos foi apoiado pelas autoridades da
época, laico e eclesiástico, e adotada pelos indivíduos ou grupos que
aspiravam fazer carreira, na Igreja ou no Estado.
           Constatamos que o nosso regime epistemológico é muito
estranho, busca suas raízes na Antigüidade, que sustenta tal concepção de
ensino – a qual recorria, explicitamente a dois grandes professores antigos,
Cícero e Quintiliano. Fundada sobre o primado da língua (instrumento de
poder e meio de comunicação entre Deus e os homens) e sobre o respeito da
escrita (pelo qual as palavras inaugurais, as da Revelação, foram
transmitidas desde a criação do mundo), essa epistemologia considera o
saber como um dado a ser decifrado, o acesso ao conhecimento como um
ato de leitura13. Por isso, a necessidade dessa etapa preliminar para chegar
ao conhecimento que era o estudo das línguas e dos textos antigos: o ensino
das humanidades.
           Por sua pretensão integradora – formar o vir bonus dicendi
peritus, homem de bem que sabe falar – assim como pelo lugar central que
dava aos textos, tal ensino só podia ser “não-disciplinar”. A explicação dos
textos antigos, ponto de partida das aprendizagens, necessitava realmente
recorrer a conhecimentos de ordem muito diversas – gramaticais e
filológicos, mas também geográficos, históricos, etinológicos, até mesmo
botânicos, zoológicos ou mineralógicos – ao mesmo tempo que a
capacidade de ressaltar as sentenças e máximas de ordem retórica, moral ou
política que devem enriquecer o discurso do orador: tudo isso era
considerado como conhecido pelo regente único de cada classe.
Reciprocamente, as produções dos alunos chamados a reutilizar o
vocabulário, as expressões, os conhecimentos de belos pensamentos
descobertos nos autores estudados, deviam testemunhar sua amplitude a
incorporar palavras e idéias em um conjunto textual harmonioso.
           A prioridade dada à finalidade retórica do ensino não significa,
no entanto, que o ensino humanístico não se preocupa em transmitir
conhecimentos (esse objetivo está explicitamente inscrito, por exemplo, em
certas versões do mais célebre dos planos de estudo da época, o Ratio
studiorum jesuíta14): também não se pode falar ou escrever sem conteúdo.

13
  Sobre a longa duração dessa concepção de acesso ao conhecimento como lectio, ver Eugenio
Garin, trad. française L’Éducation de l’homme moderne. La pédagogie de la Renaissance,
1400 – 1600, rééd. Paris, Fayard, 1995, coll. « Pluriel », pp. 66 – 70.
14
   A versão definitiva da Ratio studiorum jesuíta, a de 1599, foi recentemente objeto de uma
reedição acompanhada duma tradução francesa: Ratio studiorum. Plan raisonné et institution
des études dans la Compagnie de Jésus, Paris, Belin, 1997, 314 p. Fazemos aqui referência às

12
Mas esses conhecimentos, não sendo estudados por eles mesmos, não eram
objeto de uma exposição sistemática, salvo a título recreativo, no contexto
do que se chamava então o erudito (um espaço de tempo voluntariamente
deixado ao regente para repousar e fazer com que os alunos descansem da
austera disciplina da explicação de textos)15: eram dados à medida da leitura
dos textos, em função dos conteúdos a serem explicados. É assim que
conhecimentos que dizem respeito, para nós, à história – o desenrolar de
certos acontecimentos, a descrição das instituições ou dos costumes de uma
certa época – podiam ser apresentados no momento da explicação de uma
poesia ou de uma obra oratória de Cícero... Inversamente, a leitura dos
historiadores antigos, que faziam parte dos programas das classes (na classe
de humanidades, principalmente, mas também em outras classes)
oportunizavam não tanto o estudo dos acontecimentos mas o dos
procedimentos de escrita próprios ao historiador: mais que a própria história
tratava-se conforme as finalidades gerais - as do ensino das humanidades,
de aprender como escrever.
            Quanto aos conhecimentos necessários à compreensão das obras
históricas estudadas, tendo em vista o conteúdo militar-político das obras
dos historiadores antigos, consistiam principalmente em conhecimentos
geográficos que permitiam ter uma idéia do teatro das operações e seguir o
desenrolar dos combates descritos. A cronologia era considerada como um
acessório do estudo desses textos históricos - a linguagem da época
costumava unir à cronologia a geografia sob a expressão “os dois olhos da
história”. A ciência cronológica era de toda maneira, na época em que
foram criadas as instituições de educação humanistas (isto é, no século
XVI), um campo de pesquisa extremamente “preciso”, exigindo uma vasta
cultura filológica e científica, que não devia ser exposta em classe16. Ainda
não se dispunha, mesmo se desejassem ardentemente conhecimentos que
permitissem reconstituir a sucessão dos acontecimentos relacionados pelos
textos antigos. O único meio de datação, pouco preciso, de que dispunham
os regentes humanistas era efetivamente a filologia, na medida em que essa
procede por comparação entre os diversos estágios de uma língua (o latim,



instruções mais detalhadas da primeira versão da Ratio, a de 1586, consultável em Ladislaus
Lukàcs, Monumenta paedagogica Societatis Jesu, Rome, Institutum Societatis Jesu, t. I – VII,
1965 – 1992, t. V, p. 151. Ver também as instruções de P. Orlandini, Circa il modo de legger
dell’humanista (1582 – 83), ibid. t. VI, p. 520.
15
   Não conhececendo publicações especificadamente consagradas à essa questão, permito-me
indicar minha obra L’Histoire enseignée au Grand Siècle…, op. cit., pp. 61 – 71.
16
   Ver Anthony Grafton, Joseph Scaliger. A Study in the History of Classical Scholarship. II –
Historical Chronology, Oxford, Clarendon Press, 1993, 766 p.

                                                                                          13
nesse caso) no curso de sua evolução17 - o que reconduz outra vez à
necessidade de um domínio tão aprofundado quanto possível dos textos
escritos nessa língua.
           Imaginamos, portanto, a impossibilidade, em um tal contexto de
um “curso” de história que consistiria em uma apresentação seguida dos
acontecimentos – do mesmo modo que um “ curso” de qualquer matéria que
fosse, na medida em que se estudasse em prioridade textos. Daí a
proposição de ver no ensino das humanidades, um ensino por definição
“não-disciplinar”; e isso não devido a uma incapacidade dos regentes da
época em criar um outro, mas em virtude dos princípios que tinham
presidido a sua organização. Foi assim que as instâncias dirigentes da
Companhia de Jesus refutaram a proposição feita por muitos de seus
membros de criar um curso de história, conforme o modelo praticado por
seus rivais protestantes; não porque elas recusassem a história em si, mas
porque romperiam com o respeito aos textos antigos, base de sua
pedagogia18.
           Também vemos que o material documentário utilizado em tal
ensino oferece amplitude à interpretação, já que seus conteúdos, na medida
em que dizem respeito quase que exclusivamente às realidades tratados
pelos textos antigos, são exclusivamente históricos: trata-se de palavras, de
fatos, de pensamentos vindos da Antigüidade. Entretanto, essas palavras,
fatos e pensamentos não chegam aos alunos de maneira ordenada pois os
textos são escolhidos em função de seu grau de dificuldade lingüística, não
obedecendo à ordem cronológica. Assim, não podemos pretender que os
alunos dos colégios do Antigo Regime saiam totalmente despojados de
conhecimentos históricos: eles tinham, ao contrário, um conhecimento da
Antigüidade bem mais profundo que os alunos e mesmo os professores
atuais de história. Mas esse saber histórico era desordenado e, sobretudo,
lacunar, porque ignorava quase tudo o que chamamos hoje de Idade Média -
sem falar da época em que viviam os alunos.
           Esse fato pode escandalizarnos? Isso não teria mais sentido senão
o de se indignar com teorias científicas que estiveram em voga antes das
nossas. A história, para os regentes dos colégios humanistas, não era um
conjunto de conhecimentos, o produto de uma pesquisa fundada sobre uma

17
   Ver Donald R. Kelley, Foundations of Modern Historical Scholarship. Language, Law and
History in the French Renaissance, New York/London, Columbia University Press, 1970, 321
p.
18
   Cf. François de Dainville, « L’enseignement de l’histoire et de la géographie… », art. cit.;
para uma discussão da tese sustentada nesse artigo, ver Annie Bruter, « Entre rhétorique et
politique: l’histoire dans les collèges jésuites au XVIIe siècle » in Les Humanités classiques,
Histoire de l’éducation n° 74, op. cit., pp. 59 – 88.

14
metodologia regrada: a palavra não designava um domínio particular do
saber – todo o saber, na época, era tido como vindo do passado, portanto
como história – mas um ramo da retórica, definido por um modo específico
de escrita, o modo narrativo. Só eram, conseqüentemente, considerados
como historiadores aqueles que soubessem usar esse modo com talento, em
bom latim ou em bom grego – o que desqualificava os cronistas
medievais19. Não se tratava, então, na época de “ensinar história” segundo o
sentido atual do termo: conforme as concepções pedagógicas e científicas
da época, os alunos deviam ler os historiadores antigos, pois se procurava
na leitura elementos para ensinar a arte de escrever, graças à qual a França
disporia um dia, ao menos esperavam, de historiadores dignos desse nome
que ela ainda não tinha...


“Usos” e pedagogia da história no século XVII

           O paradoxo é que esse ensino das humanidades eclodiu no
momento em que as concepções mudaram, procedentes de uma época mais
antiga (a da cultura manuscrita da Renascença), da cristalização sob a forma
de modelo pedagógico - mas não é próprio a todo sistema educativo, por
definição encarregado de transmitir o que vem do passado, atrasar o que diz
respeito à sociedade que o envolve? Poderíamos aqui mencionar
brevemente alguns fatores dessa mudança, enumerando sucessivamente o
que, na realidade, se relaciona de maneira muito mais complexa.
           Um primeiro fator de mudança situa-se, bem entendido, no plano
político. A vitória da fidelidade monárquica sobre os vínculos de
dependência confessional, que põe fim às guerras de religião20; o triunfo do
absolutismo e a paroquialização da vida mundana e cultural do século
XVII21 focalizam, de agora em diante, o interesse sobre a história nacional,
vista através da história das dinastias reinantes e de sua corte.
Paralelamente, se manifesta uma evolução do sentimento religioso: a
importância cada vez maior acordada às práticas – portanto aos costumes –

19
   Ver Arnaldo Momigliano, « Ancient History and the Antiquarian », 1950, trad. française
« L’histoire ancienne et l’Antiquaire » dans Arnaldo Momigliano, Problèmes d’historiographie
ancienne et moderne, Paris, Gallimard, 1983, pp. 244 – 293.
20
  Myriam Yardeni, La Conscience nationale en France pendant les guerres de religion (1559
– 1598), Louvain/Paris, Nauwelaerts/Béatrice-Nauwelaerts, 1971, 392 p.
21
  Ver Roger Chartier, « Trajectoires et tensions culturelles de l’Ancien Régime » in André
Burguière et Jacques Revel (dir.), Histoire de la France. Les formes de la culture, Paris,
Éditions du Seuil, 1993, pp. 307 – 392.

                                                                                        15
como critério de ortodoxia confessional22, leva a acentuar fins
moralizadores da educação, em que o aprofundamento do esforço de
aculturação religiosa iniciado no século precedente, no âmbito da rivalidade
entre Reforma e Contra-Reforma23, induz o recurso à narração histórica
como meio de fazer interiorizar, desde a infância, as verdades e os valores
transmitidos pelo catecismo24. No plano cultural, enfim, o progresso da
produção impressa a coloca à disposição de um público cada vez mais
vasto, que se estende, a partir dali, além do círculo dos “doutos” para os
quais a leitura era uma atividade quase profissional25: o uso de uma
literatura mais mundana, mais atraente e de mais fácil acesso que a
literatura latina e grega, ao mesmo tempo que uma especialização acrescida
de gêneros.
            Ora, todos esses fatores se encontram com uma outra mutação,
dependendo ela do plano científico. O saber fundamental da época, do
nosso ponto de vista, é a elaboração de uma linha de tempo única sobre a
qual se ordenam os fatos até então dispersos, conhecidos através dos textos
antigos e medievais26. É essa aquisição da ciência “cronológica” da
Renascença, que os resumos de história - que parecem cada vez mais
numerosos durante o século, em latim27 e em francês28 - pretendem
vulgarizar. A utilização dessa linha de tempo dá aos estudos históricos um
novo modo de apreensão dos fatos (por ordem de sucessão cronológica e

22
  Michel de Certeau, « L’inversion du pensable. L’histoire religieuse du XVIIe siècle » (1969)
et « La formalité des pratiques. Du système religieux à l’éthique des Lumières (XVIIe –
XVIIIe) » (1973), artigos retomados em Michel de Certeau, L’Écriture de l’histoire, Paris,
Gallimard, 1975, pp. 131 – 152 et 153 – 212.
23
  Jean-Claude Dhôtel, Les Origines du catéchisme moderne d’après les premiers manuels
imprimés en France, Paris, Aubier, 1967, 472 p.
24
  Claude Fleury, Catéchisme historique, Paris, Vve G. Clouzier, 1683, 2 vol. in-12, t. I: Petit
Catéchisme; Fénelon, De l’Éducation des filles, 1687 (a edição consultada é a de Paris, P.
Aubouin, 1696, in-12, 272 p.).
25
   Ver Henri-Jean Martin, Livre, pouvoirs et société à Paris au XVIIe siècle (1598 – 1701),
1969, rééd. Genève, Droz, 1999, 2 vol., 1091 p.
26
  Anthony Grafton, Joseph Scaliger…, op. cit.; D.J. Wilcox, The Measure of Time Past.
Prenewtonian Chronologies and the Rhetoric of Relative Time, Chicago/London, The
University of Chicago Press, 1987.
27
   Só mencionaremos aqui os dois mais célebres entre cuja utilização com fins pedagógicos é
atestada, que são também os mais antigos: l’Epitomae historiarum libri X do jesuíta Torsellini,
que apareceu pela primeira vez em Roma em 1598, que podemos consultar na edição de Lyon,
J. Cardon e P. Cavellat, 1620, in-12, p. lim., 640 p. e index; e o Rationarium temporum… de P.
Denis Petau, Paris, S. Cramoisy, 1633, 2 t. en 1 vol. in-12.
28
  Há desde o início a coexistência de duas séries de resumos de história, uma em latim, outra
em francês. O estudo de suas relações e a maneira em que o francês se impôs através das
edições sucessivas ainda está a ser feito.

16
não mais por contiguidade, temática ou geográfica). Fornece, pelas
referências temporais que estabelece, um instrumento de aprendizagem que
faltava até então (as datas...). Coloca, assim, mais claramente em evidência
as lacunas na exposição dos acontecimentos, incitando completá-las;
contribuiu, desse modo, para transformar a noção do tempo, dando uma
visão linear... todas coisas que, sem atacar, destroem profundamente o
respeito sempre proclamado dos historiadores da Antigüidade.
           Assim, vemos manifestar-se ao longo do século, através da
literatura de vulgarização histórica e dos projetos ou tratados sobre a
educação, aspirações a um outro tipo de relação com o passado que não seja
o do ensino humanista: uma relação mais natural, mais direta, que contorna
o obstáculo da aprendizagem das línguas antigas e exige o acesso a um
passado mais próximo e mais acessível. A tradução dos autores antigos, se
não for novidade, conhece então outra idade do ouro: os “belos infiéis”29
colocam esses autores ao alcance dos leitores (e das leitoras) que não foram
obrigados às disciplinas austeras de aprendizagens humanistas. A oferta de
obras históricas se diversifica: produções humanistas, que continuam sua
carreira florescente, compêndios de história e histórias mais ou menos
romanescas30, destinados a um público maior e menos informado.
           Paralelamente, se afirma cada vez mais explicitamente a
necessidade de conhecer a história de seu país em um movimento, aliás não
isento de contradições – as mesmas que vimos surgir no fim do século
XVII, a respeito da educação do príncipe cristão, apresentada como modelo
a ser seguido mas reservado ao poder e aos que são destinados por natureza;
isto é, por seu nascimento31. Ora, a história mantinha nesse modelo um
lugar central, como complemento indispensável das matérias “teóricas”
necessárias à formação principesca que eram a moral e a política: era a
história que estava destinada a fornecer os exemplos, ilustrando os preceitos
abstratos que constituíam essas ciências. Essa história necessária aos
príncipes englobava-se bem à história antiga, não se isolava: devia fornecer
aos futuros governantes modelos mais próximos deles do que os heróis da


29
  Roger Zuber, Les « Belles infidèles » et la formation du goût classique, 1968, rééd. Paris,
Albin Michel, 1995, coll. « Bibliothèque de l’Évolution de l’humanité », 521 p.
30
  Sobre a “fusão” entre história e romance na segunda metade do século XVII, ver Bernard
Magné, Crise de la littérature française sous Louis XIV: Humanisme et nationalisme, Lille,
Atelier de reproduction des thèses Lille III, 1976, 2 vol., 1026 p., multigr.
31
   Annie Bruter, « Des arcana imperii à l’éducation du citoyen: le modèle de l’éducation
historique au XVIIIe siècle », apresentado no colóquio organizado pela Société française
d’étude du dix-huitième siècle et la Société italienne d’étude du dix-huitième siècle, com
l’UMR LIRE (CNRS n° 5611 – Université Stendhal – Grenoble I), « L’Institution du Prince au
XVIIIe siècle », Grenoble, 14 – 16 octobre 1999, a ser publicado nas Atas do colóquio.

                                                                                          17
Antigüidade, bem como conhecimentos positivos (militares, genealógicos,
diplomáticos, econômicos, etc.) sobre os assuntos do reino, isto é, sobre o
presente ou o passado próximo. Uma nova pedagogia da história surge,
assim, conjugando a aprendizagem da cronologia com o curso dialogado no
qual o aluno escuta e discute o relato dos acontecimentos, que deverão ser
em seguida redigidos: tal é, ao menos, a pedagogia descrita pelos
preceptores dos príncipes no fim do século XVII32. Quanto aos primeiros
“manuais escolares” de história, não provêm da educação principesca33, mas
das pensões aristocráticas onde se ministravam os cursos particulares de
história pelos “chambristes”34.
           Os preceptores dos príncipes não publicam suas obras sem
fornecer uma advertência sobre a inconveniência que teria para as “pessoas
comuns” pretender o mesmo saber que os príncipes. Concede-se ao homem
comum somente um “uso moral” da história destinada a ensinar os
malefícios das paixões: o “uso político” desta é reservado aos príncipes e
aos “Grandes”35. Compreendemos, vendo a história assim colocada como
disciplina central da educação ao mesmo tempo que subtraída ao comum
dos mortais, o seu estatuto marginal, inacessível no último século do Antigo
Regime. Era objeto de um ensino, sobre o qual encontramos vestígios
através de resumos explicitamente destinados à juventude36, de exercícios


32
    Charles-Bénigne Bossuet, « De l’instruction du Dauphin, Lettre au pape Innocent XI »
(1679) dans Œuvres complètes, Bar-le-Duc, par des prêtres de l’Immaculée Conception de St-
Dizier, 1863, t. XII; Claude Fleury, Traité du choix et de la méthode des études, Paris, P.
Auboin, P. Émery et C. Clousier, 1686, in-12, 365 p.; Géraud de Cordemoy, « De la nécessité
de l’Histoire, de son usage, & de la manière dont il faut mêler les autres sciences, en la faisant
lire à un Prince » dans Divers traités de métaphysique, d’histoire et de politique, Paris, Vve de
J.-B. Coignard, 1691, in-12, VI-292 p
33
  É, por exemplo, o caso, citando somente o mais célebre, de Instruction sur l’Histoire de
France & Romaine par demande & réponses, Avec une explication succincte des
Métamorphoses d’Ovide, & un Recueil de belles Sentences tirées de plusieurs bons Auteurs,
Paris, A. Pralard, 1687, in-12, em que o autor, Le Ragois, era preceptor do Duque de Maine.
34
    Faltando lugar para uma bibliografia completa, mencionaremos: Nouveaux Élémens
d’histoire et de géographie à l’usage des pensionnaires du Collège de Louis le Grand du
jésuite Buffier, 2ème éd. Paris, M. Bordelet, 1731, 2 partes em 1 vol. in-12. Os resumos do
Padre Berthault, regente à Juilly: Florus Francicus, Paris, J. Libert, 1630, in-24, 279 p.; Florus
Gallicus, Paris, J. Libert, 1632, in-24, 324 p.; Florus Gaulois ou l’abrégé des guerres de
France, t. I, Paris, J. Libert, 1634, in-8°, 298 p., são talvez oriundos dos cursos desse
pensionato que a tradição historiográfica considera como o primeiro a ter ministrado o ensino
de história, mas a prova da utilização desses resumos para fins pedagógicos não existe.
35
  Annie Bruter, « La “confiscation” de l’histoire: l’éclatement des usages de l’histoire au
XVIIe siècle » in Henri Moniot et Maciej Serwanski, L’Histoire et ses fonctions. Une pensée et
des pratiques au présent, Paris/Montréal, L’Harmattan, 2000, pp. 27 – 46.
36
     Os resumos da época precedente visavem um público bem mais definido.

18
públicos 37, até mesmo de redações dos alunos38. Mas, excetuando as
instituições inovadoras que foram as pensões particulares e as escolas
militares, esse ensino não foi, em geral, integrado ao currículo escolar - a
história continuava sendo um tipo de matéria facultativa sob a
responsabilidade das famílias. Explica-se, assim, a insistência em reclamar
sua introdução nos colégios no século XVIII39, quando há provas da
existência de seu ensino na época; mas é o estatuto desse ensino que
persiste impreciso, por causa de seu caráter marginal, não-normatizado.
            Somos levados, assim, a distinguir duas coisas normalmente
confundidas no discurso sobre a educação (pelo fato de seguirem agora
juntas, a saber, pedagogia e escolarização - chamamos aqui pedagogia toda
tentativa intencional de transmissão de um saber). Se a história do ensino
histórico mostra que houve a invenção de uma pedagogia da história, com
seus procedimentos e seu material específico na segunda metade do século
XVII, mostra também que essa invenção se fez fora do âmbito propriamente
escolar: é no espaço mais flexível da educação principesca ou do pensionato
aristocrático que se elaboraram métodos e instrumentos de uma instrução
histórica autônoma, independente da leitura dos historiadores antigos,
procedendo a uma apresentação contínua dos acontecimentos - da criação
do mundo até a época contemporânea.
            O estudo das resistências à integração dessa história autônoma ao
currículo escolar, e os fatores que terminaram impondo-a junto das
humanidades clássicas, ultrapassaria muito os limites temporais desse
artigo, pois levaria ao debate sobre a educação do século XVIII e a
Revolução, sobre os liceus do século XIX. Contentar-nos-emos em assinalar
que a introdução da história no ensino dos liceus e colégios do Império e da
Restauração (mencionada nos programas desde 180240, a história é dotada
de um horário específico e de um programa embrionário em 181441, de
professores “especiais”, em certos liceus, pelo menos a partir de 181842) não

37
  Ver por exemplo Pierre Jean de Berulle répondra sur l’histoire chronologique de l’Église…
Au Collège de Louis le Grand, le Vendredi 8 avril 1707, à quatre heures après midi, Arch. S.J.
Vanves, É Pa 30 – 7.
38
  O curso de Bossuet sobre Charles IX redigido para o príncipe herdeiro foi publicado por
Régine Pouzet sob o título Charles IX, récit d’histoire, Clermont-Ferrand, Adosa, 1993.
39
  Ver, por exemplo, o artigo « Collèges » da Enciclopédia, no qual D’Alembert se queixa « do
pouco caso dado ao estudo da História nos colégios », Encyclopédie ou Dictionnaire raisonné
des Arts, des Sciences et des Métiers, t. III, Paris, 1753.
40
  Philippe Marchand (éd.), L’Histoire et la géographie dans l’enseignement secondaire. Textes
officiels. T. 1: 1795 – 1914, Paris, INRP, 2000, textes 4, 5, 6, pp. 95 – 96.
41
     Ibid., texte 12, pp. 101 – 103.
42
     Ibid.,texte 15, pp. 109 – 110.

                                                                                          19
poderia ser feita tão rapidamente, se os professores não dispusessem de um
mínimo de material pedagógico já elaborado. Ora, uma parte pelo menos
desse material pedagógico, remonta aos preceptores dos príncipes do fim do
século XVII, como Fleury ou Le Ragois, cujas obras conhecem, ao longo do
século XIX, uma carreira que só se extinguiu com as reformas
republicanas43.


                                                  ***

           A primeira das reflexões, de ordem mais geral, pela qual
gostaríamos de encerrar esse artigo, concerne à temporalidade própria da
história das disciplinas escolares. André Chervel abordou o problema,
assinalando a longa duração dos processos de criação e de funcionamento
de uma disciplina44. No mesmo sentido - e contra uma certa tradição
historiográfica, que vê na aparição do ensino da história no século XIX uma
criação ex nihilo do poder político -, esperamos ter mostrado que a
constituição da história em matéria “ensinável” foi um fenômeno de longa
duração, cujas premissas são encontradas bem antes da época de seu
“nascimento” oficial, e que continuamos em realidade, bem além: a
emancipação da história como disciplina plenamente autônoma, ensinada
por professores especializados, só foi conseguida na virada do século XIX
para o XX45. Então, sobre a base de uma experiência pedagógica já multi-
secular, mesmo se ficou muito tempo reservada a uma minoria, o ensino da
história pode-se tornar, nessa época, o instrumento por excelência da
integração patriótica e cívica dos alunos46 - instrumento cujas incertezas,
que cercam o futuro do Estado-Nação, questionam atualmente a sua própria
finalidade.
           Essa longa duração da formação de uma disciplina escolar está
ligada à complexidade de um processo, cujos múltiplos componentes


43
   Ver Martin Lyons, Le Triomphe du livre. Une histoire sociologique de la lecture dans la
France du XIXe siècle, Paris, Promodis, 1987, pp. 85 – 104.
44
     « L’histoire des disciplines scolaires… », art. cit., pp. 30 – 31.
45
     Philippe Marchand (éd.), L’Histoire et la géographie…, op. cit., pp. 75 – 84.
46
   De uma abundante bibliografia, destacarei aqui somente dois artigos que fizeram sucesso:
Jacques et Mona Ozouf, « Le thème du patriotisme dans les manuels primaires », 1962,
republicado em Mona Ozouf, L’École de la France, Paris, Gallimard, 1984, pp. 185 – 213;
Pierre Nora, « Lavisse, instituteur national. Le “Petit Lavisse”, évangile de la République », in
Pierre Nora (éd.), Les Lieux de mémoire. I – La République, rééd. Paris, Gallimard, 1997, coll.
« Quarto », pp. 239 – 275.

20
tentou-se mostrar. Entraram, de fato, em jogo diversos fatores - cada um
com seu ritmo próprio de evolução. Os objetivos da educação, por exemplo,
mudam no decorrer do tempo: se ficaram, durante o período considerado
aqui, dominados pela finalidade retórica, pudemos vê-los enfraquecer de
uma maneira que acentuou o alcance moralizante da leitura dos
historiadores antigos para todos os alunos; ao passo que era confiscado o
“uso político” da história, decretado monopólio dos príncipes na época do
absolutismo triunfante. Mas, bem antes dessa etapa, ocorrem outras
transformações pelas quais se cortou em profundidade a relação com o
passado, isto é, com o ensino humanista: transformações técnicas,
econômicas e sociais, progresso da escrita e da imprensa, desenvolvimento
dos aparelhos administrativos, ampliação do público de leitores,
transformações científicas, metodológicas e pedagógicas levadas, no que diz
respeito à história, à elaboração de uma cronologia unificada, à renovação
do modo de leitura dos historiadores e à experimentação de novos métodos
de ensino.
           Sobre essa complexidade gostaríamos de insistir para finalizar, a
fim de lutar contra o risco de uma leitura evolucionista, vendo na pesquisa
aqui apresentada uma tentativa a mais para conferir uma “origem” ao ensino
da história atual. É, ao contrário, a inter-relação constante que pensamos
poder revelar entre expectativas e ambições culturais e sociais, concepções
e meios científicos, técnicos ou pedagógicas, que faz da história das
disciplinas escolares um campo de pesquisa tão vasto quanto apaixonante
para explorar, nessa época de mudanças de nossa sociedade que questiona
cada dia mais os sistemas educativos que herdamos do passado.


Annie Bruter é Pesquisadora do Service d’histoire de l’education – URA
CNRS 1397/Institut National de Recherche Pédagogique. Paris/França
Maria Helena Camara Bastos é Professora no Programa de Pós-
Graduação em Educação da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande
do Sul; Pesquisadora do CNPQ.


Recebido em: 10/08/2005
Aceito em: 15/01/2006




                                                                         21
.
Igreja, religião e ensino elementar antes das leis de
     laicização européias: um reexame crítico de suas
                           relações1
                                Pierre Caspard
                    Tradução de Maria Helena Camara Bastos


Resumo

Este artigo propõe um reexame do lugar ocupado pela religião no ensino elementar na época
moderna, no seu conteúdo, no seu controle, nas suas grandes finalidades e nos seus objetivos
pedagógicos concretos. A reflexão diz respeito a um caso específico: o das escolas de vilas de
um cantão suíço, francofone e de religião reformada (calvinista), estudadas do século XVI ao
século XIX. Mostra uma grande imbricação dos aspectos religiosos e laicos nesse ensino e um
crescimento muito antigo da importância dos segundos, bem antes das leis de laicização da
metade do século XIX, que terão, sobretudo, por objetivo a fundação da República baseada em
uma noção ampla de cidadania. Essa conclusão poderia se estender de forma mais extensiva,
apesar de certas especificidades, aos países católicos ou luteranos da Europa moderna.
Palavras-chave: Religião, Laicidade, Suíça, Estado, Igreja, Época Moderna, Pedagogia cristã,
Aprendizagens elementares, Racionalismo, Humanismo



Resume

Cet article propose un réexamen de la place tenue par la religion dans l’enseignement
élémentaire à l’époque moderne, dans son contenu, son contrôle, ses grandes finalités et ses
objectifs pédagogiques concrets. La réflexion porte sur un cas précis: celui des écoles
villageoises d’un canton suisse, francophone et de religion réformée (calviniste), étudiées du
XVIe au XIXe siècle. Elle montre une imbrication forte des aspects religieux et laïcs dans cet
enseignement et un accroissement très ancien de l’importance des seconds, bien avant les lois
de laïcisation du milieu du XIXe siècle, qui auront surtout pour but de fonder la République sur
une notion de citoyenneté élargie. Cette conclusion pourrait largement s’étendre, malgré
certaines spécificités, aux pays catholiques ou luthériens de l’Europe moderne.
Mots clés: Religion – Laïcité – Suisse – Etat – Eglise – Epoque moderne – Pédagogie
chrétienne – Apprentissages élémentaires – Rationalisme – Humanisme.




1
  Título original “Eglise, religion et enseignement elémentaire avant les lois de laïcisation
européennes: un réexamen critique de leurs rapports”. Autorizado especialmente pelo autor
para publicação nesta revista.

         História da Educação, ASPHE/FaE/UFPel, Pelotas, n. 19, p. 23-37, abr. 2006
                         Disponível em: http//fae.ufpel.edu.br/asphe
A reflexão sobre a educação e sua história é naturalmente binária.
Avança antagonismos frontais, princípios inconciliáveis, rupturas heróicas.
A religião encontrou-se assim colocada no centro dos esquemas de
interpretação da educação, em dois momentos de sua história comum. No
século XVI, a Reforma, seguida da Contra-Reforma em países católicos, é
considerada como o acontecimento fundador de um ensino elementar de
massa. “Os protestantes aprenderam a ler a partir de Calvin”, pode-se
escrever para sublinhar a profundidade dessa ruptura2. No século XIX, ao
contrário, os governantes dos Estados laicos ou republicanos atribuíram
massivamente à organização religiosa sobre o ensino popular a causa de
seus atrasos e insuficiências: cabia de agora em diante às leis de laicização
passar a escola da sombra para a luz.
           País de confissão majoritariamente reformada, o cantão suíço de
Neuchâtel é objeto, em ambos momentos, de discursos realmente
conformados. Vejamos o que Aimé Humbert, primeiro diretor de Educação
Pública do governo radical estabelecido pela Revolução de março de 1848,
diz ao apresentar seu projeto de lei sobre a instrução pública, que será
votado em março de 1850. Ele enuncia inicialmente, como uma evidência
histórica, que a Reforma deu um “elã salutar” às escolas, “rompendo os
entraves de Roma, permitindo a todos os cristãos a leitura das Sagradas
Escrituras”; mas continua afirmando que essas escolas, criadas com um
objetivo de puro doutrinamento religioso, somente habituavam os alunos “a
recitar sem compreender, a falar sem refletir, a aprender para esquecer, sem
nenhum aproveitamento para o desenvolvimento de seu julgamento, e
menos ainda para sua memória, que tinha sido cansada, atordoada”3. O
governo republicano podia colocar, enfim e pela primeira vez, a razão das
crianças no centro da instrução elementar.
           Esse discurso, de alguma maneira dá início à vulgata que é ainda
hoje pregnante4, mas que merece um sério reexame. Nossa intenção é


2
 Furet F., Ozouf J.: Lire et écrire. L’alphabétisation des Français de Calvin à Jules Ferry. Paris
1977, 2 vol.
3
  Bulletin officiel des délibérations du Grand Conseil, 21 novembre 1849. Em sua ação como
Diretor da Educação Pública, A. Humbert testemunha um espírito infinitivamente mais
pragmático e matizado que possa supor o manequeísmo de seu discurso.
4
  Por exemplo: “Os alunos são habituados a repetir, copiar e recitar sem nenhum raciocínio”.
Schwitzguébel-Leroy A.: Le système scolaire neuchâtelois vers la fin de l’Ancien Régime. In:
Histoire de l’université de Neuchâtel, t.1 Hauterive, 1988, pp. 40-41; ou ainda para a Suíça em
seu conjunto: Capitani F. de: “A Igreja vê no ensino elementar o melhor meio de manter a
ortodoxia na população […]. Aprendem de memória, a compreensão dos textos é secundária”.
In: Nouvelle histoire de la Suisse et des Suisses, t.2. Lausanne 1983, p. 145. O estudo citado de
A. Schwitzguébel-Leroy oferece uma excelente apresentação do sistema escolar de Neuchâtel

24
mostrar que o papel da religião no ensino, antes de sua laicização por via
legislativa, é objeto de uma tríplice distorção na memória e na história da
educação. Essas distorções superestimaram o papel da instituição religiosa
na impulsão e no controle do ensino, como na definição de seu conteúdo.
Menosprezam os princípios e os objetivos da pedagogia adotados nas
escolas elementares. Subestimam, enfim, as profundas transformações
ocorridas bem acima das leis escolares que balizaram o século XIX. Esse
reexame será operado o mais próximo possível do terreno escolar, pela
análise do funcionamento efetivo das escolas e do papel dos principais
protagonistas do ensino dispensado durante três séculos. A questão das
relações entre sagrado e secular poderá assim aparecer de uma maneira
diferente da sua quando abordada unicamente no terreno dos princípios, das
doutrinas e das idéias, onde os protagonistas da história se situam o mais
frequëntemente para justificar sua ação.


1 A Reforma, a Igreja e os Pastores

           As exigências formuladas pela Reforma em matéria de instrução
das crianças são bem conhecidas5. Desde o século XII, a Igreja tinha
repousado a fé em um conhecimento intelectual, que devia ser então objeto
de um ensino. Os reformadores aumentaram essa exigência incluindo a
leitura pessoal da Bíblia, o que induzia um ideal de domínio generalizado da
leitura pelos cristãos. Este objetivo se encontra de forma plena nas
Ordonnances ecclésiastiques de Neuchâtel, de 1564, que recomendam a
todos os pais e mães que instruam seus filhos para que possam motivar sua
fé, e preconizam para tal a criação de escolas6.
           Não podemos, no entanto, limitar-nos a deduzir a afirmação de
um princípio a evolução que posteriormente conhecerá a instrução das
crianças. O ideal afirmado pela Reforma foi de fato atingido muito
progressivamente. Até o fim do século XVII, numerosas crianças foram
admitidas à comunhão, sacramento ao qual acendiam somente na idade


nos anos de 1830-1840, incluindo desenvolvimentos sobre as posições oficiais da Classe dos
Pastores concernente ao ensino.
5
  Em uma abundante bibliografia, uma das obras de referência em língua francesa é: Chartier
R., Compère M.M, Julia D.: L’éducation en France, du XVI e au XVIIIe siècle. Paris 1976, bem
como o capítulo consagrado por D. Julia à “Une catéchisation de masse” in: Becchi E., Julia D.
(Dirs): Histoire de l’enfance en Occident de l’Antiquité au XVIIe siècle, Paris 1998.
6
  Boyve J.: Annales historiques du comté de Neuchâtel et Valangin, Berne et Neuchâtel 1854-
1859, Vol. 2, p. 123-124.

                                                                                          25
aproximada de 16 ou 17 anos7, em Neuchâtel, sem o domínio da leitura de
textos tão difíceis quanto o Antigo e o Novo Testamento. Os primeiros
casos confirmados de recusa ostensiva contrária à admissão de crianças por
causa do iletrismo, por parte de um pastor, não são encontrados senão no
início do século XVIII, multiplicando-se posteriormente8. Isso conduz, não
à diminuição da importância dos ideais educativos formulados de início,
mas à obrigação de compreender o ritmo e as modalidades com que foram
concretamente atingidos.
           Deste ponto de vista, convém questionar inicialmente o papel da
Igreja de Neauchâtel como instituição. Sua história é bem conhecida,
marcada por alguns tempos fortes como a ação de Guilhaume Farel,
companheiro próximo de Calvino, a de Jean-Frédéric Ostervald, teólogo
reputado em toda a Europa no século XVIII, depois, mais anedóticos, mas
fortemente mediatizadas, as altercações de Jean-Jacques Rousseau com a
Venerável Classe dos Pastores9. Em um principado que, da Idade Média a
1848, teve uma grande independência, ao mesmo tempo em relação aos
seus príncipes (franceses ou prussianos) e em relação a Confederação
helvética, a Classe dos Pastores, cujo decano é um primus inter pares,
desempenhou um papel de corporação que defendia os interesses materiais e
morais de seus membros, face ao Estado e às comunas, tentados a ignorar
seus direitos e prerrogativas ou usurpá-los. Também defendeu uma certa
ortodoxia doutrinal, regulou a formação, o recrutamento e a carreira de seus
membros, unificou a liturgia, resolveu ou deu um parecer sobre as questões
pastorais relativas às paróquias e manteve, enfim, relações intelectuais com
outras Igrejas protestantes, especialmente as de Genebra, Berna, Bâle
(Suíça) e Montbéliard (França).
           No domínio escolar, a intervenção a mais recorrente da Classe
dos Pastores diz respeito ao controle que exerce, ou pretende exercer, sobre
a nomeação dos regentes. Mas, enquanto que, nos primeiros tempos da
Reforma, esses eram muitas vezes eles próprios pastores ou diáconos, a
função foi totalmente laicizada durante o século XVII, o poder de nomeação


7
  Caspard P.: Examen de soi-même, examen public, examen d’Etat. De l’admission à la Sainte-
Cène aux certificats de fin d’études, XVIe-XIXe siècles. In: Histoire de l’éducation, mai 2002,
p. 17-74.
8
  Em 1731, o pastor de Verrières escreve “que não depende de mim não receber as crianças
para comungar enquanto não souberem ler”, e só aceita efetivamente algumas
condicionalmente. Cf. Caspard P., art.cit, p. 56.
9
  Robert, M., Hammann G.: L’Eglise dans la société d’Ancien Régime. In: Histoire du Pays de
Neuchâtel Hauterive 1991, t. 2. De la Réforme à 1815, p. 271-315. Hammann G.: Eglises et
communautés religieuses. In: Histoire du Pays de Neuchâtel Hauterive 1993, t. 3 De 1815 à nos
jours, p. 219-255.

26
voltou às comunas que pagavam seus salários. A aprovação da Classe era
igualmente necessária, em razão das funções da Igreja que eram exercidas,
aliás, pelos regentes (ler a Bíblia e dirigir o canto no templo, recitar as
preces em certas circunstâncias). Mas as comunas sustentavam que, para a
regência da escola stricto sensu, elas tinham liberdade total para recrutar ou
para demitir quem desejassem. Casos de conflito chegavam de tempos em
tempos à Classe, que apelava eventualmente ao Conselho de Estado de
Neuchâtel, cujos pareceres iam preferencialmente no sentido do direito das
comunas10.
           Isso não impedia as autoridades comunais de trabalhar, na grande
maioria dos casos, em harmonia com o pastor do lugar, o consultor das
questões escolares e associando às visitas anuais à sua escola onde
desempenhava seguidamente o papel de examinador. Mas, diferentemente
dos países católicos ou luteranos, a Classe não exercia, como instituição,
nenhuma autoridade hierárquica sobre o andamento das escolas,
principalmente não tinha nenhum direito de visita, de inspeção nem mesmo
de simples informação.
           É, portanto, o contexto das comunas e das paróquias, campo de
ação dos pastores, que aparece como o mais pertinente para uma análise do
papel desempenhado pela Igreja no desenvolvimento da instrução
elementar. Desse ponto de vista, a Reforma efetivamente marcou uma
ruptura que, em diversos aspectos, teve incidências maiores na educação.
           A primeira foi, a partir de então, a profunda inserção dos pastores
em seu meio. Antes da Reforma, os padres de Neuchâtel estavam
seguidamente ausentes e, em muitos casos, não havia nem mesmo vigário
para atender sua paróquia11. Eles dependiam de uma autoridade hierárquica
distante, os bispos de Lausanne ou de Besançon, que visitavam raramente
sua diocese. A Reforma mudou essa situação. A partir de agora, o pastor
reside na sua paróquia, de onde só pode ausentar-se excepcionalmente ou
por motivo justificável. Ele é apoiado por um Conselho dos Anciãos, eleito
pelos paroquianos, e não há mais superior hierárquico, exceto a autoridade
coletiva da Classe, da qual é membro. A antiga função do clérigo de ensinar
se encontra pois assegurada por uma maior interação com a população; essa
interação funcionando, é essencial sublinhar, em um duplo sentido. O
pastor, apoiado nos Anciãos, pode promover de forma mais eficaz a
instrução na sua paróquia12. Mas, inversamente, os paroquianos podem
10
     Archives de l’Etat de Neuchâtel (AEN): Actes de la Classe, XVIIe-XIXe siècles.
11
  Quadroni, D.: L’Eglise dans la société médiévale. In: Histoire du Pays de Neuchâtel
Hauterive 1989, t. 1 De la préhistoire au Moyen Age, p. 243-262.
12
   No exemplo citado na nota 8, o pastor tem o cuidado de precisar que suas exigências
“receberam o consentimento dos Anciãos, de forma unânime”.

                                                                                      27
exigir que ele não perca seu interesse por essa função, que não é
necessariamente considerada por cada pastor como a mais gratificante, se
comparada à prédica, ao acolhimento dos pensionistas ou às atividades
literárias, teológicas, científicas ou corporativas nas quais não é raro se
investirem.
            Desde o fim do século XVII, temos o exemplo de muitas
paróquias que cobram dos seus pastores suas tarefas de instrução,
dispensando-os de alguns sermões anuais em benefício de horas de
catecismo suplementares, contabilizando com desconfiança as que são
realmente efetuadas, para ver se o cômputo é bom, ou solicitando lhes
lembrar, com mais firmeza, as suas obrigações educativas às famílias
obstinadas13. No final do século XVIII, os pastores dedicam assim,
anualmente, mais de uma centena de horas ao catecismo e à preparação de
catecúmenos à confirmação, bem mais que a predicação no templo.
            Uma segunda ruptura induzida pela Reforma concerne ao
estatuto matrimonial dos padres. Que não sejam mais obrigados ao celibato
ou a uma concubinagem vergonhosa diz respeito à educação de várias
maneiras. O fato dos pastores terem, a partir de agora, o encargo de uma
família, às vezes numerosa, incita-os, para atendê-la, a exercer atividades
complementares a suas funções pastorais, visto que a secularização dos bens
da Igreja amputou as rendas atribuídas às paróquias. Segundo o pastor
Frène, que escreveu, no fim do século XVIII, que ele não era pastor “senão
durante um quarto do meu tempo”14, proporção sem dúvida próxima a de
muitos outros pastores que deixaram ou não testemunhos de seu emprego de
tempo. Ora, a principal dessas atividades complementares é o ensino dado
de forma privada, através de lições particulares, de acolhimento de
pensionistas, até mesmo a organização de verdadeiros pensionatos. Esse
ensino excede em muito o da religião ou do catecismo, para abordar um
grande leque de matérias profanas. A atividade de ensinar pode, aliás, ser
exercida de forma bem mais eficaz pois as esposas dos pastores, e até
mesmo uma ou outra de suas filhas, podiam ajudá-los, segundo uma prática
realmente corrente na época moderna, incluindo aqui os regentes
encarregados do ensino comunal15.
            Embora, antigamente presente nas polêmicas anticatólicas,
podemos reconhecer também uma parte de verdade na idéia segundo a qual

13
     Caspard P.: art.cit.
14
     Frêne T.-R.: Journal de ma vie. Ed. par A. Bandelier, Porrentruy et Bienne 1993.
15
   É, por exemplo, o caso de um dos primeiros grandes pensionatos, fundado pelo pastor de
Montmollin após a década de 1740. Sobre o papel das esposas de regentes, ver: Caspard P.: La
maîtresse cachée. Aux origines de l’institutrice publique, 1650-1850. In: Annales Pestalozzi, 3,
à paraître.

28
ser casado e chefe de família dá aos pastores uma sensibilidade mais fina às
questões educativas, e uma maior familiaridade com a experiência de seus
paroquianos nesse domínio, particularmente no que se refere à educação das
meninas. Deste ponto de vista, não se constata em Neuchâtel nenhum traço
de neurose sexual tão presente nos discursos – senão nas práticas – católicas
em matéria de co-educação dos sexos, o que manifestadamente contribuiu a
dar às meninas um nível de instrução não muito distante daquele conferido
aos meninos, até mesmo superior em certas áreas16.
           Em última análise, a participação dos pastores na função de
professores é múltipla. Na própria idéia dos reformadores – Lutero,
Calvino, Farel – a escola elementar não era senão uma instituição educativa
entre outras, mas particularmente destinada às crianças cujos pais não
tinham competência ou tempo necessário para instruí-las eles mesmos, a
primeira dessas condições agindo menos devido ao elevado nível de
instrução da população. De fato, o dispositivo da instrução oferecido às
famílias, mesmo modestas, não cessou de ampliar-se com o tempo. No
século XVIII, compreendia, ao lado da escola e da igreja, diversas formas
de pensão familiar, em Neuchâtel mesmo ou no exterior, lições e cursos
particulares sobre diversas matérias e, enfim, práticas de autodidática ou de
instrução familiar e doméstica17.
           Em um dispositivo tão variado, a ação do pastor era ela mesma
multiforme. A catequese era seu campo reservado, mas a leitura
(comentada) da Bíblia, as orações, o canto dos salmos, a prolongavam até a
escola e a família. Inversamente, o pastor participava de diversas maneiras
do ensino das matérias profanas, com suas próprias crianças, seus
pensionistas, ministrando aulas particulares ou pela sua competência na
escola pública do lugar. Daí essa grande imbricação de ensino profano e
religioso dado pelo pastor ou marcados por sua intervenção. Da Reforma às
leis de laicização, um dos seus símbolos foi o exame condicionando a
admissão dos alunos à ratificação da promessa de batismo e comunhão.
Esse exame verificava tudo ao mesmo tempo, a instrução religiosa das
crianças e um certo número de competências intelectuais: ler, compreender,
memorizar, reformular, induzir e deduzir... As próprias modalidades do

16
  Assim, em 1853, entre 10.600 meninos e meninas, o desempenho das meninas é um pouco
melhor em leitura e em escrita, muito melhor em ortografia, em resumos de leitura e em
composição francesa. Fonte: AEN, D.I.P. Rapport du Département de l’Instruction publique,
1853.
17
   Caspard P.: Pourquoi on a envie d’apprendre. L’autodidaxie ordinaire à Neuchâtel, XVI e-
XIXe siècles, in: Histoire de l’éducation, mai 1996, p. 65-110; Id: Les changes linguistiques
d’adolescents. Une pratique éducative, XVIIe-XIXe siècles. In: Revue historique neuchâteloise,
janvier 2000, p. 5-85.

                                                                                          29
exame não colocavam em confronto dois atores, mas três: o pastor que
examina os catecúmenos no templo, as crianças que eram examinadas, mas
também os paroquianos, vindos em massa para avaliar, ao mesmo tempo, as
performances dos jovens da vila no momento em que eles se preparavam
para tornarem-se “adultos”, e a maneira com que o pastor desempenhava
sua missão de instrução. Esta convergência de finalidades, laicas e sacras,
em um exame que era um rito de passagem social, abrindo-se para um
sacramento maior da religião cristã, leva a interrogar mais detalhadamente o
ensino dispensado nas escolas elementares.


2 A instrução religiosa e sua pedagogia

           Que o ensino ministrado nas escolas comunais – protestantes ou
católicas – do Antigo Regime tinha um conteúdo e finalidades
essencialmente religiosas está gravado em uma vulgata particularmente
compacta, que preconiza que seja o regente de escola somente o “auxiliar”
do pastor ou do padre, que exerça sua função sob a “férula” da Igreja, que o
ensino que ele ministra vise essencialmente a formação de “bons cristãos18”,
que os métodos empregados (ditos catequéticos) visem restituir, sem
discussão, as verdades da fé. É sobre essa vulgata que Aimé Humbert se
referiu em seu discurso de 1849, e que percorre, ainda hoje, uma boa parte
da historiografia. Isso conduz à interrogação sucessiva sobre os conteúdos,
os objetivos e os métodos do ensino elementar.

a) Os conteúdos

           Os conteúdos do ensino elementar são determinados pelas
comunas, soberanas nesse campo como nos outros aspectos das questões
escolares. Os programas são periodicamente rediscutidos, enriquecidos ou
definidos, e às vezes apresentados por escrito19, após serem discutidos e
votados em assembléia dos habitantes da comuna. O pastor é naturalmente
associado à reflexão sobre o programa de ensino, menos para garantir o


18
   Visão levada aos extremos limites quando explica a presença do cálculo no currículo pelo
fato de que “todo bom cristão reformado deve conhecer os rudimentos para administrar seus
bens conforme os mandamentos de Deus”...! Hammann G., L’Eglise…, art.cit., p. 227.
19
  Caspard P.: Une source de l’histoire du temps scolaire à l’époque moderne: les règlements
d’écoles. In: Compère M.M. (Dir.): Histoire du temps scolaire en Europe. Paris 1997, p. 241-
254.

30
espaço da religião, que pouco contestadas, do que em razão de seu alto nível
de instrução, e que o torna um especialista apreciado e dedicado.
            Mas avaliar a parte do conteúdo religioso nos programas é mais
complexo do que parece. Se considerarmos os diferentes ramos de ensino
apresentados, total ou em parte, no currículo das escolas comunais, na
primeira metade do século XIX20, é possível distinguir entre eles três
grupos, desse ponto de vista. Inicialmente, aparece o que a lei de março de
1850 chama de “ensino religioso propriamente dito”, isto é, as verdades da
fé, tais como contidas e apresentadas nos diferentes catecismos em uso, de
livre escolha de cada paróquia. A partir dos anos 1730, é o catecismo de J.
F. Ostervald que será o mais divulgado, sem ser no entanto o único21. A
religião está igualmente presente em um conjunto de outras aprendizagens,
as quais fornecem tudo ou parte da matéria e do conteúdo. É o caso da
leitura feita das Passagens extraídas do Novo Testamento22, o texto integral
do Antigo e sobretudo do Novo Testamento; da recitação, dita também
memorização ou “decorada”, em que o Catecismo e as Passagens serão
solicitadas até a metade do século XIX, até mesmo depois; do canto, em que
os Salmos de Davi e os Cânticos fornecem o essencial da matéria; da
história sagrada, eventualmente acompanhada da geografia sagrada (da
Palestina). Os exercícios de escrita e de cópia, enfim, dizem respeito
seguidamente a textos piedosos ou morais. Ao contrário, a religião está
totalmente ausente de uma terceira categoria de ensinos: o cálculo, a
aritmética, a ortografia, a gramática, o desenho, o alemão, a escrituração
comercial, os trabalhos de agulha para as moças, a história e a geografia do
cantão, da Suíça, da Europa (que pode, entretanto, incluir a história da
Reforma) e do mundo, bem como a composição francesa, cujos assunto são
sempre profanos, as vezes morais, mas sem abordar as questões de fé ou de
dogma.
            Esse currículo só é ensinado de forma completa nas vilas
maiores, nas outras se restringem às matérias principais. Mas o movimento
geral de enriquecimento do currículo elementar desde a Reforma é de fato
destacável: enquanto no século XVI, ele ainda se centra na religião, na



20
   Caspard P., Examen…, art.cit., p. 28: Tableau de l’enseignement religieux dans le
curriculum des écoles communales, 1601-1828.
21
  Barthel P.: Jean-Frédéric Ostervald l’Européen, 1663-1747. Novateur neuchâtelois. Genève
2001.
22
  Ostervald J.F.: Recueil des passages du Nouveau Testament. Qui servent à établir les vérités
et les devoirs de la religion chrétienne. Neuchâtel 1734. Essa pequena obra tão famosa e
divulgada que jamais foi chamada de outra maneira que sob o nome de Passagens.

                                                                                          31
leitura e no canto23; a partir do século XVII, acrescenta-se a escrita, a
aritmética e a ortografia; depois, durante o século XVIII, a gramática, a
geografia, a história, a análise gramatical e o desenho, e enfim, na primeira
metade do século XIX, as outras matérias listadas acima. A lei de março de
1850, que impõe pela primeira vez um programa obrigatório de instrução
elementar a todas as comunas do país, repetirá essa lista, acrescentando a
instrução cívica, e reduzindo pois o ensino religioso “propriamente dito”,
confiado ao único pastor, sem que possa ser imposto aos professores
elementares24. Essa última medida suscitou naturalmente a oposição de uma
parte da Classe dos Pastores, mas admitia-se que resultava de um processo
de marginalização do ensino religioso no currículo da escola elementar,
resultado natural de seu contínuo enriquecimento há três séculos.

b) As grandes finalidades do ensino

           O enriquecimento do currículo jamais suscitou uma franca
oposição por parte da Classe e dos pastores, mesmo se alguns dentre eles,
politicamente conservadores, pudessem julgar que se dispensava às crianças
um ensino “acima de suas condições”. Mas o sentimento mais expresso era
a satisfação diante “da extensão tomada quase por toda a parte pelo campo
do ensino”, a constatação que “as escolas continuam a avançar na rota onde
entraram, a desenvolver e estender o campo de seus estudos”25.
           Esse amplo consenso entre a Igreja e as famílias repousava sobre
uma adesão partilhada em duas grandes finalidades simultaneamente
atribuídas à instrução. A primeira era que a criança possa tornar-se cristã
“por conhecimento e por escolha”, pois a fé não se transmite e o batismo,
por si só, não torna ninguém cristão. Tornar-se cristão resulta portanto de
um ato individual, efetuado com toda autonomia por uma criança que deve
ser beneficiada, para isso, com a instrução necessária. A segunda finalidade
era de permitir à criança tornar-se, por sua instrução, “útil para si mesma e
para a sociedade”. De essência laica, esse princípio se encontra também nas
injunções paternas como nos escritos dos reformadores, como de
Guilhaume Farel que proclama, em 1534, “seja qual for o estado em que
homem se encontre, a ciência e o conhecimento de muitas coisas lhe


23
   Cf. o regulamento da escola de Saint-Blaise en 1619, publicado em Caspard P.: Une
source…, art.cit., p. 250-252.
24
   Segundo a lei de março de 1850; a de junho de 1861 a reintroduz nos programas, mas torna-
se facultativa após a lei de 1872.
25
     AEN, D.I.P. 1, Rapports sur l’éducation publique de 1844 et 1845.

32
servirá”26, o que não representa senão uma expressão do ideal humanista e
enciclopédico da Renascença. No primeiro lugar desses conhecimentos
úteis vem certamente a leitura, mas está longe de ser considerada somente
como uma ferramenta que dá acesso a um conhecimento pessoal das
Escrituras; ela abre também, e indissociavelmente, a todas as “ciências e
conhecimentos” úteis ao homem em sua vida social, portanto à própria
sociedade. A conjunção dessas duas finalidades explica que o
enriquecimento do currículo das escolas elementares, do século XVI ao
século XIX, não suscitou antagonismos maiores entre seus componentes
laicos e religiosos. A religião, aliás, ali conservou seu lugar, de maneira
absoluta, senão relativa.

c) A pedagogia, entre memória e julgamento

           A pedagogia adotada nas escolas elementares do Antigo Regime
foi seguidamente reduzida à forma catequética, isto é, a um encadeamento
de perguntas e respostas a serem citadas de cor. De fato, o lugar dos
procedimentos de catequese é bem reconhecido. O próprio Calvino deu um
dos primeiros exemplos disso no seu Catecismo de 154327, apressadamente
redigido e julgado rapidamente de maneira descuidada; em Neuchâtel, ele
sofreu logo a concorrência de outros28. Nas matérias profanas, essa forma de
catecismo pôde igualmente ser adotada, por exemplo, nos manuais de
geografia em uso no fim do século XVIII29. De maneira mais geral, as
sociedades antigas, e, portanto, suas escolas, davam uma importância real à
memória, à recitação, ao aprender “de cor”, mas dá-se uma visão
excessivamente reduzida desse interesse, quando concluímos que as
crianças eram levadas a “repetir sem compreender”.
           Compreender o conteúdo de um texto é, evidentemente e bem ao
contrário, o centro de uma injunção feita à criança de “explicar a razão” de
sua fé, seja qual for, por outro lado, a capacidade que realmente é sua de
satisfazer a um exercício tão difícil. Calvino dá – entre muitos outros – o
exemplo dos tesouros pródigos da pedagogia para fazer compreender um
certo capítulo do seu catecismo30. Théodore de Bèze solicita que os alunos

26
     Farel G.: Sommaire et brève déclaration, 1534. Réed. Neuchâtel, 1980.
27
     Calvin J.: Le catéchisme de l’Eglise de Genève, 1542.
28
  Vuilleumier H.: Notice historique sur les catéchismes qui ont été en usage dans l’Eglise du
pays de Vaud depuis le temps de la Réformation, Lausanne 1888.
29
  Ostervald S.F.: Cours élémentaire de géographie ancienne et moderne et de sphère, par
demandes et réponses. Neuchâtel, 1ère éd: 1757, 10e éd: 1800.
30
     Calvin J.: Deux congrégations et exposition du catéchisme, Genève 1563, réed. Paris, 1964.

                                                                                             33
aprendam e cantem os Salmos que traduziu com inteligência, “como
homens”, e não somente de memória, “como pássaros”31. Tais testemunhos
são inúmeros, podem até mesmo serem encontrados em escritos de
modestos habitantes de vilas que lembram de forma sábia, em 1802: “Por
que aprendemos? Não é para reter palavras, é para melhor compreender”32.
           Essa exigência de compreensão se encontra tanto nas matérias
profanas quanto nas religiosas, o exercício do “julgamento” e da
“inteligência” são enaltecidos de forma similar em todo o ensino elementar.
A pedagogia das Luzes, que tende privilegiar o ensino “por princípios” em
relação ao ensino “por rotina” acentua ainda essa exigência, favorecendo a
invenção de procedimentos ou de exercícios identificados com uma
aprendizagem mais dedutiva: a popularidade da gramática testemunha isso e
sua introdução massiva nas escolas das vilas de Neuchâtel onde, desde o
início do século XIX, está presente em quase metade dos programas33.
           A importância dada a essa pedagogia da compreensão pode ser
sistematicamente avaliada através do balanço da visita de inspeção a que se
submete o conjunto de escolas de Neuchâtel – em torno de 250 – no final do
ano escolar de 1850-51; isto é, o último que viu essas escolas funcionarem,
no essencial, segundo as modalidades do “Antigo regime escolar”, como
começou-se então a denominá-lo34. Os relatórios dos comissários do
governo enviados para prestar contas ao Departamento de Educação
pública, não podem ser julgados excessivamente indulgentes com o Antigo
Regime, pois seus autores foram todos escolhidos entre os simpatizantes da
República. Eles dão uma imagem interessante dos princípios pedagógicos
aplicados pelos regentes e dos objetivos que os comissários julgam
atingidos, ou não, em cada uma das matérias ensinadas, sejam elas profanas
ou religiosas.
           O critério que a maioria dos relatórios coloca em destaque é a
maneira pela qual os alunos testemunham sua inteligência, seu julgamento,
sua capacidade de raciocinar, seja quando do exame ou dos seus trabalhos
ao longo do ano, que mostram aos examinadores no dia de visita. Isso é
válido para a grande maioria das matérias ensinadas e examinadas: leitura,
gramática, análise, aritmética, geografia, história, recitação, composição
francesa. Em todas essas matérias, incluindo a história sagrada e a recitação,

31
     Cité dans Caspard P.: Examen…, art.cit., p. 27.
32
     Ibid, p. 44.
33
   Caspard P.: L’orthographe et la dictée: problèmes de périodisation d’un apprentissage, XVII e
- XIXe siècles. In: Le Cartable de Clio, Lausanne 2004, p. 255-264.
34
  AEN, DIP 25 IX à XIII: Rapports des commissaires du gouvernement sur les visites des
écoles en 1851.

34
quando dizem respeito aos textos religiosos, se reencontra a oposição entre
a memorização e a verdadeira compreensão, a primeira sendo totalmente
estigmatizada quando não acompanhada da segunda. Só escapam a esse
critério a escrita, os trabalhos de agulha, o desenho e o canto, que são
julgados a partir das qualidades de cuidado, de elegância ou de exatidão,
cujos autores testemunham.
           Ao contrário, o critério de compreensão vale também para as
provas de religião, quando essa matéria consta do exame35. São desprezadas
pelos comissários, as respostas dadas de cor, sem julgamento, o espetáculo
lamentável “dos alunos que recitam sua religião como papagaios, que
demonstram nada compreender”, dando assim a impressão que, para o
pastor que os instruiu e os interroga, a religião é “simplesmente uma
questão de memória, e não de ciência”. Esse último termo mostra que, para
os comissários, a religião não é uma matéria totalmente à parte, que deve
ser ensinada exigindo da criança o mesmo exercício de julgamento e de
reflexão das demais matérias profanas e, isso, mesmo se envolver
“sentimento, coração, convicção”, qualidades igualmente apreciadas nas
respostas dos alunos.
           Resumindo, podemos dizer que os comissários estão satisfeitos
com a pedagogia cujos efeitos observam nas escolas, sendo que em torno da
metade dessas são julgadas sob esse ponto de vista de boas a excelentes, as
outras estão divididas igualmente entre médias ou medíocres, e fracas ou
nulas36. Sua satisfação é menor para o exame da religião do que para as
outras matérias, mas transparece freqüentemente, como julga este
comissário “interessante ouvir as crianças deduzirem com muita
propriedade as conseqüências práticas que se pode tirar de um grande
número de fatos contados no Livro Divino”.


                                             ***

           A República de Neuchâtel fez da modernização do sistema
escolar um dos seus objetivos maiores. A laicização do conteúdo de ensino,
tal qual, não constitui senão uma parte secundária dessa política. Confiar o
ensino religioso “propriamente dito” ao único pastor, fora do programa de
ensino obrigatório assegurado pelos professores primários, só prolongava

35
  A lei de março de 1850 prevê que um exame e um relatório especial sejam feitos pelos
pastores e enviados ao DEP, mas as práticas são ainda hesitantes, e a prova de religião continua
muitas vezes a figurar no exame geral.
36
     Caspard P.: Etude à paraître.

                                                                                            35
uma evolução anterior; o secretário da Classe reconhecia, alguns anos antes,
que não resultava de um grande propósito, mas de uma infinidade de
vontades particulares”37. Sob o mesmo impulso, o currículo continua a se
enriquecer, suscitando em 1854 a criação oficial de um ensino primário
superior ou secundário moderno, já existente de fato, ao passo que a
multiplicação e a diversificação dos exercícios escolares contribuíam bem
mais à atividade reflexiva dos alunos.
           A ruptura a mais significativa visada pela política de
modernização da escola residiu fundamentalmente na vontade dos
republicanos em resolver o problema político criado pela evolução
demográfica e sociocultural do país38. A partir do século XVIII, aumentou
em todo o cantão a presença de minorias religiosas, católicas, judaicas,
dissidentes. Ao contrário, as corporações comunais, que tinham se fechado
no século XVI, pretendiam conservar a total direção de suas escolas, porém,
muitas delas agora eram freqüentadas por uma maioria de crianças de
origem simples, de confissões diversas, e privadas dos direitos cívicos. Os
republicanos se propuseram então como objetivo minorar ou suprimir o
papel dos corpos intermediários (Igrejas, comunas) para privilegiar o debate
de dois atores: o Estado e o cidadão39.
           No ensino, a Pátria – com seus dois níveis, o cantão de Neuchâtel
e a Confederação Helvética – torna-se assim a nova figura do coletivo, que
cada cidadão devia conhecer e amar, e especialmente o futuro cidadão: o
Aluno, figura também nova da criança escolarizada. É por isso que foi
introduzido o ensino da instrução cívica, acrescido do da história e da
geografia do cantão e da Confederação; enquanto que os novos livros de
leitura ofereciam paisagens, riquezas e heróis do país para serem admirados,
e que os cantos populares ou patrióticos (como Ranz des vaches, cantado
em dialeto) permitiam aos alunos manifestar o entusiasmo que lhes
inspiravam. Em um contexto europeu de aumento dos nacionalismos, a
laicização da escola de Neuchâtel se caracteriza menos como uma vitória
frontal sobre a religião ou a Igreja nacional, do que como o adiantamento,

37
     AEN, Actes de la Classe, Rapport du 18 février 1846.
38
    Caspard P.: “Reflektieren Spiegel? Bausteine zu einer vergleichenden Betrachtung der
unentgeltlichen und entkonfessionalisiert en Pflichtschule in Frankreich und in der Schweiz”
in: Criblez L., Hofstetter R., Magnin C. (Dir.): Eine Schule für die Demokratie. Berne, P. Lang,
1999, p. 433-454.
39
  Sobre os problemas institucionais e políticos analisados em longa duração como em curta
duração nos anos fundadores da República, ver dois números especiais da Revue historique
neuchâteloise: Des chartes de franchise à la nouvelle constitution: une histoire des institutions
neuchâteloises, juillet 2002, et Révolution neuchâteloise, 1848-1998, juillet 1998, ainsi que
Christ T., Riard S.: Du réduit communal à l’espace national. Le statut des étrangers dans le
canton de Neuchâtel, 1750-1914. Hauterive 2000.

36
aliás parcial e negociado, de muitas autoridades locais e fragmentadas,
buscando uma autoridade central única, isto é, como um alargamento das
formas antigas do laos40.


Pierre Caspard é diretor e pesquisador do Service d’Histoire de
l’éducation / Institut National de Recherche Pédagogique – França.
Maria Helena Camara Bastos é Professora no Programa de Pós-
Graduação em Educação da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande
do Sul; Pesquisadora do CNPQ.


Recebido em: 15/01/2006
Aceito em: 20/02/2006




40
     Laos = Povo (Nota da tradutora)

                                                                    37
.
Escola de Engenharia de Porto Alegre (1896-1934):
   hegemonia política na construção da universidade *
                                Marília Costa Morosini
                              Maria Estela Dal Pai Franco


Resumo

O texto resgata a trajetória da Escola de Engenharia de Porto Alegre (E.E.) em seus primórdios
- 1896-1922 - e como Universidade Técnica (U.T.) - 1922-1934. A análise qualifica a E.E.
como uma instituição científica ímpar para a época pela sua hegemonia com o Estado do Rio
Grande do Sul e pela sua face universitária com aproximações à idéia de universidade
moderna, cujas funções privilegiam a pesquisa. Foram utilizados princípios de análise de
conteúdo sobre fontes de informação normativas, de ocorrências, livros, revistas e jornais.
Palavras-chave: Escola de Engenharia de Porto Alegre; história da educação.



Abstract

The paper presents the historical path of the Porto Alegre School of Engineering (E.E.) in its
early times - 1896- 1922 – and as Technical University (T.U.) – 1922 – 1934. The analysis
characterizes the School of Engineering as a peculiar scientific institution, to its time, for its
political hegemony with the State of Rio Grande do Sul and for its university feature,
connected to the idea of modern university, whose functions focuses on research. Various
documents were analyzed: legislative, factual, books, periodicals and newspapers.
Key-words: Porto Alegre School of Engineering; history of education.




         História da Educação, ASPHE/FaE/UFPel, Pelotas, n. 19, p. 39-57, abr. 2006
                         Disponível em: http//fae.ufpel.edu.br/asphe
Introdução

           A Escola de Engenharia de Porto Alegre (E.E.) foi o pilar do
ensino superior no Rio Grande do Sul (RS) e gênese da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul. Congregava características incomuns para o
ensino superior brasileiro à época dominado pelas escolas de formação de
bacharéis, inspiradas no modelo francês-napoleônico de faculdades voltadas
ao eruditismo e à profissionalização. A E.E., inicialmente orientada por
modelo universitário alemão e, após, americano, caracterizou-se pela
interligação entre os diferentes graus de ensino, pela descentralização de
suas atividades no Estado e pela produção e divulgação do conhecimento
produzido.
           O (PRR) Partido Republicano Riograndense dominava o cenário
político do estado e constituía-se na forma superior de organização
(MACCIOCHI, 1977, p.64) da concepção positivista. Sob tal perspectiva, a
ciência e o governo dos sábios, cuja ordem levaria ao progresso do Estado,
desempenhavam um papel preponderante para a construção do capitalismo.
É então criada a E.E. que representa a manutenção da hegemonia do grupo
no poder, a qual não se restringe à dominação pela coerção, mas estende-se
à formação do consenso, para a qual se faz imprescindível a função
educativa (GRUPPI, 1980).
           Este trabalho tem como objetivo resgatar a trajetória da E.E. em
seus primórdios e em seu desenvolvimento para Universidade Técnica,
qualificativo dado à E.E. nos Estatutos de 1922, abarcando o período de
1896-1934. Objetiva-se revelar as ligações entre a E.E. e o Estado e sua face
universitária.


1 O Estado do rs e a Escola de Engenharia

           Durante a República Velha (1890-1930), a realidade brasileira e,
mais precisamente a riograndense, reflete a busca de inserção no processo
global de internacionalização do capitalismo, pela via monopolista. Tal
postura exigia a adoção de uma moral ética - a do valor trabalho - e um
estado "científico" forte - ditadura científica -, centralizador e com
hegemonia dos setores mais avançados do capital. Um Estado que além de
"celeiro do País" (PESAVENTO, apud DACANAL, 1989:194), forçasse a
modernização. Tal estado, na virada do século, se concretizou apoiando-se

40
no Partido Republicano Riograndense (PRR), sob novo grupo de atores
políticos. O PRR aproximou-se do
                     [...] moderno Príncipe (Partido Político) que deve e não pode deixar
                     de ser o propagandista e o organizador de uma reforma intelectual e
                     moral, o que significa criar o terreno para o desenvolvimento ulterior
                     da vontade coletiva - deve estar ligado a um programa de reforma
                     econômica; (GRAMSCI, l984, p.13).

            No RS, a concepção positivista Comteana corporificou-se no
PRR e não se restringiu ao caráter de religião da humanidade Quanto a
questão da ciência, considerada a investigação do real, do precisamente
determinado e do útil, seu desenvolvimento marcava a passagem do poder
espiritual para mãos de sábios e cientistas e do poder material, para
industriais.
            A E.E. pode ser considerada a obra mais grandiosa do espírito
positivista no RS, com íntima e estreita relação entre o Estado-RS e a escola
pela: identidade de princípios, reconhecimento da importância do Estado,
concessão de auxílios financeiros e desempenho de funções políticas
concomitante às acadêmicas na E.E.. No que tange à identidade de
princípios entre a E.E. e o Estado do RS, a concepção positivista de
sociedade está presente em diversos estatutos que orientam a escola.
            Em relação ao reconhecimento da importância do Estado para a
E.E. a forma predominante é a dos elogios dirigidos à figura dos Presidentes
do Estado: Dr. Carlos Barbosa (Ata n.º 100 de 31/11/1912) e Dr. Borges de
Medeiros (Ata n.º 139 de 07/04/1917). É comum que os Institutos da E.E.
homenageassem os políticos do Estado, através de sua nominação. Ao lado
dos elogios aos membros do governo, é destacada a concordância na
concepção de técnica, bem como a relação de dependência da E.E. ao
Estado do RS.
            A estreita relação se manifesta também pela concessão de
auxílios financeiros do Estado do RS. A E.E. dispunha de auxílios
provenientes das Intendências, assim como de particulares e de empresas.
Entretanto, através dos relatórios da E.E, sabe-se que a Lei nº 72 de 28 de
novembro de 1908 concedia ao Instituto Técnico Profissional um auxílio,
pelo prazo de dez anos a contar de primeiro de janeiro de 1911, proveniente
da arrecadação da taxa profissional de 2% (lei orçamentária de apoio ao
ensino técnico) posteriormente, como auxílio ao Instituto de Agronomia e
Veterinária.
            A estreita relação E.E. - Estado RS projeta-se, também, no
desempenho de funções políticas, no executivo e/ou no legislativo, por
professores, concomitante às funções acadêmicas e/ou administrativas na
escola. (Quadro 2).

                                                                                       41
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História da Educação e a formação do professor na UNISINOS

  • 1. ASSOCIAÇÃO SUL-RIO-GRANDENSE DE PESQUISADORES EM HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO NÚMERO 19 Abril – 2006 Disponível em: http//fae.ufpel.edu.br/asphe SEMESTRAL História da Educação Pelotas n. 19 p. 1-310 Abril 2006
  • 2. HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO ASPHE Presidente: Maria Helena Câmara Bastos Vice-Presidente: Maria Stephanou Secretário: Claudemir de Quadros Conselho Editorial Nacional Conselho Editorial Internacional Dra. Denice Cattani (USP) Dr. Alain Choppin Dr. Dermeval Saviani (UNICAMP) (INRP, França) Dr. Elomar Antonio Callegaro Tambara (UFPel) Dr. Antonio Castillo Gómez Dr. Jorge Luiz da Cunha (UFSM) (Univer. de Alcalá – Espanha) Dr. José Gonçalves Gondra (UERJ) Dr. Luís Miguel Carvalho Dr. Luciano Mendes de Faria Filho (UFMG) (Univer. Técnica de Lisboa) Dr. Lúcio Kreutz (UNISINOS) Dr. Rogério Fernandes Dr. Maria Teresa Santos Cunha (UDESC) (Univer. de Lisboa) Dra. Maria Helena Bastos (PUCRS) Dra. Marta Maria de Araújo (UFRGN) Comissão Executiva Prof. Dr. Elomar Antonio Callegaro Tambara Profa. Dra. Eliane Teresinha Peres Consultores Ad-hoc Dra Giana Lange do Amaral Dr. José Fernando Kielling Dr. Jorge Luis da Cunha Dra. Beatriz Daudt Fischer Editoração eletrônica e arte final da capa Flávia Guidotti flaviaguidotti@hotmail.com Imagem da capa Johannes Verneer. Mulher em Azul - 1662. Rijksmuseum, Amsterdã. História da Educação Número avulso: R$ 15,00 Single Number: U$ 10,00 (postage included). História da Educação / ASPHE (Associação Sul-Rio-Grandense de Pesquisadores em História da Educação) FaE/UFPel. n. 19 (Abril 2006) - Pelotas: ASPHE - Semestral. ISSN 1414-3518 v. 1 n. 1 Abril, 1997 1. História da Educação - periódico I. ASPHE/FaE/UFPel CDD: 370-5
  • 3. Sumário Apresentação ............................................................................................ 5 Um exemplo de pesquisa sobre a história de uma disciplina escolar: a História ensinada no século XVI Annie Bruter; Tradução de Maria Helena Camara Bastos ...................... 7 Igreja, religião e ensino elementar antes das leis de laicização européias: um reexame crítico de suas relações Pierre Caspard; Tradução de Maria Helena Camara Bastos................. 23 Escola de Engenharia de Porto Alegre (1896-1934): hegemonia política na construção da universidade Marília Costa Morosini; Maria Estela Dal Pai Franco ......................... 39 Educação, Religião e República: repercussões dos debates entre Católicos e Republicanos no Triângulo Mineiro-MG (1892-1931) Carlos Henrique de Carvalho; Wenceslau Gonçalves Neto ................... 59 Leituras de anarquistas brasileiros na primeira década do século XX Dagoberto Buim Arena........................................................................ 89 Caubóis e Caipiras. Os land grant colleges e a Escola Superior de Agricultura de Viçosa Maria das Graças M. Ribeiro ............................................................ 105 A fotografia e a pesquisa em História da Educação: elementos para a construção de uma metodologia Elisa dos Santos Vanti ....................................................................... 121 O conceito "Exclusão" na literatura educacional brasileira: os primeiros 25 an os (1974-1999) Avelino da Rosa Oliveira ................................................................... 131 Resenha ................................................................................................ 161 Alfabetto: Autobiografia Escolar de Frei Betto Gilse H. M. Fortes............................................................................. 163 Parte II.................................................................................................. 167 Apresentação ........................................................................................ 169
  • 4. A disciplina História da Educação na formação de professores: desafios contemporâneos Clarice Nunes ................................................................................... 173 A Disciplina História da Educação no Curso de Pedagogia da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (1942-2002) Maria Helena Camara Bastos; Fernanda de Bastani Busnello; Elizandra Ambrosio Lemos ................................................................ 181 Aspectos da trajetória da disciplina História da Educação no curso de Pedagogia do Centro Universitário Franciscano de Santa Maria: temas clássicos e ordem cronológica Claudemir de Quadros ...................................................................... 213 A disciplina de História da Educação na Faculdade e no Centro Universitário La Salle Miguel Alfredo Orth .......................................................................... 229 O Ensino de História da Educação na UNIJUI Anna Rosa Fontella Santiago............................................................. 243 A História da Educação no curso de pedagogia da Universidade de Passo Fundo: aportes na história recente em busca de novas perspectivas Rosimar Serena Siqueira Esquinsani .................................................. 253 Historia da Educação e a formação do professor na UNISINOS Flávia Obino Corrêa Werle; Berenice Corsetti ................................... 263 Apontamentos sobre a disciplina História da Educação na Universidade da Região da Campanha – URCAMP (1959-2001) Regina Quintanilha Azevedo; Clarisse Ismério; Marilene Vaz Silveira ............................................................................................. 275 O ensino de História da Educação na História da Faculdade de Educação da UFRGS: primeiras aproximações Maria Stephanou............................................................................... 293 História da Educação no Curso de Pedagogia da Universidade Federal de Pelotas Elomar Tambara ............................................................................... 301 Orientações aos colaboradores............................................................... 309 4
  • 5. Apresentação Este número da revista “História da Educação” reveste-se de um significado especial pois representa uma homenagem à Associação Sul-Rio- Grandense de História da Educação no momento em que a mesma completa 10 anos de existência. Esta associação é a mantenedora deste periódico, e com denodo e muito sacrifício tem conseguido manter seu alto padrão de qualidade, atestado, fundamentalmente pela qualidade dos artigos nela publicados. Neste número mais uma vez, temos o prazer de apresentar trabalhos de investigadores caracterizados como de excelência tanto em nível nacional como internacional. De modo que somos gratos a todos que colaboraram com seus textos para este número e esperamos ter suas contribuições em outras edições desta revista. Neste número, em substituição ao tradicional “documento’ que publicamos em todos os números anteriores estamos publicando um dossiê sobre o ensino de história da educação nos cursos de pedagogia no Rio Grande do Sul. Estes trabalhos foram, em sua maioria, apresentados no XI Encontro Sul-Rio Grandense de Pesquisadores em História da Educação realizado na Unisinos em S. Leopoldo. Temos a convicção que a leitura desta revista será de muito proveito a nossos associados, assinantes e ao público interessado em história da educação. A comissão executiva História da Educação, ASPHE/FaE/UFPel, Pelotas, n. 19, p. 5, abr. 2006 Disponível em: http//fae.ufpel.edu.br/asphe
  • 6. .
  • 7. Um exemplo de pesquisa sobre a história de uma disciplina escolar: a História ensinada no século XVII1 Annie Bruter Tradução de Maria Helena Camara Bastos Resumo Partindo de uma breve análise das condições, nas quais se estabeleceram as visões (divergentes) do surgimento da disciplina escolar « história », em curso hoje na historiografia francesa, este artigo propõe-se recolocar a questão na longa duração, remontando os colégios de humanidades do Antigo Regime, mostrando que a própria noção de «disciplina escolar » não é pertinente para descrever seu ensino, analisando certas transformações (sócio-políticas, técnicas, culturais...) que conduziram a constituição da história como matéria autônoma de ensino para as elites no fim do século XVII. Palavras-chave: História; Ensino; Século XVII. Resumée Partant d’une brève analyse des conditions dans lesquelles se sont mises en place les visions (divergentes) de l’apparition de la discipline scolaire « histoire » qui ont cours aujourd’hui dans l’historiographie française, cet article se propose de replacer la question dans la longue durée en remontant aux collèges d’humanités de l’Ancien Régime et en montrant que la notion même de « discipline scolaire » n’est pas pertinente pour décrire leur enseignement, puis en survolant certaines des transformations (socio-politiques, techniques, culturelles…) qui ont abouti à la constitution de l’histoire en matière autonome d’enseignement pour les élites à la fin du XVIIe siècle. Mots-clés: Histoire; enseignement; XVIIe siècle. 1 Título em francês: “Un exemple de recherche sur l’histoire d’une discipline scolaire: l’histoire enseignee au XVIIe siècle”. Especialmente escrito para ser publicado no Brasil. História da Educação, ASPHE/FaE/UFPel, Pelotas, n. 19, p. 7-21, abr. 2006 Disponível em: http//fae.ufpel.edu.br/asphe
  • 8. A idéia de que os conhecimentos de qualquer ordem que nós dispomos são o resultado de uma construção humana - não o fruto de uma revelação ou de uma reminiscência - é atualmente amplamente admitida, pelo menos entre os pesquisadores que produzem esses conhecimentos; a idéia de que as disciplinas escolares pelas quais esses conhecimentos chegam às jovens gerações são também o produto de um trabalho coletivo, de um conjunto de atores do sistema educativo, que tem dificuldade em conquistar o direito de cidadão na França. Freqüentemente, vistos como cópias das ciências eruditas mais ou menos simplificadas para serem usados pelos alunos, as disciplinas escolares não foram por muito tempo apreendidas pelos historiadores do ensino senão de maneira teleológica, em função das teorias científicas e das concepções pedagógicas que eram as da sua época. É principalmente o caso dos historiadores que tiveram uma grande influência na França no início da IIIª República - época de importantes reformas no ensino em todos os níveis (primário, secundário e superior), como de Gabriel Compayré2 e de Émile Durkheim3: tratava-se bem mais de dar uma genealogia à nova pedagogia que desejavam implantar do que restituir seu sentido original às práticas de ensino do passado, das quais desejavam precisamente se descartar. Ora, a seus trabalhos a história do ensino por muito tempo permaneceu tributária na França no século XX. O ensino da história encontrava-se em uma posição absolutamente especial como objeto historiográfico: por ser considerado instrumento essencial de formação patriótica e cívica na pedagogia dessa época, só podia voltar-se ao seu passado celebrando sua própria instauração, rejeitando nas trevas do atraso mental as instituições de ensino que não lhe atribuíram o lugar de destaque que devia, segundo ele, ser o seu. No âmbito da rivalidade entre ensino laico e ensino confessional - que marcou profundamente, como já sabemos, a vida política e científica do início da IIIª República -, a questão histórica a ser resolvida era, portanto, saber se o ensino da história tinha nascido nos colégios do Antigo Regime - essencialmente controlados pela Igreja4 - ou nos estabelecimentos 2 Gabriel Compayré, Histoire critique des doctrines de l’éducation en France depuis le XVIe siècle, Paris, Hachette, 1879, 2 vol. in-8°. 3 Émile Durkheim, L’Évolution pédagogique en France (avec une introduction de M. Halbwachs), Paris, Presses universitaires de France, 1938, 2e éd. 1969, 403 p. (curso sobre história do ensino na França proferido por Durkheim na Sorbonne em 1904-1905 e reprisado nos anos seguintes até a guerra). 4 É a tese defendida pelos historiadores das grandes ordens dedicadas ao ensino Oratorianos ou Companhia de Jesus: Paul Lallemand, Histoire de l’éducation dans l’ancien Oratoire de France, 1888, réimp. Genève, Slatkine – Megariotis Reprints, 1976, 474 p.; François de Dainville, La Naissance de l’humanisme moderne, 1940, réimp. Genève, Slatkine Reprints, 8
  • 9. originários da Revolução Francesa (escolas centrais, liceus). Semelhante questão, sobre a qual muito se escreveu, não podia chegar a nenhuma conclusão. Os materiais disponíveis são de fato interpretados de diversas maneiras: se definirmos o ensino de história que se tem provando que a história está presente, e mesmo superabundante, nos colégios do Antigo Regime, se definirmos essa disciplina como conjunto de conteúdos, eles demonstram ao contrário, que ela não existia se tivermos uma concepção administrativa da disciplina escolar como entidade regida por disposições regulamentares (um programa, exames, horários, etc.). Um outro fator de incerteza para a interpretação da documentação: durante muito tempo, houve a falta de atenção às especificidades dos colégios do Antigo Regime, como se esses fossem, conforme a uma norma geral, semelhante àquela que, pouco a pouco, se impôs nos estabelecimentos públicos do século XIX. Enquanto em alguns colégios, justapunham-se uma estrutura propriamente escolar; isto é, um conjunto de classes que correspondiam às normas de um plano de estudos, e um pensionato que funciona de maneira bem mais flexível, vindo de encontro aos desejos das famílias; completando-se, assim, a formação dada nas classes através de ensinos especiais5. Ora, no quadro desses ensinos, de certa forma particulares, se desenvolveu uma pedagogia da história prenúncios da de hoje. Na história do ensino na França, portanto, a renovação da problemática que aconteceu no fim do século XX – outra época de perturbações profundas do sistema educativo francês – transformou os termos da questão de duas maneiras diferentes. De uma lado, foi colocado o problema do papel social desempenhado pelos estabelecimentos escolares (seguindo o exemplo da sociologia crítica da educação, que se desenvolve nos anos 1960), diversos estudos revelaram a coexistência, por muito tempo ocultada, de diferentes tipos de educação em certos estabelecimentos do Antigo Regime, em particular nos que reuniam um colégio de prestígio e um pensionato aristocrático6 - como La Flèche e Louis-le-Grand no que diz respeito aos estabelecimentos jesuíticos, Juilly e Vendôme para os que eram 1969, XX-390 p.; du même, « L’enseignement de l’histoire et de la géographie et le “Ratio studiorum” » (1954), art. repris dans François de Dainville (Marie-Madeleine Compère éd.), L’Éducation des jésuites, Paris, Les Éditions de Minuit, rééd. 1991, pp. 427 – 454 5 Mark Motley, Becoming a French Aristocrat. The Education of the Court Nobility, 1580 – 1715, Princeton, Princeton University Press, 1990, X – 241 p. 6 Duas sínteses sobre esse tema: Marie-Madeleine Compère, Du Collège au lycée (1500 – 1850). Généalogie de l’enseignement secondaire français, Paris, Gallimard/Julliard, 1985, coll. « Archives », 286 p.; Dominique Julia, Huguette Bertrand, Serge Bonin, Alexandra Laclau, Atlas de la Révolution française. 2. L’enseignement, 1760 – 1815, Paris, Editions de l’Ecole des Hautes Etudes en Sciences Sociales, 1987, 105 p. 9
  • 10. mantidos pelos oratorianos. Por outro lado, alguns trabalhos levantaram o problema da historicidade das próprias disciplinas. Redefinindo-as como produções coletivas das instituições de ensino (e não mais como reflexo simplificado de conhecimentos), André Chervel pode assim mostrar, em um artigo pioneiro7, que a própria noção de disciplina escolar é uma noção recente, que apareceu precisamente ao mesmo tempo em que as reformas de ensino que foram implementadas na virada do século XIX-XX. Essa reformulação permitiu relançar a questão da história do ensino histórico em novos termos e perguntar não somente em que momento apareceu um ensino de história semelhante ao de hoje, mas também em que consistiam a história e seu ensino antes desse momento. Essa questão foi objeto de uma pesquisa empreendida, em primeiro lugar, no contexto de uma tese de didática da história8, retomada em uma jornada de estudos sobre o ensino das humanidades clássicas, organizada por André Chervel e Marie-Madeleine Compère no Service d’histoire de l’éducation do INRP 9 -esse estudo resultou em uma obra sobre a história ensinada no século XVII10. Embasada em materiais diversos, compreende tanto os planos de estudos em vigor e os exemplos de “lições- modelos” propostos aos professores na época, quanto tratados sobre a educação e os resumos de história utilizados para fins pedagógicos (condição atestada por testemunhos da época e a confusão seguidamente feita entre os resumos do Antigo Regime e os “manuais” de hoje era de natureza a deturpar a interpretação do material documental). O campo geográfico abarcado é a França, não por desinteresse pela comparação nesse domínio, mas porque as fontes mais facilmente acessíveis, no contexto de uma pesquisa necessariamente limitada no tempo, são as fontes francesas. Sem retroceder ao aspecto historiográfico da questão, tentaremos resumir aqui os principais resultados dessa pesquisa, centrando-nos em dois pontos: o caráter “não-disciplinar” do ensino dos colégios do Antigo Regime e a maneira pela qual a história era ali tratada; a evolução dos “usos” da história no século XVII e, conseqüentemente, o aparecimento de 7 André Chervel, « L’histoire des disciplines scolaires: réflexions sur un domaine de recherche », Histoire de l’éducation n° 38, Paris, INRP, mai 1988, pp. 59 – 119; repris in André Chervel, La Culture scolaire, Paris, Belin, 1998, pp. 9 – 56. 8 Annie Bruter, Les Paradigmes pédagogiques. Recherches sur l’enseignement de l’histoire au XVIIe siècle (1600 – 1680), Université Paris VII, décembre 1993, 426 p. 9 Uma parte das comunicações apresentadas durante essa jornada foram publicadas no número temático Les Humanités classiques, Histoire de l’éducation n° 74, Paris, INRP, mai 1997, 253 p. 10 Annie Bruter, L’Histoire enseignée au Grand Siècle. Naissance d’une pédagogie, Paris, Belin, 1997, 237 p. 10
  • 11. novas práticas de ensino dessa matéria. Em síntese, se tentará construir um ensaio para contribuir a uma reflexão sobre o processo de longa duração – ou seja, a constituição de um campo de saber em disciplina escolar. A História em um ensino “não-disciplinar” A própria natureza do material documental legado pelas práticas escolares do século XVII – planos de estudos, lições-modelos e obras pedagógicas – e a impossibilidade de interpretá-lo através das categorias regulamentares pelas quais definimos hoje a disciplina escolar (horários, programas, etc.) orientou a pesquisa em uma primeira etapa: antes de qualquer tentativa de apreensão do lugar da história propriamente dita, no ensino dos colégios, é preciso esclarecer os princípios e os fins desse ensino, que não havia nenhum motivo a priori de supor idênticos aos de hoje. Se o século XVII (ao menos na primeira metade) é realmente uma época de vigoroso crescimento escolar, que viu a expansão dos colégios humanistas iniciada no século precedente11, a demanda educativa a qual atendiam essas instituições se distinguia em diversos pontos das de hoje. Retomando a si a ambição integradora, a da retórica antiga12, os estudos humanistas pretendiam conciliar em uma mesma visão três finalidades que nos acostumamos a separar claramente: uma finalidade prática de domínio da linguagem, uma finalidade cognitiva de aquisição de conhecimentos, uma finalidade religiosa de acesso à ciência e à virtude. São esses três objetivos que encontramos simultaneamente presentes no programa de estudos, inteiramente constituído de textos vindos da Antigüidade, como nos procedimentos de ensino: tratava-se, antes de mais nada, de levar os alunos a exprimirem-se através de inúmeros exercícios, orais ou escritos. Esse treinamento intensivo, fundado no estudo de textos- modelos propostos à imitação, visava assegurar o domínio das línguas antigas (ou, em todo caso, do latim; a voga do grego no século XVI não continuou no século seguinte) ao mesmo tempo em que assegurava o das técnicas – retórica e filologia – que tornavam os alunos eloqüentes e capazes de ascender ao saber: esse era, de fato, criado como corpus textual, seja ele profano, textos antigos, ou de livros sagrados. Atendendo ao mesmo tempo às necessidades da Igreja da Contra-reforma, que procurava formar 11 Cf. Marie-Madeleine Compère, Du Collège au lycée…, op. cit. 12 Sobre essa questão, ver Marc Fumaroli, L’Âge de l’éloquence. Rhétorique et « res literaria » de la Renaissance au seuil de l’époque classique, Genève, Droz, 1980, 882 p. 11
  • 12. pregadores, e às necessidades dos príncipes para os quais se recrutava o aparelho administrativo, necessitando de homens aptos a manejar a linguagem. Esse programa de estudos foi apoiado pelas autoridades da época, laico e eclesiástico, e adotada pelos indivíduos ou grupos que aspiravam fazer carreira, na Igreja ou no Estado. Constatamos que o nosso regime epistemológico é muito estranho, busca suas raízes na Antigüidade, que sustenta tal concepção de ensino – a qual recorria, explicitamente a dois grandes professores antigos, Cícero e Quintiliano. Fundada sobre o primado da língua (instrumento de poder e meio de comunicação entre Deus e os homens) e sobre o respeito da escrita (pelo qual as palavras inaugurais, as da Revelação, foram transmitidas desde a criação do mundo), essa epistemologia considera o saber como um dado a ser decifrado, o acesso ao conhecimento como um ato de leitura13. Por isso, a necessidade dessa etapa preliminar para chegar ao conhecimento que era o estudo das línguas e dos textos antigos: o ensino das humanidades. Por sua pretensão integradora – formar o vir bonus dicendi peritus, homem de bem que sabe falar – assim como pelo lugar central que dava aos textos, tal ensino só podia ser “não-disciplinar”. A explicação dos textos antigos, ponto de partida das aprendizagens, necessitava realmente recorrer a conhecimentos de ordem muito diversas – gramaticais e filológicos, mas também geográficos, históricos, etinológicos, até mesmo botânicos, zoológicos ou mineralógicos – ao mesmo tempo que a capacidade de ressaltar as sentenças e máximas de ordem retórica, moral ou política que devem enriquecer o discurso do orador: tudo isso era considerado como conhecido pelo regente único de cada classe. Reciprocamente, as produções dos alunos chamados a reutilizar o vocabulário, as expressões, os conhecimentos de belos pensamentos descobertos nos autores estudados, deviam testemunhar sua amplitude a incorporar palavras e idéias em um conjunto textual harmonioso. A prioridade dada à finalidade retórica do ensino não significa, no entanto, que o ensino humanístico não se preocupa em transmitir conhecimentos (esse objetivo está explicitamente inscrito, por exemplo, em certas versões do mais célebre dos planos de estudo da época, o Ratio studiorum jesuíta14): também não se pode falar ou escrever sem conteúdo. 13 Sobre a longa duração dessa concepção de acesso ao conhecimento como lectio, ver Eugenio Garin, trad. française L’Éducation de l’homme moderne. La pédagogie de la Renaissance, 1400 – 1600, rééd. Paris, Fayard, 1995, coll. « Pluriel », pp. 66 – 70. 14 A versão definitiva da Ratio studiorum jesuíta, a de 1599, foi recentemente objeto de uma reedição acompanhada duma tradução francesa: Ratio studiorum. Plan raisonné et institution des études dans la Compagnie de Jésus, Paris, Belin, 1997, 314 p. Fazemos aqui referência às 12
  • 13. Mas esses conhecimentos, não sendo estudados por eles mesmos, não eram objeto de uma exposição sistemática, salvo a título recreativo, no contexto do que se chamava então o erudito (um espaço de tempo voluntariamente deixado ao regente para repousar e fazer com que os alunos descansem da austera disciplina da explicação de textos)15: eram dados à medida da leitura dos textos, em função dos conteúdos a serem explicados. É assim que conhecimentos que dizem respeito, para nós, à história – o desenrolar de certos acontecimentos, a descrição das instituições ou dos costumes de uma certa época – podiam ser apresentados no momento da explicação de uma poesia ou de uma obra oratória de Cícero... Inversamente, a leitura dos historiadores antigos, que faziam parte dos programas das classes (na classe de humanidades, principalmente, mas também em outras classes) oportunizavam não tanto o estudo dos acontecimentos mas o dos procedimentos de escrita próprios ao historiador: mais que a própria história tratava-se conforme as finalidades gerais - as do ensino das humanidades, de aprender como escrever. Quanto aos conhecimentos necessários à compreensão das obras históricas estudadas, tendo em vista o conteúdo militar-político das obras dos historiadores antigos, consistiam principalmente em conhecimentos geográficos que permitiam ter uma idéia do teatro das operações e seguir o desenrolar dos combates descritos. A cronologia era considerada como um acessório do estudo desses textos históricos - a linguagem da época costumava unir à cronologia a geografia sob a expressão “os dois olhos da história”. A ciência cronológica era de toda maneira, na época em que foram criadas as instituições de educação humanistas (isto é, no século XVI), um campo de pesquisa extremamente “preciso”, exigindo uma vasta cultura filológica e científica, que não devia ser exposta em classe16. Ainda não se dispunha, mesmo se desejassem ardentemente conhecimentos que permitissem reconstituir a sucessão dos acontecimentos relacionados pelos textos antigos. O único meio de datação, pouco preciso, de que dispunham os regentes humanistas era efetivamente a filologia, na medida em que essa procede por comparação entre os diversos estágios de uma língua (o latim, instruções mais detalhadas da primeira versão da Ratio, a de 1586, consultável em Ladislaus Lukàcs, Monumenta paedagogica Societatis Jesu, Rome, Institutum Societatis Jesu, t. I – VII, 1965 – 1992, t. V, p. 151. Ver também as instruções de P. Orlandini, Circa il modo de legger dell’humanista (1582 – 83), ibid. t. VI, p. 520. 15 Não conhececendo publicações especificadamente consagradas à essa questão, permito-me indicar minha obra L’Histoire enseignée au Grand Siècle…, op. cit., pp. 61 – 71. 16 Ver Anthony Grafton, Joseph Scaliger. A Study in the History of Classical Scholarship. II – Historical Chronology, Oxford, Clarendon Press, 1993, 766 p. 13
  • 14. nesse caso) no curso de sua evolução17 - o que reconduz outra vez à necessidade de um domínio tão aprofundado quanto possível dos textos escritos nessa língua. Imaginamos, portanto, a impossibilidade, em um tal contexto de um “curso” de história que consistiria em uma apresentação seguida dos acontecimentos – do mesmo modo que um “ curso” de qualquer matéria que fosse, na medida em que se estudasse em prioridade textos. Daí a proposição de ver no ensino das humanidades, um ensino por definição “não-disciplinar”; e isso não devido a uma incapacidade dos regentes da época em criar um outro, mas em virtude dos princípios que tinham presidido a sua organização. Foi assim que as instâncias dirigentes da Companhia de Jesus refutaram a proposição feita por muitos de seus membros de criar um curso de história, conforme o modelo praticado por seus rivais protestantes; não porque elas recusassem a história em si, mas porque romperiam com o respeito aos textos antigos, base de sua pedagogia18. Também vemos que o material documentário utilizado em tal ensino oferece amplitude à interpretação, já que seus conteúdos, na medida em que dizem respeito quase que exclusivamente às realidades tratados pelos textos antigos, são exclusivamente históricos: trata-se de palavras, de fatos, de pensamentos vindos da Antigüidade. Entretanto, essas palavras, fatos e pensamentos não chegam aos alunos de maneira ordenada pois os textos são escolhidos em função de seu grau de dificuldade lingüística, não obedecendo à ordem cronológica. Assim, não podemos pretender que os alunos dos colégios do Antigo Regime saiam totalmente despojados de conhecimentos históricos: eles tinham, ao contrário, um conhecimento da Antigüidade bem mais profundo que os alunos e mesmo os professores atuais de história. Mas esse saber histórico era desordenado e, sobretudo, lacunar, porque ignorava quase tudo o que chamamos hoje de Idade Média - sem falar da época em que viviam os alunos. Esse fato pode escandalizarnos? Isso não teria mais sentido senão o de se indignar com teorias científicas que estiveram em voga antes das nossas. A história, para os regentes dos colégios humanistas, não era um conjunto de conhecimentos, o produto de uma pesquisa fundada sobre uma 17 Ver Donald R. Kelley, Foundations of Modern Historical Scholarship. Language, Law and History in the French Renaissance, New York/London, Columbia University Press, 1970, 321 p. 18 Cf. François de Dainville, « L’enseignement de l’histoire et de la géographie… », art. cit.; para uma discussão da tese sustentada nesse artigo, ver Annie Bruter, « Entre rhétorique et politique: l’histoire dans les collèges jésuites au XVIIe siècle » in Les Humanités classiques, Histoire de l’éducation n° 74, op. cit., pp. 59 – 88. 14
  • 15. metodologia regrada: a palavra não designava um domínio particular do saber – todo o saber, na época, era tido como vindo do passado, portanto como história – mas um ramo da retórica, definido por um modo específico de escrita, o modo narrativo. Só eram, conseqüentemente, considerados como historiadores aqueles que soubessem usar esse modo com talento, em bom latim ou em bom grego – o que desqualificava os cronistas medievais19. Não se tratava, então, na época de “ensinar história” segundo o sentido atual do termo: conforme as concepções pedagógicas e científicas da época, os alunos deviam ler os historiadores antigos, pois se procurava na leitura elementos para ensinar a arte de escrever, graças à qual a França disporia um dia, ao menos esperavam, de historiadores dignos desse nome que ela ainda não tinha... “Usos” e pedagogia da história no século XVII O paradoxo é que esse ensino das humanidades eclodiu no momento em que as concepções mudaram, procedentes de uma época mais antiga (a da cultura manuscrita da Renascença), da cristalização sob a forma de modelo pedagógico - mas não é próprio a todo sistema educativo, por definição encarregado de transmitir o que vem do passado, atrasar o que diz respeito à sociedade que o envolve? Poderíamos aqui mencionar brevemente alguns fatores dessa mudança, enumerando sucessivamente o que, na realidade, se relaciona de maneira muito mais complexa. Um primeiro fator de mudança situa-se, bem entendido, no plano político. A vitória da fidelidade monárquica sobre os vínculos de dependência confessional, que põe fim às guerras de religião20; o triunfo do absolutismo e a paroquialização da vida mundana e cultural do século XVII21 focalizam, de agora em diante, o interesse sobre a história nacional, vista através da história das dinastias reinantes e de sua corte. Paralelamente, se manifesta uma evolução do sentimento religioso: a importância cada vez maior acordada às práticas – portanto aos costumes – 19 Ver Arnaldo Momigliano, « Ancient History and the Antiquarian », 1950, trad. française « L’histoire ancienne et l’Antiquaire » dans Arnaldo Momigliano, Problèmes d’historiographie ancienne et moderne, Paris, Gallimard, 1983, pp. 244 – 293. 20 Myriam Yardeni, La Conscience nationale en France pendant les guerres de religion (1559 – 1598), Louvain/Paris, Nauwelaerts/Béatrice-Nauwelaerts, 1971, 392 p. 21 Ver Roger Chartier, « Trajectoires et tensions culturelles de l’Ancien Régime » in André Burguière et Jacques Revel (dir.), Histoire de la France. Les formes de la culture, Paris, Éditions du Seuil, 1993, pp. 307 – 392. 15
  • 16. como critério de ortodoxia confessional22, leva a acentuar fins moralizadores da educação, em que o aprofundamento do esforço de aculturação religiosa iniciado no século precedente, no âmbito da rivalidade entre Reforma e Contra-Reforma23, induz o recurso à narração histórica como meio de fazer interiorizar, desde a infância, as verdades e os valores transmitidos pelo catecismo24. No plano cultural, enfim, o progresso da produção impressa a coloca à disposição de um público cada vez mais vasto, que se estende, a partir dali, além do círculo dos “doutos” para os quais a leitura era uma atividade quase profissional25: o uso de uma literatura mais mundana, mais atraente e de mais fácil acesso que a literatura latina e grega, ao mesmo tempo que uma especialização acrescida de gêneros. Ora, todos esses fatores se encontram com uma outra mutação, dependendo ela do plano científico. O saber fundamental da época, do nosso ponto de vista, é a elaboração de uma linha de tempo única sobre a qual se ordenam os fatos até então dispersos, conhecidos através dos textos antigos e medievais26. É essa aquisição da ciência “cronológica” da Renascença, que os resumos de história - que parecem cada vez mais numerosos durante o século, em latim27 e em francês28 - pretendem vulgarizar. A utilização dessa linha de tempo dá aos estudos históricos um novo modo de apreensão dos fatos (por ordem de sucessão cronológica e 22 Michel de Certeau, « L’inversion du pensable. L’histoire religieuse du XVIIe siècle » (1969) et « La formalité des pratiques. Du système religieux à l’éthique des Lumières (XVIIe – XVIIIe) » (1973), artigos retomados em Michel de Certeau, L’Écriture de l’histoire, Paris, Gallimard, 1975, pp. 131 – 152 et 153 – 212. 23 Jean-Claude Dhôtel, Les Origines du catéchisme moderne d’après les premiers manuels imprimés en France, Paris, Aubier, 1967, 472 p. 24 Claude Fleury, Catéchisme historique, Paris, Vve G. Clouzier, 1683, 2 vol. in-12, t. I: Petit Catéchisme; Fénelon, De l’Éducation des filles, 1687 (a edição consultada é a de Paris, P. Aubouin, 1696, in-12, 272 p.). 25 Ver Henri-Jean Martin, Livre, pouvoirs et société à Paris au XVIIe siècle (1598 – 1701), 1969, rééd. Genève, Droz, 1999, 2 vol., 1091 p. 26 Anthony Grafton, Joseph Scaliger…, op. cit.; D.J. Wilcox, The Measure of Time Past. Prenewtonian Chronologies and the Rhetoric of Relative Time, Chicago/London, The University of Chicago Press, 1987. 27 Só mencionaremos aqui os dois mais célebres entre cuja utilização com fins pedagógicos é atestada, que são também os mais antigos: l’Epitomae historiarum libri X do jesuíta Torsellini, que apareceu pela primeira vez em Roma em 1598, que podemos consultar na edição de Lyon, J. Cardon e P. Cavellat, 1620, in-12, p. lim., 640 p. e index; e o Rationarium temporum… de P. Denis Petau, Paris, S. Cramoisy, 1633, 2 t. en 1 vol. in-12. 28 Há desde o início a coexistência de duas séries de resumos de história, uma em latim, outra em francês. O estudo de suas relações e a maneira em que o francês se impôs através das edições sucessivas ainda está a ser feito. 16
  • 17. não mais por contiguidade, temática ou geográfica). Fornece, pelas referências temporais que estabelece, um instrumento de aprendizagem que faltava até então (as datas...). Coloca, assim, mais claramente em evidência as lacunas na exposição dos acontecimentos, incitando completá-las; contribuiu, desse modo, para transformar a noção do tempo, dando uma visão linear... todas coisas que, sem atacar, destroem profundamente o respeito sempre proclamado dos historiadores da Antigüidade. Assim, vemos manifestar-se ao longo do século, através da literatura de vulgarização histórica e dos projetos ou tratados sobre a educação, aspirações a um outro tipo de relação com o passado que não seja o do ensino humanista: uma relação mais natural, mais direta, que contorna o obstáculo da aprendizagem das línguas antigas e exige o acesso a um passado mais próximo e mais acessível. A tradução dos autores antigos, se não for novidade, conhece então outra idade do ouro: os “belos infiéis”29 colocam esses autores ao alcance dos leitores (e das leitoras) que não foram obrigados às disciplinas austeras de aprendizagens humanistas. A oferta de obras históricas se diversifica: produções humanistas, que continuam sua carreira florescente, compêndios de história e histórias mais ou menos romanescas30, destinados a um público maior e menos informado. Paralelamente, se afirma cada vez mais explicitamente a necessidade de conhecer a história de seu país em um movimento, aliás não isento de contradições – as mesmas que vimos surgir no fim do século XVII, a respeito da educação do príncipe cristão, apresentada como modelo a ser seguido mas reservado ao poder e aos que são destinados por natureza; isto é, por seu nascimento31. Ora, a história mantinha nesse modelo um lugar central, como complemento indispensável das matérias “teóricas” necessárias à formação principesca que eram a moral e a política: era a história que estava destinada a fornecer os exemplos, ilustrando os preceitos abstratos que constituíam essas ciências. Essa história necessária aos príncipes englobava-se bem à história antiga, não se isolava: devia fornecer aos futuros governantes modelos mais próximos deles do que os heróis da 29 Roger Zuber, Les « Belles infidèles » et la formation du goût classique, 1968, rééd. Paris, Albin Michel, 1995, coll. « Bibliothèque de l’Évolution de l’humanité », 521 p. 30 Sobre a “fusão” entre história e romance na segunda metade do século XVII, ver Bernard Magné, Crise de la littérature française sous Louis XIV: Humanisme et nationalisme, Lille, Atelier de reproduction des thèses Lille III, 1976, 2 vol., 1026 p., multigr. 31 Annie Bruter, « Des arcana imperii à l’éducation du citoyen: le modèle de l’éducation historique au XVIIIe siècle », apresentado no colóquio organizado pela Société française d’étude du dix-huitième siècle et la Société italienne d’étude du dix-huitième siècle, com l’UMR LIRE (CNRS n° 5611 – Université Stendhal – Grenoble I), « L’Institution du Prince au XVIIIe siècle », Grenoble, 14 – 16 octobre 1999, a ser publicado nas Atas do colóquio. 17
  • 18. Antigüidade, bem como conhecimentos positivos (militares, genealógicos, diplomáticos, econômicos, etc.) sobre os assuntos do reino, isto é, sobre o presente ou o passado próximo. Uma nova pedagogia da história surge, assim, conjugando a aprendizagem da cronologia com o curso dialogado no qual o aluno escuta e discute o relato dos acontecimentos, que deverão ser em seguida redigidos: tal é, ao menos, a pedagogia descrita pelos preceptores dos príncipes no fim do século XVII32. Quanto aos primeiros “manuais escolares” de história, não provêm da educação principesca33, mas das pensões aristocráticas onde se ministravam os cursos particulares de história pelos “chambristes”34. Os preceptores dos príncipes não publicam suas obras sem fornecer uma advertência sobre a inconveniência que teria para as “pessoas comuns” pretender o mesmo saber que os príncipes. Concede-se ao homem comum somente um “uso moral” da história destinada a ensinar os malefícios das paixões: o “uso político” desta é reservado aos príncipes e aos “Grandes”35. Compreendemos, vendo a história assim colocada como disciplina central da educação ao mesmo tempo que subtraída ao comum dos mortais, o seu estatuto marginal, inacessível no último século do Antigo Regime. Era objeto de um ensino, sobre o qual encontramos vestígios através de resumos explicitamente destinados à juventude36, de exercícios 32 Charles-Bénigne Bossuet, « De l’instruction du Dauphin, Lettre au pape Innocent XI » (1679) dans Œuvres complètes, Bar-le-Duc, par des prêtres de l’Immaculée Conception de St- Dizier, 1863, t. XII; Claude Fleury, Traité du choix et de la méthode des études, Paris, P. Auboin, P. Émery et C. Clousier, 1686, in-12, 365 p.; Géraud de Cordemoy, « De la nécessité de l’Histoire, de son usage, & de la manière dont il faut mêler les autres sciences, en la faisant lire à un Prince » dans Divers traités de métaphysique, d’histoire et de politique, Paris, Vve de J.-B. Coignard, 1691, in-12, VI-292 p 33 É, por exemplo, o caso, citando somente o mais célebre, de Instruction sur l’Histoire de France & Romaine par demande & réponses, Avec une explication succincte des Métamorphoses d’Ovide, & un Recueil de belles Sentences tirées de plusieurs bons Auteurs, Paris, A. Pralard, 1687, in-12, em que o autor, Le Ragois, era preceptor do Duque de Maine. 34 Faltando lugar para uma bibliografia completa, mencionaremos: Nouveaux Élémens d’histoire et de géographie à l’usage des pensionnaires du Collège de Louis le Grand du jésuite Buffier, 2ème éd. Paris, M. Bordelet, 1731, 2 partes em 1 vol. in-12. Os resumos do Padre Berthault, regente à Juilly: Florus Francicus, Paris, J. Libert, 1630, in-24, 279 p.; Florus Gallicus, Paris, J. Libert, 1632, in-24, 324 p.; Florus Gaulois ou l’abrégé des guerres de France, t. I, Paris, J. Libert, 1634, in-8°, 298 p., são talvez oriundos dos cursos desse pensionato que a tradição historiográfica considera como o primeiro a ter ministrado o ensino de história, mas a prova da utilização desses resumos para fins pedagógicos não existe. 35 Annie Bruter, « La “confiscation” de l’histoire: l’éclatement des usages de l’histoire au XVIIe siècle » in Henri Moniot et Maciej Serwanski, L’Histoire et ses fonctions. Une pensée et des pratiques au présent, Paris/Montréal, L’Harmattan, 2000, pp. 27 – 46. 36 Os resumos da época precedente visavem um público bem mais definido. 18
  • 19. públicos 37, até mesmo de redações dos alunos38. Mas, excetuando as instituições inovadoras que foram as pensões particulares e as escolas militares, esse ensino não foi, em geral, integrado ao currículo escolar - a história continuava sendo um tipo de matéria facultativa sob a responsabilidade das famílias. Explica-se, assim, a insistência em reclamar sua introdução nos colégios no século XVIII39, quando há provas da existência de seu ensino na época; mas é o estatuto desse ensino que persiste impreciso, por causa de seu caráter marginal, não-normatizado. Somos levados, assim, a distinguir duas coisas normalmente confundidas no discurso sobre a educação (pelo fato de seguirem agora juntas, a saber, pedagogia e escolarização - chamamos aqui pedagogia toda tentativa intencional de transmissão de um saber). Se a história do ensino histórico mostra que houve a invenção de uma pedagogia da história, com seus procedimentos e seu material específico na segunda metade do século XVII, mostra também que essa invenção se fez fora do âmbito propriamente escolar: é no espaço mais flexível da educação principesca ou do pensionato aristocrático que se elaboraram métodos e instrumentos de uma instrução histórica autônoma, independente da leitura dos historiadores antigos, procedendo a uma apresentação contínua dos acontecimentos - da criação do mundo até a época contemporânea. O estudo das resistências à integração dessa história autônoma ao currículo escolar, e os fatores que terminaram impondo-a junto das humanidades clássicas, ultrapassaria muito os limites temporais desse artigo, pois levaria ao debate sobre a educação do século XVIII e a Revolução, sobre os liceus do século XIX. Contentar-nos-emos em assinalar que a introdução da história no ensino dos liceus e colégios do Império e da Restauração (mencionada nos programas desde 180240, a história é dotada de um horário específico e de um programa embrionário em 181441, de professores “especiais”, em certos liceus, pelo menos a partir de 181842) não 37 Ver por exemplo Pierre Jean de Berulle répondra sur l’histoire chronologique de l’Église… Au Collège de Louis le Grand, le Vendredi 8 avril 1707, à quatre heures après midi, Arch. S.J. Vanves, É Pa 30 – 7. 38 O curso de Bossuet sobre Charles IX redigido para o príncipe herdeiro foi publicado por Régine Pouzet sob o título Charles IX, récit d’histoire, Clermont-Ferrand, Adosa, 1993. 39 Ver, por exemplo, o artigo « Collèges » da Enciclopédia, no qual D’Alembert se queixa « do pouco caso dado ao estudo da História nos colégios », Encyclopédie ou Dictionnaire raisonné des Arts, des Sciences et des Métiers, t. III, Paris, 1753. 40 Philippe Marchand (éd.), L’Histoire et la géographie dans l’enseignement secondaire. Textes officiels. T. 1: 1795 – 1914, Paris, INRP, 2000, textes 4, 5, 6, pp. 95 – 96. 41 Ibid., texte 12, pp. 101 – 103. 42 Ibid.,texte 15, pp. 109 – 110. 19
  • 20. poderia ser feita tão rapidamente, se os professores não dispusessem de um mínimo de material pedagógico já elaborado. Ora, uma parte pelo menos desse material pedagógico, remonta aos preceptores dos príncipes do fim do século XVII, como Fleury ou Le Ragois, cujas obras conhecem, ao longo do século XIX, uma carreira que só se extinguiu com as reformas republicanas43. *** A primeira das reflexões, de ordem mais geral, pela qual gostaríamos de encerrar esse artigo, concerne à temporalidade própria da história das disciplinas escolares. André Chervel abordou o problema, assinalando a longa duração dos processos de criação e de funcionamento de uma disciplina44. No mesmo sentido - e contra uma certa tradição historiográfica, que vê na aparição do ensino da história no século XIX uma criação ex nihilo do poder político -, esperamos ter mostrado que a constituição da história em matéria “ensinável” foi um fenômeno de longa duração, cujas premissas são encontradas bem antes da época de seu “nascimento” oficial, e que continuamos em realidade, bem além: a emancipação da história como disciplina plenamente autônoma, ensinada por professores especializados, só foi conseguida na virada do século XIX para o XX45. Então, sobre a base de uma experiência pedagógica já multi- secular, mesmo se ficou muito tempo reservada a uma minoria, o ensino da história pode-se tornar, nessa época, o instrumento por excelência da integração patriótica e cívica dos alunos46 - instrumento cujas incertezas, que cercam o futuro do Estado-Nação, questionam atualmente a sua própria finalidade. Essa longa duração da formação de uma disciplina escolar está ligada à complexidade de um processo, cujos múltiplos componentes 43 Ver Martin Lyons, Le Triomphe du livre. Une histoire sociologique de la lecture dans la France du XIXe siècle, Paris, Promodis, 1987, pp. 85 – 104. 44 « L’histoire des disciplines scolaires… », art. cit., pp. 30 – 31. 45 Philippe Marchand (éd.), L’Histoire et la géographie…, op. cit., pp. 75 – 84. 46 De uma abundante bibliografia, destacarei aqui somente dois artigos que fizeram sucesso: Jacques et Mona Ozouf, « Le thème du patriotisme dans les manuels primaires », 1962, republicado em Mona Ozouf, L’École de la France, Paris, Gallimard, 1984, pp. 185 – 213; Pierre Nora, « Lavisse, instituteur national. Le “Petit Lavisse”, évangile de la République », in Pierre Nora (éd.), Les Lieux de mémoire. I – La République, rééd. Paris, Gallimard, 1997, coll. « Quarto », pp. 239 – 275. 20
  • 21. tentou-se mostrar. Entraram, de fato, em jogo diversos fatores - cada um com seu ritmo próprio de evolução. Os objetivos da educação, por exemplo, mudam no decorrer do tempo: se ficaram, durante o período considerado aqui, dominados pela finalidade retórica, pudemos vê-los enfraquecer de uma maneira que acentuou o alcance moralizante da leitura dos historiadores antigos para todos os alunos; ao passo que era confiscado o “uso político” da história, decretado monopólio dos príncipes na época do absolutismo triunfante. Mas, bem antes dessa etapa, ocorrem outras transformações pelas quais se cortou em profundidade a relação com o passado, isto é, com o ensino humanista: transformações técnicas, econômicas e sociais, progresso da escrita e da imprensa, desenvolvimento dos aparelhos administrativos, ampliação do público de leitores, transformações científicas, metodológicas e pedagógicas levadas, no que diz respeito à história, à elaboração de uma cronologia unificada, à renovação do modo de leitura dos historiadores e à experimentação de novos métodos de ensino. Sobre essa complexidade gostaríamos de insistir para finalizar, a fim de lutar contra o risco de uma leitura evolucionista, vendo na pesquisa aqui apresentada uma tentativa a mais para conferir uma “origem” ao ensino da história atual. É, ao contrário, a inter-relação constante que pensamos poder revelar entre expectativas e ambições culturais e sociais, concepções e meios científicos, técnicos ou pedagógicas, que faz da história das disciplinas escolares um campo de pesquisa tão vasto quanto apaixonante para explorar, nessa época de mudanças de nossa sociedade que questiona cada dia mais os sistemas educativos que herdamos do passado. Annie Bruter é Pesquisadora do Service d’histoire de l’education – URA CNRS 1397/Institut National de Recherche Pédagogique. Paris/França Maria Helena Camara Bastos é Professora no Programa de Pós- Graduação em Educação da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul; Pesquisadora do CNPQ. Recebido em: 10/08/2005 Aceito em: 15/01/2006 21
  • 22. .
  • 23. Igreja, religião e ensino elementar antes das leis de laicização européias: um reexame crítico de suas relações1 Pierre Caspard Tradução de Maria Helena Camara Bastos Resumo Este artigo propõe um reexame do lugar ocupado pela religião no ensino elementar na época moderna, no seu conteúdo, no seu controle, nas suas grandes finalidades e nos seus objetivos pedagógicos concretos. A reflexão diz respeito a um caso específico: o das escolas de vilas de um cantão suíço, francofone e de religião reformada (calvinista), estudadas do século XVI ao século XIX. Mostra uma grande imbricação dos aspectos religiosos e laicos nesse ensino e um crescimento muito antigo da importância dos segundos, bem antes das leis de laicização da metade do século XIX, que terão, sobretudo, por objetivo a fundação da República baseada em uma noção ampla de cidadania. Essa conclusão poderia se estender de forma mais extensiva, apesar de certas especificidades, aos países católicos ou luteranos da Europa moderna. Palavras-chave: Religião, Laicidade, Suíça, Estado, Igreja, Época Moderna, Pedagogia cristã, Aprendizagens elementares, Racionalismo, Humanismo Resume Cet article propose un réexamen de la place tenue par la religion dans l’enseignement élémentaire à l’époque moderne, dans son contenu, son contrôle, ses grandes finalités et ses objectifs pédagogiques concrets. La réflexion porte sur un cas précis: celui des écoles villageoises d’un canton suisse, francophone et de religion réformée (calviniste), étudiées du XVIe au XIXe siècle. Elle montre une imbrication forte des aspects religieux et laïcs dans cet enseignement et un accroissement très ancien de l’importance des seconds, bien avant les lois de laïcisation du milieu du XIXe siècle, qui auront surtout pour but de fonder la République sur une notion de citoyenneté élargie. Cette conclusion pourrait largement s’étendre, malgré certaines spécificités, aux pays catholiques ou luthériens de l’Europe moderne. Mots clés: Religion – Laïcité – Suisse – Etat – Eglise – Epoque moderne – Pédagogie chrétienne – Apprentissages élémentaires – Rationalisme – Humanisme. 1 Título original “Eglise, religion et enseignement elémentaire avant les lois de laïcisation européennes: un réexamen critique de leurs rapports”. Autorizado especialmente pelo autor para publicação nesta revista. História da Educação, ASPHE/FaE/UFPel, Pelotas, n. 19, p. 23-37, abr. 2006 Disponível em: http//fae.ufpel.edu.br/asphe
  • 24. A reflexão sobre a educação e sua história é naturalmente binária. Avança antagonismos frontais, princípios inconciliáveis, rupturas heróicas. A religião encontrou-se assim colocada no centro dos esquemas de interpretação da educação, em dois momentos de sua história comum. No século XVI, a Reforma, seguida da Contra-Reforma em países católicos, é considerada como o acontecimento fundador de um ensino elementar de massa. “Os protestantes aprenderam a ler a partir de Calvin”, pode-se escrever para sublinhar a profundidade dessa ruptura2. No século XIX, ao contrário, os governantes dos Estados laicos ou republicanos atribuíram massivamente à organização religiosa sobre o ensino popular a causa de seus atrasos e insuficiências: cabia de agora em diante às leis de laicização passar a escola da sombra para a luz. País de confissão majoritariamente reformada, o cantão suíço de Neuchâtel é objeto, em ambos momentos, de discursos realmente conformados. Vejamos o que Aimé Humbert, primeiro diretor de Educação Pública do governo radical estabelecido pela Revolução de março de 1848, diz ao apresentar seu projeto de lei sobre a instrução pública, que será votado em março de 1850. Ele enuncia inicialmente, como uma evidência histórica, que a Reforma deu um “elã salutar” às escolas, “rompendo os entraves de Roma, permitindo a todos os cristãos a leitura das Sagradas Escrituras”; mas continua afirmando que essas escolas, criadas com um objetivo de puro doutrinamento religioso, somente habituavam os alunos “a recitar sem compreender, a falar sem refletir, a aprender para esquecer, sem nenhum aproveitamento para o desenvolvimento de seu julgamento, e menos ainda para sua memória, que tinha sido cansada, atordoada”3. O governo republicano podia colocar, enfim e pela primeira vez, a razão das crianças no centro da instrução elementar. Esse discurso, de alguma maneira dá início à vulgata que é ainda hoje pregnante4, mas que merece um sério reexame. Nossa intenção é 2 Furet F., Ozouf J.: Lire et écrire. L’alphabétisation des Français de Calvin à Jules Ferry. Paris 1977, 2 vol. 3 Bulletin officiel des délibérations du Grand Conseil, 21 novembre 1849. Em sua ação como Diretor da Educação Pública, A. Humbert testemunha um espírito infinitivamente mais pragmático e matizado que possa supor o manequeísmo de seu discurso. 4 Por exemplo: “Os alunos são habituados a repetir, copiar e recitar sem nenhum raciocínio”. Schwitzguébel-Leroy A.: Le système scolaire neuchâtelois vers la fin de l’Ancien Régime. In: Histoire de l’université de Neuchâtel, t.1 Hauterive, 1988, pp. 40-41; ou ainda para a Suíça em seu conjunto: Capitani F. de: “A Igreja vê no ensino elementar o melhor meio de manter a ortodoxia na população […]. Aprendem de memória, a compreensão dos textos é secundária”. In: Nouvelle histoire de la Suisse et des Suisses, t.2. Lausanne 1983, p. 145. O estudo citado de A. Schwitzguébel-Leroy oferece uma excelente apresentação do sistema escolar de Neuchâtel 24
  • 25. mostrar que o papel da religião no ensino, antes de sua laicização por via legislativa, é objeto de uma tríplice distorção na memória e na história da educação. Essas distorções superestimaram o papel da instituição religiosa na impulsão e no controle do ensino, como na definição de seu conteúdo. Menosprezam os princípios e os objetivos da pedagogia adotados nas escolas elementares. Subestimam, enfim, as profundas transformações ocorridas bem acima das leis escolares que balizaram o século XIX. Esse reexame será operado o mais próximo possível do terreno escolar, pela análise do funcionamento efetivo das escolas e do papel dos principais protagonistas do ensino dispensado durante três séculos. A questão das relações entre sagrado e secular poderá assim aparecer de uma maneira diferente da sua quando abordada unicamente no terreno dos princípios, das doutrinas e das idéias, onde os protagonistas da história se situam o mais frequëntemente para justificar sua ação. 1 A Reforma, a Igreja e os Pastores As exigências formuladas pela Reforma em matéria de instrução das crianças são bem conhecidas5. Desde o século XII, a Igreja tinha repousado a fé em um conhecimento intelectual, que devia ser então objeto de um ensino. Os reformadores aumentaram essa exigência incluindo a leitura pessoal da Bíblia, o que induzia um ideal de domínio generalizado da leitura pelos cristãos. Este objetivo se encontra de forma plena nas Ordonnances ecclésiastiques de Neuchâtel, de 1564, que recomendam a todos os pais e mães que instruam seus filhos para que possam motivar sua fé, e preconizam para tal a criação de escolas6. Não podemos, no entanto, limitar-nos a deduzir a afirmação de um princípio a evolução que posteriormente conhecerá a instrução das crianças. O ideal afirmado pela Reforma foi de fato atingido muito progressivamente. Até o fim do século XVII, numerosas crianças foram admitidas à comunhão, sacramento ao qual acendiam somente na idade nos anos de 1830-1840, incluindo desenvolvimentos sobre as posições oficiais da Classe dos Pastores concernente ao ensino. 5 Em uma abundante bibliografia, uma das obras de referência em língua francesa é: Chartier R., Compère M.M, Julia D.: L’éducation en France, du XVI e au XVIIIe siècle. Paris 1976, bem como o capítulo consagrado por D. Julia à “Une catéchisation de masse” in: Becchi E., Julia D. (Dirs): Histoire de l’enfance en Occident de l’Antiquité au XVIIe siècle, Paris 1998. 6 Boyve J.: Annales historiques du comté de Neuchâtel et Valangin, Berne et Neuchâtel 1854- 1859, Vol. 2, p. 123-124. 25
  • 26. aproximada de 16 ou 17 anos7, em Neuchâtel, sem o domínio da leitura de textos tão difíceis quanto o Antigo e o Novo Testamento. Os primeiros casos confirmados de recusa ostensiva contrária à admissão de crianças por causa do iletrismo, por parte de um pastor, não são encontrados senão no início do século XVIII, multiplicando-se posteriormente8. Isso conduz, não à diminuição da importância dos ideais educativos formulados de início, mas à obrigação de compreender o ritmo e as modalidades com que foram concretamente atingidos. Deste ponto de vista, convém questionar inicialmente o papel da Igreja de Neauchâtel como instituição. Sua história é bem conhecida, marcada por alguns tempos fortes como a ação de Guilhaume Farel, companheiro próximo de Calvino, a de Jean-Frédéric Ostervald, teólogo reputado em toda a Europa no século XVIII, depois, mais anedóticos, mas fortemente mediatizadas, as altercações de Jean-Jacques Rousseau com a Venerável Classe dos Pastores9. Em um principado que, da Idade Média a 1848, teve uma grande independência, ao mesmo tempo em relação aos seus príncipes (franceses ou prussianos) e em relação a Confederação helvética, a Classe dos Pastores, cujo decano é um primus inter pares, desempenhou um papel de corporação que defendia os interesses materiais e morais de seus membros, face ao Estado e às comunas, tentados a ignorar seus direitos e prerrogativas ou usurpá-los. Também defendeu uma certa ortodoxia doutrinal, regulou a formação, o recrutamento e a carreira de seus membros, unificou a liturgia, resolveu ou deu um parecer sobre as questões pastorais relativas às paróquias e manteve, enfim, relações intelectuais com outras Igrejas protestantes, especialmente as de Genebra, Berna, Bâle (Suíça) e Montbéliard (França). No domínio escolar, a intervenção a mais recorrente da Classe dos Pastores diz respeito ao controle que exerce, ou pretende exercer, sobre a nomeação dos regentes. Mas, enquanto que, nos primeiros tempos da Reforma, esses eram muitas vezes eles próprios pastores ou diáconos, a função foi totalmente laicizada durante o século XVII, o poder de nomeação 7 Caspard P.: Examen de soi-même, examen public, examen d’Etat. De l’admission à la Sainte- Cène aux certificats de fin d’études, XVIe-XIXe siècles. In: Histoire de l’éducation, mai 2002, p. 17-74. 8 Em 1731, o pastor de Verrières escreve “que não depende de mim não receber as crianças para comungar enquanto não souberem ler”, e só aceita efetivamente algumas condicionalmente. Cf. Caspard P., art.cit, p. 56. 9 Robert, M., Hammann G.: L’Eglise dans la société d’Ancien Régime. In: Histoire du Pays de Neuchâtel Hauterive 1991, t. 2. De la Réforme à 1815, p. 271-315. Hammann G.: Eglises et communautés religieuses. In: Histoire du Pays de Neuchâtel Hauterive 1993, t. 3 De 1815 à nos jours, p. 219-255. 26
  • 27. voltou às comunas que pagavam seus salários. A aprovação da Classe era igualmente necessária, em razão das funções da Igreja que eram exercidas, aliás, pelos regentes (ler a Bíblia e dirigir o canto no templo, recitar as preces em certas circunstâncias). Mas as comunas sustentavam que, para a regência da escola stricto sensu, elas tinham liberdade total para recrutar ou para demitir quem desejassem. Casos de conflito chegavam de tempos em tempos à Classe, que apelava eventualmente ao Conselho de Estado de Neuchâtel, cujos pareceres iam preferencialmente no sentido do direito das comunas10. Isso não impedia as autoridades comunais de trabalhar, na grande maioria dos casos, em harmonia com o pastor do lugar, o consultor das questões escolares e associando às visitas anuais à sua escola onde desempenhava seguidamente o papel de examinador. Mas, diferentemente dos países católicos ou luteranos, a Classe não exercia, como instituição, nenhuma autoridade hierárquica sobre o andamento das escolas, principalmente não tinha nenhum direito de visita, de inspeção nem mesmo de simples informação. É, portanto, o contexto das comunas e das paróquias, campo de ação dos pastores, que aparece como o mais pertinente para uma análise do papel desempenhado pela Igreja no desenvolvimento da instrução elementar. Desse ponto de vista, a Reforma efetivamente marcou uma ruptura que, em diversos aspectos, teve incidências maiores na educação. A primeira foi, a partir de então, a profunda inserção dos pastores em seu meio. Antes da Reforma, os padres de Neuchâtel estavam seguidamente ausentes e, em muitos casos, não havia nem mesmo vigário para atender sua paróquia11. Eles dependiam de uma autoridade hierárquica distante, os bispos de Lausanne ou de Besançon, que visitavam raramente sua diocese. A Reforma mudou essa situação. A partir de agora, o pastor reside na sua paróquia, de onde só pode ausentar-se excepcionalmente ou por motivo justificável. Ele é apoiado por um Conselho dos Anciãos, eleito pelos paroquianos, e não há mais superior hierárquico, exceto a autoridade coletiva da Classe, da qual é membro. A antiga função do clérigo de ensinar se encontra pois assegurada por uma maior interação com a população; essa interação funcionando, é essencial sublinhar, em um duplo sentido. O pastor, apoiado nos Anciãos, pode promover de forma mais eficaz a instrução na sua paróquia12. Mas, inversamente, os paroquianos podem 10 Archives de l’Etat de Neuchâtel (AEN): Actes de la Classe, XVIIe-XIXe siècles. 11 Quadroni, D.: L’Eglise dans la société médiévale. In: Histoire du Pays de Neuchâtel Hauterive 1989, t. 1 De la préhistoire au Moyen Age, p. 243-262. 12 No exemplo citado na nota 8, o pastor tem o cuidado de precisar que suas exigências “receberam o consentimento dos Anciãos, de forma unânime”. 27
  • 28. exigir que ele não perca seu interesse por essa função, que não é necessariamente considerada por cada pastor como a mais gratificante, se comparada à prédica, ao acolhimento dos pensionistas ou às atividades literárias, teológicas, científicas ou corporativas nas quais não é raro se investirem. Desde o fim do século XVII, temos o exemplo de muitas paróquias que cobram dos seus pastores suas tarefas de instrução, dispensando-os de alguns sermões anuais em benefício de horas de catecismo suplementares, contabilizando com desconfiança as que são realmente efetuadas, para ver se o cômputo é bom, ou solicitando lhes lembrar, com mais firmeza, as suas obrigações educativas às famílias obstinadas13. No final do século XVIII, os pastores dedicam assim, anualmente, mais de uma centena de horas ao catecismo e à preparação de catecúmenos à confirmação, bem mais que a predicação no templo. Uma segunda ruptura induzida pela Reforma concerne ao estatuto matrimonial dos padres. Que não sejam mais obrigados ao celibato ou a uma concubinagem vergonhosa diz respeito à educação de várias maneiras. O fato dos pastores terem, a partir de agora, o encargo de uma família, às vezes numerosa, incita-os, para atendê-la, a exercer atividades complementares a suas funções pastorais, visto que a secularização dos bens da Igreja amputou as rendas atribuídas às paróquias. Segundo o pastor Frène, que escreveu, no fim do século XVIII, que ele não era pastor “senão durante um quarto do meu tempo”14, proporção sem dúvida próxima a de muitos outros pastores que deixaram ou não testemunhos de seu emprego de tempo. Ora, a principal dessas atividades complementares é o ensino dado de forma privada, através de lições particulares, de acolhimento de pensionistas, até mesmo a organização de verdadeiros pensionatos. Esse ensino excede em muito o da religião ou do catecismo, para abordar um grande leque de matérias profanas. A atividade de ensinar pode, aliás, ser exercida de forma bem mais eficaz pois as esposas dos pastores, e até mesmo uma ou outra de suas filhas, podiam ajudá-los, segundo uma prática realmente corrente na época moderna, incluindo aqui os regentes encarregados do ensino comunal15. Embora, antigamente presente nas polêmicas anticatólicas, podemos reconhecer também uma parte de verdade na idéia segundo a qual 13 Caspard P.: art.cit. 14 Frêne T.-R.: Journal de ma vie. Ed. par A. Bandelier, Porrentruy et Bienne 1993. 15 É, por exemplo, o caso de um dos primeiros grandes pensionatos, fundado pelo pastor de Montmollin após a década de 1740. Sobre o papel das esposas de regentes, ver: Caspard P.: La maîtresse cachée. Aux origines de l’institutrice publique, 1650-1850. In: Annales Pestalozzi, 3, à paraître. 28
  • 29. ser casado e chefe de família dá aos pastores uma sensibilidade mais fina às questões educativas, e uma maior familiaridade com a experiência de seus paroquianos nesse domínio, particularmente no que se refere à educação das meninas. Deste ponto de vista, não se constata em Neuchâtel nenhum traço de neurose sexual tão presente nos discursos – senão nas práticas – católicas em matéria de co-educação dos sexos, o que manifestadamente contribuiu a dar às meninas um nível de instrução não muito distante daquele conferido aos meninos, até mesmo superior em certas áreas16. Em última análise, a participação dos pastores na função de professores é múltipla. Na própria idéia dos reformadores – Lutero, Calvino, Farel – a escola elementar não era senão uma instituição educativa entre outras, mas particularmente destinada às crianças cujos pais não tinham competência ou tempo necessário para instruí-las eles mesmos, a primeira dessas condições agindo menos devido ao elevado nível de instrução da população. De fato, o dispositivo da instrução oferecido às famílias, mesmo modestas, não cessou de ampliar-se com o tempo. No século XVIII, compreendia, ao lado da escola e da igreja, diversas formas de pensão familiar, em Neuchâtel mesmo ou no exterior, lições e cursos particulares sobre diversas matérias e, enfim, práticas de autodidática ou de instrução familiar e doméstica17. Em um dispositivo tão variado, a ação do pastor era ela mesma multiforme. A catequese era seu campo reservado, mas a leitura (comentada) da Bíblia, as orações, o canto dos salmos, a prolongavam até a escola e a família. Inversamente, o pastor participava de diversas maneiras do ensino das matérias profanas, com suas próprias crianças, seus pensionistas, ministrando aulas particulares ou pela sua competência na escola pública do lugar. Daí essa grande imbricação de ensino profano e religioso dado pelo pastor ou marcados por sua intervenção. Da Reforma às leis de laicização, um dos seus símbolos foi o exame condicionando a admissão dos alunos à ratificação da promessa de batismo e comunhão. Esse exame verificava tudo ao mesmo tempo, a instrução religiosa das crianças e um certo número de competências intelectuais: ler, compreender, memorizar, reformular, induzir e deduzir... As próprias modalidades do 16 Assim, em 1853, entre 10.600 meninos e meninas, o desempenho das meninas é um pouco melhor em leitura e em escrita, muito melhor em ortografia, em resumos de leitura e em composição francesa. Fonte: AEN, D.I.P. Rapport du Département de l’Instruction publique, 1853. 17 Caspard P.: Pourquoi on a envie d’apprendre. L’autodidaxie ordinaire à Neuchâtel, XVI e- XIXe siècles, in: Histoire de l’éducation, mai 1996, p. 65-110; Id: Les changes linguistiques d’adolescents. Une pratique éducative, XVIIe-XIXe siècles. In: Revue historique neuchâteloise, janvier 2000, p. 5-85. 29
  • 30. exame não colocavam em confronto dois atores, mas três: o pastor que examina os catecúmenos no templo, as crianças que eram examinadas, mas também os paroquianos, vindos em massa para avaliar, ao mesmo tempo, as performances dos jovens da vila no momento em que eles se preparavam para tornarem-se “adultos”, e a maneira com que o pastor desempenhava sua missão de instrução. Esta convergência de finalidades, laicas e sacras, em um exame que era um rito de passagem social, abrindo-se para um sacramento maior da religião cristã, leva a interrogar mais detalhadamente o ensino dispensado nas escolas elementares. 2 A instrução religiosa e sua pedagogia Que o ensino ministrado nas escolas comunais – protestantes ou católicas – do Antigo Regime tinha um conteúdo e finalidades essencialmente religiosas está gravado em uma vulgata particularmente compacta, que preconiza que seja o regente de escola somente o “auxiliar” do pastor ou do padre, que exerça sua função sob a “férula” da Igreja, que o ensino que ele ministra vise essencialmente a formação de “bons cristãos18”, que os métodos empregados (ditos catequéticos) visem restituir, sem discussão, as verdades da fé. É sobre essa vulgata que Aimé Humbert se referiu em seu discurso de 1849, e que percorre, ainda hoje, uma boa parte da historiografia. Isso conduz à interrogação sucessiva sobre os conteúdos, os objetivos e os métodos do ensino elementar. a) Os conteúdos Os conteúdos do ensino elementar são determinados pelas comunas, soberanas nesse campo como nos outros aspectos das questões escolares. Os programas são periodicamente rediscutidos, enriquecidos ou definidos, e às vezes apresentados por escrito19, após serem discutidos e votados em assembléia dos habitantes da comuna. O pastor é naturalmente associado à reflexão sobre o programa de ensino, menos para garantir o 18 Visão levada aos extremos limites quando explica a presença do cálculo no currículo pelo fato de que “todo bom cristão reformado deve conhecer os rudimentos para administrar seus bens conforme os mandamentos de Deus”...! Hammann G., L’Eglise…, art.cit., p. 227. 19 Caspard P.: Une source de l’histoire du temps scolaire à l’époque moderne: les règlements d’écoles. In: Compère M.M. (Dir.): Histoire du temps scolaire en Europe. Paris 1997, p. 241- 254. 30
  • 31. espaço da religião, que pouco contestadas, do que em razão de seu alto nível de instrução, e que o torna um especialista apreciado e dedicado. Mas avaliar a parte do conteúdo religioso nos programas é mais complexo do que parece. Se considerarmos os diferentes ramos de ensino apresentados, total ou em parte, no currículo das escolas comunais, na primeira metade do século XIX20, é possível distinguir entre eles três grupos, desse ponto de vista. Inicialmente, aparece o que a lei de março de 1850 chama de “ensino religioso propriamente dito”, isto é, as verdades da fé, tais como contidas e apresentadas nos diferentes catecismos em uso, de livre escolha de cada paróquia. A partir dos anos 1730, é o catecismo de J. F. Ostervald que será o mais divulgado, sem ser no entanto o único21. A religião está igualmente presente em um conjunto de outras aprendizagens, as quais fornecem tudo ou parte da matéria e do conteúdo. É o caso da leitura feita das Passagens extraídas do Novo Testamento22, o texto integral do Antigo e sobretudo do Novo Testamento; da recitação, dita também memorização ou “decorada”, em que o Catecismo e as Passagens serão solicitadas até a metade do século XIX, até mesmo depois; do canto, em que os Salmos de Davi e os Cânticos fornecem o essencial da matéria; da história sagrada, eventualmente acompanhada da geografia sagrada (da Palestina). Os exercícios de escrita e de cópia, enfim, dizem respeito seguidamente a textos piedosos ou morais. Ao contrário, a religião está totalmente ausente de uma terceira categoria de ensinos: o cálculo, a aritmética, a ortografia, a gramática, o desenho, o alemão, a escrituração comercial, os trabalhos de agulha para as moças, a história e a geografia do cantão, da Suíça, da Europa (que pode, entretanto, incluir a história da Reforma) e do mundo, bem como a composição francesa, cujos assunto são sempre profanos, as vezes morais, mas sem abordar as questões de fé ou de dogma. Esse currículo só é ensinado de forma completa nas vilas maiores, nas outras se restringem às matérias principais. Mas o movimento geral de enriquecimento do currículo elementar desde a Reforma é de fato destacável: enquanto no século XVI, ele ainda se centra na religião, na 20 Caspard P., Examen…, art.cit., p. 28: Tableau de l’enseignement religieux dans le curriculum des écoles communales, 1601-1828. 21 Barthel P.: Jean-Frédéric Ostervald l’Européen, 1663-1747. Novateur neuchâtelois. Genève 2001. 22 Ostervald J.F.: Recueil des passages du Nouveau Testament. Qui servent à établir les vérités et les devoirs de la religion chrétienne. Neuchâtel 1734. Essa pequena obra tão famosa e divulgada que jamais foi chamada de outra maneira que sob o nome de Passagens. 31
  • 32. leitura e no canto23; a partir do século XVII, acrescenta-se a escrita, a aritmética e a ortografia; depois, durante o século XVIII, a gramática, a geografia, a história, a análise gramatical e o desenho, e enfim, na primeira metade do século XIX, as outras matérias listadas acima. A lei de março de 1850, que impõe pela primeira vez um programa obrigatório de instrução elementar a todas as comunas do país, repetirá essa lista, acrescentando a instrução cívica, e reduzindo pois o ensino religioso “propriamente dito”, confiado ao único pastor, sem que possa ser imposto aos professores elementares24. Essa última medida suscitou naturalmente a oposição de uma parte da Classe dos Pastores, mas admitia-se que resultava de um processo de marginalização do ensino religioso no currículo da escola elementar, resultado natural de seu contínuo enriquecimento há três séculos. b) As grandes finalidades do ensino O enriquecimento do currículo jamais suscitou uma franca oposição por parte da Classe e dos pastores, mesmo se alguns dentre eles, politicamente conservadores, pudessem julgar que se dispensava às crianças um ensino “acima de suas condições”. Mas o sentimento mais expresso era a satisfação diante “da extensão tomada quase por toda a parte pelo campo do ensino”, a constatação que “as escolas continuam a avançar na rota onde entraram, a desenvolver e estender o campo de seus estudos”25. Esse amplo consenso entre a Igreja e as famílias repousava sobre uma adesão partilhada em duas grandes finalidades simultaneamente atribuídas à instrução. A primeira era que a criança possa tornar-se cristã “por conhecimento e por escolha”, pois a fé não se transmite e o batismo, por si só, não torna ninguém cristão. Tornar-se cristão resulta portanto de um ato individual, efetuado com toda autonomia por uma criança que deve ser beneficiada, para isso, com a instrução necessária. A segunda finalidade era de permitir à criança tornar-se, por sua instrução, “útil para si mesma e para a sociedade”. De essência laica, esse princípio se encontra também nas injunções paternas como nos escritos dos reformadores, como de Guilhaume Farel que proclama, em 1534, “seja qual for o estado em que homem se encontre, a ciência e o conhecimento de muitas coisas lhe 23 Cf. o regulamento da escola de Saint-Blaise en 1619, publicado em Caspard P.: Une source…, art.cit., p. 250-252. 24 Segundo a lei de março de 1850; a de junho de 1861 a reintroduz nos programas, mas torna- se facultativa após a lei de 1872. 25 AEN, D.I.P. 1, Rapports sur l’éducation publique de 1844 et 1845. 32
  • 33. servirá”26, o que não representa senão uma expressão do ideal humanista e enciclopédico da Renascença. No primeiro lugar desses conhecimentos úteis vem certamente a leitura, mas está longe de ser considerada somente como uma ferramenta que dá acesso a um conhecimento pessoal das Escrituras; ela abre também, e indissociavelmente, a todas as “ciências e conhecimentos” úteis ao homem em sua vida social, portanto à própria sociedade. A conjunção dessas duas finalidades explica que o enriquecimento do currículo das escolas elementares, do século XVI ao século XIX, não suscitou antagonismos maiores entre seus componentes laicos e religiosos. A religião, aliás, ali conservou seu lugar, de maneira absoluta, senão relativa. c) A pedagogia, entre memória e julgamento A pedagogia adotada nas escolas elementares do Antigo Regime foi seguidamente reduzida à forma catequética, isto é, a um encadeamento de perguntas e respostas a serem citadas de cor. De fato, o lugar dos procedimentos de catequese é bem reconhecido. O próprio Calvino deu um dos primeiros exemplos disso no seu Catecismo de 154327, apressadamente redigido e julgado rapidamente de maneira descuidada; em Neuchâtel, ele sofreu logo a concorrência de outros28. Nas matérias profanas, essa forma de catecismo pôde igualmente ser adotada, por exemplo, nos manuais de geografia em uso no fim do século XVIII29. De maneira mais geral, as sociedades antigas, e, portanto, suas escolas, davam uma importância real à memória, à recitação, ao aprender “de cor”, mas dá-se uma visão excessivamente reduzida desse interesse, quando concluímos que as crianças eram levadas a “repetir sem compreender”. Compreender o conteúdo de um texto é, evidentemente e bem ao contrário, o centro de uma injunção feita à criança de “explicar a razão” de sua fé, seja qual for, por outro lado, a capacidade que realmente é sua de satisfazer a um exercício tão difícil. Calvino dá – entre muitos outros – o exemplo dos tesouros pródigos da pedagogia para fazer compreender um certo capítulo do seu catecismo30. Théodore de Bèze solicita que os alunos 26 Farel G.: Sommaire et brève déclaration, 1534. Réed. Neuchâtel, 1980. 27 Calvin J.: Le catéchisme de l’Eglise de Genève, 1542. 28 Vuilleumier H.: Notice historique sur les catéchismes qui ont été en usage dans l’Eglise du pays de Vaud depuis le temps de la Réformation, Lausanne 1888. 29 Ostervald S.F.: Cours élémentaire de géographie ancienne et moderne et de sphère, par demandes et réponses. Neuchâtel, 1ère éd: 1757, 10e éd: 1800. 30 Calvin J.: Deux congrégations et exposition du catéchisme, Genève 1563, réed. Paris, 1964. 33
  • 34. aprendam e cantem os Salmos que traduziu com inteligência, “como homens”, e não somente de memória, “como pássaros”31. Tais testemunhos são inúmeros, podem até mesmo serem encontrados em escritos de modestos habitantes de vilas que lembram de forma sábia, em 1802: “Por que aprendemos? Não é para reter palavras, é para melhor compreender”32. Essa exigência de compreensão se encontra tanto nas matérias profanas quanto nas religiosas, o exercício do “julgamento” e da “inteligência” são enaltecidos de forma similar em todo o ensino elementar. A pedagogia das Luzes, que tende privilegiar o ensino “por princípios” em relação ao ensino “por rotina” acentua ainda essa exigência, favorecendo a invenção de procedimentos ou de exercícios identificados com uma aprendizagem mais dedutiva: a popularidade da gramática testemunha isso e sua introdução massiva nas escolas das vilas de Neuchâtel onde, desde o início do século XIX, está presente em quase metade dos programas33. A importância dada a essa pedagogia da compreensão pode ser sistematicamente avaliada através do balanço da visita de inspeção a que se submete o conjunto de escolas de Neuchâtel – em torno de 250 – no final do ano escolar de 1850-51; isto é, o último que viu essas escolas funcionarem, no essencial, segundo as modalidades do “Antigo regime escolar”, como começou-se então a denominá-lo34. Os relatórios dos comissários do governo enviados para prestar contas ao Departamento de Educação pública, não podem ser julgados excessivamente indulgentes com o Antigo Regime, pois seus autores foram todos escolhidos entre os simpatizantes da República. Eles dão uma imagem interessante dos princípios pedagógicos aplicados pelos regentes e dos objetivos que os comissários julgam atingidos, ou não, em cada uma das matérias ensinadas, sejam elas profanas ou religiosas. O critério que a maioria dos relatórios coloca em destaque é a maneira pela qual os alunos testemunham sua inteligência, seu julgamento, sua capacidade de raciocinar, seja quando do exame ou dos seus trabalhos ao longo do ano, que mostram aos examinadores no dia de visita. Isso é válido para a grande maioria das matérias ensinadas e examinadas: leitura, gramática, análise, aritmética, geografia, história, recitação, composição francesa. Em todas essas matérias, incluindo a história sagrada e a recitação, 31 Cité dans Caspard P.: Examen…, art.cit., p. 27. 32 Ibid, p. 44. 33 Caspard P.: L’orthographe et la dictée: problèmes de périodisation d’un apprentissage, XVII e - XIXe siècles. In: Le Cartable de Clio, Lausanne 2004, p. 255-264. 34 AEN, DIP 25 IX à XIII: Rapports des commissaires du gouvernement sur les visites des écoles en 1851. 34
  • 35. quando dizem respeito aos textos religiosos, se reencontra a oposição entre a memorização e a verdadeira compreensão, a primeira sendo totalmente estigmatizada quando não acompanhada da segunda. Só escapam a esse critério a escrita, os trabalhos de agulha, o desenho e o canto, que são julgados a partir das qualidades de cuidado, de elegância ou de exatidão, cujos autores testemunham. Ao contrário, o critério de compreensão vale também para as provas de religião, quando essa matéria consta do exame35. São desprezadas pelos comissários, as respostas dadas de cor, sem julgamento, o espetáculo lamentável “dos alunos que recitam sua religião como papagaios, que demonstram nada compreender”, dando assim a impressão que, para o pastor que os instruiu e os interroga, a religião é “simplesmente uma questão de memória, e não de ciência”. Esse último termo mostra que, para os comissários, a religião não é uma matéria totalmente à parte, que deve ser ensinada exigindo da criança o mesmo exercício de julgamento e de reflexão das demais matérias profanas e, isso, mesmo se envolver “sentimento, coração, convicção”, qualidades igualmente apreciadas nas respostas dos alunos. Resumindo, podemos dizer que os comissários estão satisfeitos com a pedagogia cujos efeitos observam nas escolas, sendo que em torno da metade dessas são julgadas sob esse ponto de vista de boas a excelentes, as outras estão divididas igualmente entre médias ou medíocres, e fracas ou nulas36. Sua satisfação é menor para o exame da religião do que para as outras matérias, mas transparece freqüentemente, como julga este comissário “interessante ouvir as crianças deduzirem com muita propriedade as conseqüências práticas que se pode tirar de um grande número de fatos contados no Livro Divino”. *** A República de Neuchâtel fez da modernização do sistema escolar um dos seus objetivos maiores. A laicização do conteúdo de ensino, tal qual, não constitui senão uma parte secundária dessa política. Confiar o ensino religioso “propriamente dito” ao único pastor, fora do programa de ensino obrigatório assegurado pelos professores primários, só prolongava 35 A lei de março de 1850 prevê que um exame e um relatório especial sejam feitos pelos pastores e enviados ao DEP, mas as práticas são ainda hesitantes, e a prova de religião continua muitas vezes a figurar no exame geral. 36 Caspard P.: Etude à paraître. 35
  • 36. uma evolução anterior; o secretário da Classe reconhecia, alguns anos antes, que não resultava de um grande propósito, mas de uma infinidade de vontades particulares”37. Sob o mesmo impulso, o currículo continua a se enriquecer, suscitando em 1854 a criação oficial de um ensino primário superior ou secundário moderno, já existente de fato, ao passo que a multiplicação e a diversificação dos exercícios escolares contribuíam bem mais à atividade reflexiva dos alunos. A ruptura a mais significativa visada pela política de modernização da escola residiu fundamentalmente na vontade dos republicanos em resolver o problema político criado pela evolução demográfica e sociocultural do país38. A partir do século XVIII, aumentou em todo o cantão a presença de minorias religiosas, católicas, judaicas, dissidentes. Ao contrário, as corporações comunais, que tinham se fechado no século XVI, pretendiam conservar a total direção de suas escolas, porém, muitas delas agora eram freqüentadas por uma maioria de crianças de origem simples, de confissões diversas, e privadas dos direitos cívicos. Os republicanos se propuseram então como objetivo minorar ou suprimir o papel dos corpos intermediários (Igrejas, comunas) para privilegiar o debate de dois atores: o Estado e o cidadão39. No ensino, a Pátria – com seus dois níveis, o cantão de Neuchâtel e a Confederação Helvética – torna-se assim a nova figura do coletivo, que cada cidadão devia conhecer e amar, e especialmente o futuro cidadão: o Aluno, figura também nova da criança escolarizada. É por isso que foi introduzido o ensino da instrução cívica, acrescido do da história e da geografia do cantão e da Confederação; enquanto que os novos livros de leitura ofereciam paisagens, riquezas e heróis do país para serem admirados, e que os cantos populares ou patrióticos (como Ranz des vaches, cantado em dialeto) permitiam aos alunos manifestar o entusiasmo que lhes inspiravam. Em um contexto europeu de aumento dos nacionalismos, a laicização da escola de Neuchâtel se caracteriza menos como uma vitória frontal sobre a religião ou a Igreja nacional, do que como o adiantamento, 37 AEN, Actes de la Classe, Rapport du 18 février 1846. 38 Caspard P.: “Reflektieren Spiegel? Bausteine zu einer vergleichenden Betrachtung der unentgeltlichen und entkonfessionalisiert en Pflichtschule in Frankreich und in der Schweiz” in: Criblez L., Hofstetter R., Magnin C. (Dir.): Eine Schule für die Demokratie. Berne, P. Lang, 1999, p. 433-454. 39 Sobre os problemas institucionais e políticos analisados em longa duração como em curta duração nos anos fundadores da República, ver dois números especiais da Revue historique neuchâteloise: Des chartes de franchise à la nouvelle constitution: une histoire des institutions neuchâteloises, juillet 2002, et Révolution neuchâteloise, 1848-1998, juillet 1998, ainsi que Christ T., Riard S.: Du réduit communal à l’espace national. Le statut des étrangers dans le canton de Neuchâtel, 1750-1914. Hauterive 2000. 36
  • 37. aliás parcial e negociado, de muitas autoridades locais e fragmentadas, buscando uma autoridade central única, isto é, como um alargamento das formas antigas do laos40. Pierre Caspard é diretor e pesquisador do Service d’Histoire de l’éducation / Institut National de Recherche Pédagogique – França. Maria Helena Camara Bastos é Professora no Programa de Pós- Graduação em Educação da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul; Pesquisadora do CNPQ. Recebido em: 15/01/2006 Aceito em: 20/02/2006 40 Laos = Povo (Nota da tradutora) 37
  • 38. .
  • 39. Escola de Engenharia de Porto Alegre (1896-1934): hegemonia política na construção da universidade * Marília Costa Morosini Maria Estela Dal Pai Franco Resumo O texto resgata a trajetória da Escola de Engenharia de Porto Alegre (E.E.) em seus primórdios - 1896-1922 - e como Universidade Técnica (U.T.) - 1922-1934. A análise qualifica a E.E. como uma instituição científica ímpar para a época pela sua hegemonia com o Estado do Rio Grande do Sul e pela sua face universitária com aproximações à idéia de universidade moderna, cujas funções privilegiam a pesquisa. Foram utilizados princípios de análise de conteúdo sobre fontes de informação normativas, de ocorrências, livros, revistas e jornais. Palavras-chave: Escola de Engenharia de Porto Alegre; história da educação. Abstract The paper presents the historical path of the Porto Alegre School of Engineering (E.E.) in its early times - 1896- 1922 – and as Technical University (T.U.) – 1922 – 1934. The analysis characterizes the School of Engineering as a peculiar scientific institution, to its time, for its political hegemony with the State of Rio Grande do Sul and for its university feature, connected to the idea of modern university, whose functions focuses on research. Various documents were analyzed: legislative, factual, books, periodicals and newspapers. Key-words: Porto Alegre School of Engineering; history of education. História da Educação, ASPHE/FaE/UFPel, Pelotas, n. 19, p. 39-57, abr. 2006 Disponível em: http//fae.ufpel.edu.br/asphe
  • 40. Introdução A Escola de Engenharia de Porto Alegre (E.E.) foi o pilar do ensino superior no Rio Grande do Sul (RS) e gênese da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Congregava características incomuns para o ensino superior brasileiro à época dominado pelas escolas de formação de bacharéis, inspiradas no modelo francês-napoleônico de faculdades voltadas ao eruditismo e à profissionalização. A E.E., inicialmente orientada por modelo universitário alemão e, após, americano, caracterizou-se pela interligação entre os diferentes graus de ensino, pela descentralização de suas atividades no Estado e pela produção e divulgação do conhecimento produzido. O (PRR) Partido Republicano Riograndense dominava o cenário político do estado e constituía-se na forma superior de organização (MACCIOCHI, 1977, p.64) da concepção positivista. Sob tal perspectiva, a ciência e o governo dos sábios, cuja ordem levaria ao progresso do Estado, desempenhavam um papel preponderante para a construção do capitalismo. É então criada a E.E. que representa a manutenção da hegemonia do grupo no poder, a qual não se restringe à dominação pela coerção, mas estende-se à formação do consenso, para a qual se faz imprescindível a função educativa (GRUPPI, 1980). Este trabalho tem como objetivo resgatar a trajetória da E.E. em seus primórdios e em seu desenvolvimento para Universidade Técnica, qualificativo dado à E.E. nos Estatutos de 1922, abarcando o período de 1896-1934. Objetiva-se revelar as ligações entre a E.E. e o Estado e sua face universitária. 1 O Estado do rs e a Escola de Engenharia Durante a República Velha (1890-1930), a realidade brasileira e, mais precisamente a riograndense, reflete a busca de inserção no processo global de internacionalização do capitalismo, pela via monopolista. Tal postura exigia a adoção de uma moral ética - a do valor trabalho - e um estado "científico" forte - ditadura científica -, centralizador e com hegemonia dos setores mais avançados do capital. Um Estado que além de "celeiro do País" (PESAVENTO, apud DACANAL, 1989:194), forçasse a modernização. Tal estado, na virada do século, se concretizou apoiando-se 40
  • 41. no Partido Republicano Riograndense (PRR), sob novo grupo de atores políticos. O PRR aproximou-se do [...] moderno Príncipe (Partido Político) que deve e não pode deixar de ser o propagandista e o organizador de uma reforma intelectual e moral, o que significa criar o terreno para o desenvolvimento ulterior da vontade coletiva - deve estar ligado a um programa de reforma econômica; (GRAMSCI, l984, p.13). No RS, a concepção positivista Comteana corporificou-se no PRR e não se restringiu ao caráter de religião da humanidade Quanto a questão da ciência, considerada a investigação do real, do precisamente determinado e do útil, seu desenvolvimento marcava a passagem do poder espiritual para mãos de sábios e cientistas e do poder material, para industriais. A E.E. pode ser considerada a obra mais grandiosa do espírito positivista no RS, com íntima e estreita relação entre o Estado-RS e a escola pela: identidade de princípios, reconhecimento da importância do Estado, concessão de auxílios financeiros e desempenho de funções políticas concomitante às acadêmicas na E.E.. No que tange à identidade de princípios entre a E.E. e o Estado do RS, a concepção positivista de sociedade está presente em diversos estatutos que orientam a escola. Em relação ao reconhecimento da importância do Estado para a E.E. a forma predominante é a dos elogios dirigidos à figura dos Presidentes do Estado: Dr. Carlos Barbosa (Ata n.º 100 de 31/11/1912) e Dr. Borges de Medeiros (Ata n.º 139 de 07/04/1917). É comum que os Institutos da E.E. homenageassem os políticos do Estado, através de sua nominação. Ao lado dos elogios aos membros do governo, é destacada a concordância na concepção de técnica, bem como a relação de dependência da E.E. ao Estado do RS. A estreita relação se manifesta também pela concessão de auxílios financeiros do Estado do RS. A E.E. dispunha de auxílios provenientes das Intendências, assim como de particulares e de empresas. Entretanto, através dos relatórios da E.E, sabe-se que a Lei nº 72 de 28 de novembro de 1908 concedia ao Instituto Técnico Profissional um auxílio, pelo prazo de dez anos a contar de primeiro de janeiro de 1911, proveniente da arrecadação da taxa profissional de 2% (lei orçamentária de apoio ao ensino técnico) posteriormente, como auxílio ao Instituto de Agronomia e Veterinária. A estreita relação E.E. - Estado RS projeta-se, também, no desempenho de funções políticas, no executivo e/ou no legislativo, por professores, concomitante às funções acadêmicas e/ou administrativas na escola. (Quadro 2). 41