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A Poesia como Documento Histórico:
    Reflexões Transdisciplinares
                               Renata Cardoso de Sousa
                       Orientador: Fábio de Souza Lessa
            Laboratório de História Antiga (LHIA-UFRJ)
      Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
                                    Tecnológico (CNPq)
Apresentação

• Nosso objetivo nessa comunicação é mostrar
  como a poesia pode servir de documentação
  histórica, bem como dialogar com os
  pesquisadores oriundos da área de Letras no
  tocante à análise da epopeia.
• Apresentaremos, também, um método de
  análise que pode ajudar a compreender o
  universo histórico e cultural dos poemas
  homéricos.
O tratamento da documentação
             escrita

• Positivismo: corrente que se expandiu para várias
  áreas do conhecimento no século XIX. Na História,
  acreditava-se poder chegar à verdade absoluta dos
  acontecimentos através da utilização de documentos
  escritos oficiais; ideia de prova e primazia da história
  política.
• Mesmo com o surgimento quase concomitante da
  Antropologia e da Arqueologia, essas ciências eram
  pouco utilizadas no meio historiográfico, visto que se
  ocupavam de povos primitivos, ágrafos.
O tratamento da documentação
             escrita

• A partir do final da década de 1920, a Escola dos
  Annales, outra corrente historiográfica, chamou
  atenção para outros objetos, abrindo o leque de
  fontes para a História, e permitu que outras ciências
  auxiliassem no estudo deles.
• Um desses objetos incorporados foi a fonte literária.
O tratamento das obras de
             Homero

• Mesmo sendo escritas, as epopeias homéricas
  não foram sempre um objeto de estudo no
  campo historiográfico: elas contavam mitos.
• A “Questão Homérica”: desde a Antiguidade,
  havia indagações sobre a unidade das
  epopeias, sobre a existência de Homero,
  sobre a precisão das descrições. A partir do
  século XVIII, esse debate ficou concentrado
  em duas correntes (analistas e unitaristas).
O tratamento das obras de
             Homero

• Heinrich Schliemann (1822-1890), um
  comerciante alemão, embevecido pelos
  poemas homéricos, decidiu investir na
  descoberta de Troia, a fim de provar a
  veracidade da Ilíada e da Odisseia.
• Cada artefato encontrado pertencia a um
  personagem da guerra para ele: a máscara
  funerária de Agamêmnon, a taça de Nestor, as
  joias de Hécuba.
O tratamento das obras de
             Homero

• Algumas décadas depois, arqueólogos
  profissionais recomeçaram as escavações no
  local e acabaram descobrindo onze “Troias”,
  sobrepostas umas às outras, sendo a Troia
  homérica a VIIa.
• Com a Arqueologia, descobriu-se uma
  imiscuidade de períodos nas obras homéricas.
O tratamento das obras de
                Homero

•    Isso se dá porque “É possível que o período descrito na obra
    [de Homero] abarque um milênio completo, do ano 1600 ao
    600 a.C.” (COLOMBANI, 2005, p. 8).
•    As escavações em Hissarlik não estão sendo feitas para
    comprovar a Ilíada ou a Odisseia; do mesmo modo, não é a
    função do historiador que se debruça sobre as obras
    homéricas tentar provar que a guerra de Troia, ou o “rapto”
    de Helena, ou as viagens de Odisseu de fato aconteceram.
    Não é nossa função provar que Páris, Heitor, Príamo, Aquiles,
    Ájax ou Agamêmnon existiram realmente.
A função do historiador das obras
            homéricas

• “(...) o aproveitamento histórico da obra homérica
  será seguro e maior sempre que apontar para o
  estudo de aspectos como família, vida social e
  política, instituições e normas, princípios éticos,
  comportamento religioso, cultura material, ou
  fatores econômicos.” (GABBA, 1986, p. 45).



  GABBA, Emilio. Homero. In: CRAWFORD, Michael (Org.). Fuentes para el Estudio de la Historia
  Antigua. Madrid: Taurus, 1986, p. 38-45.
Exemplo de análise: Páris

• Não basta analisar um herói apenas em sua
  singularidade: é preciso levar em conta a
  sociedade em que ele vive.
• Para isso, realizamos uma leitura isotópica da
  obra, a fim de verificar, em nível axiológico,
  quais são os elementos euforizados,
  disforizados e aforizados.
Exemplo de análise: Páris

• O que se espera de um membro dessa sociedade?
 Que tenha honra (timé);       Que tenha justa-medida
 Que tenha virtude (areté);     (métron) em seus atos;
 Que tenha coragem na          Que respeite os anciãos;
  guerra;                       Que se case;
 Que respeite os deuses,       Que       participe      das
  oferecendo-lhes libações;      discussões na agorá;
 Que respeite os ritos de      Que cozinhe os alimentos,
  hospitalidade (xénia);         bem como não beba o
                                 vinho puro.
Exemplo de análise: Páris

• Como Páris é representado na Ilíada?
 “divo” (theoeidés), (vários          “sedutor de mulheres” (III, v.
  versos);                              39);
 “marido de Helena cacheada”          “careces de força e coragem”
  (vários versos);                      (III, v. 45);
 “Páris funesto” (Dýsparis), (III,    “Esses cabelos, a cítara, os
  v. 39);                               dons de Afrodite, a beleza” (III,
 “fautor desta guerra” (III, v.        v. 54);
  87; VII, v. 374);                    “Mas, voluntário, te escusas;
 “fautor de desgraças” (VI, v.         não queres lutar” (VI, v. 523);
  282);                                “Este, porém, nunca teve
 “de belas feições” (III, v. 39);      firmeza, nem nunca há de tê-
                                        la” (VI, v. 352).
Exemplo de análise: Páris

• A priori, Páris parece ser um anti-herói.
• Entretanto, ao continuarmos a leitura da Ilíada,
  vemos que ele retorna ao combate, mata outros
  guerreiros, demonstrando sua habilidade com o arco
  e flecha.
• Desse modo, Páris configura-se em um modelo de
  como proceder, visto que age de maneira vil mas
  procura consertar seus erros.
• As obras homéricas têm uma função paidêutica.
Considerações finais

• Demonstramos aqui que a poesia pode ser um documento
  histórico, à medida que possui elementos reveladores da
  cultura helênica políade, por ser uma obra de cunho
  paidêutico.
• Além disso, mostramos uma abordagem desses poemas que
  pode auxiliar àquele que se debruça sobre eles.
• Mostramos, também, como é importante ir ao texto e
  analisar de que forma ele é construído para se estudar essa
  sociedade e as personagens descritas na epopeia. O
  aproveitamento é ainda maior quando voltamos ao texto em
  sua língua original, visto que cada termo engendra uma noção
  que pode se perder na tradução.

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A poesia como documento histórico: reflexões transdisciplinares

  • 1. A Poesia como Documento Histórico: Reflexões Transdisciplinares Renata Cardoso de Sousa Orientador: Fábio de Souza Lessa Laboratório de História Antiga (LHIA-UFRJ) Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq)
  • 2. Apresentação • Nosso objetivo nessa comunicação é mostrar como a poesia pode servir de documentação histórica, bem como dialogar com os pesquisadores oriundos da área de Letras no tocante à análise da epopeia. • Apresentaremos, também, um método de análise que pode ajudar a compreender o universo histórico e cultural dos poemas homéricos.
  • 3. O tratamento da documentação escrita • Positivismo: corrente que se expandiu para várias áreas do conhecimento no século XIX. Na História, acreditava-se poder chegar à verdade absoluta dos acontecimentos através da utilização de documentos escritos oficiais; ideia de prova e primazia da história política. • Mesmo com o surgimento quase concomitante da Antropologia e da Arqueologia, essas ciências eram pouco utilizadas no meio historiográfico, visto que se ocupavam de povos primitivos, ágrafos.
  • 4. O tratamento da documentação escrita • A partir do final da década de 1920, a Escola dos Annales, outra corrente historiográfica, chamou atenção para outros objetos, abrindo o leque de fontes para a História, e permitu que outras ciências auxiliassem no estudo deles. • Um desses objetos incorporados foi a fonte literária.
  • 5. O tratamento das obras de Homero • Mesmo sendo escritas, as epopeias homéricas não foram sempre um objeto de estudo no campo historiográfico: elas contavam mitos. • A “Questão Homérica”: desde a Antiguidade, havia indagações sobre a unidade das epopeias, sobre a existência de Homero, sobre a precisão das descrições. A partir do século XVIII, esse debate ficou concentrado em duas correntes (analistas e unitaristas).
  • 6. O tratamento das obras de Homero • Heinrich Schliemann (1822-1890), um comerciante alemão, embevecido pelos poemas homéricos, decidiu investir na descoberta de Troia, a fim de provar a veracidade da Ilíada e da Odisseia. • Cada artefato encontrado pertencia a um personagem da guerra para ele: a máscara funerária de Agamêmnon, a taça de Nestor, as joias de Hécuba.
  • 7. O tratamento das obras de Homero • Algumas décadas depois, arqueólogos profissionais recomeçaram as escavações no local e acabaram descobrindo onze “Troias”, sobrepostas umas às outras, sendo a Troia homérica a VIIa. • Com a Arqueologia, descobriu-se uma imiscuidade de períodos nas obras homéricas.
  • 8. O tratamento das obras de Homero • Isso se dá porque “É possível que o período descrito na obra [de Homero] abarque um milênio completo, do ano 1600 ao 600 a.C.” (COLOMBANI, 2005, p. 8). • As escavações em Hissarlik não estão sendo feitas para comprovar a Ilíada ou a Odisseia; do mesmo modo, não é a função do historiador que se debruça sobre as obras homéricas tentar provar que a guerra de Troia, ou o “rapto” de Helena, ou as viagens de Odisseu de fato aconteceram. Não é nossa função provar que Páris, Heitor, Príamo, Aquiles, Ájax ou Agamêmnon existiram realmente.
  • 9. A função do historiador das obras homéricas • “(...) o aproveitamento histórico da obra homérica será seguro e maior sempre que apontar para o estudo de aspectos como família, vida social e política, instituições e normas, princípios éticos, comportamento religioso, cultura material, ou fatores econômicos.” (GABBA, 1986, p. 45). GABBA, Emilio. Homero. In: CRAWFORD, Michael (Org.). Fuentes para el Estudio de la Historia Antigua. Madrid: Taurus, 1986, p. 38-45.
  • 10. Exemplo de análise: Páris • Não basta analisar um herói apenas em sua singularidade: é preciso levar em conta a sociedade em que ele vive. • Para isso, realizamos uma leitura isotópica da obra, a fim de verificar, em nível axiológico, quais são os elementos euforizados, disforizados e aforizados.
  • 11. Exemplo de análise: Páris • O que se espera de um membro dessa sociedade?  Que tenha honra (timé);  Que tenha justa-medida  Que tenha virtude (areté); (métron) em seus atos;  Que tenha coragem na  Que respeite os anciãos; guerra;  Que se case;  Que respeite os deuses,  Que participe das oferecendo-lhes libações; discussões na agorá;  Que respeite os ritos de  Que cozinhe os alimentos, hospitalidade (xénia); bem como não beba o vinho puro.
  • 12. Exemplo de análise: Páris • Como Páris é representado na Ilíada?  “divo” (theoeidés), (vários  “sedutor de mulheres” (III, v. versos); 39);  “marido de Helena cacheada”  “careces de força e coragem” (vários versos); (III, v. 45);  “Páris funesto” (Dýsparis), (III,  “Esses cabelos, a cítara, os v. 39); dons de Afrodite, a beleza” (III,  “fautor desta guerra” (III, v. v. 54); 87; VII, v. 374);  “Mas, voluntário, te escusas;  “fautor de desgraças” (VI, v. não queres lutar” (VI, v. 523); 282);  “Este, porém, nunca teve  “de belas feições” (III, v. 39); firmeza, nem nunca há de tê- la” (VI, v. 352).
  • 13. Exemplo de análise: Páris • A priori, Páris parece ser um anti-herói. • Entretanto, ao continuarmos a leitura da Ilíada, vemos que ele retorna ao combate, mata outros guerreiros, demonstrando sua habilidade com o arco e flecha. • Desse modo, Páris configura-se em um modelo de como proceder, visto que age de maneira vil mas procura consertar seus erros. • As obras homéricas têm uma função paidêutica.
  • 14. Considerações finais • Demonstramos aqui que a poesia pode ser um documento histórico, à medida que possui elementos reveladores da cultura helênica políade, por ser uma obra de cunho paidêutico. • Além disso, mostramos uma abordagem desses poemas que pode auxiliar àquele que se debruça sobre eles. • Mostramos, também, como é importante ir ao texto e analisar de que forma ele é construído para se estudar essa sociedade e as personagens descritas na epopeia. O aproveitamento é ainda maior quando voltamos ao texto em sua língua original, visto que cada termo engendra uma noção que pode se perder na tradução.