1. Há muito tempo que Pedro Passos Coelho assumiu com convicção ideológica o programa político que está a impor
ao país. Recusou fazer o papel de quem não concorda nada com o que a Troika impõe mas está obrigado ao seu
cumprimento. Não hesitou sequer em ir mais além, desejoso de mostrar aos credores, mercados e seus
representantes que, melhor do que um ajustamento neoliberal, só um hiper-ajustamento neoliberal. Um ano e
meio depois de ter sido eleito primeiro-ministro, e já responsável por dois orçamentos de Estado, anunciou que,
até Fevereiro de 2013, irá apresentar um plano para cortar mais 4 mil milhões de euros na despesa pública. A parte
de leão do corte incidirá na educação, na segurança social e na saúde. Mais co-pagamentos, despedimentos,
concessões e privatizações; mais cortes nas transferências sociais e na provisão pública de serviços essenciais.
Medidas, todas elas, que irão agravar o desemprego e a recessão (ainda mais do que o faz o aumento da receita
fiscal) e que comprometem, por muito tempo, a capacidade que os poderes públicos terão de cumprir
minimamente o contrato social da democracia.
Desse contrato faz parte o Estado usar os recursos públicos e os impostos – progressivos, não confiscatórios – para
construir um edifício de prestação universal e redistribuição solidária visando combater as desigualdades
socioeconómicas e criar sociedades de bem-estar. As dificuldades conjunturais que afectam as funções do Estado
podem ter uma solução que não passe pelo desmantelamento de todo este edifício. Em primeiro lugar, porque as
necessidades de financiamento externo do Estado português são já limitadas (excluindo o serviço da dívida,
correspondiam em 2011 a menos 0,4% do produto interno bruto [1]). Em segundo lugar, porque basta uma
renegociação da dívida que corte 2% nos juros para se conseguir a tal diminuição da despesa de 4 mil milhões de
euros. Esse corte nos juros significaria tão-somente que Portugal passaria a pagar aos fundos credores mais ou
menos o que eles próprios pagam quando se financiam. Mas para o governo de Passos Coelho essa hipótese não
convém, porque não corresponde ao seu projecto ideológico.
A rápida degradação do país e o estilhaçamento de qualquer maioria social ou política que possa ter sustentado
esta coligação contrastam com a manutenção em funções de uma solução governativa apodrecida, mas actuante.
Entre protestos e acusações de incompetência política, o governo continua a impor as suas escolhas, a usar cada
previsão, que a realidade contraria, como um amortecedor na escalada dos cortes seguintes. A situação é
insustentável, mas ninguém sabe quando irão os obstáculos sociais e institucionais às políticas de austeridade,
bem como o desastre económico que elas causam, traduzir-se em soluções governativas que ponham fim à fase
austeritária do neoliberalismo europeu.
Sandra Monteiro – Le Monde Diplomatique Dezembro de 2012
A Direcção - 9 Janeiro de 2013
Sindicato Nacional dos Profissionais de Seguros e Afins
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