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Machado de Assis
Eixo temático
O conto traz uma análise do
comportamento de alguns membros
da sociedade. Descreve-os de
maneira
extremamente
clara, precisa, com um humor
recatado, ironizando-os usando como
pano de fundo uma conversa
"inocente" como a de um pai com um
filho.
Este conto, um dos mais
deliciosos libelos do escritor contra a
mediocridade intelectual e social, é
satírico por excelência, lembrando a
ironia filosófica dos relatos curtos
de Voltaire. Praticamente sem
ação, seu núcleo temático gira em
torno de uma exposição de ideias
cínicas, através do diálogo entre pai
e filho.
O narrador cede seu espaço à
reprodução das falas das duas únicas
personagens: pai e filho. O tom
terrivelmente irônico da fala do pai
revela, obviamente, a denúncia feita
pelo autor por trás do conto em relação
a uma sociedade burguesa medíocre
e arrogante, que prega o sucesso a
qualquer preço, mesmo à custa do
empobrecimento da vida interior e das
relações humanas.
O diálogo familiar acontece
numa noite às onze horas, após um
jantar comemorativo dos 21 anos do
filho. Quando pai e filho ficam a sós
na sala, este aconselha o filho a se
tornar um Medalhão, ou seja, um
homem que ao chegar à velhice,
tenha adquirido respeito e fama na
sociedade do Rio de Janeiro do
século XIX.
Para tanto, será necessário que ele
mude seus hábitos e costumes e passe
a viver sob uma máscara, anulando os
seus gostos pessoais e suas atitudes. E
nisso disserta sobre a necessidade do
filho de sempre manter-se neutro, usar e
abusar de palavras sem sentido,
conhecer pouco, ter vocabulário limitado
etc. Ao final, é uma bela ironia
machadiana sobre como encontram-se
os valores da sociedade de sua época.
Portanto, o medalhão, tipo
criado pelo autor neste conto, se
caracteriza por aparentar ser o que
não é. Caracteriza-se, sobretudo,
por ter, como nos medalhões, uma
face oculta e sem atrativos, voltada
apenas para o corpo do dono, e
outra, vistosa, virada para o exterior,
para ser vista e admirada,
respeitada.
Considerações
O conto não tem um narrador.
De um lado, a presença de um
pai que quer projetar seus ideais
frustrados de sucesso no jovem
filho; de outro lado, o filho que se
sujeita a aceitar passivamente as
imposições do pai, anulando-se.
Os papéis sociais no conto machadiano,
pertencem, num primeiro momento, a um
grupo restrito: pai e filho. As personagens
não possuem nomes e são, portanto,
caracterizadas somente pela posição que
ocupam no grupo familiar. Num segundo
momento, no decorrer da narrativa, há a
construção de um terceiro papel social,
este pertencente a um grupo mais amplo: o
Medalhão.
Linguagem
O diálogo estabelecido no conto, há a presença das formas de tratamento.
O pai dirige-se ao filho sempre utilizando a 2ª pessoa pronominal:
tu, te, contigo, teu etc.; o filho, por sua vez, utiliza-se a 3ª pessoa, com valor
de 2ª pessoa: vosmecê, lhe, o senhor etc. No primeiro caso, a presença da 2ª
pessoa dá um valor de proximidade ao discurso (ou tentativa de), dando um
maior sentimento de intimidade. No segundo caso, o uso da 3ª pessoa, mostra
uma aceitação do discurso paterno, como se não houvesse outro meio de
discussão. É a aceitação pacífica do papel social que cabe ao filho no final
do século XIX.
Teoria do medalhão

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  • 2.
  • 3. Eixo temático O conto traz uma análise do comportamento de alguns membros da sociedade. Descreve-os de maneira extremamente clara, precisa, com um humor recatado, ironizando-os usando como pano de fundo uma conversa "inocente" como a de um pai com um filho.
  • 4. Este conto, um dos mais deliciosos libelos do escritor contra a mediocridade intelectual e social, é satírico por excelência, lembrando a ironia filosófica dos relatos curtos de Voltaire. Praticamente sem ação, seu núcleo temático gira em torno de uma exposição de ideias cínicas, através do diálogo entre pai e filho.
  • 5. O narrador cede seu espaço à reprodução das falas das duas únicas personagens: pai e filho. O tom terrivelmente irônico da fala do pai revela, obviamente, a denúncia feita pelo autor por trás do conto em relação a uma sociedade burguesa medíocre e arrogante, que prega o sucesso a qualquer preço, mesmo à custa do empobrecimento da vida interior e das relações humanas.
  • 6. O diálogo familiar acontece numa noite às onze horas, após um jantar comemorativo dos 21 anos do filho. Quando pai e filho ficam a sós na sala, este aconselha o filho a se tornar um Medalhão, ou seja, um homem que ao chegar à velhice, tenha adquirido respeito e fama na sociedade do Rio de Janeiro do século XIX.
  • 7. Para tanto, será necessário que ele mude seus hábitos e costumes e passe a viver sob uma máscara, anulando os seus gostos pessoais e suas atitudes. E nisso disserta sobre a necessidade do filho de sempre manter-se neutro, usar e abusar de palavras sem sentido, conhecer pouco, ter vocabulário limitado etc. Ao final, é uma bela ironia machadiana sobre como encontram-se os valores da sociedade de sua época.
  • 8. Portanto, o medalhão, tipo criado pelo autor neste conto, se caracteriza por aparentar ser o que não é. Caracteriza-se, sobretudo, por ter, como nos medalhões, uma face oculta e sem atrativos, voltada apenas para o corpo do dono, e outra, vistosa, virada para o exterior, para ser vista e admirada, respeitada.
  • 9.
  • 10. Considerações O conto não tem um narrador. De um lado, a presença de um pai que quer projetar seus ideais frustrados de sucesso no jovem filho; de outro lado, o filho que se sujeita a aceitar passivamente as imposições do pai, anulando-se.
  • 11. Os papéis sociais no conto machadiano, pertencem, num primeiro momento, a um grupo restrito: pai e filho. As personagens não possuem nomes e são, portanto, caracterizadas somente pela posição que ocupam no grupo familiar. Num segundo momento, no decorrer da narrativa, há a construção de um terceiro papel social, este pertencente a um grupo mais amplo: o Medalhão.
  • 12. Linguagem O diálogo estabelecido no conto, há a presença das formas de tratamento. O pai dirige-se ao filho sempre utilizando a 2ª pessoa pronominal: tu, te, contigo, teu etc.; o filho, por sua vez, utiliza-se a 3ª pessoa, com valor de 2ª pessoa: vosmecê, lhe, o senhor etc. No primeiro caso, a presença da 2ª pessoa dá um valor de proximidade ao discurso (ou tentativa de), dando um maior sentimento de intimidade. No segundo caso, o uso da 3ª pessoa, mostra uma aceitação do discurso paterno, como se não houvesse outro meio de discussão. É a aceitação pacífica do papel social que cabe ao filho no final do século XIX.