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IX JORNADA MORFOANALÍTICA 2013
Ribeirão Preto SP.

Entre a Carne e o Sonho
Lazslo A. Ávila
O Corpo e a Subjetividade
•
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•
•

O que é a Pessoa?
Psiquismo corporalizado / Personalidade encarnada
Um sujeito e sua história viva
Trajetória e vicissitudes de um organismo com vida
mental (cognitiva/afetiva e simbólica/sócio-cultural)
para além de sua biologia.
• Exemplos na Arte Contemporânea
• A Psicossomática Psicanalítica
Egon Schiele (12/06/1890 – 31/10/1918)

• A arte não pode
ser moderna, a
arte é eterna.
Enlace (Par de Amantes II), 1917
Death and the Maiden 1915/16
Frida Kahlo (06/07/1907 – 13/07/1954)
A Psicossomática Psicanalítica
• As dualidades pulsionais freudianas:
• Os instintos de conservação versus
instintos sexuais,
• As pulsões do ego versus pulsões
sexuais,
• Eros e Thanatos, as pulsões de vida
versus pulsões de morte.
A Psicossomática Psicanalítica
• Georg Groddeck (1866-1934).
• Minha experiência no Ambulatório Geral da
Faculdade de Medicina de São José do Rio
Preto, SP.
• Conceitos e técnicas de atuação
psicossomática.
• A pesquisa psicanalítica na Universidade.
• Entre a Carne e o Sonho.
Georg Groddeck
Georg Groddeck, primeira carta a
Freud, 27 de maio de 1917
• “O id, que se mantém em misteriosa conexão com
a sexualidade, forma tanto o nariz como a mão
do ser humano, assim como seus pensamentos e
seus sentimentos. Manifesta-se tanto na
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obsessiva ou na histeria. E do mesmo modo que a
atividade do id, aparecendo como histeria ou
neurose, é objeto de tratamento
psicanalítico, assim também o será a doença
cardíaca ou o câncer. Em essência não existem
diferenças que possam nos levar a aplicar aqui e
não lá a psicanálise.”
G. Groddeck, “O Livro d’Isso”, 1921
• "Pode-se imaginar o processo de recuperação mais
ou menos como uma reforma do organismo. O
organismo individual tem no próprio inconsciente
toda a mão-de-obra e geralmente também todo o
material para realizar essa reforma. Se não realizá-la
voluntariamente - o que costuma fazer de forma
mais ou menos perfeita - isso é sinal de que há
algum obstáculo paralisando as forças inconscientes.
Talvez haja um muro que deva ser derrubado por
fora, ou então montes de entulho que se
acumularam e cabe removê-los; vez por outra,
também falta material de construção; aí é preciso
uma operação cirúrgica, tratamento pela física ou
pela química.”
G. Groddeck, “O Livro d’Isso”, 1921
• “O inconsciente não fala somente em sonhos,
fala a partir do temperamento, do franzir da
testa, das batidas do coração, e fala
igualmente na silenciosa advertência do ácido
úrico, uma forma de suscetibilidade (diátese),
na irritação do simpático, nas características
da tísica, como também fala, afinal, com a voz
insistente da enfermidade.” (p. 7)
• Os desejos humanos se materializam nas mais variadas
formas e atividades da vida: “na descoberta das
chaminés ou dos navios a vapor; no manejo do arado
ou da enxada; escrevendo versos ou meditando; no
amor a Deus ou à natureza; no crime e nos atos de
autoridade; nas boas e nas más ações; na religião ou
na blasfêmia; sujando a toalha ou quebrando os copos;
nos batimentos do coração e na transpiração; na fome
e na sêde; no cansaço e no vigor; na morfina e na
febre; no adultério e no voto de castidade; no andar, no
ficar em pé, no estar deitado; na dor e na alegria; na
felicidade e no descontentamento.” Mas é no processo
das doenças que essas extraordinárias capacidades se
manifestam ainda com maior intensidade, podendo
então o desejo ser externalizado no corpo doente.
Psicossomática Psicanalítica
Teoria e Prática
• Adoecer é um fato biográfico que transcende os processos
biofísicos e remete à constituição psicossomática e à história
do sujeito. Por um lado temos a materialidade do corpo e a
realidade dos processos fisiológicos e anatomopatológicos do
corpo-organismo, de outro lado, a mente com sua
modelagem sociocultural, acossada pela intensidade das
pulsões na dramaticidade dos efeitos do inconsciente sobre a
vida psíquica. Tanto na saúde quanto na doença uma
complexa série de fatores de ordem somática devem se
compor com os fatores sociais e culturais que a existência
implica, e que tem seu campo próprio de expressão na
mente. Tanto no viver como no adoecer, a vida mental
compõe-se com a vida orgânica, em um mútuo tecer-se e em
mútua dependência.
Psicossomática Psicanalítica
Teoria e Prática
• O corpo e a psique se encontram fundidos no
início da vida, conformando o que Winnicott
denomina de “psicossoma”. Joyce McDougall
(1987, 1991) demonstrou a complexidade dessa
articulação do psíquico com o somático e as
vicissitudes que podem advir no corpo ao longo
da vida dos sujeitos. Apesar da palavra
“psicossomático” sugerir a integração desses dois
âmbitos, o padecimento psicossomático, na
forma de doenças orgânicas, ocorre não devido à
integração, mas justamente devido à nãointegração ou desintegração dessa unidade do
psicossoma.
Psicossomática Psicanalítica
Teoria e Prática
• Esse modelo da psicossomática assemelha-se à concepção
freudiana do amálgama da pulsão de vida com a pulsão de morte.
Os processos vitais contêm inevitavelmente elementos das duas
pulsões, vida e morte sempre atuam conjuntamente, não há vida
sem morte. Contudo, esse amálgama às vezes se rompe, e há um
processo de desfusão, tal como Melanie Klein supõe ocorrer no
início da vida, levando à projeção da pulsão de morte. Para Freud,
toda vez que ocorre a des-fusão pulsional, Thanatos se libera e
torna-se plenamente mortífero. As doenças são processos
decorrentes dessa liberação e a própria morte, segundo Freud,
ocorre por razões internas ao organismo. Ou seja, o organismo
permite a morte, ao perder as catexias libidinais das pulsões de
vida. Adoecer e morrer, por um lado, são a inevitabilidade do
organismo enquanto ser vivo e, por outro lado, são a
conseqüência do abandono do investimento na vida.
Psicossomática Psicanalítica
Teoria e Prática
• Mas, em sendo vida humana, há algo de extrabiológico, pois temos que considerar a vida mental e todo o
conjunto de significações pessoais e intersubjetivas que
cercam e permeiam o viver, ou morrer. O que estamos
ressaltando é que o viver humano é psicossomático, e
adoecer e morrer também são fenômenos
psicossomáticos, pois são experiências do ser total, mentee-corpo. Não se pode considerar os processos da vida e da
morte apenas como fatos biológicos, estritamente afetando
o organismo e colocando entre parênteses os aspectos
simbólicos inerentes ao viver do sujeito humano. Se tudo o
que fazemos ou vivemos está banhado por símbolos, como
a morte não o estaria?
Psicossomática Psicanalítica
Teoria e Prática
• Com Groddeck , nós nos autorizamos a “interpretar” o
corpo e suas doenças. O corpo deixou de ser aquela
tela obscura, aquele vão intransponível, ou como Freud
dizia, aquele “rochedo”, para se apresentar como um
“texto”, um “ser falante”, um símbolo a ser decifrado. O
sintoma corporal carrega significação. A diferença, com
Groddeck, é que qualquer processo corporal pode ser
encarado como se fosse um sintoma histérico – não
porque tudo seja histeria, mas porque tudo é história.
Ou seja, tudo é biografia, história viva de um sujeito
sempre corpo-e-alma, psicossomático, ser total, ser
integral, biologia com psicologia, ou
melhor, psicanálise.
Psicossomática Psicanalítica
Teoria e Prática
• Conceitualmente, proponho o seguinte esquema para a gênese do
sintoma psicossomático: trazemos continuamente, inscrito em nosso
inconsciente, o psicossoma do início de nossa vida. Éramos um todo
integrado, a mente estritamente dependente dos influxos do corpo.
Depois, ao longo do nosso desenvolvimento, a psique foi adquirindo
uma quase-independência: nossa capacidade de abstração nos permite
um nível tão sofisticado de pensamento que adquirimos a possibilidade
de praticamente nos afastarmos de nosso corpo, perder a consciência
de seus limites e limitações e vivenciar por várias horas do dia apenas o
que nossa mente apresenta como conteúdo. Por exemplo, ficar horas
debruçado em um problema, em um estudo, em uma atividade
qualquer, sem perceber que estamos deformando nossa coluna,
derramando excessivamente ácido clorídrico em nosso estomago, hiperventilando, rompendo as barreiras imunológicas, e muitas outras formas
de desrespeito ao nosso equilíbrio fisiológico. O corpo, assim, padece
pelo alheamento da mente quanto às suas necessidades e
características de equilibração.
Psicossomática Psicanalítica
Teoria e Prática
• Uma doença, do ponto de vista psicossomático, nasce dessa
alienação. O corpo é agredido sem que a mente forneça os meios
de evitar ou combater a agressão. Certas vivências muito
profundas, principalmente emoções muito intensas, atingem o ser,
impactando o corpo e a mente não partilha, ausentando-se do
embate. Há uma mensagem que é enviada para a mente (para o
cérebro enquanto órgão central do sistema nervoso, responsável
pelo comando geral do corpo). Contudo, a mente não dá àquela
mensagem uma tradução. Não lhe fornece uma representação.
Sem representação, o processo permanece somático. Sem
ingresso no psiquismo, o caminho natural daquela excitação é o
retorno ao corpo. Isso é o precursor da doença. Se houver um
auxílio “externo”, como um vírus, ou alguma deficiência no próprio
organismo, aquela agressão inicial ganha força e passa a
bombardear o corpo. A mente só vai atentar ao problema quando
ele já se materializar enquanto doença física.
Psicossomática Psicanalítica
Teoria e Prática
• Se a mente interrompesse esse percurso, desse abrigo e acolhimento
ao estímulo inicial, que é, por exemplo, uma emoção, isso conduziria
aos primórdios da representação. Seria um processo onírico: o corpo
enviando para a mente elementos para tomarem uma forma
pictográfica inicial, que a mente pode reconhecer como sonho. Se a
mente acolher esse “sonho somático”, ele pode prosseguir e se
tornar um pensamento consciente ou pré-consciente. Se for
conscientizado, ele ganha todo o auxílio dos demais componentes
mentais: vontade, inteligência, capacidade de simbolização, entre
outros, que permitem a esse processo ser elaborado e conduzir a
alguma forma de expressão não mais corporal e sim simbólica.
Psicossomática Psicanalítica
Teoria e Prática
• Para conseguir tratar um sintoma
psicossomático é necessário torná-lo
pensável. Primeiro é preciso que o sujeito fale,
pois através de sua palavra se abre o caminho
para buscar as vivências mudas que se
somatizaram. Se houver a recondução dessa
vivência para o domínio psíquico, o corpo será
poupado deste sintoma, desse sofrimento
investido no corpo.
Psicossomática Psicanalítica
Teoria e Prática
• Procuro propiciar que o sujeito fale de seu corpo
anterior à doença e após ela, dando expressão às
angústias conectadas ao medo da morte e das
limitações, e às angústias mais primitivas: temor
à castração, ataque ao narcisismo, medo de
desintegração psicossomática, vivências de
desamparo e solidão. O tratamento se faz
analítico. O paciente se coloca sujeito de sua
doença, de suas dores, de sua história. Pensamos
juntos o como e o porquê de sua doença.
Psicossomática Psicanalítica
Teoria e Prática
• Buscamos compreender também e esse é um dos
pontos cruciais, a origem da doença. Não sua
etiologia biológica, mas os motivos que levaram o
doente a “aceitar” a doença. Como se abriu a
“janela imunológica” que possibilitou a doença se
instalar? Que conflitos no interior daquela pessoa
podem ter tornado desejável ficar doente? Que
culpas, medos, raivas ou anseios podem
encontrar expressão e satisfação nos sintomas da
doença?
•
O paciente, tornado sujeito, se interroga.
Busca se autoconhecer. Faz da doença, como diria
Groddeck, uma iniciação.

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  • 1. IX JORNADA MORFOANALÍTICA 2013 Ribeirão Preto SP. Entre a Carne e o Sonho Lazslo A. Ávila
  • 2. O Corpo e a Subjetividade • • • • O que é a Pessoa? Psiquismo corporalizado / Personalidade encarnada Um sujeito e sua história viva Trajetória e vicissitudes de um organismo com vida mental (cognitiva/afetiva e simbólica/sócio-cultural) para além de sua biologia. • Exemplos na Arte Contemporânea • A Psicossomática Psicanalítica
  • 3. Egon Schiele (12/06/1890 – 31/10/1918) • A arte não pode ser moderna, a arte é eterna.
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  • 7. Enlace (Par de Amantes II), 1917
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  • 10. Death and the Maiden 1915/16
  • 11. Frida Kahlo (06/07/1907 – 13/07/1954)
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  • 15. A Psicossomática Psicanalítica • As dualidades pulsionais freudianas: • Os instintos de conservação versus instintos sexuais, • As pulsões do ego versus pulsões sexuais, • Eros e Thanatos, as pulsões de vida versus pulsões de morte.
  • 16. A Psicossomática Psicanalítica • Georg Groddeck (1866-1934). • Minha experiência no Ambulatório Geral da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto, SP. • Conceitos e técnicas de atuação psicossomática. • A pesquisa psicanalítica na Universidade. • Entre a Carne e o Sonho.
  • 18. Georg Groddeck, primeira carta a Freud, 27 de maio de 1917 • “O id, que se mantém em misteriosa conexão com a sexualidade, forma tanto o nariz como a mão do ser humano, assim como seus pensamentos e seus sentimentos. Manifesta-se tanto na pneumonia ou no câncer como na neurose obsessiva ou na histeria. E do mesmo modo que a atividade do id, aparecendo como histeria ou neurose, é objeto de tratamento psicanalítico, assim também o será a doença cardíaca ou o câncer. Em essência não existem diferenças que possam nos levar a aplicar aqui e não lá a psicanálise.”
  • 19. G. Groddeck, “O Livro d’Isso”, 1921 • "Pode-se imaginar o processo de recuperação mais ou menos como uma reforma do organismo. O organismo individual tem no próprio inconsciente toda a mão-de-obra e geralmente também todo o material para realizar essa reforma. Se não realizá-la voluntariamente - o que costuma fazer de forma mais ou menos perfeita - isso é sinal de que há algum obstáculo paralisando as forças inconscientes. Talvez haja um muro que deva ser derrubado por fora, ou então montes de entulho que se acumularam e cabe removê-los; vez por outra, também falta material de construção; aí é preciso uma operação cirúrgica, tratamento pela física ou pela química.”
  • 20. G. Groddeck, “O Livro d’Isso”, 1921 • “O inconsciente não fala somente em sonhos, fala a partir do temperamento, do franzir da testa, das batidas do coração, e fala igualmente na silenciosa advertência do ácido úrico, uma forma de suscetibilidade (diátese), na irritação do simpático, nas características da tísica, como também fala, afinal, com a voz insistente da enfermidade.” (p. 7)
  • 21. • Os desejos humanos se materializam nas mais variadas formas e atividades da vida: “na descoberta das chaminés ou dos navios a vapor; no manejo do arado ou da enxada; escrevendo versos ou meditando; no amor a Deus ou à natureza; no crime e nos atos de autoridade; nas boas e nas más ações; na religião ou na blasfêmia; sujando a toalha ou quebrando os copos; nos batimentos do coração e na transpiração; na fome e na sêde; no cansaço e no vigor; na morfina e na febre; no adultério e no voto de castidade; no andar, no ficar em pé, no estar deitado; na dor e na alegria; na felicidade e no descontentamento.” Mas é no processo das doenças que essas extraordinárias capacidades se manifestam ainda com maior intensidade, podendo então o desejo ser externalizado no corpo doente.
  • 22. Psicossomática Psicanalítica Teoria e Prática • Adoecer é um fato biográfico que transcende os processos biofísicos e remete à constituição psicossomática e à história do sujeito. Por um lado temos a materialidade do corpo e a realidade dos processos fisiológicos e anatomopatológicos do corpo-organismo, de outro lado, a mente com sua modelagem sociocultural, acossada pela intensidade das pulsões na dramaticidade dos efeitos do inconsciente sobre a vida psíquica. Tanto na saúde quanto na doença uma complexa série de fatores de ordem somática devem se compor com os fatores sociais e culturais que a existência implica, e que tem seu campo próprio de expressão na mente. Tanto no viver como no adoecer, a vida mental compõe-se com a vida orgânica, em um mútuo tecer-se e em mútua dependência.
  • 23. Psicossomática Psicanalítica Teoria e Prática • O corpo e a psique se encontram fundidos no início da vida, conformando o que Winnicott denomina de “psicossoma”. Joyce McDougall (1987, 1991) demonstrou a complexidade dessa articulação do psíquico com o somático e as vicissitudes que podem advir no corpo ao longo da vida dos sujeitos. Apesar da palavra “psicossomático” sugerir a integração desses dois âmbitos, o padecimento psicossomático, na forma de doenças orgânicas, ocorre não devido à integração, mas justamente devido à nãointegração ou desintegração dessa unidade do psicossoma.
  • 24. Psicossomática Psicanalítica Teoria e Prática • Esse modelo da psicossomática assemelha-se à concepção freudiana do amálgama da pulsão de vida com a pulsão de morte. Os processos vitais contêm inevitavelmente elementos das duas pulsões, vida e morte sempre atuam conjuntamente, não há vida sem morte. Contudo, esse amálgama às vezes se rompe, e há um processo de desfusão, tal como Melanie Klein supõe ocorrer no início da vida, levando à projeção da pulsão de morte. Para Freud, toda vez que ocorre a des-fusão pulsional, Thanatos se libera e torna-se plenamente mortífero. As doenças são processos decorrentes dessa liberação e a própria morte, segundo Freud, ocorre por razões internas ao organismo. Ou seja, o organismo permite a morte, ao perder as catexias libidinais das pulsões de vida. Adoecer e morrer, por um lado, são a inevitabilidade do organismo enquanto ser vivo e, por outro lado, são a conseqüência do abandono do investimento na vida.
  • 25. Psicossomática Psicanalítica Teoria e Prática • Mas, em sendo vida humana, há algo de extrabiológico, pois temos que considerar a vida mental e todo o conjunto de significações pessoais e intersubjetivas que cercam e permeiam o viver, ou morrer. O que estamos ressaltando é que o viver humano é psicossomático, e adoecer e morrer também são fenômenos psicossomáticos, pois são experiências do ser total, mentee-corpo. Não se pode considerar os processos da vida e da morte apenas como fatos biológicos, estritamente afetando o organismo e colocando entre parênteses os aspectos simbólicos inerentes ao viver do sujeito humano. Se tudo o que fazemos ou vivemos está banhado por símbolos, como a morte não o estaria?
  • 26. Psicossomática Psicanalítica Teoria e Prática • Com Groddeck , nós nos autorizamos a “interpretar” o corpo e suas doenças. O corpo deixou de ser aquela tela obscura, aquele vão intransponível, ou como Freud dizia, aquele “rochedo”, para se apresentar como um “texto”, um “ser falante”, um símbolo a ser decifrado. O sintoma corporal carrega significação. A diferença, com Groddeck, é que qualquer processo corporal pode ser encarado como se fosse um sintoma histérico – não porque tudo seja histeria, mas porque tudo é história. Ou seja, tudo é biografia, história viva de um sujeito sempre corpo-e-alma, psicossomático, ser total, ser integral, biologia com psicologia, ou melhor, psicanálise.
  • 27. Psicossomática Psicanalítica Teoria e Prática • Conceitualmente, proponho o seguinte esquema para a gênese do sintoma psicossomático: trazemos continuamente, inscrito em nosso inconsciente, o psicossoma do início de nossa vida. Éramos um todo integrado, a mente estritamente dependente dos influxos do corpo. Depois, ao longo do nosso desenvolvimento, a psique foi adquirindo uma quase-independência: nossa capacidade de abstração nos permite um nível tão sofisticado de pensamento que adquirimos a possibilidade de praticamente nos afastarmos de nosso corpo, perder a consciência de seus limites e limitações e vivenciar por várias horas do dia apenas o que nossa mente apresenta como conteúdo. Por exemplo, ficar horas debruçado em um problema, em um estudo, em uma atividade qualquer, sem perceber que estamos deformando nossa coluna, derramando excessivamente ácido clorídrico em nosso estomago, hiperventilando, rompendo as barreiras imunológicas, e muitas outras formas de desrespeito ao nosso equilíbrio fisiológico. O corpo, assim, padece pelo alheamento da mente quanto às suas necessidades e características de equilibração.
  • 28. Psicossomática Psicanalítica Teoria e Prática • Uma doença, do ponto de vista psicossomático, nasce dessa alienação. O corpo é agredido sem que a mente forneça os meios de evitar ou combater a agressão. Certas vivências muito profundas, principalmente emoções muito intensas, atingem o ser, impactando o corpo e a mente não partilha, ausentando-se do embate. Há uma mensagem que é enviada para a mente (para o cérebro enquanto órgão central do sistema nervoso, responsável pelo comando geral do corpo). Contudo, a mente não dá àquela mensagem uma tradução. Não lhe fornece uma representação. Sem representação, o processo permanece somático. Sem ingresso no psiquismo, o caminho natural daquela excitação é o retorno ao corpo. Isso é o precursor da doença. Se houver um auxílio “externo”, como um vírus, ou alguma deficiência no próprio organismo, aquela agressão inicial ganha força e passa a bombardear o corpo. A mente só vai atentar ao problema quando ele já se materializar enquanto doença física.
  • 29. Psicossomática Psicanalítica Teoria e Prática • Se a mente interrompesse esse percurso, desse abrigo e acolhimento ao estímulo inicial, que é, por exemplo, uma emoção, isso conduziria aos primórdios da representação. Seria um processo onírico: o corpo enviando para a mente elementos para tomarem uma forma pictográfica inicial, que a mente pode reconhecer como sonho. Se a mente acolher esse “sonho somático”, ele pode prosseguir e se tornar um pensamento consciente ou pré-consciente. Se for conscientizado, ele ganha todo o auxílio dos demais componentes mentais: vontade, inteligência, capacidade de simbolização, entre outros, que permitem a esse processo ser elaborado e conduzir a alguma forma de expressão não mais corporal e sim simbólica.
  • 30. Psicossomática Psicanalítica Teoria e Prática • Para conseguir tratar um sintoma psicossomático é necessário torná-lo pensável. Primeiro é preciso que o sujeito fale, pois através de sua palavra se abre o caminho para buscar as vivências mudas que se somatizaram. Se houver a recondução dessa vivência para o domínio psíquico, o corpo será poupado deste sintoma, desse sofrimento investido no corpo.
  • 31. Psicossomática Psicanalítica Teoria e Prática • Procuro propiciar que o sujeito fale de seu corpo anterior à doença e após ela, dando expressão às angústias conectadas ao medo da morte e das limitações, e às angústias mais primitivas: temor à castração, ataque ao narcisismo, medo de desintegração psicossomática, vivências de desamparo e solidão. O tratamento se faz analítico. O paciente se coloca sujeito de sua doença, de suas dores, de sua história. Pensamos juntos o como e o porquê de sua doença.
  • 32. Psicossomática Psicanalítica Teoria e Prática • Buscamos compreender também e esse é um dos pontos cruciais, a origem da doença. Não sua etiologia biológica, mas os motivos que levaram o doente a “aceitar” a doença. Como se abriu a “janela imunológica” que possibilitou a doença se instalar? Que conflitos no interior daquela pessoa podem ter tornado desejável ficar doente? Que culpas, medos, raivas ou anseios podem encontrar expressão e satisfação nos sintomas da doença? • O paciente, tornado sujeito, se interroga. Busca se autoconhecer. Faz da doença, como diria Groddeck, uma iniciação.