2. • Não é uma obra filosófica: não possui os
procedimentos próprios a um escrito filosófico
• É literária: Apresenta estrutura narrativa.
• Tempo
• Espaço
• Personagens
• Enredo: Situação inicial; Quebra da situação
inicial; conflito; desenvolvimento do conflito;
clímax; desfecho ou conclusão.
• Foco narrativo
3. Compreensão da linguagem literária
• Literatura e sociedade
• O estudo de uma obra literária deve ser
precedida pelo estudo da sociedade que a
produz.
• uma obra literária é expressão de valores,
interesses e cultura de uma ou outra classe
social específica.
4. Marx e Freud
• Marx (1983) e Freud (1978), um se referindo a
determinação social e o outro a determinação
individual do pensamento, demoliram o castelo
positivista da neutralidade e da objetividade.
• Um pensador pode ser ideólogo de uma classe
social intencionalmente ou inintencionalmente
(ou para utilizar terminologia equivocada de
Falcon, “conscientemente” ou
“inconscientemente”).
5. Ideologia social
• O que define se alguém é ideólogo de uma
classe social específica não é a sua
intencionalidade e sim a coincidência de suas
ideias com os valores e interesses desta
classe.
• Um indivíduo tende a representar os
interesses e valores de sua própria classe, mas
isto não ocorre necessariamente em todos os
casos
6. Voltaire e sua ideologia
• A definição de Voltaire como ideólogo da burguesia
não pode ser feita a priori, pois é necessário
anteriormente ver a relação de coincidência ou não
entre suas ideias e os valores, interesses e cultura da
burguesia. A simples constatação de coincidência, por
sua vez, não possui valor explicativo. Para entender as
ideias de Voltaire é necessário não só ver qual classe
social ele representa, mas também ver quais são as
tarefas políticas e sociais do pensamento de tal classe
no momento histórico em que ele é produzido e assim
buscar compreender o pensador e suas ideias.
7. O mundo de Voltaire
• século XVIII : pela transformação social que
marca a transição do feudalismo para o
capitalismo.
• O comércio cria a riqueza mobiliária
• A aristocracia é substituída pela burguesia
• Mudança cultural, moral e intelectual
• Com a ascensão da burguesia surge o
proletariado.
8. Voltaire e as mudanças sociais
• Assim como combatia a intolerância, o
clericalismo, a propriedade feudal, também
defendia algo: a razão, a tolerância, a
liberdade e a propriedade burguesa.
9. O mundo de Cândido
• A literatura se caracteriza pela utilização de
uma linguagem simbólica, ou seja, o autor
nunca diz o que quer dizer de forma direta,
clara, objetiva. A metáfora, os exemplos, etc.,
são meios de se utilizar tal linguagem. Por
isto, não se pode ler uma obra literária como
se fosse um tratado político ou científico e
não se deve tomar tudo ao pé da letra. O
autor quer sempre transmitir uma mensagem
10. • A ridicularização da ideologia do “melhor dos
mundos possíveis” de Leibniz é bastante fácil
de se perceber
• O filósofo Pangloss é a corporificação de
Leibniz. Ele “lecionava metafísico-teólogo-
cosmolonigologia” e era o preceptor dos filhos
do Barão e do bastardo Cândido.
11. • Pangloss “provava admiravelmente que sem
causa não há efeito, e que, neste melhor dos
mundos possíveis, o castelo de monsenhor o
Barão era o mais belo dos castelos, e a
senhora baronesa a melhor das baronesas
possíveis” (Voltaire, 1984, p. 26).
12. Voltaire ironiza Pangloss
• para este, as coisas não poderiam ser de outra maneira e
tudo foi feito para um determinado fim. Os narizes
foram feitos para apoio dos óculos, as pernas para o uso
dos calções, os porcos para serem comidos, etc. Certo
dia, a Srta. Cunegundes, filha do Barão, viu “o maior
filósofo da província” (Pangloss) “entregue a uma lição
de física experimental com a criada-grave de sua mãe” e
“como tivesse acentuada propensão para as ciências,
observou, de fôlego suspenso, as experiências reiteradas
de que se fizera testemunha; percebeu muito às claras a
razão suficiente do doutor, os efeitos e as causas, e
afastou-se agitada, toda pensativa, toda cheia de desejo
de ser sábia, calculando bem poder, também ela, ser a
razão suficiente do pequeno Cândido, que poderia, por
seu turno, ser a sua” (Voltaire, 1984, p. 27-28).
13. O resultado disso é previsível:
• Cunegundes “encontrou-se com Cândido, ao voltar para o
castelo, e enrubesceu: Cândido enrubesceu também. Deu-lhe
bom-dia com voz entrecortada; Cândido respondeu-lhe sem
saber o que dizia. No dia seguinte, depois do jantar, ao saírem
da mesa, Cunegundes e Cândido se encontraram atrás de um
biombo; Cunegundes deixou cair o lenço, Cândido apanhou;
ela, inocentemente, segurou-lhe a mão, ao passo que,
inocentemente, ele beijava a sua, com uma vivacidade, uma
sensibilidade, uma graça toda particular; seus lábios se
encontraram, seus olhos se incendiaram, os joelhos lhes
tremeram, suas mãos perderam o rumo. O senhor Barão (...)
passou perto do biombo, e, ao ver aquela causa e tal efeito,
expulsou Cândido do castelo a violentos pontapés no traseiro;
Cunegundes desmaiou; depois de retemperada, esbofeteou-a
a senhora baronesa; e tudo foi consternação no mais belo e
no mais agradável dos castelos possíveis” (Voltaire, 1984, p.
28).
14. Crítica à injustiça e à ideologia do
“melhor dos mundos possíveis”
• Cândido foi expulso do castelo. O que significa
o castelo? Ele significa o mundo feudal, a
idade das trevas. O Barão “era um dos mais
poderosos suseranos da Vestfália”. A relação
de vassalagem está presente e a separação
entre nobres e plebeus proíbe a união entre
Cunegundes e Cândido. Assim, Voltaire critica,
ao mesmo tempo, a injustiça que reina no
castelo e a ideologia que afirma ser este o
“melhor dos mundos possíveis”.
15. A Sociedade de transição não é o
“melhor dos mundos possíveis”
• A sociedade de transição que cerca o castelo
também não é o melhor dos mundos
possíveis. No decorrer da narrativa se
desenrola uma série de catástrofes que se
abate sobre os indivíduos (Cândido, Pangloss,
Cunegundes, etc.) e sobre as sociedades
(guerras, terremotos). Assim, torna-se
questionável a filosofia de Pangloss, o
otimismo.
16. Mudança de foco
• A viagem ao novo mundo significa que, através de Cândido,
Voltaire muda o foco de sua crítica. O objeto da crítica passa a
ser Rosseau. O “homem selvagem”, bom por natureza, é
questionado. O “mito do bom selvagem” é destruído através de
duas constatações: em primeiro lugar, o mundo novo já foi
corrompido pelos europeus (espanhóis, portugueses, jesuítas,
etc.) e não existe mais nenhum “estado de natureza” no
continente americano; em segundo lugar, o homem em seu
estado natural não é necessariamente bom, como demonstra os
selvagens chamados “orelhões”. Eles confundem Cândido e seu
companheiro Cacambo com jesuítas e querem comê-los. Cândido
afirma: “vamos certamente ser assados ou cozidos. Ah! Que diria
mestre Pangloss, se visse a pura natureza?” (Voltaire, 1984, p.
76). A “pura natureza” convive com o canibalismo, o principal
argumento existente contra a bondade natural dos selvagens.
17. O homem não é bom e nem mau por
natureza. É através da razão que ele se
humaniza
• Por isso, emerge no interior do novo mundo um
lugar onde os selvagens (os não-europeus) são
bons e civilizados: o Eldorado. Neste país
estranho, onde se despreza o ouro e não tem
igreja e monges, vive-se na harmonia e na paz.
Entretanto, Cândido e Cacambo chegam neste
lugar por acaso e levados pela correnteza
incontrolável de um rio. Os príncipes, no
passado, ordenaram, com o consentimento da
nação, que nenhum habitante pudesse sair do
reino. Segundo o rei: “foi isto que nos conservou
a inocência e a felicidade” (Voltaire, 1984, p. 83).
18. • Portanto, chegar em Eldorado é quase impossível
e tal reino se mantém puro porque os
estrangeiros não conseguem chegar até lá e os
habitantes não querem sair de lá. Mesmo se
quisessem, a saída é bastante difícil. Segundo o
rei: “é impossível subir a correnteza que aqui vos
trouxe por milagre, sob arcadas de rochedos. As
montanhas que circundam meu reino têm de
altura dez mil pés, e são retas como muralhas:
elas ocupam, de largura, cada uma, um espaço
de mais de dez léguas; não se pode descer senão
por precipícios” (Voltaire, 1984, p. 86).
19. • Entretanto, o bondoso rei manda construir uma
máquina engenhosa para transportar os dois
estrangeiros. O Eldorado só continua existindo graças
ao seu isolamento. É difícil para um estrangeiro viver
em tal lugar, apesar de suas vantagens. Por isto,
Cândido e Cacambo resolvem partir e isto significa que
o Eldorado não é o nosso mundo e nem foi feito para
nós. O “paraíso terrestre” é um lugar que nos impede
de amar (Cândido) e de aventurar-se pelo mundo
(Cacambo), significa, portanto, um retorno ao “paraíso
celeste”, retorno impossível após se comer o fruto da
árvore do conhecimento.
20. Decadência da nobreza
• Depois de muitas outras catástrofes, Cândido retorna à
Europa. Passam pela França, Inglaterra e chegam à
Veneza. Lá encontram seis reis destronados. Cândido
afirma: “eis aí, todavia, seis reis destronados com
quem vimos de cear! E ainda entre eles há um a quem
dei esmola. É possível existirem muitos outros
príncipes ainda mais desventurados”(Voltaire, 1984, p.
124). Isto significa, ao mesmo tempo, a decadência da
nobreza provocada pela artificialidade da forma como
ela conquista suas riquezas e a mudança na relação
entre um nobre e um plebeu, pois, hoje, é o último
que dá esmola ao primeiro.
21. Oposição entre o mundo da nobreza e
o mundo dos plebeus
• Cândido acaba chegando a Constantinopla. Lá estão juntos
Cândido, Pangloss, Cunegundes e outros companheiros de
aventuras. O reencontro com Cunegundes é
surpreendente, pois ela havia perdido sua beleza, mas,
mesmo assim, Cândido manteria sua promessa de
casamento. Entretanto, ele encontraria a oposição do filho
do Barão e irmão de Cunegundes. Apesar de não ter o
mínimo desejo de casar, Cândido estava determinado,
devido a impertinência do Barão, a concluir sua promessa.
Logo se desfizeram do Barão e assim puniram “o orgulho
de um Barão alemão”. Aqui, novamente, se vê a oposição
entre a nobreza (e o mundo feudal e das trevas que ela
representa) e o mundo dos plebeus, do “terceiro estado”,
da burguesia nascente.
22. Conclusão
• O final da obra é um elogio a vida burguesa. Depois de
se encontrarem com um velho que cultivava o seu
jardim e produzia sua própria riqueza através do
trabalho, Cândido e seus amigos resolvem fazer o
mesmo. Segundo o velho: “o trabalho afasta de nós
três grandes males: o tédio, o vício e a necessidade”
(Voltaire, 1984, p. 136). Cândido diz que o velho
conseguiu uma vida preferível à dos seis reis
destronados, ou seja, mais uma vez se opõe nobreza e
burguesia. Assim, todos se colocam a trabalhar na
granja de Cândido e a “fazendola rendeu muito”.
23. O trabalho é necessário
• O filósofo Pangloss diz: “todos os acontecimentos
se encadeiam no melhor dos mundos possíveis;
porque, afinal, se não tivésseis sido expulso de
um belo castelo a grandes pontapés no traseiro,
por amor da senhorinha Cunegundes; se não
tivésseis ido parar em mãos da inquisição; se não
tivésseis percorrido a América, a pé; se não
tivésseis assestado uma boa espadada no Barão;
se não tivésseis perdidos vossos carneiros da boa
terra de Eldorado; não estaríeis agora comendo
confeitos de cidra e pistachas” (Voltaire, 1984, p.
137). Cândido respondia que é preciso trabalhar.
24. O trabalho é que justifica a
propriedade.
• . Voltaire, leitor e admirador de Locke, concordava
com este na relação que ele via entre propriedade e
trabalho. A granja é apenas um símbolo da
propriedade burguesa e, portanto, não expressa
nenhuma “utopia pequeno-burguesa”. A concepção
de Voltaire é parecida com a de Locke (1978): o
“estado de natureza” não era tão ruim como Hobbes
supunha, pois a instituição do “estado social” e da
propriedade burguesa é realizada para vivermos
“melhor”. Aliás, no final da narrativa de Cândido ou o
Otimismo, vemos uma inversão: é o mundo da granja,
o mundo das luzes e da burguesia, que é o “melhor dos
mundos possíveis”.
25. Final feliz
• No final da narrativa de Cândido ou o Otimismo, vemos
uma inversão: é o mundo da granja, o mundo das luzes e
da burguesia, que é o “melhor dos mundos possíveis”.
Leibniz é o Pangloss do feudalismo e Voltaire é o Pangloss
do capitalismo. O primeiro Pangloss é um ideólogo da
nobreza e o segundo é o ideólogo da burguesia. A granja
não significa retorno à pequena propriedade (pois ela é
símbolo da propriedade burguesa) e nem é uma “utopia
pequeno-burguesa”, sendo, na verdade, uma ideologia
(inversão da realidade) burguesa. O mundo burguês torna-
se o “melhor dos mundos possíveis”. No final da narrativa,
Voltaire abandona a crítica da nobreza para fazer a
apologia da burguesia.
26. Objetivo de Voltaire
• Em síntese, podemos dizer que Cândido ou o
Otimismo não é uma crítica ao otimismo, mas
uma crítica ao otimismo da nobreza. No seu
lugar instaura o otimismo das luzes. O
objetivo de Voltaire é contrapor o século das
luzes à idade das trevas e demonstrar a
superioridade do primeiro. E nós, herdeiros do
iluminismo, continuamos otimistas e vivendo
no “melhor dos mundos possíveis”.
27. • BIBLIOGRAFIA
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• Fortes, Luiz Roberto Salinas. O Iluminismo e os Reis Filósofos. 2a edição, São Paulo, Brasiliense, 1985.
• Foucault, Michel. O Que é o Iluminismo? In: Escobar, Carlos Henrique (Org.). Michel Foucault. Dossier. Rio de
Janeiro, Taurus, 1984.
• Freud, Sigmund. O Futuro de Uma Ilusão. In: Col. Os Pensadores. 3aedição, São Paulo: Abril Cultural, 1978.
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• Locke, John. Segundo Tratado sobre o Governo Civil. In: Col. Os Pensadores, São Paulo: Abril Cultural, 1978.
• Marx, Karl. Contribuição à Crítica da Economia Política. 3a edição, São Paulo: Martins Fontes, 1983.
• Marx, Karl. O Dezoito Brumário e Cartas a Kugelmann. 5a edição, Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1986.
• Rousseau, Jean-Jacques. O Contrato Social. In: Col. Os Pensadores, 4aedição, São Paulo: Nova Cultural, 1987.
• Soubol, Albert. A Revolução Francesa. 5a edição, São Paulo, Difel, 1985.
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• Voltaire, Cândido ou o Otimismo. Rio de Janeiro, Tecnoprint, 1984.
• Weber, Max. A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo. 5a edição, São Paulo, Pioneira, 1987.
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• http://informecritica.blogspot.com.br/2011/05/candido-de-voltaire-auto-imagem-do.html