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A Gaguez
Trabalho realizado por:
Ângela Enes Pereira
Isabel Saraiva Barbosa
Universidade Portucalense
Porto, Portugal
2 Fevereiro 2008
Perturbações da Linguagem - Prof. Dr.ª Margarida Paiva
“Acredita que mais tarde ou mais cedo
alguma coisa verdadeira vai ter de ser
feita por ti, mais que apenas manejar
as aparências.”
Streccht, P. (1999) pág. 177
Índice
Introdução ....................................................................................................... 4
Causas da gaguez .......................................................................................... 5
Consequências da gaguez .............................................................................. 7
O que podemos fazer? .................................................................................... 9
Gisela era triste sozinha e “diferente” .............................................................. 12
Conclusão ....................................................................................................... 16
Bibliografia ....................................................................................................... 17
Introdução
É nas reuniões de família que é dada às crianças a aos adultos, a
oportunidade, a possibilidade de conjuntamente, num “tom” de aprendizagem
ou de brincadeiras, praticar e desenvolver muitas competências de
comunicação, verbais ou não verbais e resolver muitos desafios, muitos
problemas.
É aqui, que de forma privilegiada e única as crianças encontrarão os
seus primeiros modelos, as “referências” para uma inserção na vida social.
Neste trabalho, específico sobre a gaguez iremos demonstrar, sobretudo
a importância do meio familiar como fonte de uma sociabilização mais ou
menos positiva numa criança que sofra desta perturbação da linguagem.
Outros factores como a hereditariedade, a questão psicológica e física
serão abordados, na tentativa de explicar e perceber comportamentos e
sentimentos de uma criança “presa” a algo que a impede de ser livre e
espontânea, na comunicação e na inter-relação com os demais, uma
perturbação da linguagem apelidada de “gaguez” que faz dela alguém
diferente.
Causas da gaguez
Não há uma causa específica e nenhuma gaguez é absolutamente igual
à outra, de acordo com vários autores a gaguez dá-se a partir das dificuldades
de articulação normais, comuns a todas as crianças por volta dos três anos de
idade, sendo que a maior parte das crianças atravessa esta fase sem
problemas, mas em algumas esta dificuldade normal pode transformar-se em
gaguez.
As hesitações, as repetições e a demora na emissão das palavras, são
algumas das suas manifestações, bem como, o prolongamento anormal dos
sons. Cientistas alemães revelam ter descoberto que a gaguez permanente é
provocada por uma disfunção no hemisfério esquerdo onde se interligam as
estruturas cerebrais envolvidas no planeamento com a articulação do discurso.
Como foi já foi referido, esta pode ter início entre os dois e os quatro
anos e cerca de metade das crianças em que a gaguez persiste até aos cinco
anos, quando adultos podem ainda gaguejar.
A ocorrência de erros na articulação dos sons da fala, como omissão,
substituição e distorção de fonemas, que não decorram de alterações
neurológicas, mas sim de alterações funcionais, são considerados desvios
anatómicos dos órgãos fonoarticulatórios.
Alguns investigadores, concluem que a gaguez se deve a uma forma
subtil de lesão cerebral, outros ainda consideram-na como um problema
essencialmente psicológico. A hereditariedade também se inclui como uma das
possíveis causas, pois é vulgar esta perturbação da linguagem surgir em
pessoas cujas as famílias tenham casos de gaguez. Por exemplo, avós, pais
ou irmãos, ou manifestar-se até em indivíduos que na fase da aquisição da
linguagem sejam sujeitos ao convívio com pessoas gagas. Daí se poder
concluir, da importância do meio para o surgimento desta perturbação da fala.
Não havendo consenso quanto a uma causa única, a gaguez ou dislalia,
pode ser um distúrbio de base neurológica, no qual o cérebro encontre
dificuldades para controlar os movimentos automáticos da fala espontânea, na
idade infantil. As lesões cerebrais em consequência da hipoxia, prematuridade
ou traumatismo craniano, também podem ser consideradas causas, associadas
ou não à herança genética.
Este transtorno na comunicação pode estar associado a um atraso geral
do desenvolvimento e a deficits cognitivos. Por outro lado, e não de menos
importância, surge-nos a deficiência auditiva, pode surgir como causa de maior
ou menor gravidade no desenvolvimento da linguagem, sendo também
pertinente o momento em que esta deficiência surja, ou seja, diagnosticada e
com que intensidade.
É facto, que a surdez adquirida após o processo inicial da aprendizagem
da linguagem oral causa menos transtorno sobre o desenvolvimento da fala,
aquisição de vocabulário e estrutura linguística, do que uma surdez adquirida
na fase pré-verbal.
Relativamente, ao desenvolvimento afectivo e social, podemos afirmar
que são factores fundamentais que estão associados a todos os anteriormente
enumerados, é fundamental o indivíduo estar inserido num meio ambiente de
harmonia de afectos e estímulos (a começar pelo familiar), pois a gaguez anda
sem dúvida associada a situação de pressão social, a acontecimentos
geradores de stress e ansiedade, principalmente os que exigem comunicação.
Quando a afectividade é pobre existem traumas de infância associados,
certamente que a criança sofrerá de uma profunda e dolorosa insegurança
emocional, que poderá acompanhá-la, até à fase adulta e até acentuar o seu
problema de gaguez.
Consequências da gaguez
A gaguez ou dislalia, é uma dificuldade em falar, em comunicar, esta
perturbação da comunicação afecta o bem-estar bio psicossocial do indivíduo.
As consequências desta perturbação são várias e podem surgir
associados a comportamentos motores, tais como, o piscar de olhos, tiques,
tremores dos lábios ou da face, extensões bruscas da cabeça, movimentos
respiratórios irregulares, ou até fechar os pulsos no acto de fala, estes sinais
são muito visíveis e podem afectar psicologicamente a criança ou o indivíduo,
inibindo até o seu convívio social.
O rendimento escolar, laboral e social intensifica-se de forma negativa,
em situações de grande pressão social, ou seja, sempre que existam ou surjam
acontecimentos com um elevado nível de stress ou ansiedade, esta
perturbação da fala será também ela intensificada.
Como já vimos anteriormente, o rendimento escolar de uma criança
gaga estará em risco, pois esta perturbação irá certamente comprometer o
processo de ensino-aprendizagem, gerando dificuldades e consequentemente
o insucesso escolar, senão devidamente acompanhado.
A criança que tropeça nas sílabas, como já foi referido, apresentando
dificuldade em verbalizar certas palavras, prejudicando a fluidez do seu
discurso, levará à interferência no seu rendimento escolar, o que poderá
acentuar o seu problema de gaguez, pois é na escola que existem o maiores e
mais frequentes momentos de interacção com os demais alunos e educador
(es). A criança é mais solicitada a responder, em situação de sala de aula ou
outra, estará mais exposta, mais vulnerável. A criança poderá sentir-se
pressionada e a gaguez tornar-se-á então mais evidente, podendo até ser alvo
da chacota dos demais.
O sentimento de insegurança surge e, a criança com medo de falar irá
gaguejar mais, comprometendo, assim, a sua auto-estima. O sono perturbado
e a enurese surgem, a onicofagia (roer as unhas desenfreadamente)
manifesta-se e qualquer situação tensa, aumentará estes sintomas
conjuntamente com a gaguez. O isolamento surge muitas vezes neste contexto
e nesta fase da vida.
Se a gaguez persistir na fase adulta, irá certamente comprometer os
seus relacionamentos sociais e profissionais quer qualitativamente, quer
quantitativamente.
Constata-se que muitos gagos apresentam percepções e sentimentos
negativos relacionados com a gaguez e com eles mesmo, a vergonha, a
frustração, a culpa, a baixa auto-estima e, o sentimento de inutilidade são
alguns exemplos com os quais eles se debatem diariamente e contra os quais
lutam numa sobrevivência desigual.
A importância que o gago atribui a determinada circunstância, situação
ou cenário potência a frequência da gaguez, daí que muitas vezes como forma
de se protegerem evitem socialmente estar em situação de destaque ou
protagonismo. Recorrendo inteligentemente muitas vezes a cenas
camuflatórias, exemplo disso é o uso de vocábulos sinónimos.
Este possível insucesso poderá numa fase adulta comprometer, por sua
vez a escolha e até a promoção profissional. Sentimentos de frustração e de
baixa auto-estima, ou a vivência de experiências traumatizantes poderão
produzir alterações profundas nos comportamentos sociais, levando mesmo a
grande isolamento.
É facto que muitos indivíduos, na tentativa de evitar gagueja, e do
esforço excessivo que é protagonizado quer mentalmente, quer fisicamente,
nesse sentido desencadeia vários sintomas contrários, que leva a uma fala
repleta de falhas de ritmo, pausas silenciosas, frases incompletas, alterações
na sincronização entre a respiração e a produção da fala.
A dislalia ou gaguez está assim, associada à crispação ao nível dos
lábios, da língua, da laringe e até do peito. As manifestações tais como,
palidez, transpiração excessiva, rubor intenso e tremores são frequentemente e
deverão ser tratados logo que possível, dado que no caso de uma criança terá
mais possibilidade de se curar do que um adolescente ou até mesmo um
adulto.
O que podemos fazer?
A dislalia ou gaguez traz instabilidade, turbulência, irritabilidade, falta de
confiança em si e nas suas potencialidades.
A ansiedade está muito presente e os distúrbios somáticos a ele
associados também.
A questão é o que oferecer a este ser “hiper-emotivo”?
As investigações afirmam que aproximadamente 80% dos gagos
recuperam espontaneamente antes dos dezasseis anos de idade. No entanto,
os restantes 20% podem receber um acompanhamento psicológico se o
necessitarem para conhecerem alguns métodos de controlo da gaguez ou para
trabalharem algum aspecto emocional que esteja associado a esta
perturbação, tais como já referimos anteriormente (baixa auto-estima,
dificuldades de sociabilização, perturbações comportamentais, entre outras).
Há quem defenda que esta perturbação da fala, pode ser tratada em
escolas especializadas com métodos especializados extraídos da psicologia
comportamental (behaviorismo) e da psicologia das profundidades. Por outro
lado é também amplamente defendido, que a aplicação da Terapia da Fala e
suas técnicas melhora substancialmente as manifestações da fala do indivíduo;
tais como (o canto, representações teatrais) estas terapias terão um alto valor
curativo e de libertação de tensões a todos os níveis.
A prática de exercícios respiratórios, é outra recomendação efectiva
(treinos respiratórios lentos e controlados e combinados com movimentos
coordenados.
O diagnóstico e a intervenção fonoaudiológicas são fundamentais para o
sucesso terapêutico, visto que a criança apresenta condições mais favoráveis
para a aprendizagem de novas competências, entre elas, a fluência,
nomeadamente nos anos pré-escolares.
A participação dos familiares e professores é fundamental nesta fase da
vida da criança, pois ela imitará os modelos de fala a que estiver exposta, daí a
importância destes intervenientes na gaguez infantil, para além da terapia
fonoaudiológica. A Intervenção Precoce neste domínio adquire um contorno
fundamental porque em alguns casos, resultados positivos são frequentes num
período curto de tempo, que de outra forma, se negligenciada na idade pré-
escolar poderá tornar-se numa gaguez persistente.
Então podemos dizer, que o trabalho integrado com a família é
fundamental, visto esta ter o principal papel de interlocução com a criança no
acto de comunicar.
Assim sendo neste microsistema íntimo e próximo da criança, a fala
tornar-se-á tanto mais fluente, se quem interage com ela, tiver uma postura
facilitadora ou não. O trabalho conjunto do terapeuta com a família poderá
propiciar resultados mais positivos, sendo que, haverá trabalho de continuidade
da fluência do discurso, trabalhado e adquirido na terapia para o lar. Ou seja, é
fundamental que sejam dadas orientações específicas aos familiares que vivam
com a criança, para que possam ter e transmitir um modelo de fala, o mais
adequado possível à fluência trabalhada pelo técnico.
É por isso fundamental, que saibam “como fazer” e “o que fazer” perante
um quadro de gaguez.
Há, assim, vários objectivos a trabalhar com a família, destacando-se em
primeiro lugar a compreensão e sensibilização desta problemática junto dela.
Por outro lado, há que fazer a distinção entre as “disfluências” comuns e as
“disfluências” que levam à gaguez. A identificação de factores causadores da
interrupção da fala da criança e como minimizá-los; a valorização da qualidade
das interacções diárias com a criança revela-se primordial. Não menos
importante, é saber operacionalizar modelos de comunicação que facilitem os
actos de fala (fala mais lenta, fácil e relaxada, aumentar o tempo das pausas
nas conversações, promover momentos de silêncio para escutar).
A criança deverá seguir “o novo” modelo de fala, de forma natural, quer
na terapia, quer no seu lar, o que levará progressivamente a sentir maior
segurança, nesta uniformização de métodos.
Nesta intervenção, a família deve ser alertada, instruída para que haja
uma efectiva diminuição do facto “ansiedade”, devendo esta aprender como
contornar as chamadas palavras “problemáticas”, evitando a sua pronunciação,
aprender a falar mais pausadamente, e também exercícios respiratórios
favoráveis ao relaxamento. Esta não deverá dizer à criança para não ter medo
de falar, para ficar calma ou para respirar antes de falar, pois tais conselhos só
servirão para agudizar a sua ansiedade. Deve também, estar atenta na criação
e manutenção de rotinas, ou seja, nos horários para comer, para dormir, para ir
para a escola, pois podem parecer questões de menor importância, mas que
na realidade assumem grande relevância, se pensarmos que alterações de
rotinas podem criar ou aumentar o estado de ansiedade numa criança gaga.
Neste âmbito é de todo relevante evitar discutir na frente dela e deve-se
valorizar o que ela diz, “ouvindo-a” realmente e dando-lhe a devida atenção e
paciência. Esta atitude positiva, melhorará a auto-estima da criança, deve-se
por isso elogiá-la sempre que possível. Deve-se transformar os momentos de
diálogo com a criança em momentos agradáveis, fazendo uso sempre que
desejável do reforço positivo.
O sucesso da aquisição de novas competências dependem também da
complexidade crescente dos actos de fala a praticar, pois assim, serão
facilitadores no desenvolvimento deste processo.
É primente, ajudar a criança a munir-se de estratégias de defesa perante
factores e situações que contribuam para a sua “disfluência”. Levar a criança
progressivamente a desvalorizar esta situação, aumentando-lhe competências
de discurso de forma adaptativa a diversas situações de comunicação, nos
seus actos de fala, é prioritário.
Claro que o relacionamento positivo entre estes intervenientes, será
fonte de uma sociabilização efectiva e facilitada, quer no seu presente, quer no
seu futuro.
Gisela “era triste, sozinha e diferente”
As crianças têm uma visão do mundo muito particular, mais genuína e
muitas vezes as decisões que tomam relativamente ao seu comportamento,
têm por base a forma como se vêm, quer na relação que mantêm com os
outros quer relativamente à forma como acreditam que são vistas.
É muito importante para elas acreditarem e sentirem que são
especialmente queridas, e que têm valor, sobretudo no seu meio familiar. A
comunicação é por excelência o meio de vínculo que serve uma criança e que
a ajuda na sua integração e sociabilização, não só no seu microsistema como
noutras relações de âmbito mais lato.
A Gisela uma menina que sentiu necessidade de pedir apoio à médica
de família porque gaguejava e sobretudo porque se sentia privada de alegria,
num penoso processo de gaguez que surgiu aos quatro anos e se foi
acentuando com o passar do tempo. “A gaguez é mais do que tudo um sintoma
que traduz um conflito intrapsíquico, o qual sem ser exprimido fica no fundo da
garganta com as palavras que não conseguem sair”. Através desta afirmação,
a psicanalista Nicole Fabre, demonstra bem o quanto a expressão de um
problema inconsciente e recalcado pode penalizar a vida de um ser sensível,
como o é, especialmente uma criança.
A Gisela tem todo um microsistema que favorece o surgimento e a
permanência desta perturbação da linguagem, visto que, existem vários
factores associados em seu redor tidos como causadores. Nomeadamente, o
factor biológico e hereditário da gaguez do pai e do irmão, e o factor
psicológico, na sua relação afectiva com a mãe.
Ana Maria Martinez, afirma que “o desenvolvimento da linguagem é
melhor nas meninas, pois elas começam a falar mais cedo”, no caso da Gisela
apesar de ter iniciado a fala correctamente o meio envolvente desta menina,
resultou de forma negativa para o seu desenvolvimento linguístico, acabando
por desencadear uma gaguez que persistiu.
Gisela sente-se desigual e só. O castigo, o bater, o ralhar contribuíram
fortemente para a sua insegurança, provavelmente começou a gaguejar com
medo da sua enurese nocturna, que por si só, já é factor que se não
controlada, é geradora de stress. Numa situação tensa, o medo aumenta, o
sono é perturbado e a enurese surge, no caso da Gisela também como
experiência negativa e traumática provocada pelo comportamento negativo da
mãe que lhe reforça a insegurança, batendo-lhe.
Gisela, não foi aceite no seu meio familiar, nomeadamente pela mãe,
visto que esta não lhe proporcionou um ambiente positivo e acertivo para as
suas necessidades aquando da sua primeira infância.
Constata-se que Gisela só começa a gaguejar por volta dos 3/4 anos,
aquilo que poderia ter sido uma dificuldade normal neste processo de
aprendizagem dos actos de fala, se transformou numa gaguez persistente.
Gisela não só teve “enurese” nocturna, como fez controle de esfíncteres
muito tardiamente, a sua relação afectiva com a mãe é geradora de
desequilíbrio, stress, angústia, ansiedade e acentua as suas dificuldades.
Podemos afirmar que esta mãe, não só motivou a gaguez da filha, como
a acentuou desenvolvendo problemas do foro psicológico na mesma.
Mesmo não havendo consenso quanto a uma única causa na gaguez, e
sabendo que Gisela tem um potencial hereditário desta perturbação através do
pai e do irmão que devemos considerar importante e também potenciador no
aparecimento de sua gaguez, o comportamento da mãe é certamente o grande
impulsionador para que esta menina seja triste, só e “diferente”.
A própria Mãe assume que o facto da filha gaguejar tem como principal
causa a violência continuada que lhe infringiu. Gisela desenvolveu, assim,
sentimentos de baixa auto-estima, culpa, inferioridade, ansiedade, descontrole
nas suas necessidades biológicas primárias, e impotência perante a sua
qualidade de vida física e psíquica. Na Lei de Protecção de Crianças e Jovens
em Risco, Lei n.º 147/99 de 1 de Outubro, artigo 1.º, lê-se que “considera-se
que a criança ou jovem está em perigo quando se encontra, designadamente,
numa das seguintes situações: - está abandonada ou vive entregue a si própria
– sofre maus tratos físicos ou psíquicos”. Neste caso, claramente, Gisela, está
sujeita de forma directa a comportamentos que afectam o seu equilíbrio
emocional. É visível que o seio familiar é fonte de uma desarmonia onde a
agressividade é constante e as exigências à pequena Gisela, são exageradas,
provocando-lhe desadaptação, pressão e stress.
É notório que estando sujeita a uma afectividade pobre, esta menina
desencadeia e acentua os seus problemas de comunicação, e sofrendo de
insegurança emocional grave, a gaguez manifesta-se.
Reiterando a ideia de que a mãe teve um papel determinante na
actuação da filha, é a afirmação de que Gisela gaguejava mais em casa do que
com os amigos. O que poderia inibir um convívio social (a sua gaguez), foi
invertido, ou seja, que Gisela desenvolve maior insegurança junto da mãe, por
isso gagueja mais em casa.
O meio familiar não proporcionou a Gisela a crença de que era uma
criança desejada, nem lhe facultou o sentimento de auto-estima e auto-
confiança para crescer de forma saudável, quer fisicamente, quer
psiquicamente. Daí ter também resultado uma situação de asma e ansiedade,
apenas controlada pela medicação. Provavelmente, a própria ansiedade,
opressão, angústia e tensão interna a que foi sendo sujeita lhe desencadeou as
suas dificuldades na respiração (asma).
O respeito pelo seu ser foi dilacerado, e a responsabilidade de contribuir
para a resolução de um problema (enurese nocturna) foi ultrajada, resultando
numa situação hostil.
O acompanhamento psicológico para esta menina é fundamental, quer
para um controle da ansiedade, quer para minimizar as consequências
advindas da mesma. O terapeuta certamente que terá um papel
importantíssimo na sua vida, como promotor de uma auto-confiança perdida,
reforçando aquilo que Gisela sabe fazer de melhor, provavelmente nas
situações de fala, reforçar aquilo que diz e não a forma como o diz,
provavelmente associará outras técnicas (canto, recitação) por exemplo,
levando-a a realizar experiências positivas que lhe devolvam a alegria perdida,
e a confiança na sua capacidade de comunicar.
Aparentemente Gisela teve um desenvolvimento normal, mas pode de
alguma forma ter uma predisposição que influencie a parte neurológica,
motivada negativamente, como já referimos pelo ambiente familiar.
As terapias de relaxamento, também poderão ser um contributo positivo
para que a Gisela tenha desempenhos cada vez mais positivos e encontre na
sua caminhada sentimentos de aceitação dela própria e que a ajudem a
superar esta dificuldade no acto de falar.
A intervenção terapêutica na família seria, certamente, algo de muito
positivo, no desenvolvimento psicossocial, seria mais produtivo e efectivo.
Ensinar “o que fazer” e sobretudo “como fazer” para além do desbloquear de
emoções negativas da mãe, parece-nos algo de fundamental em todo este
processo.
Um processo que se quer de “ajuda mútua” na resolução de problemas
afectivos, claro que devidamente acompanhados, por especialistas e técnicos
com capacidade de orientação e intervenção funcional. Educar para uma
melhor interacção social, em primeiro lugar no seio familiar.
Todos os indivíduos anseiam por compreensão, aceitação e apreço
como seres humanos especiais, estas serão qualidades que de uma forma
encorajadora ajudará certamente a mudar “representações” negativas de si
próprios e dos outros, levando a sentimentos de pertença e a interacção sociais
positivas e desejáveis.
Conclusão
“Foi com amor e felicidade que ele foi mais educado”
John Denver
A partilha da felicidade entre adultos e crianças é aprender conceitos
como harmonia, cooperação, responsabilidade partilhada, respeito mútuo e
amor, na vida e nas suas relações. E ter a certeza de que aquilo que fazemos e
o modo como o fazemos determinam a nossa qualidade de vida. A história da
Gisela e da criança canadiana retratam-no bem. Gisela é uma menina sofrida
pelo ambiente familiar negativo e a criança canadiana que apesar de também
sofrer de gaguez era feliz porque a sua família e os seus amigos, eram o seu
suporte, o seu apoio e a sua perturbação da linguagem era facilmente
ultrapassável.
A forma como se cuida de quem se ama é determinante na resolução de
problemas físicos, psíquicos ou sociais.
“Um pouco de imperfeição não é assim tão mau
Um pouco de imperfeição não nos deve pôr tristes” (…)
(…) “Um pouco de imperfeição no sítio perfeito
pode fazer com que este mundo não tão perfeito
seja mais fácil de enfrentar
mais de nós poderíamos caminhar na direcção certa
se aprendêssemos a viver com um pouco de imperfeição” (…)
Kathy Schinski
Bibliografia
Correia, Luís de Miranda (1999). “Alunos com Necessidades Educativas
Especiais nas Classes Regulares”. Porto. Porto Editora
Correia, Luís de Miranda (2003). “Inclusão e Necessidades Educativas
Especiais”. Porto. Porto Editora
Silveira, Marina e Rodrigues Almeida (2005). “Caminhos para a Inclusão
Humana”. Edições Asa
Ministério do Trabalho e da Solidariedade (1999) “Guia de Legislação e
Recursos sobre Trabalho Infantil”.
Nelsen, Jane. (2002). “Disciplina Positiva”. Mc Graw Hill.
Strecht, Pedro (1999). “Precisa de ti” Perturbações psicossociais em
crianças e adolescentes. Lisboa: Assírio e Alvim
Artigos de pesquisa na Internet:
www.gagowebsite.com
www.paginasterra.com.br
www.cercifaf.org.pt
www.seegnal.pt
Material de apoio facultado pela Professora.

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A gaguez

  • 1. A Gaguez Trabalho realizado por: Ângela Enes Pereira Isabel Saraiva Barbosa Universidade Portucalense Porto, Portugal 2 Fevereiro 2008 Perturbações da Linguagem - Prof. Dr.ª Margarida Paiva
  • 2. “Acredita que mais tarde ou mais cedo alguma coisa verdadeira vai ter de ser feita por ti, mais que apenas manejar as aparências.” Streccht, P. (1999) pág. 177
  • 3. Índice Introdução ....................................................................................................... 4 Causas da gaguez .......................................................................................... 5 Consequências da gaguez .............................................................................. 7 O que podemos fazer? .................................................................................... 9 Gisela era triste sozinha e “diferente” .............................................................. 12 Conclusão ....................................................................................................... 16 Bibliografia ....................................................................................................... 17
  • 4. Introdução É nas reuniões de família que é dada às crianças a aos adultos, a oportunidade, a possibilidade de conjuntamente, num “tom” de aprendizagem ou de brincadeiras, praticar e desenvolver muitas competências de comunicação, verbais ou não verbais e resolver muitos desafios, muitos problemas. É aqui, que de forma privilegiada e única as crianças encontrarão os seus primeiros modelos, as “referências” para uma inserção na vida social. Neste trabalho, específico sobre a gaguez iremos demonstrar, sobretudo a importância do meio familiar como fonte de uma sociabilização mais ou menos positiva numa criança que sofra desta perturbação da linguagem. Outros factores como a hereditariedade, a questão psicológica e física serão abordados, na tentativa de explicar e perceber comportamentos e sentimentos de uma criança “presa” a algo que a impede de ser livre e espontânea, na comunicação e na inter-relação com os demais, uma perturbação da linguagem apelidada de “gaguez” que faz dela alguém diferente.
  • 5. Causas da gaguez Não há uma causa específica e nenhuma gaguez é absolutamente igual à outra, de acordo com vários autores a gaguez dá-se a partir das dificuldades de articulação normais, comuns a todas as crianças por volta dos três anos de idade, sendo que a maior parte das crianças atravessa esta fase sem problemas, mas em algumas esta dificuldade normal pode transformar-se em gaguez. As hesitações, as repetições e a demora na emissão das palavras, são algumas das suas manifestações, bem como, o prolongamento anormal dos sons. Cientistas alemães revelam ter descoberto que a gaguez permanente é provocada por uma disfunção no hemisfério esquerdo onde se interligam as estruturas cerebrais envolvidas no planeamento com a articulação do discurso. Como foi já foi referido, esta pode ter início entre os dois e os quatro anos e cerca de metade das crianças em que a gaguez persiste até aos cinco anos, quando adultos podem ainda gaguejar. A ocorrência de erros na articulação dos sons da fala, como omissão, substituição e distorção de fonemas, que não decorram de alterações neurológicas, mas sim de alterações funcionais, são considerados desvios anatómicos dos órgãos fonoarticulatórios. Alguns investigadores, concluem que a gaguez se deve a uma forma subtil de lesão cerebral, outros ainda consideram-na como um problema essencialmente psicológico. A hereditariedade também se inclui como uma das possíveis causas, pois é vulgar esta perturbação da linguagem surgir em pessoas cujas as famílias tenham casos de gaguez. Por exemplo, avós, pais ou irmãos, ou manifestar-se até em indivíduos que na fase da aquisição da linguagem sejam sujeitos ao convívio com pessoas gagas. Daí se poder concluir, da importância do meio para o surgimento desta perturbação da fala. Não havendo consenso quanto a uma causa única, a gaguez ou dislalia, pode ser um distúrbio de base neurológica, no qual o cérebro encontre dificuldades para controlar os movimentos automáticos da fala espontânea, na idade infantil. As lesões cerebrais em consequência da hipoxia, prematuridade
  • 6. ou traumatismo craniano, também podem ser consideradas causas, associadas ou não à herança genética. Este transtorno na comunicação pode estar associado a um atraso geral do desenvolvimento e a deficits cognitivos. Por outro lado, e não de menos importância, surge-nos a deficiência auditiva, pode surgir como causa de maior ou menor gravidade no desenvolvimento da linguagem, sendo também pertinente o momento em que esta deficiência surja, ou seja, diagnosticada e com que intensidade. É facto, que a surdez adquirida após o processo inicial da aprendizagem da linguagem oral causa menos transtorno sobre o desenvolvimento da fala, aquisição de vocabulário e estrutura linguística, do que uma surdez adquirida na fase pré-verbal. Relativamente, ao desenvolvimento afectivo e social, podemos afirmar que são factores fundamentais que estão associados a todos os anteriormente enumerados, é fundamental o indivíduo estar inserido num meio ambiente de harmonia de afectos e estímulos (a começar pelo familiar), pois a gaguez anda sem dúvida associada a situação de pressão social, a acontecimentos geradores de stress e ansiedade, principalmente os que exigem comunicação. Quando a afectividade é pobre existem traumas de infância associados, certamente que a criança sofrerá de uma profunda e dolorosa insegurança emocional, que poderá acompanhá-la, até à fase adulta e até acentuar o seu problema de gaguez.
  • 7. Consequências da gaguez A gaguez ou dislalia, é uma dificuldade em falar, em comunicar, esta perturbação da comunicação afecta o bem-estar bio psicossocial do indivíduo. As consequências desta perturbação são várias e podem surgir associados a comportamentos motores, tais como, o piscar de olhos, tiques, tremores dos lábios ou da face, extensões bruscas da cabeça, movimentos respiratórios irregulares, ou até fechar os pulsos no acto de fala, estes sinais são muito visíveis e podem afectar psicologicamente a criança ou o indivíduo, inibindo até o seu convívio social. O rendimento escolar, laboral e social intensifica-se de forma negativa, em situações de grande pressão social, ou seja, sempre que existam ou surjam acontecimentos com um elevado nível de stress ou ansiedade, esta perturbação da fala será também ela intensificada. Como já vimos anteriormente, o rendimento escolar de uma criança gaga estará em risco, pois esta perturbação irá certamente comprometer o processo de ensino-aprendizagem, gerando dificuldades e consequentemente o insucesso escolar, senão devidamente acompanhado. A criança que tropeça nas sílabas, como já foi referido, apresentando dificuldade em verbalizar certas palavras, prejudicando a fluidez do seu discurso, levará à interferência no seu rendimento escolar, o que poderá acentuar o seu problema de gaguez, pois é na escola que existem o maiores e mais frequentes momentos de interacção com os demais alunos e educador (es). A criança é mais solicitada a responder, em situação de sala de aula ou outra, estará mais exposta, mais vulnerável. A criança poderá sentir-se pressionada e a gaguez tornar-se-á então mais evidente, podendo até ser alvo da chacota dos demais. O sentimento de insegurança surge e, a criança com medo de falar irá gaguejar mais, comprometendo, assim, a sua auto-estima. O sono perturbado e a enurese surgem, a onicofagia (roer as unhas desenfreadamente) manifesta-se e qualquer situação tensa, aumentará estes sintomas conjuntamente com a gaguez. O isolamento surge muitas vezes neste contexto e nesta fase da vida.
  • 8. Se a gaguez persistir na fase adulta, irá certamente comprometer os seus relacionamentos sociais e profissionais quer qualitativamente, quer quantitativamente. Constata-se que muitos gagos apresentam percepções e sentimentos negativos relacionados com a gaguez e com eles mesmo, a vergonha, a frustração, a culpa, a baixa auto-estima e, o sentimento de inutilidade são alguns exemplos com os quais eles se debatem diariamente e contra os quais lutam numa sobrevivência desigual. A importância que o gago atribui a determinada circunstância, situação ou cenário potência a frequência da gaguez, daí que muitas vezes como forma de se protegerem evitem socialmente estar em situação de destaque ou protagonismo. Recorrendo inteligentemente muitas vezes a cenas camuflatórias, exemplo disso é o uso de vocábulos sinónimos. Este possível insucesso poderá numa fase adulta comprometer, por sua vez a escolha e até a promoção profissional. Sentimentos de frustração e de baixa auto-estima, ou a vivência de experiências traumatizantes poderão produzir alterações profundas nos comportamentos sociais, levando mesmo a grande isolamento. É facto que muitos indivíduos, na tentativa de evitar gagueja, e do esforço excessivo que é protagonizado quer mentalmente, quer fisicamente, nesse sentido desencadeia vários sintomas contrários, que leva a uma fala repleta de falhas de ritmo, pausas silenciosas, frases incompletas, alterações na sincronização entre a respiração e a produção da fala. A dislalia ou gaguez está assim, associada à crispação ao nível dos lábios, da língua, da laringe e até do peito. As manifestações tais como, palidez, transpiração excessiva, rubor intenso e tremores são frequentemente e deverão ser tratados logo que possível, dado que no caso de uma criança terá mais possibilidade de se curar do que um adolescente ou até mesmo um adulto.
  • 9. O que podemos fazer? A dislalia ou gaguez traz instabilidade, turbulência, irritabilidade, falta de confiança em si e nas suas potencialidades. A ansiedade está muito presente e os distúrbios somáticos a ele associados também. A questão é o que oferecer a este ser “hiper-emotivo”? As investigações afirmam que aproximadamente 80% dos gagos recuperam espontaneamente antes dos dezasseis anos de idade. No entanto, os restantes 20% podem receber um acompanhamento psicológico se o necessitarem para conhecerem alguns métodos de controlo da gaguez ou para trabalharem algum aspecto emocional que esteja associado a esta perturbação, tais como já referimos anteriormente (baixa auto-estima, dificuldades de sociabilização, perturbações comportamentais, entre outras). Há quem defenda que esta perturbação da fala, pode ser tratada em escolas especializadas com métodos especializados extraídos da psicologia comportamental (behaviorismo) e da psicologia das profundidades. Por outro lado é também amplamente defendido, que a aplicação da Terapia da Fala e suas técnicas melhora substancialmente as manifestações da fala do indivíduo; tais como (o canto, representações teatrais) estas terapias terão um alto valor curativo e de libertação de tensões a todos os níveis. A prática de exercícios respiratórios, é outra recomendação efectiva (treinos respiratórios lentos e controlados e combinados com movimentos coordenados. O diagnóstico e a intervenção fonoaudiológicas são fundamentais para o sucesso terapêutico, visto que a criança apresenta condições mais favoráveis para a aprendizagem de novas competências, entre elas, a fluência, nomeadamente nos anos pré-escolares. A participação dos familiares e professores é fundamental nesta fase da vida da criança, pois ela imitará os modelos de fala a que estiver exposta, daí a importância destes intervenientes na gaguez infantil, para além da terapia fonoaudiológica. A Intervenção Precoce neste domínio adquire um contorno fundamental porque em alguns casos, resultados positivos são frequentes num
  • 10. período curto de tempo, que de outra forma, se negligenciada na idade pré- escolar poderá tornar-se numa gaguez persistente. Então podemos dizer, que o trabalho integrado com a família é fundamental, visto esta ter o principal papel de interlocução com a criança no acto de comunicar. Assim sendo neste microsistema íntimo e próximo da criança, a fala tornar-se-á tanto mais fluente, se quem interage com ela, tiver uma postura facilitadora ou não. O trabalho conjunto do terapeuta com a família poderá propiciar resultados mais positivos, sendo que, haverá trabalho de continuidade da fluência do discurso, trabalhado e adquirido na terapia para o lar. Ou seja, é fundamental que sejam dadas orientações específicas aos familiares que vivam com a criança, para que possam ter e transmitir um modelo de fala, o mais adequado possível à fluência trabalhada pelo técnico. É por isso fundamental, que saibam “como fazer” e “o que fazer” perante um quadro de gaguez. Há, assim, vários objectivos a trabalhar com a família, destacando-se em primeiro lugar a compreensão e sensibilização desta problemática junto dela. Por outro lado, há que fazer a distinção entre as “disfluências” comuns e as “disfluências” que levam à gaguez. A identificação de factores causadores da interrupção da fala da criança e como minimizá-los; a valorização da qualidade das interacções diárias com a criança revela-se primordial. Não menos importante, é saber operacionalizar modelos de comunicação que facilitem os actos de fala (fala mais lenta, fácil e relaxada, aumentar o tempo das pausas nas conversações, promover momentos de silêncio para escutar). A criança deverá seguir “o novo” modelo de fala, de forma natural, quer na terapia, quer no seu lar, o que levará progressivamente a sentir maior segurança, nesta uniformização de métodos. Nesta intervenção, a família deve ser alertada, instruída para que haja uma efectiva diminuição do facto “ansiedade”, devendo esta aprender como contornar as chamadas palavras “problemáticas”, evitando a sua pronunciação, aprender a falar mais pausadamente, e também exercícios respiratórios
  • 11. favoráveis ao relaxamento. Esta não deverá dizer à criança para não ter medo de falar, para ficar calma ou para respirar antes de falar, pois tais conselhos só servirão para agudizar a sua ansiedade. Deve também, estar atenta na criação e manutenção de rotinas, ou seja, nos horários para comer, para dormir, para ir para a escola, pois podem parecer questões de menor importância, mas que na realidade assumem grande relevância, se pensarmos que alterações de rotinas podem criar ou aumentar o estado de ansiedade numa criança gaga. Neste âmbito é de todo relevante evitar discutir na frente dela e deve-se valorizar o que ela diz, “ouvindo-a” realmente e dando-lhe a devida atenção e paciência. Esta atitude positiva, melhorará a auto-estima da criança, deve-se por isso elogiá-la sempre que possível. Deve-se transformar os momentos de diálogo com a criança em momentos agradáveis, fazendo uso sempre que desejável do reforço positivo. O sucesso da aquisição de novas competências dependem também da complexidade crescente dos actos de fala a praticar, pois assim, serão facilitadores no desenvolvimento deste processo. É primente, ajudar a criança a munir-se de estratégias de defesa perante factores e situações que contribuam para a sua “disfluência”. Levar a criança progressivamente a desvalorizar esta situação, aumentando-lhe competências de discurso de forma adaptativa a diversas situações de comunicação, nos seus actos de fala, é prioritário. Claro que o relacionamento positivo entre estes intervenientes, será fonte de uma sociabilização efectiva e facilitada, quer no seu presente, quer no seu futuro.
  • 12. Gisela “era triste, sozinha e diferente” As crianças têm uma visão do mundo muito particular, mais genuína e muitas vezes as decisões que tomam relativamente ao seu comportamento, têm por base a forma como se vêm, quer na relação que mantêm com os outros quer relativamente à forma como acreditam que são vistas. É muito importante para elas acreditarem e sentirem que são especialmente queridas, e que têm valor, sobretudo no seu meio familiar. A comunicação é por excelência o meio de vínculo que serve uma criança e que a ajuda na sua integração e sociabilização, não só no seu microsistema como noutras relações de âmbito mais lato. A Gisela uma menina que sentiu necessidade de pedir apoio à médica de família porque gaguejava e sobretudo porque se sentia privada de alegria, num penoso processo de gaguez que surgiu aos quatro anos e se foi acentuando com o passar do tempo. “A gaguez é mais do que tudo um sintoma que traduz um conflito intrapsíquico, o qual sem ser exprimido fica no fundo da garganta com as palavras que não conseguem sair”. Através desta afirmação, a psicanalista Nicole Fabre, demonstra bem o quanto a expressão de um problema inconsciente e recalcado pode penalizar a vida de um ser sensível, como o é, especialmente uma criança. A Gisela tem todo um microsistema que favorece o surgimento e a permanência desta perturbação da linguagem, visto que, existem vários factores associados em seu redor tidos como causadores. Nomeadamente, o factor biológico e hereditário da gaguez do pai e do irmão, e o factor psicológico, na sua relação afectiva com a mãe. Ana Maria Martinez, afirma que “o desenvolvimento da linguagem é melhor nas meninas, pois elas começam a falar mais cedo”, no caso da Gisela apesar de ter iniciado a fala correctamente o meio envolvente desta menina, resultou de forma negativa para o seu desenvolvimento linguístico, acabando por desencadear uma gaguez que persistiu. Gisela sente-se desigual e só. O castigo, o bater, o ralhar contribuíram fortemente para a sua insegurança, provavelmente começou a gaguejar com medo da sua enurese nocturna, que por si só, já é factor que se não controlada, é geradora de stress. Numa situação tensa, o medo aumenta, o
  • 13. sono é perturbado e a enurese surge, no caso da Gisela também como experiência negativa e traumática provocada pelo comportamento negativo da mãe que lhe reforça a insegurança, batendo-lhe. Gisela, não foi aceite no seu meio familiar, nomeadamente pela mãe, visto que esta não lhe proporcionou um ambiente positivo e acertivo para as suas necessidades aquando da sua primeira infância. Constata-se que Gisela só começa a gaguejar por volta dos 3/4 anos, aquilo que poderia ter sido uma dificuldade normal neste processo de aprendizagem dos actos de fala, se transformou numa gaguez persistente. Gisela não só teve “enurese” nocturna, como fez controle de esfíncteres muito tardiamente, a sua relação afectiva com a mãe é geradora de desequilíbrio, stress, angústia, ansiedade e acentua as suas dificuldades. Podemos afirmar que esta mãe, não só motivou a gaguez da filha, como a acentuou desenvolvendo problemas do foro psicológico na mesma. Mesmo não havendo consenso quanto a uma única causa na gaguez, e sabendo que Gisela tem um potencial hereditário desta perturbação através do pai e do irmão que devemos considerar importante e também potenciador no aparecimento de sua gaguez, o comportamento da mãe é certamente o grande impulsionador para que esta menina seja triste, só e “diferente”. A própria Mãe assume que o facto da filha gaguejar tem como principal causa a violência continuada que lhe infringiu. Gisela desenvolveu, assim, sentimentos de baixa auto-estima, culpa, inferioridade, ansiedade, descontrole nas suas necessidades biológicas primárias, e impotência perante a sua qualidade de vida física e psíquica. Na Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Risco, Lei n.º 147/99 de 1 de Outubro, artigo 1.º, lê-se que “considera-se que a criança ou jovem está em perigo quando se encontra, designadamente, numa das seguintes situações: - está abandonada ou vive entregue a si própria – sofre maus tratos físicos ou psíquicos”. Neste caso, claramente, Gisela, está sujeita de forma directa a comportamentos que afectam o seu equilíbrio emocional. É visível que o seio familiar é fonte de uma desarmonia onde a agressividade é constante e as exigências à pequena Gisela, são exageradas, provocando-lhe desadaptação, pressão e stress.
  • 14. É notório que estando sujeita a uma afectividade pobre, esta menina desencadeia e acentua os seus problemas de comunicação, e sofrendo de insegurança emocional grave, a gaguez manifesta-se. Reiterando a ideia de que a mãe teve um papel determinante na actuação da filha, é a afirmação de que Gisela gaguejava mais em casa do que com os amigos. O que poderia inibir um convívio social (a sua gaguez), foi invertido, ou seja, que Gisela desenvolve maior insegurança junto da mãe, por isso gagueja mais em casa. O meio familiar não proporcionou a Gisela a crença de que era uma criança desejada, nem lhe facultou o sentimento de auto-estima e auto- confiança para crescer de forma saudável, quer fisicamente, quer psiquicamente. Daí ter também resultado uma situação de asma e ansiedade, apenas controlada pela medicação. Provavelmente, a própria ansiedade, opressão, angústia e tensão interna a que foi sendo sujeita lhe desencadeou as suas dificuldades na respiração (asma). O respeito pelo seu ser foi dilacerado, e a responsabilidade de contribuir para a resolução de um problema (enurese nocturna) foi ultrajada, resultando numa situação hostil. O acompanhamento psicológico para esta menina é fundamental, quer para um controle da ansiedade, quer para minimizar as consequências advindas da mesma. O terapeuta certamente que terá um papel importantíssimo na sua vida, como promotor de uma auto-confiança perdida, reforçando aquilo que Gisela sabe fazer de melhor, provavelmente nas situações de fala, reforçar aquilo que diz e não a forma como o diz, provavelmente associará outras técnicas (canto, recitação) por exemplo, levando-a a realizar experiências positivas que lhe devolvam a alegria perdida, e a confiança na sua capacidade de comunicar. Aparentemente Gisela teve um desenvolvimento normal, mas pode de alguma forma ter uma predisposição que influencie a parte neurológica, motivada negativamente, como já referimos pelo ambiente familiar. As terapias de relaxamento, também poderão ser um contributo positivo para que a Gisela tenha desempenhos cada vez mais positivos e encontre na sua caminhada sentimentos de aceitação dela própria e que a ajudem a superar esta dificuldade no acto de falar.
  • 15. A intervenção terapêutica na família seria, certamente, algo de muito positivo, no desenvolvimento psicossocial, seria mais produtivo e efectivo. Ensinar “o que fazer” e sobretudo “como fazer” para além do desbloquear de emoções negativas da mãe, parece-nos algo de fundamental em todo este processo. Um processo que se quer de “ajuda mútua” na resolução de problemas afectivos, claro que devidamente acompanhados, por especialistas e técnicos com capacidade de orientação e intervenção funcional. Educar para uma melhor interacção social, em primeiro lugar no seio familiar. Todos os indivíduos anseiam por compreensão, aceitação e apreço como seres humanos especiais, estas serão qualidades que de uma forma encorajadora ajudará certamente a mudar “representações” negativas de si próprios e dos outros, levando a sentimentos de pertença e a interacção sociais positivas e desejáveis.
  • 16. Conclusão “Foi com amor e felicidade que ele foi mais educado” John Denver A partilha da felicidade entre adultos e crianças é aprender conceitos como harmonia, cooperação, responsabilidade partilhada, respeito mútuo e amor, na vida e nas suas relações. E ter a certeza de que aquilo que fazemos e o modo como o fazemos determinam a nossa qualidade de vida. A história da Gisela e da criança canadiana retratam-no bem. Gisela é uma menina sofrida pelo ambiente familiar negativo e a criança canadiana que apesar de também sofrer de gaguez era feliz porque a sua família e os seus amigos, eram o seu suporte, o seu apoio e a sua perturbação da linguagem era facilmente ultrapassável. A forma como se cuida de quem se ama é determinante na resolução de problemas físicos, psíquicos ou sociais. “Um pouco de imperfeição não é assim tão mau Um pouco de imperfeição não nos deve pôr tristes” (…) (…) “Um pouco de imperfeição no sítio perfeito pode fazer com que este mundo não tão perfeito seja mais fácil de enfrentar mais de nós poderíamos caminhar na direcção certa se aprendêssemos a viver com um pouco de imperfeição” (…) Kathy Schinski
  • 17. Bibliografia Correia, Luís de Miranda (1999). “Alunos com Necessidades Educativas Especiais nas Classes Regulares”. Porto. Porto Editora Correia, Luís de Miranda (2003). “Inclusão e Necessidades Educativas Especiais”. Porto. Porto Editora Silveira, Marina e Rodrigues Almeida (2005). “Caminhos para a Inclusão Humana”. Edições Asa Ministério do Trabalho e da Solidariedade (1999) “Guia de Legislação e Recursos sobre Trabalho Infantil”. Nelsen, Jane. (2002). “Disciplina Positiva”. Mc Graw Hill. Strecht, Pedro (1999). “Precisa de ti” Perturbações psicossociais em crianças e adolescentes. Lisboa: Assírio e Alvim Artigos de pesquisa na Internet: www.gagowebsite.com www.paginasterra.com.br www.cercifaf.org.pt www.seegnal.pt Material de apoio facultado pela Professora.