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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA – CENTRO DE EDUCAÇÃO
DEPARTAMENTO DE FUNDAMENTOS DA EDUCAÇÃO
PROFESSORA – ANDRÉA FORGIARINI CECHIN


OS NEUFREUDIANOS E O DESENVOLVIMENTO HUMANO

              Muitos foram os seguidores de Freud e de suas idéias, alguns se mantiveram fiéis à 
teoria por ele proposta, mais ortodoxa, outros discordavam deste ideário em alguns pontos básicos, 
contestando algumas idéias do mestre. A literatura conta que, independente do grau de intimidade 
que estas pessoas tinham com Freud, este rompia drasticamente as relações com quem ousava 
contestá­lo. Um exemplo muito conhecido disto, foi o rompimento com Carl Jun, amigo pessoal ao 
qual Freud considerava como herdeiro do movimento psicanalítico e futuro defensor de suas idéias.
              Esses analistas que romperam com a psicanálise ortodoxa, passaram a ser conhecidos 
como   neofreudianos.   Os  maiores   pontos   de   discordância  entre   partidários   da   corrente 
neofreudiana e de Freud são os seguintes:


              a) No ponto de vista freudiano, o ego está eternamente condicionado às exigências 
                  do id. Na perspectiva neofreudiana o ego aparece com liberdade maior, podendo 
                  realizar suas funções sem a dependência extrema do id.
              b) A psicanálise ortodoxa enfatiza que as forças biológicas têm grande influência 
                  sobre a personalidade, enquanto que os neofreudianos não atribuem tanto ênfase 
                  aos   aspectos   biológicos   mas,   outrossim,   destacam   a   influências   dos   aspectos 
                  sociais e culturais.
              c) Ao  contrário   de   Freud,   que   superestima   a   questão   da   sexualidade   infantil,   os 
                  neofreudianos acreditam que o desenvolvimento da personalidade é determinado 
                  muito mais por forças psicossociais do que por forças psicossexuais e minimizam 
                  a importância do complexo de Édipo. Para os neofreudianos, as interações sociais 
                  desempenham   um   papel   mais   importante   na   infância   do   que   as   interações 
                  sexuais, sejam elas reais ou imaginárias.


              Segundo SCHULTZ & SCHULTZ (1996), a mudança no espírito intelectual do início 
do século, pode ter influenciado a contestação das idéias freudianas por muitos de seus seguidores. 
Estes autores afirmam que
À medida que os antropólogos publicavam seus estudos sobre diferentes culturas, 
                   ia ficando claro que alguns sintomas neuróticos e tabus presentes nas hipóteses 
                   freudianas não eram, ao contrário do que ele pensara, universais. Por exemplo, não 
                   existem tabus contra o incesto em todas as sociedades. Além disso, sociólogos e 
                   psicólogos sociais tinham descoverto que grande parte do comportamento humano 
                   parecia vir antes do condicionamento social do que de quaisquer tentativas de 
                   satisfazer necessidades biológicas. (p. 366)


               Entre   os   diversos   estudiosos   integrantes   da   corrente   neofreudiana   (dissidentes   ou 
descendentes),  podemos  destacar  os  seguintes:  Carl Jung, Anna Freud, Alfred  Adler, Karen 
Horney   e   Erik   Erikson.  Devido   à   impossibilidade   de   nos   determos   aqui   numa   explanação 
minuciosa do ideário de cada um desses estudiosos, procuraremos abordar, suscintamente, os pontos 
de divergência destes autores com a psicanálise freudiana.


2.1 ­ CARL JUNG (1875 – 1961) ­  Um dos pontos fundamentais de divergência entre Jung e Freud 
vincula­se com a questão da  natureza da libido. Ao contrário de Freud que a define em termos 
predominantemente sexuais, Jung a considera uma energia vital generalizada – da qual o sexo é 
apenas uma parte – que o indivíduo emprega num momento particular. Schultz & Schultz (1996), 
ilustram bem esta afirmação
                   Para Jung, entre os três e os cinco anos de vida, que ele denominava fase pré­
                   sexual, a energia libidinal serve às funções de nutrição e de crescimento e não tem 
                   nenhuma das nuanças sexuais da concepção freudiana desses primeiros anos. (p. 
                   362)


                Jung   também  rejeita   a   idéia   do   complexo   de   Édipo  porposta   por   Freud,   por 
acreditar que o apego da criança à mãe tem a ver com uma necessidade de dependência com todas 
as satisfações associadas à função materna de prover alimento.
                Outra diferença marcante entre as teorias desses autores, é o fato de que, para Freud, 
as pessoas são vítimas dos eventos sofridos na infância, enquanto que para Jung, o ser humano é 
moldado tanto por suas metas, anseios e aspirações em relação ao futuro como pelos eventos 
do passado.
                Quanto   aos   estágios   do   desenvolvimento,  Jung   acreditava   que   a   fase   mais 
importante  não era a infância,    como afirmava Freud,  mas a meia­idade,  época em que  ele 
próprio teve uma crise de identidade.
                Pode­se   dizer,   ainda,   que  Jung   enfatizava   mais   o   inconsciente   do   que   Freud. 
Preocupava­se   mais   em   mergulhar   na   mente   inconsciente,   incluindo­lhe,   inclusive,   uma   nova 
dimensão,    o   inconsciente   coletivo.  Este   último   refere­se   às   experiências   herdadas   dos   seres 
humanos como espécie e dos seus ancestrais.


2.2 ­ ANNA FREUD (1895 – 1982) ­  Filha caçula de Freud, médica de formação e psicoterapeuta 
por definição, tal como fora seu pai. Colaborou de forma substancial com a revisão da posição 
teórica ortodoxa do pai, ampliando o papel do ego em seu funcionamento independente do id.
                Em sua obra intitulada “O ego e os mecanismos de defesa” (1936), ela desenvolveu e 
esclareceu as concepções freudianas sobre o uso dos mecanismos de defesa para proteger o ego 
da   ansiedade.    Anna   sublinha   que   tais   mecanismos   decorrem   de   um   considerável   grau   de 
ansiedade, podendo (se elaborados adequadamente) serem considerados normais, até certo ponto, 
dependendo, sobretudo, da sua freqüência e intensidade.
                Coube ainda a Anna Freud o mérito de estudar e interpretar os efeitos, geralmente 
desfavoráveis, de um ambiente capaz de alterar o fluxo de normalidade do desenvolvimento, 
tal como o ambiente de conflito bélico. Também as relações entre crianças e seus pais, incluídas aí 
as influências externas, foram consideradas por ela como relevantes e até mesmo decisivas para o 
êxito do desenvolvimento em pautas de normalidade.
                Sua teoria das relações objetais também aparece como uma tentativa de modificar a 
psicanálise ortodoxa, já que Anna Freud estuda a intensa relação emocional que se desenvolve entre 
o bebê e a mãe, mais em termos cognitivos e afetivos do que em termos exclusivamente sexuais.
                Uma   outra   diferença   presente   entre   seus   estudos   e   os   do   seu   pai   é   que   Anna 
desenvolveu   sua   teoria   através   da   observação   direta   de   bebês   e   não   pedindo   que   adultos 
reconstruíssem suas primeiras experiências infantis, como Freud fazia.


2.3   ­   ALFRED   ADLER   (1870   –   1937)   ­    Este   autor   desenvolveu   uma   teoria     que   difere   da 
psicanálise freudiana em muitos aspectos, especialmente no que se refere à ênfase à influência dos 
fatores sexuais no desenvolvimento humano.
                Adler desenvolveu seu sistema de psicologia individual ao longo de linhas sociais. 
Sua   teoria   defende   que  a   personalidade   só   pode   ser   compreendida   se   investigarmos   os 
relacionamentos sociais   e as atitudes que a pessoa tem para com os outros. Segundo Schultz & 
Schultz (1996), Adler “propôs que esse interesse social, que pode ser definido como um potencial 
inato para cooperar com os outros a fim de alcançar alvos pessoais e societais, se desenvolve na 
infância por meio de experiências de aprendizagem.” (p. 369)
Ao contrário de Freud, que atribui muitos comportamentos à desejos inconscientes, 
Adler acentua a importância dos determinantes conscientes do comportamento.  Para ele, os 
seres humanos têm consciência de suas motivações.
                Outra divergência é o fato de que, enquanto para Freud o comportamento humano é 
determinado por experiências passadas, para Adler são as expectativas em relação ao futuro que 
mais influenciam. “Esforçar­se por atingir metas ou antecipar futuros eventos são elementos capazes 
de afetar o nosso comportamento presente.”  (Schultz & Schultz, 1996, p. 369)
                Adler discorda de Freud de que o sexo é o impulso dominante do comportamento. 
Segundo   ele,   o   comportamento   humano   é   determinado   por   um   sentimento   generalizado   de 
inferioridade que o impele a lutar por superioridade e perfeição. Acredita ainda que “a incapacidade 
de compensar adequadamente os sentimentos de inferioridade pode ocasionar o desenvolvimento de 
um  complexo de inferioridade, que torna a pessoa incapaz de lidar com os problemas da vida.” 
(Schultz & Schultz, 1996, p. 370)
                O conceito de  poder criativo pode ser considerado como a base para toda a teoria 
adleriana:


                    Esse   poder   criativo   representa   um   princípio   ativo   da   existência   humana 
                    comparável   à   noção   de   alma.   Certas   capacidades   e   experiências   nos   vêm   por 
                    hereditariedade e pelo ambiente, mas é o modo como usamos e interpretamos 
                    essas experiências que nos   fornece a base da nossa atitude diante da vida. Isso 
                    significa   que   estamos   concientemente   envolvidos   no   processo   de   dar   forma   à 
                    nossa personalidade e ao nosso destino. (Schultz & Schultz, 1996, p. 370)


2.4 ­ KAREN HORNEY (1885 – 1952) – Uma das primeiras feministas, foi treinada na psicanálise 
freudiana em Berlim e descreveu sua obra como uma modificação e extensão do sistema de Freud e 
não como um esforço m superá­lo.
                A   teoria   de   Horney  discorda   de   Freud   quanto   ao   fato   de   a   personalidade 
depender   de   forças   biológicas   imutáveis.  Ela   nega   a   posição   destacada   dos   fatores   sexuais, 
contesta a validade da teoria edipiana e descarta os conceitos de libido e da estrutura freudiana da 
personalidade. 
                Se opõe veementemente à idéia de Freud de que a mulher é motivada pela inveja do 
pênis e afirmou que os homens é que são motivados pela  inveja do útero,    afirmando que eles 
invejam a capacidade feminina de gerar filhos. Karen Horney acredita que esta inveja do útero e o 
conseqüente   ressentimento   se   manifestam   inconsciente   no   homem   através   de   comportamentos 
voltados a depreciar ou diminuir as mulheres.
Em   lugar   dos   instintos   freudianos   como   as   principais   forças   motivadoras   do 
comportamento,   Horney   acredita   que   a   força   propulsora   do   comportamento   humano   é   essa 
necessidade de segurança, de proteção e de libertação do medo que o bebê impotente busca no 
mundo exterior (ansiedade básica).
                 Karen Horney contesta a idéia de fases ou estágios propostos por Freud por acreditar 
que nada no desenvolvimento pode ser visto como universal, e que, pelo contrário, tudo depende de 
fatores culturais, sociais e ambientais.


2.5 ­ ERIK ERIKSON (1902 – 1994) – Erik Erikson foi treinado em psicanálise por Anna Freud. 
Ampliou a questão dos estágios do desenvolvimento, afirmou que a personalidade continua a 
se desenvolver ao longo da vida e reconheceu o impacto de forças sociais, históricas e culturais 
sobre a personalidade.
                 Erikson preocupou­se, principalmente, com o modelo social do desenvolvimento do 
ego   ao  longo  da vida humana. Para ele, a identidade é um processo, em constante mudança  e 
desenvolvimento,   que   é   determinado   pelo   histórico   do   indivíduo   e   intimamente   relacionado   às 
mudanças sociais. Erikson não isola a individualidade do seu contexto familiar e sócio­cultural, pois 
concebe o indivíduo como integrante deste amplo contexto, sem anular­se como pessoa.
                 Erikson estabelece que, a partir da fase neo­natal, cada indivíduo coloca­se entre dois 
extremos,   numa  crise   psicossocial,   e   se   sua   questão   de   equilíbrio   entre   os   extremos   não   for 
resolvida satisfatoriamente, todo fluxo do desenvolvimento posterior poderá estar comprometido de 
alguma forma. Concebe o desenvolvimento psicológico e social do indivíduo em  oito etapas, do 
nascimento à velhice, cada uma delas relacionadas a um evento importante da vida.
         CRISES 
    PSICOSSOCIAIS                 MODALIDADE                     EVENTO
      Confiança X 
   desconfiança básica             Oral­sensorial               alimentação
                                 (0 aos 18 meses)
Autonomia X vergonha e          Locomotora­genital
          dúvida                (18 meses – 3 anos)        Controle esfincteriano
                                Locomotora­genital              Locomoção
    Iniciativa X culpa              (3 – 6 anos)
     Produtividade X                  Latência
      inferioridade                 (6 – 12 anos)                  Escola
  Identidade X confusão 
         de papéis                  Adolescência          Relacionamento entre os 
                                                                   pares
Intimidade X isolamento                                  Relacionamento de amor
                                   Adulto jovem
     Geratividade X               Adulto médio ou 
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  Integridade do ego X                                    Reflexão e aceitação da 
        desespero                     Velhice                      vida


                 Schultz & Schultz (1996) afirmam que, para Erikson


                    Cada um desses estágios de crescimento, embora carregado de tensão o bastante 
                    para ser considerado uma crise, pode Ter desfecho positivo se for resolvido de 
                    maneira adaptativa. Além disso, a pessoa que fracassar em algum deles e ficar 
                    com uma forma desajustada de reagir, pode corrigir isso por meio da adaptação 
                    bem­sucedida num estágio ulterior. Há, pois, esperança para o futuro em todos os 
                    estágios do crescimento da personalidade. (p. 382)


                 Como se pode perceber, algumas concepções neofreudianas sobre o desenvolvimento 
tem   pouca   semelhança   com   a   psicanálise   ortodoxa   e   só   são   consideradas   psicanalíticas   por   se 
mostrarem distantes da tradição psicológica comportamentalista e compartilharem com Freud um 
enorme interesse pela compreensão da personalidade humana.
                 Pode­se afirmar que a teoria psicanalítica sofreu muito mais com as fragmentações 
do que a teoria comportamentalista. Apesar das mudanças atribuídas pelos neocomportamentalistas, 
“todos partilham a crença de John B. Watson segundo a qual o comportamento, em alguma forma, 
deve   permanecer   como   foco   de   estudol.   Em   contrapartida,   nem   todos   os   seguidores   de   Freud 
concordam que o foco do seu estudo devam ser as forças inconscientes ou biológicas, ou que o 
comportamento humano é motivado pelo sexo e pela agressão.” (Schltz & Schultz, 1996, p. 384)




REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
AJURIAGUERRA, J. de. Manual de psiquiatria infantil. 2. Ed. Ver. Amp. Ed. Masson e Atheneu. 
  s. d. 
BOCK,   Ana   Maria  B., FURTADO, Odair, TEIXEIRA, Maria de  Lourdes  T.  Psicologias:  uma 
  introdução ao estudo de psicologia. São Paulo: Saraiva, 1995.
KAPLAN, Harol, SADOCK, Benjamin. Compêndio de psiquiatria dinâmica. 3. ed. Porto Alegre: 
  Artes Médicas, 1984.
KREBS,   Ruy   Jornada  (org.)  Desenvolvimento  humano:  teorias   e  estudos.  Santa  Maria:   Casa 
  Editorial, 1995.
LUNDIN, R. W. Personalidade; uma análise do comportamento.  São Paulo: EPU, 1977.
SCHULTZ , Duane P., SCHULTZ, Sydney Ellen.  História da psicologia moderna.  8. ed. Ver. 
  Ampl. São Paulo: Cultrix, 1996. 

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  • 1. UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA – CENTRO DE EDUCAÇÃO DEPARTAMENTO DE FUNDAMENTOS DA EDUCAÇÃO PROFESSORA – ANDRÉA FORGIARINI CECHIN OS NEUFREUDIANOS E O DESENVOLVIMENTO HUMANO Muitos foram os seguidores de Freud e de suas idéias, alguns se mantiveram fiéis à  teoria por ele proposta, mais ortodoxa, outros discordavam deste ideário em alguns pontos básicos,  contestando algumas idéias do mestre. A literatura conta que, independente do grau de intimidade  que estas pessoas tinham com Freud, este rompia drasticamente as relações com quem ousava  contestá­lo. Um exemplo muito conhecido disto, foi o rompimento com Carl Jun, amigo pessoal ao  qual Freud considerava como herdeiro do movimento psicanalítico e futuro defensor de suas idéias. Esses analistas que romperam com a psicanálise ortodoxa, passaram a ser conhecidos  como   neofreudianos.   Os  maiores   pontos   de   discordância  entre   partidários   da   corrente  neofreudiana e de Freud são os seguintes: a) No ponto de vista freudiano, o ego está eternamente condicionado às exigências  do id. Na perspectiva neofreudiana o ego aparece com liberdade maior, podendo  realizar suas funções sem a dependência extrema do id. b) A psicanálise ortodoxa enfatiza que as forças biológicas têm grande influência  sobre a personalidade, enquanto que os neofreudianos não atribuem tanto ênfase  aos   aspectos   biológicos   mas,   outrossim,   destacam   a   influências   dos   aspectos  sociais e culturais. c) Ao  contrário   de   Freud,   que   superestima   a   questão   da   sexualidade   infantil,   os  neofreudianos acreditam que o desenvolvimento da personalidade é determinado  muito mais por forças psicossociais do que por forças psicossexuais e minimizam  a importância do complexo de Édipo. Para os neofreudianos, as interações sociais  desempenham   um   papel   mais   importante   na   infância   do   que   as   interações  sexuais, sejam elas reais ou imaginárias. Segundo SCHULTZ & SCHULTZ (1996), a mudança no espírito intelectual do início  do século, pode ter influenciado a contestação das idéias freudianas por muitos de seus seguidores.  Estes autores afirmam que
  • 2. À medida que os antropólogos publicavam seus estudos sobre diferentes culturas,  ia ficando claro que alguns sintomas neuróticos e tabus presentes nas hipóteses  freudianas não eram, ao contrário do que ele pensara, universais. Por exemplo, não  existem tabus contra o incesto em todas as sociedades. Além disso, sociólogos e  psicólogos sociais tinham descoverto que grande parte do comportamento humano  parecia vir antes do condicionamento social do que de quaisquer tentativas de  satisfazer necessidades biológicas. (p. 366) Entre   os   diversos   estudiosos   integrantes   da   corrente   neofreudiana   (dissidentes   ou  descendentes),  podemos  destacar  os  seguintes:  Carl Jung, Anna Freud, Alfred  Adler, Karen  Horney   e   Erik   Erikson.  Devido   à   impossibilidade   de   nos   determos   aqui   numa   explanação  minuciosa do ideário de cada um desses estudiosos, procuraremos abordar, suscintamente, os pontos  de divergência destes autores com a psicanálise freudiana. 2.1 ­ CARL JUNG (1875 – 1961) ­  Um dos pontos fundamentais de divergência entre Jung e Freud  vincula­se com a questão da  natureza da libido. Ao contrário de Freud que a define em termos  predominantemente sexuais, Jung a considera uma energia vital generalizada – da qual o sexo é  apenas uma parte – que o indivíduo emprega num momento particular. Schultz & Schultz (1996),  ilustram bem esta afirmação Para Jung, entre os três e os cinco anos de vida, que ele denominava fase pré­ sexual, a energia libidinal serve às funções de nutrição e de crescimento e não tem  nenhuma das nuanças sexuais da concepção freudiana desses primeiros anos. (p.  362) Jung   também  rejeita   a   idéia   do   complexo   de   Édipo  porposta   por   Freud,   por  acreditar que o apego da criança à mãe tem a ver com uma necessidade de dependência com todas  as satisfações associadas à função materna de prover alimento. Outra diferença marcante entre as teorias desses autores, é o fato de que, para Freud,  as pessoas são vítimas dos eventos sofridos na infância, enquanto que para Jung, o ser humano é  moldado tanto por suas metas, anseios e aspirações em relação ao futuro como pelos eventos  do passado. Quanto   aos   estágios   do   desenvolvimento,  Jung   acreditava   que   a   fase   mais  importante  não era a infância,    como afirmava Freud,  mas a meia­idade,  época em que  ele  próprio teve uma crise de identidade. Pode­se   dizer,   ainda,   que  Jung   enfatizava   mais   o   inconsciente   do   que   Freud.  Preocupava­se   mais   em   mergulhar   na   mente   inconsciente,   incluindo­lhe,   inclusive,   uma   nova 
  • 3. dimensão,    o   inconsciente   coletivo.  Este   último   refere­se   às   experiências   herdadas   dos   seres  humanos como espécie e dos seus ancestrais. 2.2 ­ ANNA FREUD (1895 – 1982) ­  Filha caçula de Freud, médica de formação e psicoterapeuta  por definição, tal como fora seu pai. Colaborou de forma substancial com a revisão da posição  teórica ortodoxa do pai, ampliando o papel do ego em seu funcionamento independente do id. Em sua obra intitulada “O ego e os mecanismos de defesa” (1936), ela desenvolveu e  esclareceu as concepções freudianas sobre o uso dos mecanismos de defesa para proteger o ego  da   ansiedade.    Anna   sublinha   que   tais   mecanismos   decorrem   de   um   considerável   grau   de  ansiedade, podendo (se elaborados adequadamente) serem considerados normais, até certo ponto,  dependendo, sobretudo, da sua freqüência e intensidade. Coube ainda a Anna Freud o mérito de estudar e interpretar os efeitos, geralmente  desfavoráveis, de um ambiente capaz de alterar o fluxo de normalidade do desenvolvimento,  tal como o ambiente de conflito bélico. Também as relações entre crianças e seus pais, incluídas aí  as influências externas, foram consideradas por ela como relevantes e até mesmo decisivas para o  êxito do desenvolvimento em pautas de normalidade. Sua teoria das relações objetais também aparece como uma tentativa de modificar a  psicanálise ortodoxa, já que Anna Freud estuda a intensa relação emocional que se desenvolve entre  o bebê e a mãe, mais em termos cognitivos e afetivos do que em termos exclusivamente sexuais. Uma   outra   diferença   presente   entre   seus   estudos   e   os   do   seu   pai   é   que   Anna  desenvolveu   sua   teoria   através   da   observação   direta   de   bebês   e   não   pedindo   que   adultos  reconstruíssem suas primeiras experiências infantis, como Freud fazia. 2.3   ­   ALFRED   ADLER   (1870   –   1937)   ­    Este   autor   desenvolveu   uma   teoria     que   difere   da  psicanálise freudiana em muitos aspectos, especialmente no que se refere à ênfase à influência dos  fatores sexuais no desenvolvimento humano. Adler desenvolveu seu sistema de psicologia individual ao longo de linhas sociais.  Sua   teoria   defende   que  a   personalidade   só   pode   ser   compreendida   se   investigarmos   os  relacionamentos sociais   e as atitudes que a pessoa tem para com os outros. Segundo Schultz &  Schultz (1996), Adler “propôs que esse interesse social, que pode ser definido como um potencial  inato para cooperar com os outros a fim de alcançar alvos pessoais e societais, se desenvolve na  infância por meio de experiências de aprendizagem.” (p. 369)
  • 4. Ao contrário de Freud, que atribui muitos comportamentos à desejos inconscientes,  Adler acentua a importância dos determinantes conscientes do comportamento.  Para ele, os  seres humanos têm consciência de suas motivações. Outra divergência é o fato de que, enquanto para Freud o comportamento humano é  determinado por experiências passadas, para Adler são as expectativas em relação ao futuro que  mais influenciam. “Esforçar­se por atingir metas ou antecipar futuros eventos são elementos capazes  de afetar o nosso comportamento presente.”  (Schultz & Schultz, 1996, p. 369) Adler discorda de Freud de que o sexo é o impulso dominante do comportamento.  Segundo   ele,   o   comportamento   humano   é   determinado   por   um   sentimento   generalizado   de  inferioridade que o impele a lutar por superioridade e perfeição. Acredita ainda que “a incapacidade  de compensar adequadamente os sentimentos de inferioridade pode ocasionar o desenvolvimento de  um  complexo de inferioridade, que torna a pessoa incapaz de lidar com os problemas da vida.”  (Schultz & Schultz, 1996, p. 370) O conceito de  poder criativo pode ser considerado como a base para toda a teoria  adleriana: Esse   poder   criativo   representa   um   princípio   ativo   da   existência   humana  comparável   à   noção   de   alma.   Certas   capacidades   e   experiências   nos   vêm   por  hereditariedade e pelo ambiente, mas é o modo como usamos e interpretamos  essas experiências que nos   fornece a base da nossa atitude diante da vida. Isso  significa   que   estamos   concientemente   envolvidos   no   processo   de   dar   forma   à  nossa personalidade e ao nosso destino. (Schultz & Schultz, 1996, p. 370) 2.4 ­ KAREN HORNEY (1885 – 1952) – Uma das primeiras feministas, foi treinada na psicanálise  freudiana em Berlim e descreveu sua obra como uma modificação e extensão do sistema de Freud e  não como um esforço m superá­lo. A   teoria   de   Horney  discorda   de   Freud   quanto   ao   fato   de   a   personalidade  depender   de   forças   biológicas   imutáveis.  Ela   nega   a   posição   destacada   dos   fatores   sexuais,  contesta a validade da teoria edipiana e descarta os conceitos de libido e da estrutura freudiana da  personalidade.  Se opõe veementemente à idéia de Freud de que a mulher é motivada pela inveja do  pênis e afirmou que os homens é que são motivados pela  inveja do útero,    afirmando que eles  invejam a capacidade feminina de gerar filhos. Karen Horney acredita que esta inveja do útero e o  conseqüente   ressentimento   se   manifestam   inconsciente   no   homem   através   de   comportamentos  voltados a depreciar ou diminuir as mulheres.
  • 5. Em   lugar   dos   instintos   freudianos   como   as   principais   forças   motivadoras   do  comportamento,   Horney   acredita   que   a   força   propulsora   do   comportamento   humano   é   essa  necessidade de segurança, de proteção e de libertação do medo que o bebê impotente busca no  mundo exterior (ansiedade básica). Karen Horney contesta a idéia de fases ou estágios propostos por Freud por acreditar  que nada no desenvolvimento pode ser visto como universal, e que, pelo contrário, tudo depende de  fatores culturais, sociais e ambientais. 2.5 ­ ERIK ERIKSON (1902 – 1994) – Erik Erikson foi treinado em psicanálise por Anna Freud.  Ampliou a questão dos estágios do desenvolvimento, afirmou que a personalidade continua a  se desenvolver ao longo da vida e reconheceu o impacto de forças sociais, históricas e culturais  sobre a personalidade. Erikson preocupou­se, principalmente, com o modelo social do desenvolvimento do  ego   ao  longo  da vida humana. Para ele, a identidade é um processo, em constante mudança  e  desenvolvimento,   que   é   determinado   pelo   histórico   do   indivíduo   e   intimamente   relacionado   às  mudanças sociais. Erikson não isola a individualidade do seu contexto familiar e sócio­cultural, pois  concebe o indivíduo como integrante deste amplo contexto, sem anular­se como pessoa. Erikson estabelece que, a partir da fase neo­natal, cada indivíduo coloca­se entre dois  extremos,   numa  crise   psicossocial,   e   se   sua   questão   de   equilíbrio   entre   os   extremos   não   for  resolvida satisfatoriamente, todo fluxo do desenvolvimento posterior poderá estar comprometido de  alguma forma. Concebe o desenvolvimento psicológico e social do indivíduo em  oito etapas, do  nascimento à velhice, cada uma delas relacionadas a um evento importante da vida. CRISES  PSICOSSOCIAIS MODALIDADE EVENTO Confiança X  desconfiança básica Oral­sensorial alimentação (0 aos 18 meses) Autonomia X vergonha e  Locomotora­genital dúvida (18 meses – 3 anos) Controle esfincteriano Locomotora­genital Locomoção Iniciativa X culpa (3 – 6 anos) Produtividade X  Latência inferioridade (6 – 12 anos) Escola Identidade X confusão  de papéis Adolescência Relacionamento entre os  pares
  • 6. Intimidade X isolamento Relacionamento de amor Adulto jovem Geratividade X  Adulto médio ou  estagnação maturidade Progenitura e criação Integridade do ego X  Reflexão e aceitação da  desespero Velhice vida Schultz & Schultz (1996) afirmam que, para Erikson Cada um desses estágios de crescimento, embora carregado de tensão o bastante  para ser considerado uma crise, pode Ter desfecho positivo se for resolvido de  maneira adaptativa. Além disso, a pessoa que fracassar em algum deles e ficar  com uma forma desajustada de reagir, pode corrigir isso por meio da adaptação  bem­sucedida num estágio ulterior. Há, pois, esperança para o futuro em todos os  estágios do crescimento da personalidade. (p. 382) Como se pode perceber, algumas concepções neofreudianas sobre o desenvolvimento  tem   pouca   semelhança   com   a   psicanálise   ortodoxa   e   só   são   consideradas   psicanalíticas   por   se  mostrarem distantes da tradição psicológica comportamentalista e compartilharem com Freud um  enorme interesse pela compreensão da personalidade humana. Pode­se afirmar que a teoria psicanalítica sofreu muito mais com as fragmentações  do que a teoria comportamentalista. Apesar das mudanças atribuídas pelos neocomportamentalistas,  “todos partilham a crença de John B. Watson segundo a qual o comportamento, em alguma forma,  deve   permanecer   como   foco   de   estudol.   Em   contrapartida,   nem   todos   os   seguidores   de   Freud  concordam que o foco do seu estudo devam ser as forças inconscientes ou biológicas, ou que o  comportamento humano é motivado pelo sexo e pela agressão.” (Schltz & Schultz, 1996, p. 384) REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: AJURIAGUERRA, J. de. Manual de psiquiatria infantil. 2. Ed. Ver. Amp. Ed. Masson e Atheneu.  s. d.  BOCK,   Ana   Maria  B., FURTADO, Odair, TEIXEIRA, Maria de  Lourdes  T.  Psicologias:  uma  introdução ao estudo de psicologia. São Paulo: Saraiva, 1995. KAPLAN, Harol, SADOCK, Benjamin. Compêndio de psiquiatria dinâmica. 3. ed. Porto Alegre:  Artes Médicas, 1984. KREBS,   Ruy   Jornada  (org.)  Desenvolvimento  humano:  teorias   e  estudos.  Santa  Maria:   Casa  Editorial, 1995. LUNDIN, R. W. Personalidade; uma análise do comportamento.  São Paulo: EPU, 1977. SCHULTZ , Duane P., SCHULTZ, Sydney Ellen.  História da psicologia moderna.  8. ed. Ver.  Ampl. São Paulo: Cultrix, 1996.