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UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO
A FORMAÇÃO DO LIVRO BÍBLICO E SUA
IMPORTÂNCIA PARA A PRÁTICA DE FÉ
ADRIANO DE SOUZA DIAS
Petrópolis, RJ
Setembro de 2015
Introdução
Para se compreender as questões referentes à Bíblia da época contemporânea é
importante buscar os aspectos historiográficos de sua elaboração. Assim sendo e,
considerando que os escritos cristãos são uma extensão dos escritos judaicos, necessário
se faz estabelecer uma interface entre a Bíblia Judaica e a Bíblia Cristã. Pretendemos,
no curso deste trabalho, apresentar como o entendimento do texto bíblico na atualidade
depende de determinados contextos na época em que foram escritos. Para isso, em um
primeiro momento, aborda-se acerca das escolas do antigo Israel; como se deu a
elaboração da escrita do texto bíblico e, bem como, a necessidade de se identificar o
processo de instrução dos escritores (escribas), a formação das escolas cristãs,
essenciais para que o texto bíblico se estendesse até os nossos dias. Por fim, destacamos
a importância dos preceitos bíblicos para a humanidade como um todo nos dias de hoje.
A formação literária do texto bíblico
A formação literária do texto bíblico e sua posterior canonização se desenvolveu a
partir de um contexto sapiencial e acadêmico, contudo, não de forma restritiva, pois, até
mesmo livros de conteúdo litúrgico, jurídico e historiográfico também pertenciam ao
gênero sapiencial e doutrinal. Pode-se dizer que a Torá transcende o conceito de código
de leis, sendo considerada um verdadeiro tratado de instrução, acolhida tanto pelos
sacerdotes e reis, como pelos sábios e profetas.
No antigo Oriente, o ato da leitura e da escrita era considerado uma profissão1
,
exercida apenas pelos escribas que exerciam suas atividades nas principais cidades da
Mesopotâmia e do Egito. É certa a importância das escolas profissionais para a
alfabetização dos israelitas, no entanto, isso não foi suficiente dar conta de uma parcela
maior da população, tendo em vista que vários fatores negativos contribuíam para essa
negação, quais sejam: aspectos sociais, econômicos e políticos, mais ainda do que a
dificuldade de aprendizagem dos signos lingüísticos.
Os rabinos e as Escolas Cristãs
1
BAKOS, M. M. Origens do Ensino. Porto Alegre: EDPUCRS, 2000 destaca que “saber ler e escrever,
no Oriente Antigo, era considerado não somente um privilégio, mas, sobretudo, uma superioridade social.
Somente as famílias abastadas podiam assegurar a instrução de um futuro escriba, pois o custo dessa
educação era muito elevado, e os estudos bastante longos. (p. 162)
Os rabinos não caracterizavam um grupo fechado que tratavam apenas de
questões legais, mas, possuíam, sim, autoridade religiosa, desprovida de qualquer poder
político ou militar. Com o crescimento das instituições sociais, nos séculos II e IV, foi
possível a criação e desenvolvimento de academias permanentes em centros urbanos. A
partir daí, os rabinos se destacaram pelo estudo da Torá, apesar de estarem longe de
constituir um grupo homogêneo2
, pois havia, entre eles, diferenças de todas as ordens,
talvez, por isso, nem sempre eram respeitados pela comunidade judaica, conquanto sua
autoridade fosse por ela reconhecida.
Pode-se afirma que o cristianismo antigo considerava os princípios helênicos do
conhecimento, principalmente no que diz respeito à ética ou a arte de viver. Nesse
sentido, a exegese tornou-se um pilar da teologia cristã por permitir uma interpretação
do texto com base nos procedimentos da lógica e da filosofia praticada pelos gregos.
O cuidado na elaboração da cópia dos manuscritos
É fato que tanto judeus como cristãos tratavam, com o devido esmero, os livros
sagrados. “E como se explica que os rudes judeus, ultrapassando as categorias culturais
do seu ambiente, tenham como tanto esmero cultivado a historiografia?”
(BETTENCOURT, 1990, p. 40). Pois, era perceptível o cuidado na elaboração da cópia
de um rolo da Torá com o fito de evitar, ao máximo, a incursão de erros. Para que isso
não ocorresse, a cópia devia ser feita diretamente a partir dos manuscritos, pois pela
oralidade é muito possível haver erro de escuta, contudo, é provável que haja alguma
cópia resultante deste último procedimento.
Após a conclusão da cópia, o rolo tinha de passar por uma ou mais revisões, cujo
trabalho deveria ser executado por até três tribunais, formado por sacerdotes, levitas e
pelos notáveis de Israel. Um texto não-revisado era totalmente proibido de ser
preservado, conquanto haja textos nessa condição, inclusive até, no caso da Torah.
Quanto à possibilidade de erros, a tolerância dos rabinos mais liberais se limitava de um
até, no máximo, três por coluna. Esse trabalho era remunerado pelos fundos do Templo,
no entanto, o prazo estipulado para a correção de erro era de, no máximo, trinta dias.
2
GERSTENBERGER, Erhard. apud RAD, Gerhard Von, 1961, p. 376): “A justificativa é relativamente
simples: por ser uma coletânea de muitos testemunhos de fé, oriundos de aproximadamente mil anos de
história do antigo Israel, o antigo Testamento não tem, nem pode ter, uma teologia homogênea.”
Os cristãos, com o fito de zelar pela fiel transmissão do texto sagrado, dispunham
de profissionais dos quais se encarregavam dessa árdua e venerada tarefa, efetuada, já
no século II, por diferentes copistas que sobre os manuscritos se debruçavam a fim de
revisá-los, corrigindo os possíveis erros.
“Por que conhecer a trajetória da Bíblia como documento
histórico é importante para a utilização desses mesmos escritos na
prática da fé cristã em nossos dias?”.
A Bíblia é um documento que se tornou um código de referência para pautar a
vida de qualquer pessoa, independente de sua crença religiosa e, principalmente,
daqueles que se declaram cristãos, pois nela é possível encontrar um verdadeiro tratado
de bons princípios, virtudes, senso de justiça, amor ao próximo e respeito às leis e aos
homens.
Para se conhecer a Bíblia como documento histórico, é necessário, considerar o
seu processo de elaboração, a cultura dos povos que a compilaram, porque a despeito de
a Palavra de Deus possuir um valor universal, os autores bíblicos escreveram para os
seus contemporâneos3
. Assim, para entender o que esses autores quiseram dizer, faz-se
necessário antes conhecer o ambiente histórico em que foram escritos4
.
“As condições epistemológicas, sociais, econômica e específicas de
gênero de nossos tempos são tão diferentes das da antiguidade, que nenhuma
afirmação bíblica, por melhor ou mais relevante que seja, pode servir de
estímulo ou norma para as nossas decisões teológicas antes de trazê-la para
esta nossa realidade e pô-la em diálogo com ela.” As narrativas da teofania da
comunidade dos séculos VI e V a.C são aspectos importantes daquela
comunidade e que se estendem até hoje como um referencial de valor ímpar
para aqueles que buscam por uma teologia e ética corretas, mas não
constituem uma lei eterna e imutável, desvencilhada do tempo.”
(GERSTENBERGER, 1998, p. 21)
Outrossim, é importante conhecer os processos de formação de seus escritos, além
de compreender certas particularidades próprias da literatura judaica e cristã e
considerar as condições culturais responsáveis pela transmissão oral de seu conteúdo e
3
GERSTENBERGER. Erhard. Teologias no Antigo Testamento : Pluralidade e sincretismo da fé em
Deus no Antigo Testamento. São Leopoldo: Editora Sinodal, 2007 destaca que “as narrativas da teofania
da comunidade dos séculos VI e V a.C são aspectos importantes daquela comunidade e que se estendem
até hoje como um referencial de valor ímpar para aqueles que buscam por uma teologia e ética corretas,
mas não constituem uma lei eterna e imutável, desvencilhada do tempo”
4
NADAL, Milagro. Curso de Iniciação ao Antigo e ao Novo Testamento. São Paulo: Edições Loyola,
1998.
desta para a composição textual, identificando as alterações de materiais utilizados,
além da característica da exegese judaica imprescindível para a interpretação textual.5
Conhecendo sua historiografia, pode-se valorizar muito mais as Escrituras, pois
devido ao seu difícil processo de formação, sua elaboração humanizada acaba por se
aproximar ainda mais das realidades humanas, é Deus voltando-se, cada vez mais, para
o homem. “Pois as palavras de Deus expressas por línguas humanas se fizeram
semelhantes à linguagem humana, tal como outrora o verbo do Pai Eterno, havendo
assumido a carne da fraqueza humana, se fez semelhante aos homens.” (VATICANO II,
apud Nadal, 1998, p.14)
Não é plausível dizer que a Bíblia é constituída de um todo harmônico6
, pois
“simplesmente não compreendemos muitas coisas, esbarramos em contradições e em
fatos que nós cristãos achamos estranhos” (RENDTORF, 2002:7), não estamos nos
referindo ao princípio da inerrância – mas tão-somente afirmando que de tanto de
humano há na formação da Bíblia que ela se revela, cada vez mais de Deus. O problema
maior consiste em espiritualizar tanto esta Palavra que ela quase se torna objeto de
idolatria, enquanto, na verdade, Deus, em toda a sua sapiência e amor incondicional
quis nos mostrar um desvão de seu caráter por meio dela.
O elemento teológico é importante, pois quem se define somente a
partir do presente não é capaz nem de se entender nem de se corrigir. O
elemento teológico é importante, pois “Deus” ou “incondicional” ou “o todo”
ou “o que me afeta incondicionalmente” (Paul Tillich) se nos depara nos
testemunhos de fé bíblicos. Portanto, o estudo da teologia bíblica tem para
nós uma função esclarecedora e crítica. Além disso e sobretudo, o Antigo
Testamento/a Bíblia Hebraica contém uma enorme quantidade ainda não
explorada de autoconhecimento humano bem como de crítica social e
religiosa, de modo que mesmo leituras repetidas têm, a cada fé, efeito
animador. (GERSTENBERGER, 2007:22 – grifo nosso)
Assim, observando o processo da elaboração da Bíblia, é possível identificar que
Deus, em nada, quis facilitar a vida de ninguém, tendo em vista que “quem
sinceramente procura Deus, é não raro detido por dificuldades que lhe provêm do
contato com a própria Palavra de Deus” (BETTENCOURT, 1990, p.11). É necessário fé
para entender que uma Palavra formada pela mão de tantas pessoas de classes
diferentes, povos variados, culturas distintas, tantas limitações, pudesse resultar em um
compêndio tão fabuloso e maravilhosamente capaz de levar ao homem uma proposta de
5
AMARAL, Fabiana Pereira do. Entre a religião e a história: a Bíblia como documento. Congresso
Internacional de História. Set/2011. Disponível em: http://www.cih.uem.br/anais/2011/trabalhos/269.pdf>
6
vida virtuosa que reflete em toda a sociedade a luz que emana do próprio Deus7
, porque
a vida de fé das pessoas e dos grupos desenrola-se em situações históricas, sociais e
concretas8
. Nesse sentido, o livro sagrado tem o condão de promover uma mudança
radical na vida do homem.
“O mundo hoje é melhor devido à influência da Bíblia. Mesmo os
próprios inimigos da Bíblia admitem que nenhum livro em toda história da
humanidade teve tamanha influência para o bem; eles reconhecem o seu
efeito sadio na civilização. Milhões de pessoas antes de conhecerem, amarem
e obedecerem a este Livro, eram escravos do pecado, dos vícios, da idolatria,
do medo, das superstições, da feitiçaria. Eram mundanas, vaidosas,
iracundas, desconfiadas, etc. Mas, depois que abraçaram este Livro, foram
por ele transformadas em criaturas salvas, alegres, libertas, felizes,
santificadas. Abandonaram todo o mal em que antes viviam e tornaram-se
boas pessoas para a família, para a sociedade e para a pátria.” GILBERTO,
2004, p.25)
Ademais, após percorrer tantos anos desde a sua elaboração até os nossos dias e
permanecer sempre com uma temática atual e necessária e, partir dela, pode-se ouvir
muitos testemunhos de uma transformação de vida.
Resta afirmar, de forma categórica, que o conteúdo essencial da Palavra sinaliza
uma clara mensagem de salvação proposta por meio da vinda do Messias como o
restaurador da condição humana de pecado, não se podendo desconsiderar que “os
autores bíblicos não se propõem como objetivo primeiro transmitir uma história, mas
uma mensagem de fé, e a partir da fé ela deve ser lida.” (NADAL, 1998, p.14). Deve-se,
ainda, considerar a importância social da palavra que é orientada para a comunidade,
algumas vezes, o autor sagrado é a voz do seu povo; a sua obra é recebida pelo povo,
que nela se reconhece.9
BIBLIOGRAFIA
AMARAL, Fabiana Pereira do. Entre a religião e a história: a Bíblia como
documento. Congresso Internacional de História. São Paulo, 22-24 Set/2011. Disponível
em: < http://www.cih.uem.br/anais/2011/trabalhos/269.pdf>
7
A verdade bíblica não se trata tão-somente de um compêndio histórico que retrata apenas a realidade do
povo israelita, mas deve ser considerado um elemento que compõe os fundamentos da fé a ser vivenciada
em todo tempo, nesse sentido, “é de importância fundamental que os textos sagrados, como expressões de
fé dos antepassados bíblicos, devem ter o seu canal de expressão na vida e no tempo contemporâneos,
devendo ser normativos para o fazer teológico e para a própria vida de fé.” (GUNNEWEG, 2005, p. 13)
8
GERSTENBERGER, Erhard, op. cit. p. 25.
9
SHREINER, J. Palavra e Mensagem do Antigo Testemunho. 2. ed. São Paulo: Editora Teológica /
Editora Sinodal, 2004.
BAKOS, Margaret Marchiori, CASTRO, Ieda Bandeira, PIRES, Letícia de Andrade
(orgs). Origens do Ensino. Porto Alegre: EDPUCRS, 2000
BETTENCOURT, Estevão. Para entender o Antigo Testamento. 4. ed., Aparecida:
Editora Santuário, 1990.
GERSTENBERGER. Erhard. Teologias no Antigo Testamento : Pluralidade e
sincretismo da fé em Deus no Antigo Testamento. São Leopoldo: Editora Sinodal, 2007.
GILBERTO, Antônio. A Bíblia através dos séculos: a historia e formação do livro dos
livros. Rio de Janeiro: CPAD, 1986.
GUNNEWEG, Antonius H. J. Teologia Bíblica do Antigo Testamento: uma história
da religião de Israel na perspectiva bíblico-teológica. São Paulo: Editora Teológica:
Edições Loyola, 2005.
NADAL, Milagro. Curso de Iniciação ao Antigo e ao Novo Testamento. São Paulo:
Edições Loyola, 1998.
RENDTORFF, Rolf. A formação do Antigo Testamento. 7. ed. São Leopoldo: Editora
Sinodal, 2002.
SHREINER, J. Palavra e Mensagem do Antigo Testemunho. 2. ed. São Paulo:
Editora Teológica, 2004

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A formação do livro bíblico e sua importância para a prática de fé

  • 1. UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO A FORMAÇÃO DO LIVRO BÍBLICO E SUA IMPORTÂNCIA PARA A PRÁTICA DE FÉ ADRIANO DE SOUZA DIAS Petrópolis, RJ Setembro de 2015
  • 2. Introdução Para se compreender as questões referentes à Bíblia da época contemporânea é importante buscar os aspectos historiográficos de sua elaboração. Assim sendo e, considerando que os escritos cristãos são uma extensão dos escritos judaicos, necessário se faz estabelecer uma interface entre a Bíblia Judaica e a Bíblia Cristã. Pretendemos, no curso deste trabalho, apresentar como o entendimento do texto bíblico na atualidade depende de determinados contextos na época em que foram escritos. Para isso, em um primeiro momento, aborda-se acerca das escolas do antigo Israel; como se deu a elaboração da escrita do texto bíblico e, bem como, a necessidade de se identificar o processo de instrução dos escritores (escribas), a formação das escolas cristãs, essenciais para que o texto bíblico se estendesse até os nossos dias. Por fim, destacamos a importância dos preceitos bíblicos para a humanidade como um todo nos dias de hoje. A formação literária do texto bíblico A formação literária do texto bíblico e sua posterior canonização se desenvolveu a partir de um contexto sapiencial e acadêmico, contudo, não de forma restritiva, pois, até mesmo livros de conteúdo litúrgico, jurídico e historiográfico também pertenciam ao gênero sapiencial e doutrinal. Pode-se dizer que a Torá transcende o conceito de código de leis, sendo considerada um verdadeiro tratado de instrução, acolhida tanto pelos sacerdotes e reis, como pelos sábios e profetas. No antigo Oriente, o ato da leitura e da escrita era considerado uma profissão1 , exercida apenas pelos escribas que exerciam suas atividades nas principais cidades da Mesopotâmia e do Egito. É certa a importância das escolas profissionais para a alfabetização dos israelitas, no entanto, isso não foi suficiente dar conta de uma parcela maior da população, tendo em vista que vários fatores negativos contribuíam para essa negação, quais sejam: aspectos sociais, econômicos e políticos, mais ainda do que a dificuldade de aprendizagem dos signos lingüísticos. Os rabinos e as Escolas Cristãs 1 BAKOS, M. M. Origens do Ensino. Porto Alegre: EDPUCRS, 2000 destaca que “saber ler e escrever, no Oriente Antigo, era considerado não somente um privilégio, mas, sobretudo, uma superioridade social. Somente as famílias abastadas podiam assegurar a instrução de um futuro escriba, pois o custo dessa educação era muito elevado, e os estudos bastante longos. (p. 162)
  • 3. Os rabinos não caracterizavam um grupo fechado que tratavam apenas de questões legais, mas, possuíam, sim, autoridade religiosa, desprovida de qualquer poder político ou militar. Com o crescimento das instituições sociais, nos séculos II e IV, foi possível a criação e desenvolvimento de academias permanentes em centros urbanos. A partir daí, os rabinos se destacaram pelo estudo da Torá, apesar de estarem longe de constituir um grupo homogêneo2 , pois havia, entre eles, diferenças de todas as ordens, talvez, por isso, nem sempre eram respeitados pela comunidade judaica, conquanto sua autoridade fosse por ela reconhecida. Pode-se afirma que o cristianismo antigo considerava os princípios helênicos do conhecimento, principalmente no que diz respeito à ética ou a arte de viver. Nesse sentido, a exegese tornou-se um pilar da teologia cristã por permitir uma interpretação do texto com base nos procedimentos da lógica e da filosofia praticada pelos gregos. O cuidado na elaboração da cópia dos manuscritos É fato que tanto judeus como cristãos tratavam, com o devido esmero, os livros sagrados. “E como se explica que os rudes judeus, ultrapassando as categorias culturais do seu ambiente, tenham como tanto esmero cultivado a historiografia?” (BETTENCOURT, 1990, p. 40). Pois, era perceptível o cuidado na elaboração da cópia de um rolo da Torá com o fito de evitar, ao máximo, a incursão de erros. Para que isso não ocorresse, a cópia devia ser feita diretamente a partir dos manuscritos, pois pela oralidade é muito possível haver erro de escuta, contudo, é provável que haja alguma cópia resultante deste último procedimento. Após a conclusão da cópia, o rolo tinha de passar por uma ou mais revisões, cujo trabalho deveria ser executado por até três tribunais, formado por sacerdotes, levitas e pelos notáveis de Israel. Um texto não-revisado era totalmente proibido de ser preservado, conquanto haja textos nessa condição, inclusive até, no caso da Torah. Quanto à possibilidade de erros, a tolerância dos rabinos mais liberais se limitava de um até, no máximo, três por coluna. Esse trabalho era remunerado pelos fundos do Templo, no entanto, o prazo estipulado para a correção de erro era de, no máximo, trinta dias. 2 GERSTENBERGER, Erhard. apud RAD, Gerhard Von, 1961, p. 376): “A justificativa é relativamente simples: por ser uma coletânea de muitos testemunhos de fé, oriundos de aproximadamente mil anos de história do antigo Israel, o antigo Testamento não tem, nem pode ter, uma teologia homogênea.”
  • 4. Os cristãos, com o fito de zelar pela fiel transmissão do texto sagrado, dispunham de profissionais dos quais se encarregavam dessa árdua e venerada tarefa, efetuada, já no século II, por diferentes copistas que sobre os manuscritos se debruçavam a fim de revisá-los, corrigindo os possíveis erros. “Por que conhecer a trajetória da Bíblia como documento histórico é importante para a utilização desses mesmos escritos na prática da fé cristã em nossos dias?”. A Bíblia é um documento que se tornou um código de referência para pautar a vida de qualquer pessoa, independente de sua crença religiosa e, principalmente, daqueles que se declaram cristãos, pois nela é possível encontrar um verdadeiro tratado de bons princípios, virtudes, senso de justiça, amor ao próximo e respeito às leis e aos homens. Para se conhecer a Bíblia como documento histórico, é necessário, considerar o seu processo de elaboração, a cultura dos povos que a compilaram, porque a despeito de a Palavra de Deus possuir um valor universal, os autores bíblicos escreveram para os seus contemporâneos3 . Assim, para entender o que esses autores quiseram dizer, faz-se necessário antes conhecer o ambiente histórico em que foram escritos4 . “As condições epistemológicas, sociais, econômica e específicas de gênero de nossos tempos são tão diferentes das da antiguidade, que nenhuma afirmação bíblica, por melhor ou mais relevante que seja, pode servir de estímulo ou norma para as nossas decisões teológicas antes de trazê-la para esta nossa realidade e pô-la em diálogo com ela.” As narrativas da teofania da comunidade dos séculos VI e V a.C são aspectos importantes daquela comunidade e que se estendem até hoje como um referencial de valor ímpar para aqueles que buscam por uma teologia e ética corretas, mas não constituem uma lei eterna e imutável, desvencilhada do tempo.” (GERSTENBERGER, 1998, p. 21) Outrossim, é importante conhecer os processos de formação de seus escritos, além de compreender certas particularidades próprias da literatura judaica e cristã e considerar as condições culturais responsáveis pela transmissão oral de seu conteúdo e 3 GERSTENBERGER. Erhard. Teologias no Antigo Testamento : Pluralidade e sincretismo da fé em Deus no Antigo Testamento. São Leopoldo: Editora Sinodal, 2007 destaca que “as narrativas da teofania da comunidade dos séculos VI e V a.C são aspectos importantes daquela comunidade e que se estendem até hoje como um referencial de valor ímpar para aqueles que buscam por uma teologia e ética corretas, mas não constituem uma lei eterna e imutável, desvencilhada do tempo” 4 NADAL, Milagro. Curso de Iniciação ao Antigo e ao Novo Testamento. São Paulo: Edições Loyola, 1998.
  • 5. desta para a composição textual, identificando as alterações de materiais utilizados, além da característica da exegese judaica imprescindível para a interpretação textual.5 Conhecendo sua historiografia, pode-se valorizar muito mais as Escrituras, pois devido ao seu difícil processo de formação, sua elaboração humanizada acaba por se aproximar ainda mais das realidades humanas, é Deus voltando-se, cada vez mais, para o homem. “Pois as palavras de Deus expressas por línguas humanas se fizeram semelhantes à linguagem humana, tal como outrora o verbo do Pai Eterno, havendo assumido a carne da fraqueza humana, se fez semelhante aos homens.” (VATICANO II, apud Nadal, 1998, p.14) Não é plausível dizer que a Bíblia é constituída de um todo harmônico6 , pois “simplesmente não compreendemos muitas coisas, esbarramos em contradições e em fatos que nós cristãos achamos estranhos” (RENDTORF, 2002:7), não estamos nos referindo ao princípio da inerrância – mas tão-somente afirmando que de tanto de humano há na formação da Bíblia que ela se revela, cada vez mais de Deus. O problema maior consiste em espiritualizar tanto esta Palavra que ela quase se torna objeto de idolatria, enquanto, na verdade, Deus, em toda a sua sapiência e amor incondicional quis nos mostrar um desvão de seu caráter por meio dela. O elemento teológico é importante, pois quem se define somente a partir do presente não é capaz nem de se entender nem de se corrigir. O elemento teológico é importante, pois “Deus” ou “incondicional” ou “o todo” ou “o que me afeta incondicionalmente” (Paul Tillich) se nos depara nos testemunhos de fé bíblicos. Portanto, o estudo da teologia bíblica tem para nós uma função esclarecedora e crítica. Além disso e sobretudo, o Antigo Testamento/a Bíblia Hebraica contém uma enorme quantidade ainda não explorada de autoconhecimento humano bem como de crítica social e religiosa, de modo que mesmo leituras repetidas têm, a cada fé, efeito animador. (GERSTENBERGER, 2007:22 – grifo nosso) Assim, observando o processo da elaboração da Bíblia, é possível identificar que Deus, em nada, quis facilitar a vida de ninguém, tendo em vista que “quem sinceramente procura Deus, é não raro detido por dificuldades que lhe provêm do contato com a própria Palavra de Deus” (BETTENCOURT, 1990, p.11). É necessário fé para entender que uma Palavra formada pela mão de tantas pessoas de classes diferentes, povos variados, culturas distintas, tantas limitações, pudesse resultar em um compêndio tão fabuloso e maravilhosamente capaz de levar ao homem uma proposta de 5 AMARAL, Fabiana Pereira do. Entre a religião e a história: a Bíblia como documento. Congresso Internacional de História. Set/2011. Disponível em: http://www.cih.uem.br/anais/2011/trabalhos/269.pdf> 6
  • 6. vida virtuosa que reflete em toda a sociedade a luz que emana do próprio Deus7 , porque a vida de fé das pessoas e dos grupos desenrola-se em situações históricas, sociais e concretas8 . Nesse sentido, o livro sagrado tem o condão de promover uma mudança radical na vida do homem. “O mundo hoje é melhor devido à influência da Bíblia. Mesmo os próprios inimigos da Bíblia admitem que nenhum livro em toda história da humanidade teve tamanha influência para o bem; eles reconhecem o seu efeito sadio na civilização. Milhões de pessoas antes de conhecerem, amarem e obedecerem a este Livro, eram escravos do pecado, dos vícios, da idolatria, do medo, das superstições, da feitiçaria. Eram mundanas, vaidosas, iracundas, desconfiadas, etc. Mas, depois que abraçaram este Livro, foram por ele transformadas em criaturas salvas, alegres, libertas, felizes, santificadas. Abandonaram todo o mal em que antes viviam e tornaram-se boas pessoas para a família, para a sociedade e para a pátria.” GILBERTO, 2004, p.25) Ademais, após percorrer tantos anos desde a sua elaboração até os nossos dias e permanecer sempre com uma temática atual e necessária e, partir dela, pode-se ouvir muitos testemunhos de uma transformação de vida. Resta afirmar, de forma categórica, que o conteúdo essencial da Palavra sinaliza uma clara mensagem de salvação proposta por meio da vinda do Messias como o restaurador da condição humana de pecado, não se podendo desconsiderar que “os autores bíblicos não se propõem como objetivo primeiro transmitir uma história, mas uma mensagem de fé, e a partir da fé ela deve ser lida.” (NADAL, 1998, p.14). Deve-se, ainda, considerar a importância social da palavra que é orientada para a comunidade, algumas vezes, o autor sagrado é a voz do seu povo; a sua obra é recebida pelo povo, que nela se reconhece.9 BIBLIOGRAFIA AMARAL, Fabiana Pereira do. Entre a religião e a história: a Bíblia como documento. Congresso Internacional de História. São Paulo, 22-24 Set/2011. Disponível em: < http://www.cih.uem.br/anais/2011/trabalhos/269.pdf> 7 A verdade bíblica não se trata tão-somente de um compêndio histórico que retrata apenas a realidade do povo israelita, mas deve ser considerado um elemento que compõe os fundamentos da fé a ser vivenciada em todo tempo, nesse sentido, “é de importância fundamental que os textos sagrados, como expressões de fé dos antepassados bíblicos, devem ter o seu canal de expressão na vida e no tempo contemporâneos, devendo ser normativos para o fazer teológico e para a própria vida de fé.” (GUNNEWEG, 2005, p. 13) 8 GERSTENBERGER, Erhard, op. cit. p. 25. 9 SHREINER, J. Palavra e Mensagem do Antigo Testemunho. 2. ed. São Paulo: Editora Teológica / Editora Sinodal, 2004.
  • 7. BAKOS, Margaret Marchiori, CASTRO, Ieda Bandeira, PIRES, Letícia de Andrade (orgs). Origens do Ensino. Porto Alegre: EDPUCRS, 2000 BETTENCOURT, Estevão. Para entender o Antigo Testamento. 4. ed., Aparecida: Editora Santuário, 1990. GERSTENBERGER. Erhard. Teologias no Antigo Testamento : Pluralidade e sincretismo da fé em Deus no Antigo Testamento. São Leopoldo: Editora Sinodal, 2007. GILBERTO, Antônio. A Bíblia através dos séculos: a historia e formação do livro dos livros. Rio de Janeiro: CPAD, 1986. GUNNEWEG, Antonius H. J. Teologia Bíblica do Antigo Testamento: uma história da religião de Israel na perspectiva bíblico-teológica. São Paulo: Editora Teológica: Edições Loyola, 2005. NADAL, Milagro. Curso de Iniciação ao Antigo e ao Novo Testamento. São Paulo: Edições Loyola, 1998. RENDTORFF, Rolf. A formação do Antigo Testamento. 7. ed. São Leopoldo: Editora Sinodal, 2002. SHREINER, J. Palavra e Mensagem do Antigo Testemunho. 2. ed. São Paulo: Editora Teológica, 2004