Ex-Multishow (editora de conteúdo novas mídias), Claudia agora é roteirista da Rede Globo e um dos primeiros trabalhos, além da experiência independente na websérie “Quero Ser Solteira”, foi ser autora colaboradora em Malhação Sonhos, uma das maiores audiências da franquia desde então. Em uma entrevista para o GShow, ela menciona as tecnologias digitais: “com a ajuda das redes sociais, a gente fica sabendo quase imediatamente o que o público está achando da novela. Eles sobem #, criam campanhas, dão sugestões pra trama e até brigam com a gente”.
e-Plan Conecta Novela e internet: interação 360° com Claudia Sardinha
1.
2. Pergunta 1
e-Plan Conecta: Conte um pouco sobre o seu começo na
internet e o que você aprendeu com a sua websérie?
3. Claudia Sardinha: “Eu comecei na internet assim que eu comecei a
trabalhar, na verdade. Porque eu acho que a gente é uma geração que nasceu
já muito nessa fase, nessa era digital e das redes sociais. Então, para mim era
muito espontâneo. E aí logo no meu primeiro estágio, eu fui trabalhar em um
portal de notícias e aí o meu primeiro emprego assim que eu me formei foi num
site de vendas coletivas e aí quando eu decidi produzir o meu próprio conteúdo,
era pra mim uma questão mais de conteúdo e mais autoral do que um objetivo
de plataforma, mas por questões de distribuição, de cinema, eu queria fazer uma
série, eu não tinha acesso aos grandes canais, não tinha ainda como entrar na
televisão e não tinha como distribuir aquilo no cinema porque era ainda muito
complicado e eu tinha 18 anos. Aí eu resolvi soltar na internet. Então, foi assim
que começou.”
5. Claudia Sardinha: “Foi a grande virada na minha carreira quando eu lancei
o "Quero Ser Solteira", que foi a minha websérie, que deu uma mudadinha na
minha vida. Eu passei seis meses pesquisando a internet, o que funcionava na
internet. Cheguei a conclusão que funcionava, na época pelo menos, humor,
funcionava alguma coisa de mundo bizarro e sexo. Aí eu pensei o que eu tenho
de conteúdo que mistura isso tudo que seja verdadeira pra mim também? Aí eu
fiz o "Quero ser solteira", que era história de uma menina que não queria casar e
não queria ter um relacionamento sério, soltei na internet, fizemos uma
estratégia que foi soltar no dia dos namorados e aí quero ser solteira no dia dos
namorados acabou gerando um pouco de mídia espontânea e isso foi muito
legal, ajudou a gente a começar e se destacar ali nas redes e foi assim.”
6. Pergunta 3
e-Plan Conecta: O CASE “MALHAÇÃO SONHOS - COMO A
INTERNET AJUDOU NO SUCESSO DA TV”. Na novela, você estava
envolvida com o processo de criação do Fanfics? Como isso se
deu e quais foram as expectativas e os resultados?
7. Claudia Sardinha: “Em Malhação Sonhos, a gente usava muito a internet. A internet
nasceu junto com a novela. Eu acho que um dos principais responsáveis por isso são os meus
chefes, a Rosane Svartman e o Paulo Halm, que já tinham trabalhado na Malhação Intensa, que
tinha acontecido dois anos antes e eles tinham sido indicados ao Emmy de Internet porque eles
fizeram uma coisa muito legal que foi a TV Orelha, que era como se fosse um Vlog de notícias
de um personagem, que aquilo se relacionava com a trama diretamente e isso deu uma
bombada. Então, a Rosane estuda muito internet, está fazendo doutorado nisso agora e ela
quando cria já se preocupa muito com isso, já é muito natural para ela também. A gente assiste
a novela olhando as segundas telas, que hoje em dia nem chamam mais de segunda tela
porque já não existe mais isso, são várias telas sendo consumidas ao mesmo tempo. Aí a gente
pensou como isso ia funcionar. Existe uma equipe de internet dentro da novela que junto com a
gente pensa em iniciativas tanto de serviço, para dar informação sobre a novela, quanto de
conteúdo exclusivo. Então, algumas coisas funcionaram muito.”
8. Claudia Sardinha: “A gente fez a Fanfic, que foi um case enorme. Os fãs já fazem Fanfic,
eles já interferem. Existe a nossa história e existe a história deles que corre pela lateral, paralelamente
do que eles gostariam que tivesse acontecido ou coisas que a gente não tem tempo de mostrar na
tela, eles criam do lado de fora. A primeira vez de um personagem, que a gente não mostrou por
exemplo, eles criavam do lado de fora e aí a gente decidiu que queria trazer isso pra gente também e
criou essa possibilidade de os fãs escreverem uma cena que a gente ia passar no ar. Isso aconteceu
em duas ocasiões: quando a Bianca estava em dúvida entre dois casais - a gente fez a cena de Dona
Flor e seus dois maridos, que foi uma sugestão do público e eles mandaram essa linha, até na época
eu fui responsável por adaptar essa cena, transformar ela no roteiro da novela, mas sendo fiel às
falas, às ações que estavam descritas no texto e isso foi muito legal. A gente começou a sentir
realmente, ter uma experiência viva de dar pra eles conteúdo, eles editarem, mandar pra gente e esse
conteúdo ir ao ar. Mandar essa ideia pra gente, a gente escrever uma cena e os atores da novela, a
equipe da novela, os diretores da novela, fazer todo mundo pensar em uma cena que foi idealizada
por um fã e essas cenas a gente sempre tentava fazer com que elas fossem importantes na trama,
que fossem momentos de virada.”
10. Claudia Sardinha: “Desde o início, como a gente tinha uma novela sobre
sonhos e sobre esse ar inspiracional, artístico também pois tinha a Ribalta que
era um set perfeito pra isso, a gente criou o "Você em Malhação". Era mais ou
menos uma vez por mês e as pessoas poderiam enviar um vídeo, tinha um
tema, mostrando o talento delas, dançando, cantando, faziam qualquer
performance relacionada a esse tema e uma vez por mês uma dessas pessoas
era escolhida a partir dessa performance para fazer uma participação na novela.
Então, esse foi o primeiro caminho de interação direta, que é pegar um fã e
colocar ele dentro da novela. E aí isso começou a se expandir.”
11. Pergunta 5
e-Plan Conecta: O segundo caminho do CASE MALHAÇÃO
SONHOS – Monitoramente e Empoderamento do público.
12. Claudia Sardinha: “A gente também fazia os Vlogs, tinha uma websérie de uma
personagem e dois outros Vlogs de outras personagens e a gente começou a ver que
era muito espontâneo. Os fã-clubes se organizavam para subir hashtags e a gente
tinha sempre mais de um Trending Topic por dia, espontaneamente, criado por eles.
Eles se organizavam, determinavam um horário para fazer aquilo e faziam
campanhas também para conseguir chamar a nossa atenção do que eles queriam
que acontecesse, queria que esse casal ficasse junto ou que eles se separassem. Aí
a gente começou a ver que eles faziam também coisas assim, por exemplo, pegavam
fotos dos atores, faziam montagens, com uma música legal, que tava na trilha e
soltavam esse conteúdo no Youtube e aquilo gerava uma repercussão grande entre
os fãs. E aí a gente resolveu que tudo que a gente via acontecendo fora, a gente
tentava trazer para dentro da novela.”
13. Pergunta 6
e-Plan Conecta: Comente sobre as vantagens de ter um
feedback interativo e instantâneo do público no digital? Os
comentários das redes sociais influenciam no rumo das tramas?
14. Claudia Sardinha: “Essa interação com o público tem milhões de vantagens. A
primeira que consigo falar de cara é a mais subjetiva e emotiva pra mim, que é o
contato direto com as pessoas que estão gostando ou não gostando daquilo que
você está fazendo. Você está em contato direto com o seu público, com o seu
consumidor e você sabe se ele está gostando ou não. Por exemplo, a gente tinha
muita resposta no Facebook, que era grande parte do nosso público, mas também
temos que entender que aquilo é segmentado, pois quando você está fazendo uma
novela na Globo e está dando 26 pontos de Ibope, tem que ver que aquilo representa
o Brasil e o Twitter é um nicho disso, são pessoas de 18 a 25 anos, enfim, tem um
perfil ali, mas aquele perfil é uma parcela importante, é uma parcela representativa
do seu público. É claro que não é exclusiva, mas é muito gostoso pois a gente fica
escrevendo, as vezes 1 ano ou mais e ficamos ali entre a gente, as vezes vai
viciando as opiniões, você fica envesado.”
16. Claudia Sardinha: “É uma galera muito criativa, muito engajada, te ajudando a escrever a
novela, te ajudando a escrever aquele conteúdo porque eles ficam de olho em tudo. Assim, se a gente
fala "fulano não sabia disso", eles falam "sabia sim, teve aquela cena que não o que". Então, eles
estão ajudando a gente com continuidade, com a história, com o background dos personagens e eles
dão ideia o tempo inteiro do que poderia acontecer. Na novela que a gente está escrevendo agora,
eles já mandam assim "se esse personagem ficasse com a outra, isso poderia acontecer porque
pensa bem, naquela cena eles se olharam e na outra ele ajudou ela a atravessar a rua, então já existe
ali uma coisa". Então, a gente fica "pode crer, se a gente precisar usar isso, esse casal é uma boa
saída”. É uma galera que tá ali disposta a te ajudar, de forma espontânea e eles brigam com a gente
também, quando eles não gostam eles falam mesmo, xingam muito no Twitter. É muito engraçado,
quando eu to escrevendo, eu penso "essa frase vai bombar no Twitter" ou essa frase vai virar Trending
Topic, essa expressão eles vão subir, porque você está vivenciando aquilo e começa a entender o que
eles gostam, começa a entender o que viraliza, que personagens eles querem fazendo o que. Tem
coisa que o fã quer ver na tela e é muito legal quando eles te pedem isso e você tem a possibilidade
de saber que tem uma galera grande que deseja isso e poder atender, se for possível.”
17. Pergunta 8
e-Plan Conecta: Existe alguma estratégia voltada para o
digital em “Totalmente demais”?
Quais são as estratégias usadas pela novela?
A MOBILIZAÇÃO DIGITAL NA NOVELA:
18. Claudia Sardinha: “SOBRE A MOBILIZAÇÃO DIGITAL NA NOVELA: Em
Totalmente Demais, que é a novela que a gente está escrevendo agora, a gente
importou algumas coisas que deram certo em Malhação. O teaser é um exemplo
disso. E para tudo isso acontecer é preciso ter uma galera, toda a equipe tem
que estar a fim de fazer aquilo acontecer e toda a equipe tem que entender a
importância disso. Os autores têm que gostar de escrever isso na novela, não
pode ser obrigação. A Rosane e o Paulo já têm ideias que vem com "e se a
gente deixasse para o público decidir o que vai acontecer na final?". Então, isso
já é uma coisa que parte deles, existe a equipe de produção e de direção da
novela que está a fim de fazer isso acontecer, que coloca na ordem do dia, que
disponibiliza equipe, tempo de set e existe a equipe de internet que é a galera
que tem essas ideias que faz acontecer, que ficam interagindo com os fãs.”
19. Claudia Sardinha: “SOBRE OS TEASERS: foi algo que deu muito certo em Malhação que é
quando eles estão editando o capítulo, lá na edição, eles pegam uns trechos e soltam aquilo no final e é
maravilhoso. Assim que a gente assiste um capítulo, a gente corre pro site porque a gente também quer ver o
teaser. Queremos ver como aquilo continua, como aconteceu, como foi digirido. Então, existe esse fluxo que o
teaser disponibiliza e tem um fluxo de acesso grande. O principal case de Totalmente Demais é que, como a
gente tava no universo da moda, é muito viva na internet com fast fashion e as blogueiras, o conteúdo digital
interferindo na redação das revistas e na vitrine. E aí a gente vê que isso gerou alterações na indústria da
moda, como aquelas pessoas vão consumir. Então, a gente criou uma personagem, que é a “Lu”, uma
funcionária da Totalmente Demais, que é a revista de moda da novela e ela é uma blogueira de moda e de
estilo, super antenada nas tendências e a gente conseguiu, eu acho que é a primeira vez na história da Globo,
que uma personagem tivesse um perfil no Instagram, de verdade. O personagem foi colocado em uma rede
social, que já é usada pelo público e então, na novela, ela tira foto, faz selfie e trinta segundos depois estão
postadas no Instagram dela e a gente produz conteúdo exclusivo também. É um Instagram muito divertido
para quem assiste a novela porque interage de maneira muito mais profunda, existe uma continuação do que
está acontecendo e também é rico mesmo para quem não assiste a novela, para quem gosta de moda, pois
existe uma equipe de figurino pensando naquele look, nas dicas que ela vai dar. Algumas pessoas realmente
se envolvem com isso e passam a conversar com a personagem, ali através daquela rede social.”
20. Pergunta 9
e-Plan Conecta: É possível medir se o sucesso na internet
influencia diretamente na audiência da novela na TV?
21. Claudia Sardinha: “Eu já trabalhei muito com essa interação do público com o
conteúdo que eu estava desenvolvendo. Eu já fiz isso com a minha websérie
independente que eu subi no Youtube, eu já fiz isso com websérie do site do
Multishow, que é um canal fechado e eu to fazendo isso agora com novela, na Globo,
que é TV aberta. Acho que dependendo do seu conteúdo e onde ele está sendo
exibido, a interação com a internet influencia de uma forma diferente. Porque na TV
aberta, o alcance é nacional e muito grande. O público de internet, no Brasil hoje
ainda, não representa a maioria do público, apesar de todo mundo agora ter celular,
mas o acesso de banda larga não é muito grande, o download de vídeos ainda é
complicado. Tem que pensar em tudo isso quando está em uma TV aberta gerando
conteúdo. Quando você está em uma TV fechada, que a audiência já é mais nichada,
aquela amostra da internet é muito mais representativa do seu conteúdo e do seu
público.”
22. Pergunta 10
e-Plan Conecta: E fora da TV aberta? A repercussão da
internet influenciava nos números da audiência?
23. Claudia Sardinha: “No Multishow, influenciava muito. Quando fazia websérie e colocava uma
webceleb como personagem, era crucial para minha audiência no site, porque um post, uma divulgação que
aquela pessoa fazia as vezes valia mais do que a divulgação institucional por conta de ser uma coisa que o
público de internet gosta, sem ser conteúdo empurrado, sem ser anúncio. Foi quando a gente começou a
fazer os spin-offs de personagens no Multishow. Ao invés de postar cartela anunciando que à 22h30, você vai
assistir o Vai Que Cola, a gente postava o Vlog da Jéssica, que era um conteúdo desenvolvido
exclusivamente pra aquilo, dela falando algo engraçado dos personagens e no final subia a cartela.
Começamos a perceber que funcionava muito mais porque as pessoas compartilham esse conteúdo, falam
“fulano, olha você na boate…” e a cartela está ali passando o serviço. Quando você posta uma cartela
“Assista o Vai Que Cola às 22h30”, a interação com o público é muito menor. O público tem menos vontade,
se sente entubado em uma propaganda. Em Totalmente Demais, o público é um pouco mais velho. Sabemos,
através de pesquisas, que muitas coisas são sucesso e não necessariamente todas essas coisas que são
sucesso estão no Twitter, no Facebook ou no Instagram. Ainda é muito empírico, tá todo mundo testando,
aprendendo a lidar, mas se você tem informação, é sempre valiosa. Se tem acesso fácil, rápido, barato a ela,
você pode de fato mudar o rumo da história. Pode pegar uma ideia ou sentir um movimento, um fluxo e ir.
Empoderamos o público e eles viram co-autores da obra. Meus chefes sempre falavam “cuidado com o que
desejam”, vocês querem isso mas pode não ser bom para aquele personagem, tem coisas que a gente sabe e
segura essa informação lá no final que não sabem ainda.”
25. Claudia Sardinha: “A gente em Totalmente Demais e na Globosat, quando
eu estava no Multishow, usava o que estava bombando na época e onde a gente
encontrava o melhor alcance. Em Totalmente demais, com temos a blogueira de
moda e é algo muito imagético, a gente desenvolveu essa personagem para o
Instagram. Achamos melhor ter um Instagram com os looks do dia, do que um
Vlog com tutorial de maquiagem, que também seria uma opção. Mas o
Instagram era uma inovação maior agora, nesse momento. A websérie a gente
posta só no nosso canal, no nosso site, mas replicamos alguns conteúdos no
Facebook, como em Malhação. As vezes um casal era mais forte no Facebook e
outro no Twitter e rolava essa briga. Era pelo perfil do público. O público mais
velho está no Facebook, o mais jovem no Twitter, outro público no Instagram.”