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 Raízes da identidade da Geografia Marxista na obra Crítica da Filosofia do Direito de
                     Hegel: aplicações na Epistemologia da Geografia


                                                 RIBEIRO JUNIOR, José Arnaldo dos Santos
                                               RONDON/NEPS/AGADÁ/GEDMMA/UFMA
                                                                    aj_ramone@hotmail.com


                                                 ALMEIDA, Juscinaldo Góes - NEPS/UFMA
                                                                juscinaldogoes@hotmail.com


                     Orientadores: Prof. Dr. Baltazar Macaíba Sousa (NEPS/DESOC/UFMA)
                                            Prof. Marcelo de Sousa Araújo (PGCULT/NEPS)


Resumo: O presente estudo visa rastrear elementos radiculares da Geografia Marxista na obra
Crítica da Filosofia do Direito de Hegel, e possíveis aplicações na epistemologia da
Geografia, contribuindo desta forma para o avanço no campo da teoria e método.


Palavras-Chave: Princípios da Filosofia do Direito. Crítica da Filosofia do Direito de Hegel.
Marx. Geografia Marxista.


1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS


       Inicialmente este trabalho representa um duplo desafio: 1) o desafio de se resgatar o
“Marx esquecido”, ou seja, trazer à tona as discussões filosóficas e políticas que o “Jovem
Marx” aborda em sua Tese de Doutorado, na Questão Judaica, nos Manuscritos Econômico-
Filosóficos e, no caso específico, da Crítica da Filosofia do Direito de Hegel. O segundo
desafio é aplicar as suas ideias filosóficas e políticas estabelecendo um paralelo e, ao mesmo
tempo, um diálogo entre Geografia e Filosofia, mostrando para a primeira (Geografia), que a
Filosofia não é supérflua e muito menos está presa ao campo das ideias, ao passo que para
segunda (Filosofia), a Geografia afirma-se como Ciência Humana e Social, dotada de cabedal
teórico-metodológico e epistemológico, no qual a teoria e a prática materializam-se no
Espaço, objeto de estudo da Geografia.
       Dito isto, aborda-se aqui as concepções marxianas da Crítica da Filosofia do Direito
de Hegel, obra do ano de 1843, na qual Marx tece críticas ferozes e contundentes ao
2



“endeusamento” do Estado por parte de Hegel, haja vista este último, subordina àquele a
Sociedade Civil e a Família na obra Princípios da Filosofia do Direito.
           Meticulosamente é traçado, simultaneamente à análise das obras citadas, paralelos e
aplicações à Epistemologia, Método e Teoria em Geografia, uma vez que a obra de Marx
apresenta material filosófico e político riquíssimo aplicável nas análises geográficas sobre
Espaço.


2 Crítica da Filosofia do Direito de Hegel, Marxismo e Geografia 1: Contribuições para a
Epistemologia na Ciência Geográfica


           Na obra Princípios da Filosofia do Direito, Hegel (2003: 226) deixa bem evidente o
caráter superior do Estado em detrimento da Família e Sociedade Civil, uma vez que os
interesses particulares, privados, tanto da Família, como da Sociedade Civil são
universalizados no Estado2. Por isso, ele afirma que:

                              261 - Em face do direito privado e do interesse particular, da família e da sociedade
                              civil, o Estado é, por um lado, necessidade exterior e poder mais alto; subordinam-
                              se-lhe as leis e os interesses daqueles domínios mas, por outro lado, é para eles fim
                              imanente, tendo a sua força na unidade do seu último fim universal e dos interesses
                              particulares do indivíduo; esta unidade exprime-se em terem aqueles domínios
                              deveres para com o Estado na medida em que também têm direitos (§ 155º).


           Sendo assim, para Hegel, a família e a sociedade civil são esferas ideais do Estado, são
seus pressupostos (fato este que o próprio Marx considera), mas que, contraditoriamente,
estão subordinados ao Estado. No entanto, o próprio Marx (1983: 11-12) aponta: “enquanto a
idéia é subjectivada, os sujeitos reais, a sociedade civil, a família [...] transformam-se aqui em
momentos subjectivos da idéia, não reais, tendo um sentido diferente”. Hegel em sua obra
traça uma oposição sistemática entre a esfera política-econômica, o Estado, e a esfera social, a
Sociedade Civil (LALLEMENT, 2004).
           O que Karl Marx pretende demonstrar em sua magnífica obra é a constante
contradição em que Hegel desenvolve as suas idéias. No caso específico citado acima, Marx
aponta que família e a sociedade civil são reais, ou seja, a divisão do Estado em família e

1
    QUAINI, Massimo. Marxismo e Geografia. 3ªed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979.
2
    A Família e Sociedade Civil são, em dois momentos respectivos, a resolução das contradições entre o Direito e
a Moral, uma vez que o Direito aparece enquanto regulação das relações entre os proprietários; já a Moral é a
constituição das relações entre os sujeitos. De acordo com CHAUÍ, Marilena. O que é ideologia. 2ªed. São
Paulo: Brasiliense, 2008.
3



sociedade civil é essencial para que o próprio Estado erija-se e tenha em si mesmo essa
consciência. Marx vai refutando contundentemente, na sua obra, a mentalidade hegeliana,
pois não crê que o Estado determine a Família e a Sociedade Civil, muito menos aceita a
mistificação proposta por Hegel para com o Estado prussiano autoritário 3. Como Lallement
(2004: 111-112) aponta “[...] longe de ser a solução para todos os problemas sociais, o Estado
é na realidade - inclusive em regimes democráticos - apenas um fator de alienação. Noutras
palavras ainda, não é tanto o Estado que cria a sociedade, mas o inverso [...]”.
          Aqui cabe já estabelecer conexões com a Geografia Política Clássica, que tem no
Estado o grande ator do espaço mundial. Moodie (1965) mostra que o Estado tem três
elementos essenciais: território, povo e organizações. Ora, mas o território nada mais é que
um espaço definido e delimitado por relações poder (SOUZA, 2007). Se pensarmos bem,
quando a Sociedade Civil organiza-se e luta por seu território surge uma estrutura de
ingerência multiescalar denominada Estado, ratificando o que Marx já havia apontado no que
tange à Sociedade Civil e à Família erigindo-se a si mesmas como Estado. De fato, não pode
existir Estado sem território, território sem sociedade civil, sociedade civil sem família,
portanto sem essas instâncias não há Estado. “Significa isto que o Estado político não pode
existir sem a base natural da família e a base artificial da sociedade civil” (MARX, 1983: 13).
          Continuando, Marx ao tecer críticas à Hegel pelo endeusamento do Estado em
detrimento da sociedade civil (LALLEMENT, 2004) traz à tona a perspectiva da
transformação social. Como? Na parte dedicada ao poder soberano, Marx ironiza Hegel
escrevendo: “Como se o povo não fosse o Estado real! O Estado é abstracto; só o povo é
concreto” (MARX, 1983: 44). A razão dessa ironia de Marx deve-se ao fato de Hegel
constantemente conceber Estado Político independente do povo. Isso fica bem claro nas
afirmações de Hegel, quando escreve: “a razão do Estado, a consciência do Estado, é uma
personalidade empírica única que exclui todas as outras [...] a personalidade do Estado só se
torna real como pessoa e no monarca (HEGEL apud MARX, 1983: 41)”.
          Notadamente, quando Hegel afirma que “o Estado é uma personalidade empírica que
exclui todas as outras”, pode-se ler: o Estado é uma personalidade empírica que exclui a
Sociedade Civil e Família. Por isso, Marx vai ser incisivo ao expressar que o grande objetivo
de Hegel é apresentar o monarca como um ser onipotente e onisciente, uma espécie de


3
    Moraes (2005a: 116-117) inculca que as formulações de Ratzel constituem um dos melhores exemplos de
“prussianismo”, sendo um dos veículos da aguerrida política cultural nacionalista e militarista de Bismarck.
Ratzel é o pioneiro formulador da Geografia política e um teórico do apetite “territorial” do Estado.
4



“Homem-Deus”. “A personalidade do Estado só é real como pessoa: o monarca” (HEGEL,
2003: 255-256). Evidentemente Hegel contradiz os próprios pressupostos do Estado, a
Sociedade Civil e a Família.
         Não obstante, Marx (1983: 32-33) reitera dizendo que: “os assuntos e actividades do
Estado estão ligados a indivíduos (o Estado só pode actuar através dos indivíduos); não o
indivíduo físico, mas sim o indivíduo político, isto é, tomado na sua condição de membro do
Estado”. Como se pode ver, Marx está contra-argumentando Hegel, pois este toma o poder
soberano, o monarca, enquanto arbítrio, impossibilitando assim a constituição do interesse
geral.
         Prosseguindo, Marx rebate Hegel pela definição que este último dá ao monarca:
personalidade do Estado, certeza de si. “O monarca é a soberania personificada, a soberania
encarnada, a consciência objetiva do Estado que exclui a soberania de todas as outras
entidades e as priva da personalidade e da consciência do Estado” (HEGEL apud MARX,
1983: 41).

                         Hegel parte do Estado e conclui que o homem é o Estado subjectivado; a democracia
                         parte do homem e conclui que o Estado é o homem objectivado. Assim como a
                         religião não cria o homem e é o homem que cria a religião, também a constituição
                         não cria o povo, sendo este que cria a constituição. De um certo ponto de vista, a
                         democracia está para todas as outras formas políticas como o cristianismo está para
                         as outras religiões. O cristianismo é a religião por excelência, a essência da religião,
                         o homem deificado sob a forma de religião particular. [...] a democracia está para
                         todas as outras formas políticas tal como a religião está para o seu Antigo
                         Testamento. O homem não existe devido à lei; esta é que existe devido a ele, sendo,
                         portanto uma existência humana, enquanto que nas outras formas políticas o homem
                         é a existência legal. Eis a diferença fundamental da democracia (MARX, 1983: 46-
                         47).


         Este trecho acima citado é riquíssimo para se entender a genialidade de Marx em sua
análise. Se repararmos bem, Marx refuta o idealismo hegeliano por meio do seu materialismo
histórico-dialético, no qual afirma que é a matéria, dinamicamente, que cria a idéia, ou seja,
por exemplo, é o homem que cria a religião e não o contrário. Sendo assim, Marx tira a
dialética da subordinação para com o idealismo, fato sumariamente evidenciado na obra
hegeliana (POLITZER, 1981).
         No tópico do poder governativo, a idéia central da crítica de Marx é quanto ao fato de
Hegel ter desenvolvido este poder apenas enquanto administração (burocracia), ou seja, o
braço do Estado. Hegel vai construindo a todo o momento a oposição entre poder governativo
e sociedade civil, tal como dois exércitos inimigos como Marx escreve. Para Marx a
burocracia é a corporação do Estado, por isso rebate Hegel (2003: 266-267) quando este
último diz:
5



                            A conservação do interesse geral do Estado e da legalidade entre os direitos
                            particulares, a redução destes àqueles exigem uma vigilância por representantes do
                            poder governamental, por funcionários executivos e também por autoridades mais
                            elevadas com poder deliberativo, portanto colegialmente organizadas. No seu
                            conjunto, as autoridades elevam-se à proximidade imediata do monarca.


          Equivocadamente Hegel pensara que construiu os representantes do poder
governamental, os funcionários executivos, como representantes da sociedade civil. Todavia
acabou por fixar a oposição entre Estado e Sociedade Civil por meio dos referidos
representantes do poder governamental, os funcionários executivos. Sabiamente Marx (1983:
77) adverte que:

                            Com estes representantes não é suprimida a oposição; esta é antes transformada em
                            oposição legal, rígida. O Estado, na medida em que é estranho e exterior ao ser da
                            Sociedade Civil, é defendido pelos representantes deste ser contra a sociedade civil.
                            A polícia, os tribunais, a administração, não são representantes da própria sociedade
                            civil, vigiando em si mesmos e através de si mesmos o seu próprio interesse comum,
                            mas sim representantes do Estado encarregados de o administrar contra a sociedade
                            civil.


          Não obstante, Hegel aborda em sua obra, um aspecto importante, que é o patriotismo e
que se pode fazer um paralelo com a Geografia.

                            Assim como a sociedade civil é o campo de batalha dos interesses individuais de
                            todos contra todos, assim aqui se trava o conflito entre este interesse geral e os
                            interesses da comunidade particular e, por outro lado, entre as duas espécies de
                            interesses reunidas e o ponto de vista mais elevado do Estado e suas determinações.
                            O espírito corporativo, que nasce da legitimidade dos domínios particulares, no
                            interior de si mesmo se transforma em espírito do Estado, pois no Estado encontra o
                            meio de alcançar os seus fins particulares. Esse é, deste ponto de vista, o segredo do
                            patriotismo dos cidadãos: reconhecem o Estado como sua substância, pois
                            conservam os seus interesses particulares, sua legitimidade, sua autoridade e
                            seu bem-estar. No espírito corporativo, que imediatamente implica a ligação do
                            particular ao universal, é onde se verifica como o poder e a profundidade do
                            Estado radicam-se nos sentimentos (HEGEL, 2003: 267, os grifos são nossos).


          Fazendo uma comparação com a Geografia, verifica-se que esta disciplina serviu
durante muito tempo (e ainda serve) à louvação da pátria, do Estado-Nação, vide a Escola
Alemã, a Escola Francesa e Escola Anglo-Saxônica4, por exemplo, que se utilizaram do
discurso geográfico para edificar o nacionalismo.

                            Hoje ainda, em todos os Estados, e sobretudo nos novos Estados recentemente
                            saídos do domínio colonial, o ensino da geografia é, incontestavelmente, ligado à
                            ilustração e à edificação do sentimento nacional. Que isso agrade ou não, os
                            argumentos geográficos pesam muito forte, não somente no discurso político (ou
                            politizado), mas também na expressão popular da idéia de pátria, quer se trate de

4
    Para maiores informações sobre as escolas geográficas vide MOREIRA, Ruy. O que é Geografia. São Paulo:
Brasiliense, 2007.
6



                            reflexos de uma ideologia nacionalista invocada pelos coronéis, uma pequena
                            oligarquia, uma "burguesia nacional", uma burocracia de grande potência, ou se
                            refira aos sentimentos do povo vietnamita (LACOSTE, 2007: 57).


          Quando Marx inverte a lógica hegeliana que aponta a subordinação da Sociedade
Civil, da Família e, até mesmo da Filosofia, para com o Estado, abriu espaço para que, mais
tarde, em meados do século XX, geógrafos estabelecessem este mesmo paralelo no que tange
à dialética Sociedade-Espaço. Como foi trabalhado/feito este paralelo? A resposta é a
Geografia Crítica ou Marxista.

                            A influência de Hegel pode ser reconhecida na obra de Ratzel e mesmo nos
                            trabalhos de Ritter. Marx teria igualmente influenciado em muitos pontos o trabalho
                            de Ratzel, de Vidal de La Blache, de Jean Brunhes. Todavia, e por múltiplas razões,
                            foi a herança idealista e positivista que, afinal de contas, acabou por se impor à
                            geografia, isto é, à geografia oficial: o cartesianismo, o comtismo e o kantismo eram
                            frequentemente apoiados e misturados aos princípios de Newton e também ao
                            darwinismo e ao spencerismo (SANTOS, 2002: 48).
          Até antes da incursão da doutrina marxiana/marxista na Geografia, esta ciência era
dominada pelo Positivismo 5. E como é do conhecimento dos estudiosos, o positivismo incutiu
na Geografia o indutivismo, a não explicação dos fenômenos e a mera observação dos
mesmos.

                            Tendo tais exercidos preparatórios mostrado espontaneamente a inanidade radical
                            das explicações vagas e arbitrárias próprias à filosofia inicial, quer teológica, quer
                            metafísica, o espírito humano renuncia de ora em diante às pesquisas absolutas, que
                            só convinham à sua infância, e circunscreve os seus esforços ao domínio desde então
                            rapidamente progressivo, da verdadeira observação, única base possível dos
                            conhecimentos realmente acessíveis, criteriosamente adaptados às nossas
                            necessidades efetivas (COMTE, 2009: 12).


          O trecho acima extraído é da obra Discurso Preliminar Sobre O Espírito Positivo, de
autoria de Isidore - Auguste - Marie - François - Xavier Comte, mais conhecido como
Augusto Comte. Neste pequeno trecho têm-se idéia do pensamento comtiano e da sua
influência na Geografia, pois esta ciência adotou como pano de fundo a descrição dos fatos,
dos lugares, das paisagens. A esta vertente da Geografia dá-se o nome de Geografia
Tradicional e era uma vertente puramente fisiográfica, na qual, o homem era apenas um
elemento da paisagem, ou como diria Paul Vidal de La Blache, “a Geografia é uma ciência
dos lugares e não dos Homens” (MORAES, 2005: 79).


5
    “Filosofia determinista que professa, de um lado, o experimentalismo sistemático e, de outro, considera
anticientífico todo o estudo das causas finais. Assim, admite que o espírito humano é capaz de atingir verdades
positivas ou da ordem experimental, mas não resolve as questões metafísicas, não verificadas pela observação e
pela experiência” (RIBEIRO JÚNIOR, 2006:15).
7



          Sob a matriz do Positivismo, a Geografia serviu para escamotear a vital importância de
se pensar o Espaço, escondendo assim as contradições vigentes no seu processo de produção.
A preocupação social era nula, haja vista não era enfatizada a Sociedade Civil (possível
alusão à Marx), mas sim o Estado (possível alusão à Hegel). O marxismo, só penetrará na
Geografia a partir da crise ambiental e dos modelos quantitativistas presentes.

                            O marxismo representa uma forma de pensamento enraizada na filosofia de Georg
                            Wilhelm Hegel (1770-1831). Todavia tenha aí suas raízes, não é um pensamento de
                            corte romântico e idealista, como o é o pensamento hegeliano, ponto alto da filosofia
                            clássica alemã. Marx (1818-1883) extrai da filosofia de Hegel o seu sentido de
                            história e o caráter dialético do real, seja esse real a natureza - campo da história
                            natural -, seja ele o homem - campo da história social -, uma história se desdobrando
                            na outra como processo de construção do homem. O sentido da história dá o tom
                            holista do pensamento marxista: a história social do homem é o salto de qualidade
                            dialético do desenvolvimento da sua história natural, um processo realizado pelo
                            trabalho (“desde quando aparece no mundo, história natural e história social do
                            homem se confundem” como Marx sintetiza em A Ideologia Alemã), por meio do
                            qual se dá a hominização do homem pelo próprio homem, fundando com isso o
                            materialismo histórico (MOREIRA, 2006:39-40).


          O período de efervescência que foi experimentado na segunda metade do século XX
abalou a Geografia. Geógrafos inquietos com as diretrizes tomadas por esta ciência começam
a questionar a função ideológica da mesma, a serviço principalmente do Estado.

                            Colocar como ponto de partida que a geografia serve, primeiro, para fazer a guerra
                            não implica afirmar que ela só serve para conduzir operações militares; ela serve
                            também para organizar territórios, são somente como previsão das batalhas que é
                            preciso mover contra este ou aquele adversário, mas também para melhor
                            controlar os homens sobre os quais o aparelho de Estado exerce sua autoridade
                            (LACOSTE, 2007: 22-23, os grifos são nossos).


          Geógrafos como P. George, R. Guglielmo, B. Kayser, Jean Tricart, Jean Dresch e,
principalmente Yves Lacoste6, David Harvey, Edward Soja, Armando Correa da Silva,
Massimo Quaini e Milton Santos, trouxeram para esta ciência a possibilidade de se fazer uma
Geografia Nova, uma Geografia que se preocupe com a transformação da sociedade e não
sirva apenas para legitimar o domínio do aparelho Estado. Eis então o pensamento marxista
sobre a Geografia.

                            Os geógrafos dos anos 1950 e 1970 descobrem Hegel e Marx, e completam, dois
                            séculos depois, o circuito da incursão da geografia pelo terreno da filosofia clássica

6
    Sobre este autor vide A Geografia - isso serve em primeiro lugar, para fazer a guerra. 13ªed. Trad. Maria
Cecília FRANÇA. Campinas, SP: Papirus, 2007. Nesta obra o autor tece uma crítica ferrenha e contundente à
sua ciência e pelo que fizeram dela, abordando pontos ideológicos (como a ação desta disciplina e sua aliança
com o Estado), a restrição ao saber pensar o espaço que fica nas mãos de poucos, o escamoteamento da
realidade social, carências epistemológicas, geopolítica, dentre outros aspectos.
8



                             alemã, incorporando ao pensamento geográfico moderno a dialética e i sentido de
                             história de Hegel, via Marx [...](MOREIRA, 2006:40).


           Um dos maiores “marxizantes7” da geografia brasileira, Milton Santos também deu
sua contribuição, no que tange à “dialeticidade” entre Sociedade e Espaço e vice-versa,
mostrando que ambos se influenciam e se determinam e não apenas um em detrimento do
outro. Milton Santos inverte toda lógica da Geografia Tradicional na qual o espaço é apenas
um produto da sociedade determinado por esta. Inverte também a lógica da Geografia
Regional de La Blache na qual o Homem, ou Sociedade, é apenas um elemento da Paisagem,
ou seja, à luz do materialismo dialético demonstra como Homem (Sociedade) e Espaço se
influenciam concomitantemente.

                             Pode-se pensar numa dialética entre a sociedade e o conjunto de formas espaciais,
                             entre a sociedade e a paisagem? Ou a dialética se daria exclusivamente entre
                             sociedade e espaço? É a sociedade, isto é, o homem, que anima as formas espaciais,
                             atribuindo-lhes um conteúdo, uma vida. Só a vida é passível desse processo infinito
                             que vai do passado ao futuro, só ela tem o poder de tudo transformar amplamente.
                             Tudo o que não retira sua significação desse comércio com o homem, é incapaz de
                             um movimento próprio, não pode participar de nenhum movimento contraditório, de
                             nenhuma dialética [...] Não existe dialética possível entre formas enquanto formas.
                             Nem, a rigor, entre paisagem e sociedade. A sociedade se geografiza através dessas
                             formas, atribuindo-lhes uma função que, ao longo da história, vai mudando. O
                             espaço é a síntese, sempre provisória, entre o conteúdo social e as formas espaciais.
                             Mas a contradição principal é entre sociedade e espaço, entre um presente invasor e
                             ubíquo que nunca se realiza completamente, e um presente localizado, que também é
                             passado objetivado nas formas sociais e nas formas geográficas encontradas. [...] Em
                             cada momento, em última análise, a sociedade está agindo sobre ela própria, e
                             jamais sobre a materialidade exclusivamente. A dialética, pois, não é entre
                             sociedade e paisagem, mas entre sociedade e espaço. E vice-versa (2006: 70-71,
                             os grifos são nossos).


           Portanto, a Geografia Crítica ou Marxista é a saída da Geografia do estado de
minoridade. É, pois, a Geografia Marxista que estabelece a dialética material entre Sociedade
e Espaço. Se antes, para a Geografia Tradicional, pensava-se que o Espaço era determinado
unilateralmente pela Sociedade (assim como Hegel subordinava a Sociedade Civil para com o
Estado), foi a partir da segunda metade do século XX, com a Geografia Crítica, que o espaço
é evidenciado, ou seja, o Espaço também determina ou influencia a Sociedade, e vice-versa
(tal como Marx pensava e ensinava que a Família, a Sociedade Civil e o Estado se
determinam simultaneamente).

                             Não há dúvida de que a assimilação do marxismo foi a pedra angular na edificação
                             da chamada geografia crítica, influenciando de modo intenso todos os seus aspectos
                             teórico-metodológicos e ideológicos. Houve diferenças significativas nas formas
                             dessa assimilação, dependendo do país, instituição ou mesmo das interpretações

7
    Aqueles “que tiram da obra de Marx o que lhes convém”, de acordo com Netto (2006: 9).
9



                       particulares de cada geógrafo sobre a obra marxiana, mas é inegável que o marxismo
                       constituiu a principal fonte da geografia crítica ou radical (DINIZ FILHO, 2004:
                       77).


       Notadamente, não foi somente esta obra marxiana, Crítica da Filosofia do Direito de
Hegel, que influenciou os geógrafos a politizarem as questões e evidenciarem a sociedade no
espaço. Todavia, as observações que Marx pondera ao longo da obra, permitem que, mesmo
indiretamente, o espaço social, o espaço da sociedade seja posto em destaque.


3 CONSIDERAÇÕES FINAIS


       Ao longo do que foi trabalhado nesta análise, observou-se que é totalmente infrutífero
a indiferença entre Geografia e Filosofia, pois ambas fornecem elementos para a compreensão
de aspectos do mundo moderno, tanto do ponto de vista teórico/conceitual, como da práxis.
       Como já fora mencionado, Hegel vê no monarca o “Homem-Deus”, bem como no
autoritarismo do Estado, a universalização e a expressão da razão. Marx, ao contrário, ressalta
frequentemente a importância da Sociedade Civil e da Família, pois ambos influenciam
simultaneamente o Estado, haja vista são seus pressupostos. A louvação que Hegel faz junto
ao Estado, personificados no monarca e nos funcionários executivos, os representantes, mais
tarde será invertida por Marx quando o proletariado assumirá o papel principal na sociedade.
       É esta dialética materialista que modificará a maneira de se fazer e pensar Geografia a
partir de meados do século XX. Ao desgarrarem-se paulatinamente da ingerência positivista
representada pela Geografia Tradicional, geógrafos de todo mundo reafirmarão o Espaço na
Teoria Social, bem como expressarão que o mesmo não é somente, reflexo da sociedade, mas
também exerce elevada influência sobre aquela. O salto de qualidade da Geografia não
poderia ser expresso com melhor nome: GEOGRAFIA MARXISTA.


                                        REFERÊNCIAS


COMTE, Augusto. Discurso Preliminar Sobre O Espírito Positivo. Trad. Renato Barboza
Rodrigues                     PEREIRA.                           Disponível                         em:
http://www.4shared.com/file/18694960/a31f46be/Augusto_Comte_-
_Discurso_premilinar_sobre_o_espirito_positivo.html?s=1. Acesso em 19 de janeiro de 2009.
10



HEGEL, G.W.F. Princípios da Filosofia do Direito. 3ª tiragem. Trad. Orlando VITORINO.
São Paulo: Martins Fontes, 2003.


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Trad. Maria Cecília FRANÇA. Campinas, SP: Papirus, 2007.


LALLEMENT, Michel. História das idéias sociológicas: das origens a Max Weber.
2ªed.Trad. Ephraim F. ALVES. Petropólis, RJ: Vozes, 2004. Partes II e III. pp.85-321.


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Editorial Presença, 1983.


MOODIE, A.E. Geografia e Política. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1965.


MORAES. A. C. R. Geografia: pequena história crítica. 20ªed. São Paulo: Annablume, 2005.


MORAES. A. C. R. Ideologias Geográficas. 5ªed. São Paulo: Annablume, 2005a.


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São Paulo: Contexto, 2006.


NETTO, J. P. O que é marxismo. São Paulo: Brasiliense, 2006.


POLITZER, Georges. Princípios Elementares de Filosofia. Trad. Silvio Donizete
CHAGAS. São Paulo: Moraes, 1986.


QUAINI, M. Marxismo e Geografia. 3ªed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979


RIBEIRO JÚNIOR, João. O que é Positivismo, São Paulo: Brasiliense, 2006.


SANTOS, Milton. A Natureza do Espaço: Técnica e Tempo, Razão e Emoção. 4ªEd. 2ª
Reimpr. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2006.
11



SANTOS, Milton. Por uma Geografia Nova: Da Crítica da Geografia a uma Geografia
Crítica. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2002.


SOUZA, M. J. L. O TERRITÓRIO: SOBRE ESPAÇO E PODER, AUTONOMIA E
DESENVOLVIMENTO. In: CASTRO, I. E; GOMES, P. C. C; CORRÊA, R. L. (orgs).
Geografia: Conceitos e Temas. 10ªed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2007.


RIBEIRO JUNIOR, J. A. S, ALMEIDA, J. G; SOUSA, B. M; ARAÚJO, M. S. Raízes da
identidade da Geografia Marxista na obra Crítica da Filosofia do Direito de Hegel:
aplicações na Epistemologia da Geografia. Manual de Resumos do IX Encontro
Humanístico. São Luís: EDUFMA, 2009.

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Raízes da identidade da Geografia Marxista na obra Crítica da Filosofia do Direito de Hegel: aplicações na Epistemologia da Geografia

  • 1. 1 Raízes da identidade da Geografia Marxista na obra Crítica da Filosofia do Direito de Hegel: aplicações na Epistemologia da Geografia RIBEIRO JUNIOR, José Arnaldo dos Santos RONDON/NEPS/AGADÁ/GEDMMA/UFMA aj_ramone@hotmail.com ALMEIDA, Juscinaldo Góes - NEPS/UFMA juscinaldogoes@hotmail.com Orientadores: Prof. Dr. Baltazar Macaíba Sousa (NEPS/DESOC/UFMA) Prof. Marcelo de Sousa Araújo (PGCULT/NEPS) Resumo: O presente estudo visa rastrear elementos radiculares da Geografia Marxista na obra Crítica da Filosofia do Direito de Hegel, e possíveis aplicações na epistemologia da Geografia, contribuindo desta forma para o avanço no campo da teoria e método. Palavras-Chave: Princípios da Filosofia do Direito. Crítica da Filosofia do Direito de Hegel. Marx. Geografia Marxista. 1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS Inicialmente este trabalho representa um duplo desafio: 1) o desafio de se resgatar o “Marx esquecido”, ou seja, trazer à tona as discussões filosóficas e políticas que o “Jovem Marx” aborda em sua Tese de Doutorado, na Questão Judaica, nos Manuscritos Econômico- Filosóficos e, no caso específico, da Crítica da Filosofia do Direito de Hegel. O segundo desafio é aplicar as suas ideias filosóficas e políticas estabelecendo um paralelo e, ao mesmo tempo, um diálogo entre Geografia e Filosofia, mostrando para a primeira (Geografia), que a Filosofia não é supérflua e muito menos está presa ao campo das ideias, ao passo que para segunda (Filosofia), a Geografia afirma-se como Ciência Humana e Social, dotada de cabedal teórico-metodológico e epistemológico, no qual a teoria e a prática materializam-se no Espaço, objeto de estudo da Geografia. Dito isto, aborda-se aqui as concepções marxianas da Crítica da Filosofia do Direito de Hegel, obra do ano de 1843, na qual Marx tece críticas ferozes e contundentes ao
  • 2. 2 “endeusamento” do Estado por parte de Hegel, haja vista este último, subordina àquele a Sociedade Civil e a Família na obra Princípios da Filosofia do Direito. Meticulosamente é traçado, simultaneamente à análise das obras citadas, paralelos e aplicações à Epistemologia, Método e Teoria em Geografia, uma vez que a obra de Marx apresenta material filosófico e político riquíssimo aplicável nas análises geográficas sobre Espaço. 2 Crítica da Filosofia do Direito de Hegel, Marxismo e Geografia 1: Contribuições para a Epistemologia na Ciência Geográfica Na obra Princípios da Filosofia do Direito, Hegel (2003: 226) deixa bem evidente o caráter superior do Estado em detrimento da Família e Sociedade Civil, uma vez que os interesses particulares, privados, tanto da Família, como da Sociedade Civil são universalizados no Estado2. Por isso, ele afirma que: 261 - Em face do direito privado e do interesse particular, da família e da sociedade civil, o Estado é, por um lado, necessidade exterior e poder mais alto; subordinam- se-lhe as leis e os interesses daqueles domínios mas, por outro lado, é para eles fim imanente, tendo a sua força na unidade do seu último fim universal e dos interesses particulares do indivíduo; esta unidade exprime-se em terem aqueles domínios deveres para com o Estado na medida em que também têm direitos (§ 155º). Sendo assim, para Hegel, a família e a sociedade civil são esferas ideais do Estado, são seus pressupostos (fato este que o próprio Marx considera), mas que, contraditoriamente, estão subordinados ao Estado. No entanto, o próprio Marx (1983: 11-12) aponta: “enquanto a idéia é subjectivada, os sujeitos reais, a sociedade civil, a família [...] transformam-se aqui em momentos subjectivos da idéia, não reais, tendo um sentido diferente”. Hegel em sua obra traça uma oposição sistemática entre a esfera política-econômica, o Estado, e a esfera social, a Sociedade Civil (LALLEMENT, 2004). O que Karl Marx pretende demonstrar em sua magnífica obra é a constante contradição em que Hegel desenvolve as suas idéias. No caso específico citado acima, Marx aponta que família e a sociedade civil são reais, ou seja, a divisão do Estado em família e 1 QUAINI, Massimo. Marxismo e Geografia. 3ªed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979. 2 A Família e Sociedade Civil são, em dois momentos respectivos, a resolução das contradições entre o Direito e a Moral, uma vez que o Direito aparece enquanto regulação das relações entre os proprietários; já a Moral é a constituição das relações entre os sujeitos. De acordo com CHAUÍ, Marilena. O que é ideologia. 2ªed. São Paulo: Brasiliense, 2008.
  • 3. 3 sociedade civil é essencial para que o próprio Estado erija-se e tenha em si mesmo essa consciência. Marx vai refutando contundentemente, na sua obra, a mentalidade hegeliana, pois não crê que o Estado determine a Família e a Sociedade Civil, muito menos aceita a mistificação proposta por Hegel para com o Estado prussiano autoritário 3. Como Lallement (2004: 111-112) aponta “[...] longe de ser a solução para todos os problemas sociais, o Estado é na realidade - inclusive em regimes democráticos - apenas um fator de alienação. Noutras palavras ainda, não é tanto o Estado que cria a sociedade, mas o inverso [...]”. Aqui cabe já estabelecer conexões com a Geografia Política Clássica, que tem no Estado o grande ator do espaço mundial. Moodie (1965) mostra que o Estado tem três elementos essenciais: território, povo e organizações. Ora, mas o território nada mais é que um espaço definido e delimitado por relações poder (SOUZA, 2007). Se pensarmos bem, quando a Sociedade Civil organiza-se e luta por seu território surge uma estrutura de ingerência multiescalar denominada Estado, ratificando o que Marx já havia apontado no que tange à Sociedade Civil e à Família erigindo-se a si mesmas como Estado. De fato, não pode existir Estado sem território, território sem sociedade civil, sociedade civil sem família, portanto sem essas instâncias não há Estado. “Significa isto que o Estado político não pode existir sem a base natural da família e a base artificial da sociedade civil” (MARX, 1983: 13). Continuando, Marx ao tecer críticas à Hegel pelo endeusamento do Estado em detrimento da sociedade civil (LALLEMENT, 2004) traz à tona a perspectiva da transformação social. Como? Na parte dedicada ao poder soberano, Marx ironiza Hegel escrevendo: “Como se o povo não fosse o Estado real! O Estado é abstracto; só o povo é concreto” (MARX, 1983: 44). A razão dessa ironia de Marx deve-se ao fato de Hegel constantemente conceber Estado Político independente do povo. Isso fica bem claro nas afirmações de Hegel, quando escreve: “a razão do Estado, a consciência do Estado, é uma personalidade empírica única que exclui todas as outras [...] a personalidade do Estado só se torna real como pessoa e no monarca (HEGEL apud MARX, 1983: 41)”. Notadamente, quando Hegel afirma que “o Estado é uma personalidade empírica que exclui todas as outras”, pode-se ler: o Estado é uma personalidade empírica que exclui a Sociedade Civil e Família. Por isso, Marx vai ser incisivo ao expressar que o grande objetivo de Hegel é apresentar o monarca como um ser onipotente e onisciente, uma espécie de 3 Moraes (2005a: 116-117) inculca que as formulações de Ratzel constituem um dos melhores exemplos de “prussianismo”, sendo um dos veículos da aguerrida política cultural nacionalista e militarista de Bismarck. Ratzel é o pioneiro formulador da Geografia política e um teórico do apetite “territorial” do Estado.
  • 4. 4 “Homem-Deus”. “A personalidade do Estado só é real como pessoa: o monarca” (HEGEL, 2003: 255-256). Evidentemente Hegel contradiz os próprios pressupostos do Estado, a Sociedade Civil e a Família. Não obstante, Marx (1983: 32-33) reitera dizendo que: “os assuntos e actividades do Estado estão ligados a indivíduos (o Estado só pode actuar através dos indivíduos); não o indivíduo físico, mas sim o indivíduo político, isto é, tomado na sua condição de membro do Estado”. Como se pode ver, Marx está contra-argumentando Hegel, pois este toma o poder soberano, o monarca, enquanto arbítrio, impossibilitando assim a constituição do interesse geral. Prosseguindo, Marx rebate Hegel pela definição que este último dá ao monarca: personalidade do Estado, certeza de si. “O monarca é a soberania personificada, a soberania encarnada, a consciência objetiva do Estado que exclui a soberania de todas as outras entidades e as priva da personalidade e da consciência do Estado” (HEGEL apud MARX, 1983: 41). Hegel parte do Estado e conclui que o homem é o Estado subjectivado; a democracia parte do homem e conclui que o Estado é o homem objectivado. Assim como a religião não cria o homem e é o homem que cria a religião, também a constituição não cria o povo, sendo este que cria a constituição. De um certo ponto de vista, a democracia está para todas as outras formas políticas como o cristianismo está para as outras religiões. O cristianismo é a religião por excelência, a essência da religião, o homem deificado sob a forma de religião particular. [...] a democracia está para todas as outras formas políticas tal como a religião está para o seu Antigo Testamento. O homem não existe devido à lei; esta é que existe devido a ele, sendo, portanto uma existência humana, enquanto que nas outras formas políticas o homem é a existência legal. Eis a diferença fundamental da democracia (MARX, 1983: 46- 47). Este trecho acima citado é riquíssimo para se entender a genialidade de Marx em sua análise. Se repararmos bem, Marx refuta o idealismo hegeliano por meio do seu materialismo histórico-dialético, no qual afirma que é a matéria, dinamicamente, que cria a idéia, ou seja, por exemplo, é o homem que cria a religião e não o contrário. Sendo assim, Marx tira a dialética da subordinação para com o idealismo, fato sumariamente evidenciado na obra hegeliana (POLITZER, 1981). No tópico do poder governativo, a idéia central da crítica de Marx é quanto ao fato de Hegel ter desenvolvido este poder apenas enquanto administração (burocracia), ou seja, o braço do Estado. Hegel vai construindo a todo o momento a oposição entre poder governativo e sociedade civil, tal como dois exércitos inimigos como Marx escreve. Para Marx a burocracia é a corporação do Estado, por isso rebate Hegel (2003: 266-267) quando este último diz:
  • 5. 5 A conservação do interesse geral do Estado e da legalidade entre os direitos particulares, a redução destes àqueles exigem uma vigilância por representantes do poder governamental, por funcionários executivos e também por autoridades mais elevadas com poder deliberativo, portanto colegialmente organizadas. No seu conjunto, as autoridades elevam-se à proximidade imediata do monarca. Equivocadamente Hegel pensara que construiu os representantes do poder governamental, os funcionários executivos, como representantes da sociedade civil. Todavia acabou por fixar a oposição entre Estado e Sociedade Civil por meio dos referidos representantes do poder governamental, os funcionários executivos. Sabiamente Marx (1983: 77) adverte que: Com estes representantes não é suprimida a oposição; esta é antes transformada em oposição legal, rígida. O Estado, na medida em que é estranho e exterior ao ser da Sociedade Civil, é defendido pelos representantes deste ser contra a sociedade civil. A polícia, os tribunais, a administração, não são representantes da própria sociedade civil, vigiando em si mesmos e através de si mesmos o seu próprio interesse comum, mas sim representantes do Estado encarregados de o administrar contra a sociedade civil. Não obstante, Hegel aborda em sua obra, um aspecto importante, que é o patriotismo e que se pode fazer um paralelo com a Geografia. Assim como a sociedade civil é o campo de batalha dos interesses individuais de todos contra todos, assim aqui se trava o conflito entre este interesse geral e os interesses da comunidade particular e, por outro lado, entre as duas espécies de interesses reunidas e o ponto de vista mais elevado do Estado e suas determinações. O espírito corporativo, que nasce da legitimidade dos domínios particulares, no interior de si mesmo se transforma em espírito do Estado, pois no Estado encontra o meio de alcançar os seus fins particulares. Esse é, deste ponto de vista, o segredo do patriotismo dos cidadãos: reconhecem o Estado como sua substância, pois conservam os seus interesses particulares, sua legitimidade, sua autoridade e seu bem-estar. No espírito corporativo, que imediatamente implica a ligação do particular ao universal, é onde se verifica como o poder e a profundidade do Estado radicam-se nos sentimentos (HEGEL, 2003: 267, os grifos são nossos). Fazendo uma comparação com a Geografia, verifica-se que esta disciplina serviu durante muito tempo (e ainda serve) à louvação da pátria, do Estado-Nação, vide a Escola Alemã, a Escola Francesa e Escola Anglo-Saxônica4, por exemplo, que se utilizaram do discurso geográfico para edificar o nacionalismo. Hoje ainda, em todos os Estados, e sobretudo nos novos Estados recentemente saídos do domínio colonial, o ensino da geografia é, incontestavelmente, ligado à ilustração e à edificação do sentimento nacional. Que isso agrade ou não, os argumentos geográficos pesam muito forte, não somente no discurso político (ou politizado), mas também na expressão popular da idéia de pátria, quer se trate de 4 Para maiores informações sobre as escolas geográficas vide MOREIRA, Ruy. O que é Geografia. São Paulo: Brasiliense, 2007.
  • 6. 6 reflexos de uma ideologia nacionalista invocada pelos coronéis, uma pequena oligarquia, uma "burguesia nacional", uma burocracia de grande potência, ou se refira aos sentimentos do povo vietnamita (LACOSTE, 2007: 57). Quando Marx inverte a lógica hegeliana que aponta a subordinação da Sociedade Civil, da Família e, até mesmo da Filosofia, para com o Estado, abriu espaço para que, mais tarde, em meados do século XX, geógrafos estabelecessem este mesmo paralelo no que tange à dialética Sociedade-Espaço. Como foi trabalhado/feito este paralelo? A resposta é a Geografia Crítica ou Marxista. A influência de Hegel pode ser reconhecida na obra de Ratzel e mesmo nos trabalhos de Ritter. Marx teria igualmente influenciado em muitos pontos o trabalho de Ratzel, de Vidal de La Blache, de Jean Brunhes. Todavia, e por múltiplas razões, foi a herança idealista e positivista que, afinal de contas, acabou por se impor à geografia, isto é, à geografia oficial: o cartesianismo, o comtismo e o kantismo eram frequentemente apoiados e misturados aos princípios de Newton e também ao darwinismo e ao spencerismo (SANTOS, 2002: 48). Até antes da incursão da doutrina marxiana/marxista na Geografia, esta ciência era dominada pelo Positivismo 5. E como é do conhecimento dos estudiosos, o positivismo incutiu na Geografia o indutivismo, a não explicação dos fenômenos e a mera observação dos mesmos. Tendo tais exercidos preparatórios mostrado espontaneamente a inanidade radical das explicações vagas e arbitrárias próprias à filosofia inicial, quer teológica, quer metafísica, o espírito humano renuncia de ora em diante às pesquisas absolutas, que só convinham à sua infância, e circunscreve os seus esforços ao domínio desde então rapidamente progressivo, da verdadeira observação, única base possível dos conhecimentos realmente acessíveis, criteriosamente adaptados às nossas necessidades efetivas (COMTE, 2009: 12). O trecho acima extraído é da obra Discurso Preliminar Sobre O Espírito Positivo, de autoria de Isidore - Auguste - Marie - François - Xavier Comte, mais conhecido como Augusto Comte. Neste pequeno trecho têm-se idéia do pensamento comtiano e da sua influência na Geografia, pois esta ciência adotou como pano de fundo a descrição dos fatos, dos lugares, das paisagens. A esta vertente da Geografia dá-se o nome de Geografia Tradicional e era uma vertente puramente fisiográfica, na qual, o homem era apenas um elemento da paisagem, ou como diria Paul Vidal de La Blache, “a Geografia é uma ciência dos lugares e não dos Homens” (MORAES, 2005: 79). 5 “Filosofia determinista que professa, de um lado, o experimentalismo sistemático e, de outro, considera anticientífico todo o estudo das causas finais. Assim, admite que o espírito humano é capaz de atingir verdades positivas ou da ordem experimental, mas não resolve as questões metafísicas, não verificadas pela observação e pela experiência” (RIBEIRO JÚNIOR, 2006:15).
  • 7. 7 Sob a matriz do Positivismo, a Geografia serviu para escamotear a vital importância de se pensar o Espaço, escondendo assim as contradições vigentes no seu processo de produção. A preocupação social era nula, haja vista não era enfatizada a Sociedade Civil (possível alusão à Marx), mas sim o Estado (possível alusão à Hegel). O marxismo, só penetrará na Geografia a partir da crise ambiental e dos modelos quantitativistas presentes. O marxismo representa uma forma de pensamento enraizada na filosofia de Georg Wilhelm Hegel (1770-1831). Todavia tenha aí suas raízes, não é um pensamento de corte romântico e idealista, como o é o pensamento hegeliano, ponto alto da filosofia clássica alemã. Marx (1818-1883) extrai da filosofia de Hegel o seu sentido de história e o caráter dialético do real, seja esse real a natureza - campo da história natural -, seja ele o homem - campo da história social -, uma história se desdobrando na outra como processo de construção do homem. O sentido da história dá o tom holista do pensamento marxista: a história social do homem é o salto de qualidade dialético do desenvolvimento da sua história natural, um processo realizado pelo trabalho (“desde quando aparece no mundo, história natural e história social do homem se confundem” como Marx sintetiza em A Ideologia Alemã), por meio do qual se dá a hominização do homem pelo próprio homem, fundando com isso o materialismo histórico (MOREIRA, 2006:39-40). O período de efervescência que foi experimentado na segunda metade do século XX abalou a Geografia. Geógrafos inquietos com as diretrizes tomadas por esta ciência começam a questionar a função ideológica da mesma, a serviço principalmente do Estado. Colocar como ponto de partida que a geografia serve, primeiro, para fazer a guerra não implica afirmar que ela só serve para conduzir operações militares; ela serve também para organizar territórios, são somente como previsão das batalhas que é preciso mover contra este ou aquele adversário, mas também para melhor controlar os homens sobre os quais o aparelho de Estado exerce sua autoridade (LACOSTE, 2007: 22-23, os grifos são nossos). Geógrafos como P. George, R. Guglielmo, B. Kayser, Jean Tricart, Jean Dresch e, principalmente Yves Lacoste6, David Harvey, Edward Soja, Armando Correa da Silva, Massimo Quaini e Milton Santos, trouxeram para esta ciência a possibilidade de se fazer uma Geografia Nova, uma Geografia que se preocupe com a transformação da sociedade e não sirva apenas para legitimar o domínio do aparelho Estado. Eis então o pensamento marxista sobre a Geografia. Os geógrafos dos anos 1950 e 1970 descobrem Hegel e Marx, e completam, dois séculos depois, o circuito da incursão da geografia pelo terreno da filosofia clássica 6 Sobre este autor vide A Geografia - isso serve em primeiro lugar, para fazer a guerra. 13ªed. Trad. Maria Cecília FRANÇA. Campinas, SP: Papirus, 2007. Nesta obra o autor tece uma crítica ferrenha e contundente à sua ciência e pelo que fizeram dela, abordando pontos ideológicos (como a ação desta disciplina e sua aliança com o Estado), a restrição ao saber pensar o espaço que fica nas mãos de poucos, o escamoteamento da realidade social, carências epistemológicas, geopolítica, dentre outros aspectos.
  • 8. 8 alemã, incorporando ao pensamento geográfico moderno a dialética e i sentido de história de Hegel, via Marx [...](MOREIRA, 2006:40). Um dos maiores “marxizantes7” da geografia brasileira, Milton Santos também deu sua contribuição, no que tange à “dialeticidade” entre Sociedade e Espaço e vice-versa, mostrando que ambos se influenciam e se determinam e não apenas um em detrimento do outro. Milton Santos inverte toda lógica da Geografia Tradicional na qual o espaço é apenas um produto da sociedade determinado por esta. Inverte também a lógica da Geografia Regional de La Blache na qual o Homem, ou Sociedade, é apenas um elemento da Paisagem, ou seja, à luz do materialismo dialético demonstra como Homem (Sociedade) e Espaço se influenciam concomitantemente. Pode-se pensar numa dialética entre a sociedade e o conjunto de formas espaciais, entre a sociedade e a paisagem? Ou a dialética se daria exclusivamente entre sociedade e espaço? É a sociedade, isto é, o homem, que anima as formas espaciais, atribuindo-lhes um conteúdo, uma vida. Só a vida é passível desse processo infinito que vai do passado ao futuro, só ela tem o poder de tudo transformar amplamente. Tudo o que não retira sua significação desse comércio com o homem, é incapaz de um movimento próprio, não pode participar de nenhum movimento contraditório, de nenhuma dialética [...] Não existe dialética possível entre formas enquanto formas. Nem, a rigor, entre paisagem e sociedade. A sociedade se geografiza através dessas formas, atribuindo-lhes uma função que, ao longo da história, vai mudando. O espaço é a síntese, sempre provisória, entre o conteúdo social e as formas espaciais. Mas a contradição principal é entre sociedade e espaço, entre um presente invasor e ubíquo que nunca se realiza completamente, e um presente localizado, que também é passado objetivado nas formas sociais e nas formas geográficas encontradas. [...] Em cada momento, em última análise, a sociedade está agindo sobre ela própria, e jamais sobre a materialidade exclusivamente. A dialética, pois, não é entre sociedade e paisagem, mas entre sociedade e espaço. E vice-versa (2006: 70-71, os grifos são nossos). Portanto, a Geografia Crítica ou Marxista é a saída da Geografia do estado de minoridade. É, pois, a Geografia Marxista que estabelece a dialética material entre Sociedade e Espaço. Se antes, para a Geografia Tradicional, pensava-se que o Espaço era determinado unilateralmente pela Sociedade (assim como Hegel subordinava a Sociedade Civil para com o Estado), foi a partir da segunda metade do século XX, com a Geografia Crítica, que o espaço é evidenciado, ou seja, o Espaço também determina ou influencia a Sociedade, e vice-versa (tal como Marx pensava e ensinava que a Família, a Sociedade Civil e o Estado se determinam simultaneamente). Não há dúvida de que a assimilação do marxismo foi a pedra angular na edificação da chamada geografia crítica, influenciando de modo intenso todos os seus aspectos teórico-metodológicos e ideológicos. Houve diferenças significativas nas formas dessa assimilação, dependendo do país, instituição ou mesmo das interpretações 7 Aqueles “que tiram da obra de Marx o que lhes convém”, de acordo com Netto (2006: 9).
  • 9. 9 particulares de cada geógrafo sobre a obra marxiana, mas é inegável que o marxismo constituiu a principal fonte da geografia crítica ou radical (DINIZ FILHO, 2004: 77). Notadamente, não foi somente esta obra marxiana, Crítica da Filosofia do Direito de Hegel, que influenciou os geógrafos a politizarem as questões e evidenciarem a sociedade no espaço. Todavia, as observações que Marx pondera ao longo da obra, permitem que, mesmo indiretamente, o espaço social, o espaço da sociedade seja posto em destaque. 3 CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao longo do que foi trabalhado nesta análise, observou-se que é totalmente infrutífero a indiferença entre Geografia e Filosofia, pois ambas fornecem elementos para a compreensão de aspectos do mundo moderno, tanto do ponto de vista teórico/conceitual, como da práxis. Como já fora mencionado, Hegel vê no monarca o “Homem-Deus”, bem como no autoritarismo do Estado, a universalização e a expressão da razão. Marx, ao contrário, ressalta frequentemente a importância da Sociedade Civil e da Família, pois ambos influenciam simultaneamente o Estado, haja vista são seus pressupostos. A louvação que Hegel faz junto ao Estado, personificados no monarca e nos funcionários executivos, os representantes, mais tarde será invertida por Marx quando o proletariado assumirá o papel principal na sociedade. É esta dialética materialista que modificará a maneira de se fazer e pensar Geografia a partir de meados do século XX. Ao desgarrarem-se paulatinamente da ingerência positivista representada pela Geografia Tradicional, geógrafos de todo mundo reafirmarão o Espaço na Teoria Social, bem como expressarão que o mesmo não é somente, reflexo da sociedade, mas também exerce elevada influência sobre aquela. O salto de qualidade da Geografia não poderia ser expresso com melhor nome: GEOGRAFIA MARXISTA. REFERÊNCIAS COMTE, Augusto. Discurso Preliminar Sobre O Espírito Positivo. Trad. Renato Barboza Rodrigues PEREIRA. Disponível em: http://www.4shared.com/file/18694960/a31f46be/Augusto_Comte_- _Discurso_premilinar_sobre_o_espirito_positivo.html?s=1. Acesso em 19 de janeiro de 2009.
  • 10. 10 HEGEL, G.W.F. Princípios da Filosofia do Direito. 3ª tiragem. Trad. Orlando VITORINO. São Paulo: Martins Fontes, 2003. LACOSTE, Yves. A Geografia - isso serve em primeiro lugar, para fazer a guerra. 13ª ed. Trad. Maria Cecília FRANÇA. Campinas, SP: Papirus, 2007. LALLEMENT, Michel. História das idéias sociológicas: das origens a Max Weber. 2ªed.Trad. Ephraim F. ALVES. Petropólis, RJ: Vozes, 2004. Partes II e III. pp.85-321. MARX, Karl Heinrich. Crítica da Filosofia do Direito de Hegel. 2ªed. Portugal-Brasil: Editorial Presença, 1983. MOODIE, A.E. Geografia e Política. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1965. MORAES. A. C. R. Geografia: pequena história crítica. 20ªed. São Paulo: Annablume, 2005. MORAES. A. C. R. Ideologias Geográficas. 5ªed. São Paulo: Annablume, 2005a. MOREIRA, R. Para onde vai o pensamento geográfico?: Por uma epistemologia crítica. São Paulo: Contexto, 2006. NETTO, J. P. O que é marxismo. São Paulo: Brasiliense, 2006. POLITZER, Georges. Princípios Elementares de Filosofia. Trad. Silvio Donizete CHAGAS. São Paulo: Moraes, 1986. QUAINI, M. Marxismo e Geografia. 3ªed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979 RIBEIRO JÚNIOR, João. O que é Positivismo, São Paulo: Brasiliense, 2006. SANTOS, Milton. A Natureza do Espaço: Técnica e Tempo, Razão e Emoção. 4ªEd. 2ª Reimpr. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2006.
  • 11. 11 SANTOS, Milton. Por uma Geografia Nova: Da Crítica da Geografia a uma Geografia Crítica. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2002. SOUZA, M. J. L. O TERRITÓRIO: SOBRE ESPAÇO E PODER, AUTONOMIA E DESENVOLVIMENTO. In: CASTRO, I. E; GOMES, P. C. C; CORRÊA, R. L. (orgs). Geografia: Conceitos e Temas. 10ªed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2007. RIBEIRO JUNIOR, J. A. S, ALMEIDA, J. G; SOUSA, B. M; ARAÚJO, M. S. Raízes da identidade da Geografia Marxista na obra Crítica da Filosofia do Direito de Hegel: aplicações na Epistemologia da Geografia. Manual de Resumos do IX Encontro Humanístico. São Luís: EDUFMA, 2009.