1. O documento trata de uma ação indenizatória movida por Vera de Arruda Miranda contra a Prefeitura Municipal de Sorocaba por danos morais decorrentes de um acidente causado por um piso escorregadio na cidade.
2. Foi concedida parcialmente a apelação da autora. Ficou comprovado o nexo causal entre a queda da autora no piso da calçada e a responsabilidade do município, que deve indenizar os danos morais no valor de R$10.000,00 corrigidos mais j
Direito administrativo. apelação cível e reexame necessário. ms. edital de
Apelação responsabilidade civil do estado - queda em calcada - condenacao danos morais.
1. PODER JUDICIÁRIO!
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SAO PAULO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO
ACÓRDÃO/DECISÃO MONOCRÁTICA
REGISTRADO(A) SOB N°
ACÓRDÃO
*03446139*
Vistos, relatados e.discutidos estes autos de
Apelação rí° 0007134-43. 2008 . 8 . 26. 0602, da Comarca de
,
Sorocaba, em que é apelante VERA DE ARRUDA MIRANDA
sendo apelado PREFEITURA MUNICIPAL DE SOROCABA.
ACORDAM, em 9a Câmara de Direito Público do
Tribunal de Justiça de Sao Paulo, proferir a seguinte
decisão: "DERAM PROVIMENTO EM PARTE AO RECURSO. V.
U.", de conformidade com o voto do(a) Relator(a), que
integra este acórdão.
O julgamento . teve a participação dos
Desembargadores ANTÔNIO RULLI (Presidente sem voto),
DÉCIO NOTARANGELI E GONZAGA FRANCESCHINI. ' •
São Paulo, 02 de março de 2011
SER6I0 GOMES
RELATOR
2. PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
APELAÇÃO CÍVEL N° 990.10.068956-8
COMARCA: SOROCABA
APELANTE: VERA DE ARRUDA MIRANDA
APELADO: MUNICÍPIO DE SOROCABA
VOTO 15033
APELAÇÃO - RESPONSABILIDADE CIVIL DO
ESTADO - Acidente - Queda em calçada -
Sentença de Improcedência - Argumentos, em
parte, convincentes - Conjunto probatório que
confirma o nexo causai entre a atuação do
município e o acidente - Piso escorregadio -
Dano moral caracterizado - Descabimento do
pagamento de pensão mensal - Apelante
professora aposentada - Não comprovação da
necessidade de custeio de novos tratamentos
médicos em virtude do acidente - Sentença
reformada em parte. APELO PARCIALMENTE
PROVIDO.
Trata-se de ação indenizatória movida por VERA
APARECIDA DE ARRUDA MIRANDA em face do MUNICÍPIO DE
SOROCABA objetivando a condenação do réu no pagamento de
indenização por danos morais, pensionamento mensal no equivalente a um
salário mínimo e pagamento de despesas médicas, ao argumento de que
teria sido "vítima do piso escorregadio colocado pela Prefeitura Municipal, na
região central da cidade de Sorocaba".
Devidamente citado (fl. 37), o réu apresentou
contestação, sustentando ausência de nexo de causalidade entre sua
conduta e o acidente no qual se envolveu a autora, não havendo, portanto,
falar em responsabilidade pelos eventuais danos por ela suportados (fls.
38/48).
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Após regular instrução, sobreveio sentença de
improcedência dos pedidos, com a conseqüente condenação da autora no
pagamento das despesas processuais e honorários de advogado, arbitrados
em 10% sobre o valor da causa (fls. 291/294).
Inconformada, a autora apela. Sustenta ter restado
devidamente comprovado nos autos que o tombo que sofreu no centro da
cidade ocorreu em virtude do fato de ser extremamente escorregadio o piso
instalado pelo réu. Afirma que a municipalidade sequer teria refutado a
matéria "publicada no dia 29/maio/2007, na primeira página do Jornal
Cruzeiro do Sul, em que o DD. Prefeito de Sorocaba Dr. Vitor Lippi revela
que o piso da área central da cidade de Sorocaba era realmente perigoso e
diante disso fixou que no prazo de 60 (sessenta) dias o referido piso não
seria mais escorregadio". Assevera, ainda, que a prova testemunhai
carreada aos autos comprovou suas alegações de que após "ter caído
permaneceu sentada no piso escorregadio da calçada sem conseguir se
levantar, chorando de dor e exposta a humilhação e vexame dos transeuntes
do centro da cidade de Sorocaba que os enxergavam de forma de
compaixão", arrematando que sofreu dor moral indenizável, notadamente
por conta da lesão que lhe causou deformidade. Com base em tal
argumentação, pugna pela reforma integral do julgado, para colhimento dos
pleitos formulados na inicial (fls. 297/307).
Não foi apresentada resposta ao recurso (fl. 310 v°).
É O RELATÓRIO.
O recurso convence em parte.
Com efeito, restou inconteste nos autos a queda da
autora na rua da Penha, centro da cidade de Sorocaba, conforme se
observa da prova coligida aos autos, notadamente do depoimento da
testemunha Joel Guerreiro, que prestou auxílio à apelante na ocasião do
infortúnio (fl. 128/129) e da testemunha Helena Cortez Souza , que declarou
ter ouvido um barulho, olhado para trás e visto a autora no chão, queixando-
se de dores e, posteriormente, sendo resgatada em uma ambulância (fl.
130).
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No mais, respeitado o entendimento do r. juízo
sentenciante, há nexo de causalidade entre a conduta do apelado e a queda
sofrida pela apelante.
Deveras, conforme se observa dos autos, inúmeros
acidentes ocorreram em virtude da falta de aderência do piso colocado pela
municipalidade na área central da cidade de Sorocaba.
Tais acidentes, conforme informação da imprensa
sorocabana, eram comuns na região central daquela urbe. Em maio de
2007, equipe de reportagem teria recebido relato de pessoa que trabalha na
região de que diariamente pessoas escorregavam em local com o mesmo
piso existente na calçada onde caiu a apelante: "essa cena repete-se
diariamente, inúmeras vezes e com diversas pessoas. Não são apenas
idosos que caem não. Mas eles são os que mais têm dificuldade para se
levantar e os que mais facilmente se machucam. Muita gente jovem e até
crianças são vítimas do piso também" (í. 26).
Em fevereiro de 2007, segundo consta de notícia
jornalística, pessoa jovem teria também sofrido uma queda na região central
de Sorocaba e fraturado o braço esquerdo (fl. 27).
Deve ser observado que, consoante relatou a testemunha
Joel Guerreiro, "a região em que caiu a autora conta com o mesmo piso da
praça central"'(fl. 128).
Nessa quadratura, nem mesmo diante do laudo pericial
trazido pelo apelado com seus memoriais finais (fl. 132/283) há como se
afastar a responsabilidade pelos danos oriundos do acidente em questão.
Em recente decisão da Décima Segunda Câmara de
Direito Público deste tribunal, já foi o município de Sorocaba condenado em
razão de acidente ocasionado pelo escorregadio piso instalado no centro
daquela cidade:
RESPONSABILIDADE CIVIL. Queda em piso cerâmico escorregadio
na via pública. Danos morais devidos pelo sofrimento e limitações decorrentes das lesões.
Dever do Município manter as vias públicas em condições seguras para os usuários.
Demanda procedente. Recurso parcialmente provido. (Apelação 994.08.089520-0, rei. Des.
Edson Ferreira, j . em 07/07/2010). ?
láçaó cível n. 990.10.068956-8 3
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Do corpo de tal julgado, a elucidativa passagem,
inteiramente aplicável também ao caso em questão: "O piso escorregadio,
fato determinante da queda, é responsabilidade do Município, sem evidência
de motivos excludentes dessa responsabilidade. Assim, cabe indenização
por danos morais pelo sofrimento físico decorrente das lesões, dos
transtornos com o tratamento e conseqüentes limitações durante o período
de convalescença".
Assim, diante da comprovada existência de nexo causai
entre o ato da ré e a queda sofrida pelo autor, patente o dever de indenizar
por parte do réu.
Inegável que a situação pela qual a apelante passou
causou extremo sofrimento e tristeza, caracterizando o dano moral.
"Colocando a questão em termos de maior amplitude, Savatier oferece uma
definição de dano moral como "qualquer sofrimento humano que não é
causado por uma perda pecuniária", e abrange todo atentado à reputação da
vítima, à sua autoridade legitima, ao seu pudor, à sua segurança e
tranqüilidade, ao seu amor-próprio estético, à integridade de sua inteligência,
a suas afeições etc. ("Traité de Ia responsabilité civile", vol.ll, n.525)... Em
sua obra "Danni morali contrattuali" Dalmartelo enuncia os elementos
caracterizadores do dano moral, segundo sua visão, como a privação ou
diminuição daqueles bens que têm um valor precípuo na vida do homem e
que são a paz, a tranqüilidade de espírito, a liberdade individual, a
integridade física, a honra e os demais sagrados afetos, classificando-os em
dano que afeta a parte social do patrimônio moral (honra, reputação etc);
dano que molesta a parte afetiva do patrimônio moral (dor, tristeza, saudade
etc); dano moral que provoca direta ou indiretamente dano patrimonial
(cicatriz deformante etc), e dano moral puro (dor, tristeza etc.)" (In
Responsabilidade Civil e sua Interpretação Jurisprudencial- 2 a ed., RT.pág.
458, Rui Stoco).
Percebe-se, destarte, que o dano moral fica configurado
quando se molesta a parte afetiva do patrimônio moral, como no caso de
frustração, dor e tristeza, o que ocorreu na hipótese vertente.
Em casos semelhantes, este Colendo Tribunal de Justiça
já decidiu:
Apelação cível n. 990.10.068956-8 4
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"Indenização - Danos morais e materiais decorrentes de
acidente motociclístico ocasionado por buraco aberto em via pública - Nexo
causai comprovado - Falta de diligência da ré na conservação - Ausência de
demonstração de culpa do autor no evento - Sentença mantida - Recurso
desprovido." (Apelação 994.08.153516-6, rei. Des. Ferraz de Arruda, j . em
14/04/10)
"RESPONSABILIDADE CIVIL Queda de motocicleta em
buraco não sinalizado na via pública. Danos morais e materiais.
CABIMENTO. Falha na prestação do serviço público de manutenção e
correta sinalização das vias públicas. Negado provimento." (Apelação
990.10.006470-3, rei. Des. Oliveira Santos, j . em 03 de maio de 2010)
O dano moral não pode ser recomposto, já que é
imensurável em termos de equivalência econômica. A indenização a ser
concedida é apenas uma justa e necessária reparação em pecúnia, como
forma de atenuar o padecimento sofrido.
Ante a inexistência de previsão legal para fixação do
montante do dano moral, já ficou assentado:
"Indenização - Responsabilidade civil. Dano moral. Verba
devida. Arbitramento. Juízo prudencial. Adequação à situação pessoal das
partes. A indenização por dano moral é arbitrâvel mediante estimativa
prudencial que leve em conta a necessidade de, com a quantia, satisfazer a
dor da vítima e dissuadir, de igual e novo atentado, o autor da ofensa. Deve,
por isso, adequar-se à condição pessoal das partes, por que não sirva de
fonte de enriquecimento da vítima, nem agrave, sem proveito, a obrigação
do ofensor. "(JTJ-LEX 236/167).
No corpo deste v. acórdão, sendo relator o então
Desembargador César Peluzo, hoje Ministro do egrégio STF, está
explicitado: "O valor por arbitrar a título de reparação moral precisa ser
eficaz para atender à sua dupla função jurídica, transparente à necessidade
de, com a quantia, satisfazer a dor da vítima e dissuadir, de igual e novo
atentado, o autor da ofensa (cf., da antiga 2a Câmara Civil, Ap. 143.413-1, in
RJTJESP 137/238-240)."
Atento a estes requisitos e considerando as lesões
suportadas pela autora, entende-se adequado a fixação da indenização por
Apelação cr n. 990.10.068956-8 5
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danos morais em R$ 10.000,00 (dez mil reais), corrigidos a partir da
prolação deste acórdão e acrescidos de juros de mora de 1 % computados
do evento danoso, a fim de proporcionar satisfação à ofendida em razão do
abalo sofrido e para que a ré envide esforços, se é que ainda não trocou o
famigerado piso, no sentido de evitar a repetição de situações como esta.
Pertinente destacar que a Lei n° 11.960/09, em vigor
desde a data de sua publicação, aos 30/6/09 (D.O.U, Seção 1, pág. 4),
dentre outras providências, alterou a redação do artigo 1°-F da Lei n°
9.494/97. Assim, para evitar incidentes desnecessários, cabe esclarecer que
o critério de correção estipulado pelo diploma de 2009 somente se aplica às
ações ajuizadas após a sua vigência, pois mencionado dispositivo versa
sobre direito material. (Vide Embargos de Declaração n° 994.07.050398-
5/50000, Relator José Santana, julgado em 10/02/10).
Quanto ao pensionamento mensal e "pagamento de
despesas futuras com médicos, cirurgias e medicamentos", sem razão a
apelante, pois não restou comprovado nos autos que ela, aposentada, tenha
sofrido diminuição em seus rendimentos por conta do fatídico acidente e, de
igual forma, não houve comprovação de que precisará de novas cirurgias ou
tratamentos médicos em virtude da queda.
Ante o recíproco decaimento, cada parte arcará com a
honorária de seu patrono e a apelante com metade do valor das custas e
despesas processuais, suspensa a exigibilidade de tais verbas, ante o
deferimento dos benefícios da gratuidade da justiça.
Isto posto, dão, em parte, provimento ao apelo, como
acima constou.
São Paulo, 02 de março de 2.011.
ERGIO GOMES
RELATOR
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